maio 17, 2011

Manifesto pró-banimento do amianto no Brasil e em solidariedade a Fernanda Giannasi

PICICA: "Fernanda Giannasi, engenheira, auditora-fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego em São Paulo e liderança indiscutível na luta pelo banimento do amianto no Brasil, recebeu ameaças de morte através de cartas postadas, pretensamente, por um departamento da Universidade de Berlim, na Alemanha. As cartas fazem clara apologia à continuidade da exploração industrial da fibra de amianto, foram escritas em linguagem agressiva e em tom ameaçador e contêm, inclusive, selos nazistas originais."








Manifesto pró-banimento do amianto no Brasil e em solidariedade a Fernanda Giannasi



O amianto, comprovadamente cancerígeno e responsável direto pela morte de muitos trabalhadores envolvidos em seu processamento, foi banido em 66 países e em quatro estados, vários municípios e capitais brasileiros. O Supremo Tribunal Federal (STF), em 04/06/2008, confirmou a lei de banimento no estado de São Paulo, modificando jurisprudências anteriores que impediam que Estados legislassem de maneira mais restritiva do que a União.


O país é um dos maiores produtores, consumidores e exportadores de amianto do mundo, que foi utilizado em quase três mil produtos industriais, principalmente telhas e caixas d´água, que são destinados, sobretudo, às populações mais carentes e, portanto, mais expostas e vulneráveis aos riscos de contaminação.


As doenças relacionadas ao amianto, como outras patologias profissionais, no Brasil, estão ainda invisíveis socialmente, ou pela falta de notificação ou pela ocultação pela própria indústria que  promove sua ocultação através de diversos mecanismos, entre os quais acordos extrajudiciais com as vítimas contendo cláusulas, como a do sigilo e a de deixarem de cumprir os compromissos firmados se forem impedidas de continuarem sua atividade utilizando substâncias químicas nocivas, como o amianto. Hoje, convive-se com um enorme silêncio epidemiológico. No caso do amianto, mais de 4.000 acordos extrajudiciais foram celebrados entre as empresas Eternit e Brasilit com seus ex e atuais empregados e somente parte destes casos foram registrados junto à Previdência Social e ao SINAN - Sistema Nacional de Agravos Notificáveis do Ministério da Saúde.


Frente a essa perversa situação, a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (ABREA) e algumas pessoas altamente comprometidas e qualificadas lutam diuturnamente para denunciar essa agressão à saúde e à vida – especialmente a dos mais pobres –, mas sofrem, por isso, constante isolamento, amordaçamento, ameaças, intimidações, perseguição e tentativas de criminalização, como já foi demonstrado no relatório Na Linha de Frente: Defensores dos Direitos Humanos no Brasil de 2002-2005, elaborado pelas organizações Justiça Global e Terra de Direitos.


Recentemente, Fernanda Giannasi, engenheira, auditora-fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego em São Paulo e liderança indiscutível na luta pelo banimento do amianto no Brasil, recebeu ameaças de morte através de cartas postadas, pretensamente, por um departamento da Universidade de Berlim, na Alemanha. As cartas fazem clara apologia à continuidade da exploração industrial da fibra de amianto, foram escritas em linguagem agressiva e em tom ameaçador e contêm, inclusive, selos nazistas originais.



A esses últimos fatos, soma-se uma longa história de ameaças e agressões sofridas por Fernanda Giannasi em função de seu engajamento profissional e social ao lado das vítimas do amianto. Foram vários processos criminais, civis e administrativos impetrados por empresas que vêm explorando e manufaturando produtos de amianto, ao longo das últimas três décadas, e que constituíram poderoso lobby, somente comparado ao do tabaco, em tamanho e poderio econômico.



Nas mais recentes ações em busca da criminalização de seu trabalho, encontram-se as reiteradas tentativas de removê-la de sua função na auditoria-fiscal na Superintendência Regional do Trabalho em São Paulo, como o processo ajuizado pela SAMA, do grupo empresarial ETERNIT, na 14ª. Vara Federal de Brasília (Processo 53186-06.2010.4.01.3400), que busca "AFASTAR A AUDITORA FISCAL DO TRABALHO "FERNANDA GIANNASI" DA FISCALIZAÇÃO DA AUTORA NO TOCANTE ÀS OPERAÇÕES CONCERNENTES AO AMIANTO" e que, felizmente, teve no dia 18/03/2011 a tutela antecipada requerida indeferida.



Responsáveis pela exportação de 65% da produção nacional de amianto in natura para a Ásia, as empresas Transportadora Cortes Ltda. e Cortes Armazéns do Guarujá buscaram também afastar Auditora-Fiscal de sua função,para que pudessem livremente agir ao arrepio da lei paulista que proíbe o amianto. Em primeiro momento, obtiveram êxito junto à Justiça Federal de Santos, que determinou que a engenheira se abstivesse de inspecionar as dependências da empresa, por seu envolvimento social na luta pela erradicação da fibra cancerígena, e alegando "a falta de imparcialidade em suas ações". Contudo, tal decisão foi reformada no Tribunal Regional Federal da 3ª. Região de São Paulo (Decisão 7642/2010 em AGRAVO DE INSTRUMENTO nº 0000023-72.2010.4.03.0000/SP impetrado pela União). Não satisfeitas com as derrotas obtidas nas instâncias superiores do Judiciário, as empresas dedicadas à exportação do amianto buscaram novamente amparo na primeira instância da Justiça Federal de Santos, que solicitou à Polícia Federal que instaurasse inquérito (IPL nº. 5-1217/09-DPF/STS/SP) para apurar possível desvio de conduta da servidora pública por "abuso de poder". Infelizmente, a autoridade policial local, Dr. Cassio Luis Guimarães Nogueira, foi levada a erro pelas empresas impetrantes e indiciou a servidora, mesmo informado sobre a decisão do Tribunal Regional Federal. Restou patente que mesmo não obtendo total êxito, as empresas teriam o indiciamento como trunfo contra a conduta ilibada da servidora, que tem constantemente comprovado os atos ilícitos cometidos por estas empresas. Resta agora ao Ministério Público Federal de Santos analisar a conclusão do inquérito policial e decidir se denuncia ou não a servidora. Se isto ocorrer, Fernanda Giannasi terá mais uma vez de ir aos Tribunais para se defender das injustas e levianas acusações do lobby do amianto, ávido por manter a servidora e fiscal longe de suas atividades.



Diante dessas ameaças, os membros da ABRASCO, reunidos em São Paulo durante o V Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde: Requerem à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) que acompanhe com atenção o caso, disponibilizando todos os meios e mecanismos necessários à proteção de Fernanda Giannasi.



Apelar à Polícia Federal que, fiel à sua missão constitucional, instaure os procedimentos necessários para que seja feita uma investigação sobre as ameaças denunciadas aqui, no sentido de identificar seu(s) autor(es) e assegurar a devida proteção à cidadã Fernanda Giannasi, recorrendo, se necessário à Interpol, que já foi avisada da existência destas cartas anônimas, que ferem a dignidade da pessoa humana;



Solicitar ao Ministério Público Federal, em sua condição de guardião da democracia, a apuração dos fatos relatados e as devidas providências no encaminhamento, acompanhamento e solução do caso;



Instar a Advocacia Geral da União (AGU) para que preste assistência jurídica à servidora pública federal que tem enfrentado dificuldades, inclusive, financeiras, para se defender diante dos inúmeros rocedimentos instaurados, com o fim único de desviá-la de seu trabalho reconhecido e premiado, não só nacional como internacionalmente em prol da saúde humana e coletiva.



Frente a certas empresas e certos setores sociais tão interessados na perpetuação do uso do amianto, que não hesitam em recorrer à manipulação de pesquisas, à chantagem do emprego e da eliminação de postos de trabalho, à criminalização dos que questionam o amianto e à violência, reafirmamos aqui o compromisso da ABRASCO pelo total banimento do amianto no Brasil, tratamento e indenização das vítimas, descontaminação e recuperação ambiental e a nossa total solidariedade para com Fernanda Giannasi e as vítimas deste mortífero produto.



Rio de Janeiro, 29 de abril de 2011.




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