abril 20, 2009

Eficiência econômica, riscos e custos ambientais da reconstrução da Rodovia BR-319

Eficiência econômica, riscos e custos ambientais da reconstrução da Rodovia BR-319
Resultados preliminares, Abril de 2009

Leonardo C. Fleck & Marcos Amend
Conservação Estratégica – CSF
Consórcio FORTIS – Sul do Amazonas

A recuperação da Rodovia BR 319 é apontada como um projeto estratégico no sentido de garantir a integração do Estado do Amazonas com outras regiões do país por via terrestre, a redução dos custos de transporte e o melhor acesso da população do interior do Amazonas à capital do Estado.

Mas, a exemplo de outras estradas construídas na Amazônia, a recuperação da rodovia deve gerar pesados custos sociais e ambientais na forma de ocupação desordenada da região, aumento dos gastos públicos municipais para atender ao aumento da demanda por serviços, aumento dos conflitos sociais e dos índices de violência, desmatamento e esgotamento dos recursos naturais, entre outros. Os efeitos diversos do projeto de recuperação da Rodovia BR-319 precisam ser bem identificados. Instrumentos que garantam uma distribuição mais equilibrada dos custos e benefícios entre as várias partes afetadas precisam ser implantados.

Com o objetivo de contribuir ao debate dessas questões, realizamos uma análise custo-benefício (ACB) do projeto de recuperação da BR-319, incorporando os custos ambientais e estimando os riscos econômicos relacionados ao projeto. Neste estudo, avaliamos somente os efeitos econômico-ambientais da recuperação do principal segmento da rodovia, foco do Estudo de Impacto Ambiental, localizado entre os quilômetros 250,00 e 655,70, no Estado do Amazonas. Este trecho encontra-se fortemente deteriorado e virtualmente intransitável desde 1986. Planeja-se sua recuperação dentro do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal, com início das obras em 2009 e término em 2011. As obras analisadas, com custo de implantação de cerca de R$557 milhões, incluem a recuperação e pavimentação da rodovia e a construção de quatro novas pontes entre Manaus e Porto Velho, o que viabilizará o tráfego continuado entre Manaus e o restante do País.

Atualmente, não há estudos disponíveis que comprovem a eficiência do investimento e possam subsidiar discussões mais aprofundadas sobre as implicações sociais e ambientais de um projeto de tal magnitude. Para apoiar o debate público sobre esta questão, foram construídos dois cenários de análise: um convencional, que reflete a abordagem metodológica comumente empregada na avaliação de projetos de infra-estrutura, e um cenário integrado, que visa incorporar custos ambientais ao cenário anterior. Não foram considerados os custos sociais.

A análise do cenário convencional demonstra que o projeto é inviável economicamente, gerando prejuízos, nos próximos 25 anos, de cerca de 315 milhões de reais em valores atualizados.

1. Isso significa que para cada real gasto no projeto seriam gerados somente 33 centavos de benefícios, em valores atuais. A inviabilidade se mantém mesmo com a adoção de uma taxa de desconto tão baixa como 3%. Uma análise mais detalhada, considerando incertezas na estimação das variáveis de entrada, confirma a sua inviabilidade, indicando prejuízo médio de 354 milhões e probabilidade zero de ser viável. O projeto seria minimamente viável somente se os seus benefícios brutos fossem multiplicados por três.

Modelagens recentes indicam que o projeto provocará forte desmatamento no Interflúvio Madeira-Purus, com a perda de importantes recursos naturais ainda em excelente estado de conservação. Estimamos o custo econômico parcial do desmatamento, modelado por Soares-Filho et al. (2006a), em aproximadamente 1,9 bilhões de reais em valores atuais.

Destes, 1,4 bilhões corresponderiam ao efeito negativo do projeto sobre as mudanças climáticas globais. Mesmo que se adote um preço de carbono mais baixo, de US$3,5/tCO2 (em vez de US$5,6/tCO2), essas perdas globais representariam 877 milhões de reais, valor muito superior aos benefícios brutos gerados pelo projeto, de 153 milhões de reais.

No cenário integrado, que inclui os custos ambientais estimados ao cenário convencional, os prejuízos do projeto aumentam significativamente e, nesse momento, somariam 2,2 bilhões de reais, ou somente 6,5 centavos de benefícios para cada real de custos gerados, em valores atuais. Por outro lado, para cada real de benefícios brutos gerados, seriam produzidos 12,2 reais de custos ambientais.

Essa análise, no entanto, não incorpora os custos e benefícios potenciais da criação recente (pós 2003) e da implantação efetiva de diversas unidades de conservação, que poderão atuar como barreiras efetivas ao desmatamento. Apoiamos o Ministério do Meio Ambiente e os governos dos Estados do Amazonas e Rondônia na estimação dos custos de implementação básica de 29 Unidades de Conservação afetadas pelo projeto da BR-319.

Somente esses custos girariam em torno de R$578 milhões, em valores atuais. Isso significa que, para que o projeto de recuperação seja economicamente eficiente, teria de gerar R$893 milhões de benefícios adicionais. Para que isso seja possível, os benefícios brutos estimados teriam de ser multiplicados por 5,7 vezes. Esses custos não incluem outros investimentos necessários em conservação e governança territorial.

Referências:

SOARES-FILHO, B. S. et al. (2006a). Modelling conservation in the Amazon Basin. Nature, 440: 520–
523.

SOARES-FILHO, B. S. et al. (2006b). Modelling conservation in the Amazon Basin. Suplementary
information to “Amazon Conservation Scenarios”. Internet:
[http://www.csr.ufmg.br/simamazonia/apresenta/suppl.pdf].

Apoio:

Fundação Gordon & Betty Moore
USAID
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