setembro 25, 2007

As versões da história

AS VERSÕES DA HISTÓRIA

Edmar Oliveira


Eu, que nunca gostei de livro didático, não devia entrar nesta história. Mas é da minha índole martelar sobre causas perdidas. Tudo começou com um artigo do Ali Kamel, n'O Globo, sobre um livro didático adotado pelo MEC, para a oitava série. Que o tal livro de história continha fatos ideológicos favoráveis ao socialismo e às biografias de figuras do comunismo, como Mao e Stalin. Que era um absurdo, para ideologias "já mostradas superadas", que isto fosse ensinado nas escolas. Até aqui fiquei quieto, ainda achando que o colunista, também, fazia uma análise mais do que ideológica por outro viés. Os jornais se assanharam. O ministro da educação teve que se explicar em entrevistas. Os leitores protestaram indignados. Comoção nacional: estávamos a assistir uma lavagem cerebral em nossas crianças. Coisas do gênero.

Até que culminou num outro colunista, de viés ideológico ainda mais aos direitos que o outro, protestar de forma tão ao gosto da grande imprensa: ele mesmo, sim, o defensor da lisura na história da humanidade, já tinha alertado que "A História da Riqueza do Homem", de Leo Huberman, forma o pensamento de esquerda nacional. E, que este livro, escrito em 1937, fazia loas ao "equivoco da humanidade" – que foi o socialismo – e errou feio na sua análise do capitalismo, que vive o seu esplendor no século XXI de forma "pungente". [1] Aqui é onde fui provocado a martelar contra a onda de indignação dos jornais. Sempre estou contra a corrente. Minha avó dizia que se eu morresse afogado no rio, deveriam procurar o corpo rio acima, dado a minha teimosia, que faz parte da minha constituição física, psíquica, química, histórica, geográfica e biológica. Só não teimo com a matemática, que é tão exata como as razões femininas.

Quando a gente passa a ter certeza do que é certo, está muito perto de uma proposta de censura. Li "A História da Riqueza do Homem" na ditadura e me lembro que era um livro proibido, que em nome da democracia de hoje querem proibir! Porque é ultrapassado e equivocado, já que seus ideais fracassaram e a globalização do capitalismo venceu. Esse é meu medo da democracia moderna. Ela só permite o pensamento único. Aí sim, coitadas de nossas crianças. Acho que o Leo Huberman tem muito a ensinar a molecada de hoje. Meus filhos devem a ele não aceitar o capitalismo como verdade absolutista de direito divino, mas como um dos caminhos possíveis para a humanidade, carregado das tragédias perpetuadas pelas injustiças que arrebatam os excluídos.

Não quero aqui defender o livro de história censurado. Até não simpatizo com os biografados defendidos. Só acho que ele pode ser escrito e que seja aceito ou rejeitado pelo teste de realidade que só os leitores são capazes de fazer. A comissão do MEC já até reconheceu que o livro não deva estar sob recomendação didática. E isto quem faz é uma comissão de professores, num processo democrático possível, como possível sempre é a democracia, que deve ser colocada no horizonte das utopias. Não era preciso tanta tempestade, ainda mais para uma versão histórica. E eu, que aprendi que o grito do Ipiranga aconteceu no quadro de Pedro Américo e que a Princesa Isabel libertou os escravos, como é que fico? Agora, que já sei até que não foi Cabral que descobriu o Brasil, quem me devolve os erros históricos que aprendi?

Vamos acalmar os ânimos. Não existe um só livro de história fiel ao que realmente aconteceu. Esta devia ser a primeira lição do professor, para evitar que se puxe o que se acha certo para um lado ou para o outro. A história, queiramos ou não, é apenas uma versão da realidade que se impõe no futuro...

21/09/2007

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