NOTA PÚBLICA
Contra a desvinculação dos benefícios da Seguridade Social do salário mínimo
Notícias veiculadas reiteradamente pela imprensa, por exemplo, nos jornais do dia 07 de agosto [1] informa que o governo teria voltado atrás em sua posição de não desvincular os benefícios da seguridade social do salário mínimo numa eminente reforma da Previdência Social. Mas, uma das medidas defendidas pelo Ministro da Previdência Social Luiz Marinho é justamente a desvinculação de alguns benefícios do salário mínimo que é a condição que assegura sua irredutibilidade. Os benefícios atacados são, mais uma vez, a aposentadoria rural e o benefício de prestação continuada (BPC), conhecido como LOAS.
Essa proposta representa um enorme retrocesso na garantia dos direitos sociais e na proteção social brasileira. E curiosamente, é defendida por um ministro, em nome de um governo, que fez sua história política na defesa dos direitos dos trabalhadores, e contou com o apoio destes para chegar onde está.
É preciso recusar definitivamente a idéia de que a Previdência só deve ser garantida àqueles que contribuíram para ela diretamente, enquanto que os que supostamente “não contribuíram” devam ser tratados de forma diferenciada, recebendo menos ou sendo acusados de que não contribuíam, por isso sendo menos merecedores do apoio do Estado.
O acerto da Constituição de 88 foi instituir a Seguridade Social, associando previdência, assistência e saúde como pilares de um sistema nacional de proteção social a todos/as os/as cidadãos/as. A Seguridade Social instituiu benefícios sociais diversos, tanto previdenciários como assistenciais, contributivos ou não, visando garantir não somente aposentadorias, pensões e auxílios aos trabalhadores que contribuem para o INSS, como também saúde para todos e suporte social para aqueles que necessitem. E para isso expandiu sua base de financiamento, que inclui não só as contribuições ao INSS, mas as contribuições sociais, a renda de loterias e mais recentemente a CPMF. Isso selou o reconhecimento de que todos os/as cidadãos/as financiam a seguridade social, direta ou indiretamente e, portanto, ela deve proteger a todos/as.
As aposentadorias rurais são dirigidas aos trabalhadores/as que durante décadas não foram reconhecidos pelo Estado e por isso ficaram de fora da Previdência garantida apenas aos/as trabalhadores/as urbanos/as. Porque deveriam receber menos que o piso de um salário mínimo garantido aos demais? Os beneficiários do BPC/Loas são idosos e pessoas portadoras de deficiência que possuem renda familiar per capita abaixo de ¼ do salário mínimo. Difícil acreditar que pessoas idosas muito pobres passaram a vida sem trabalhar. Ao contrário, a realidade é que trabalharam, em geral em condições precárias, sem carteira assinada. E muitos até contribuíam para a previdência diretamente, mas não alcançaram o direito a se aposentar, sendo suas contribuições canalizadas para o pagamento de aposentadorias de trabalhadores com melhores salários e condições de trabalho. Ou são mulheres pobres que, pela idade, não se inseriram no mercado de trabalho, mas cuidaram de seus filhos e suas famílias. Um salário mínimo para esses idosos não é privilégio, é o reconhecimento da sociedade de que seus idosos devem ser protegidos.
Quando se considera a população de mais de 60 anos, 82% das pessoas estão protegidas, restando 3,3 milhões de idosos ainda desprotegidos. Isto nos coloca em uma posição excepcional em relação à cobertura de idosos, já que a média da América Latina é de 30% a 40% de cobertura, sendo que na Argentina e Chile ela fica em torno de 60%. Esta é a razão pela qual o Brasil é hoje um país em que quase não encontramos idosos mendigando nas ruas. Ao contrário, tornaram-se provedores de suas famílias e são mais respeitados na sociedade.
As pessoas com deficiência beneficiadas pelo BPC, por sua vez, são brasileiros/as em extrema pobreza que apresentam deficiências irreversíveis, que os impede de trabalhar. Passam por uma rigorosa perícia médica antes de receber o benefício, que é também avaliado a cada dois anos. Muitos são jovens e crianças que precisam de cuidado intensivo e têm inúmeras necessidades que causam gastos elevados. Na maioria dos casos, ao menos um dos pais tem que abrir mão do trabalho porque as necessidades especiais de seus filhos requer atenção diuturna.
Já se comprovou a potência desses benefícios na redução da pobreza e das desigualdades. O Brasil tem hoje 55,9 milhões de pessoas situadas abaixo da linha de pobreza. No entanto, sem os benefícios previdenciários e assistenciais, pagos a 21 milhões de pessoas, o total de pobres, segundo dados do Ministério da Previdência Social subiria para 76,9 milhões de pessoas. E o valor do benefício faz diferença. Estudos do IPEA (2007) concluem que o BPC tem maior impacto na redução da pobreza do que o benefício do Programa Bolsa Família.
O Brasil avançou na definição de políticas para o/a idoso/a, as pessoas com deficiência, as crianças e jovens, reconhecendo sua cidadania e a necessidade de apoio do Estado. Por que agora retirar ou reduzir o principal benefício a que têm direito?
A alegação para a redução do valor dos benefícios é de novo o déficit previdenciário. Contudo, esses benefícios não são só da previdência social. O BPC é inclusive mantido com recursos da Assistência Social. Fora isso, sabe-se que o déficit de que tanto se fala não considera os recursos totais da Seguridade Social, que na verdade não é deficitária. Bastou um aumento pequeno no número de empregos formais para que, de janeiro a maio, a Previdência Social arrecadasse R$ 52,2 bilhões, 10,3% a mais do que o mesmo período em 2006. Portanto, o “insustentável” déficit da previdência pública é apenas um mecanismo de convencimento da necessidade de cortar direitos. Hoje, um dos principais alvos da sanha reformista são as mulheres e os beneficiários de salário mínimo. As mulheres teriam situação privilegiada, por receberam pensões, se aposentarem mais cedo e viverem mais. Omitem a dupla jornada de trabalho, a remuneração inferior e a função da maternidade. Segundo eles, os que ganham o mínimo também oneram os cofres da Previdência. No entanto, este argumento não se sustenta se nos debruçarmos sobre as informações fornecidas pelo próprio Ministério da Previdência: pelo segundo ano consecutivo de aumento real de salário mínimo, as receitas previdenciárias cresceram 13.9% e as despesas 13.4%.
Os defensores da redução do valor dos benefícios e das reformas na previdência alegam que teremos problemas de caixa no futuro. Esse é um problema sobre o qual de fato precisamos pensar. Mas, antes de reduzir ou retirar benefícios, propomos:
· Acabar com DRU (Desvinculação dos Recursos da União), que retira 20% dos recursos da Seguridade a cada ano;
· Rever as isenções legais dadas a diversas empresas privadas;
· Rever os valores das contribuições ao INSS, para incorporar os trabalhadores que têm ocupação mas estão fora da Previdência Social (28 milhões segundo a Previdência e 40 milhões segundo a PNAD);
· Combater drasticamente a inadimplência e a sonegação. Segundo dados da ANFIP, esses fatores, mais a isenção, somariam cerca de 20 bilhões anuais, o que corresponde a quase 3 vezes o montante pago ao BPC hoje.
O Brasil precisa ampliar sua proteção social, gerar mais empregos e desenvolvimento, para garantir vida digna a todos/as os/as brasileiros/as. Os direitos sociais não são uma “pedra no sapato” do crescimento econômico e da estabilidade. Crescimento e estabilidade devem servir para atender o bem estar dos/as cidadãos/as e não os interesses de grupos econômicos privados. Direitos sociais são a garantia de cidadãos/as saudáveis, respeitados/as e construtores/as de um futuro melhor.
ABGLT - Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis
ABONG – Associação Brasileira de ONGs
AMB – Articulação de Mulheres Brasileiras Assembléia Popular
Ateliê Gerasol (Pelo desenvolvimento Local, integrado e sustentável)
CAPINA - Cooperação e Apoio a Projetos de Inspiração Alternativa
CEBES – Centro Brasileiro de estudos em saude
CEDITER - Comissão Ecumênica dos Direitos da Terra - Tatiana Ribeiro Velloso/Presidente
Central de Movimentos Populares - CMP
Centro de Estudos Octávio Ianni (UERJ)
Centro de direitos Humanos de Palmas - TO
Centro Nordestino de Medicina Popular/Olinda-PE
CFEMEA - Centro Feminista de Estudos e Assessoria
CFESS - Conselho Federal de Serviço Social
Confederação Nacional das Associações de Moradores - CONAM
CONIC - Conselho Nacional de Igrejas Cristas
Conselho de Leigos da Arquidiocese de São Paulo - CLASP
Conselho de Leigos da Região Episcopal Ipiranga - CLERI
Conselho Nacional do Laicato do Brasil - Regional Sul 1
Consulta Popular Florianópolis
Cunhã - Coletivo Feminista da Paraíba
Criola - Rio de Janeiro
Childhope Brasil
Denise Lucinda Farage
Departamento de Serviço Social da UnB
Elvira Mirian Veloso de Mello Cosendey - Gestora do 1.º Emprego em MG - Coordenadora do FECTIPA
Elvis Elias Sampaio Pinheiro - Recife/PE
Fábio Konder Comparato – Jurista e Professor emérito da USP
Faculdade de Serviço Social da UERJ
FAOC - Fórum da Amazônia Ocidental
FASE - Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – Jorge Eduardo Durão
FASE Bahia
FMPP- Fórum Mineiro de Participação Popular
Fórum Popular do Orçamento do Rio de Janeiro / FPO-RJ
Francisco Antonio Doria, Prof. Emérito da UFRJ
GESST/UnB (Grupo de Estudos e Pesquisas em seguridade Social e Trabalho-UnB)
GESTOS- Soropositividade, Comunicação e Gênero
Gilson Moura Henrique Junior
GMEL - Grupo Mulher, Ética e Libertação
Grupo de Estudos e Pesquisas do Orçamento Público e da Seguridade Social (UERJ)
Henrique Júdice Magalhães - Jornalista, ex-servidor do INSS e pesquisador independente em Seguridade Social - Porto Alegre/RS
INAPP - Instituto de Políticas Públicas
INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos
Instituto Brasileiro de Desenvolvimento - Ibrades
Instituto Negra do Ceará – INEGRA
Instituto São Paulo de Cidadania e Política
Instituto Superior de Estudos da Religião - ISER ASSESSORIA
ISPAC - Assessoria ao Movimento Popular – Capitu
João Luiz de Souza,
José Carlos Braga – economista e Professor da UNICAM
José da Silva Seráfico de Assis Carvalho
Jubileu Sul/Brasil
Justiça Global
Laura Tavares - Professora da UFRJ
Marcha Mundial das Mulheres
Maria de Lourdes Rollemberg Mollo – UnB
Maria Lucia Fattorelli - Auditoria Cidadã da Dívida - Rede Jubileu Sul Brasil
MLPC - Movimento de Luta Popular e Comunitário de Pernambuco
Mauro Morelli - Bispo Emérito da Diocese de Duque de Caxias
Movimento de Olho na Justiça
Nilce Rosa da Costa
PACS - Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul
Pe Gabriele Cipriani - Secretário Adj./CONIC
PMM - Articulação nacional
Pólis Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais
Prof. Elaine Rossetti Behring -FSS/UERJ
PSOL - Luiz Araujo - Secretário Geral
Rede Brasileira . de Socioeconomia . Solidária - RBSES
Rede Brasil
Rede Brasileira pela Integração dos Povos – Rebrip
Rede de Educação Cidadã - Willian Bonfim - Talher Nacional
Rede Jubileu
Rodrigo Gonçalves de Souza - Eng. Agrônomo assessor técnico do Campo Vale, ASA/Minas Combate à Desertificação
Rodrigo Vieira de Ávila - Auditoria Cidadã da Dívida - Rede Jubileu Sul Brasil
Rogério Marcus Tomaz Gomes
Sindicato dos Professores de Nova Friburgo e Região – RJ
SOF Sempreviva Organização Feminista
Vicente de Paula Faleiros - Doutor em Sociologia- Coordenador do Cecria
* Jornal O Globo e Valor On Line
PICICA - Blog do Rogelio Casado - "Uma palavra pode ter seu sentido e seu contrário, a língua não cessa de decidir de outra forma" (Charles Melman) PICICA - meninote, fedelho (Ceará). Coisa insignificante. Pessoa muito baixa; aquele que mete o bedelho onde não deve (Norte). Azar (dicionário do matuto). Alto lá! Para este blogueiro, na esteira de Melman, o piciqueiro é também aquele que usa o discurso como forma de resistência da vida.
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