julho 22, 2009

Festival Amazonas Jazz: aqui “jazz” o artista local

A internacional Banda Soda Billy
Foto: Andreia Mayumi
Prezados (as),

Escrevo-lhes esta carta aberta como forma de esclarecimento aos questionamentos que têm se tornado frequentes a todos os integrantes da banda Soda Billy e que também se estendem às pessoas próximas à banda. Há 4 anos a cidade de Manaus é agraciada pelo evento conhecido como FESTIVAL AMAZONAS JAZZ que ocorre em meados de julho e é uma iniciativa da Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas sob a coordenação do Sr. Ruy Carvalho, maestro da Amazonas Band.

De forma resumida, o evento em questão reúne grandes nomes da música brasileira e internacional além dos músicos profissionais da região, estudantes e admiradores de um modo geral. Essa reunião ocorre na forma de apresentações e oficinas organizadas na programação ao longo da semana em que o evento acontece. Sem dúvida, trata-se de uma grande oportunidade de aprender novas linguagens, trocar idéias e experiências e interagir com outros músicos advindos de outras localidades.

A pergunta em questão que tem sido feita a todos nós, integrantes, é: Quanto e aonde a banda Soda Billy irá se apresentar no FESTIVAL AMAZONAS JAZZ ? E a resposta tem sido: Infelizmente não vamos nos apresentar no Festival. Quando ocorre de a pessoa perguntar o porquê e quando há tempo de explicar (o que geralmente não ocorre porque na maioria das vezes somos abordados no meio da rua, em geral no centro de Manaus), explicamos que simplesmente não fomos convidados.

Diante disso, meus caros amigos e amigas que apreciam nossa música, nos vimos na obrigação de publicar uma carta aberta de esclarecimento desta situação, mas uma carta que também seja crítica e que aponte o ponto frágil deste Festival, frágil o suficiente para, ao nosso ver, fazê-lo ruir por inteiro tornando-o, no mínimo, deveras contraditório. A pergunta inicial que nos fazemos e que demonstra isso é: É possível um festival artístico regional sem nenhuma contribuição de artistas locais? Melhor dizendo: Qual o sentido de um Festival se ele é concebido de forma vertical, ou seja, sem considerar aquilo que é produzido localmente? Isso nos leva à clássica concepção secular de que há seres colonizados e seres colonizadores (Robson Crusoé e índio Sexta Feira??), porque valoriza a informação de fora e nega quase completamente o que é feito aqui.

Desta forma, nenhum grupo é chamado, nem a Soda Billy, nem o Jazz Verde, nem o Blues na Floresta, nem o Aldeia Instrumental, K-Tdrau Funk, nem outros mais espalhados são convidados para nada. Mas alguém pode pensar: Mas eu já vi a Soda Billy no FAJ em 2007, e este ano o Canjazz (banda local ) também vai se apresentar! Ocorre que essas bandas não são convidadas, elas provocam a sua participação solicitando à coordenação, e esta decide se há uma “brecha na programação” e quando há, não há cachê, porque o cachê é todo utilizado para pagar as atrações de fora. Ora, para quê então existe um Festival desse porte ?

Não se trata de resumir a discussão ao não-pagamento de cachês, mas sim de apontar a política de como este FAJ vem sendo direcionada: de forma vertical, de cima pra baixo sem consultas às bases (público), de forma ignorante para com o produto musical local (ignora-se a musica dos grupos locais a partir de parâmetros pouco claros, pois de acordo com fonte segura, a coordenação realmente não tem interesse no que é produzido aqui).

Vamos supor que o nível dos instrumentistas locais não seja o mesmo dos de fora, uma vez que a cultura da música instrumental só começou a ser estimulada em Manaus nos anos 90 (na ocasião do primeiro Festival de Jazz de fato, promovido em 1995 pela então Fundação Villa Lobos na Ponta Negra, e que não foi reconhecido e sequer citado pela organização dos demais, ou seja, este 4º festival na verdade deveria ser o 5º!) pensamos que mesmo assim o trabalho local deve ser valorizado e isso inclui não apenas o cachê, mas o convite formal para participação, devido reconhecimento e inclusão dos mesmos na programação principal e não apenas na programação periférica.

Nós, da Soda Billy, não queremos dinheiro público/privado gerenciado pelo Estado para tocar no FAJ, porque ganhamos nosso dinheiro batalhando com nossas próprias pernas nas noites manauaras e pelo interior divulgando blues, jazz e rock n roll, assim como outros grupos também. O que queremos é respeito e reconhecimento por parte da organização deste festival, porque entendemos que não é justo gerenciar recursos públicos e privados e não valorizar a música produzida aqui; apesar de nossos esforços, não conseguimos lidar com a contradição que este festival gera.

Em suma, organizar um festival local sem artista local, isso é algo que mexe com nosso estômago “cabôco”, aliás, isso aqui em Manaus tem nome: leseira! Porque entendemos que o FAJ parece hoje uma Nau portuguesa do século XVI ou um OVNI de outro planeta que aporta aqui. Seus tripulantes descem e lançam o conteúdo e simplesmente vão embora. Amigos e amigas, isto está errado! Esta carta tenta traduzir de forma crítica e bem humorada a indignação dos grupos alijados do FAJ, ou seja, é a prova de que não somos assim tão passivos como os ET's ou Neo-Colonizadores do Séc XXI pensam.

Acrescento que todos sabem como encontrar a banda Soda Billy, pois possuímos website, comunidade no orkut, fotolog e todos com emails e telefones acessíveis, ou seja, não nos procuraram de propósito. Nós procuramos a organização em 2007, conseguimos um espaço no Teatro Gebes Medeiros que lotou na ocasião, esperamos o contato em 2008...nada, e em 2009...nada.

Esperamos ter deixado clara a nossa indignação com a postura da coordenação do Festival, e reafirmar que não se trata de dinheiro (sabemos ganhar o nosso) nem de ressentimento por não participarmos, mas de um posicionamento político diante desse equivoco que vem sendo cometido.

Nos posicionamos dessa forma porque, segundo Aristóteles, o homem é um ser político, ou seja, a política é para nós como a água é para o peixe e, não se posicionar diante dessa situação, ou seja, calar-se, é também uma forma de se posicionar, porém uma forma covarde, frágil, medrosa e desarticulada que não move nada, ao contrário, é movida. Diante disso, nos posicionamos criticamente sem ressentimentos em relação à organização, mas na expectativa de que ocorram mudanças nos próximos anos.

Para finalizar, agradecemos a atenção dada e esperamos que o esclarecimento devido tenha sido possível do porquê de nossa não participação no FAJ. Às pessoas que esbarram na gente nas ruas, aos apreciadores da boa música, aos estudantes e professores de música e publico em geral, desejamos um ótimo FAJ em 2009, são votos sinceros de todos os integrantes da banda Soda Billy.

Grato,

Matheus Gondim de Freitas Pinto
filósofo, mestre em educação e,
acima de tudo, guitarrista da banda Soda Billy.
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2 comentários:

Anônimo disse...

É lamentável que a banda não tenha sido convidada, ainda mais quando se trata de uma das poucas representantes do estilo na cidade. Vale questionar.

Unknown disse...

Essa secretaria de cultura segue uma ideologia vira- lata , que só valoriza o que é de fora. Essa corja tem que sair para dar lugar a pessoas que possuem sensibilidade para com os artistas locais.

Lúcio Batera.