PICICA: Nos anos 1980 circulava entre as comunidades de cânhamo norte-americanas
um filme de 14 minutos, feito pelo Departamento de Agricultura dos Estados
Unidos (USDA), produzido durante a Segunda Guerra Mundial. O governo
norte-americano negava a autoria. Uma pesquisa na biblioteca do USDA em
Beltsville, Mryland, confirmou a informação. Num velho catálogo de fichas foi
encontrado o sumário revelador de uma importante informação que fora subtraída
da opinião pública no processo de guerra para destruir a planta no pós-guerra: “Explica
que a guerra interrompeu o fornecimento de fibras cruas e enfatiza a
necessidade de cultivo de cânhamo nos Estados Unidos para uso militares e
civis. Retrata práticas agrícolas de plantadores de cânhamo no Kentucky e em
Wisconsin.” O filme "Hemp for Victory" teve a chancela do Depto. de Agricultura dos EUA. O que
mais teria sido apagado da Biblioteca do Congresso com o intuito de esconder incomodas verdades, porque a
história foi “reescrita” e o que forçou o governo dos Estados Unidos a cultivar
cânhamo um ano depois do termo cannabis ter sido apagada da farmacopéia oficial
dos EUA e do Formulário Nacional? Perguntas inevitáveis. O fato é que a produção de cânhamo foi
patrocinada pelo governo federal a partir daquele longínquo ano de 1942 e
mobilizou 20 mil agricultores contratados, 42 usinas de processamento a um
custo de 360 mil dólares pela Defese Plant Corporation. Égua, maninho, é
maconha pra porra!, como diria Zefofinho de Ogum, coloborador bissexto deste
PICICA. Com a aproximação do fim da guerra, garantidos o fornecimento por
produtores europeus, a produção doméstica caiu e uma reviravolta se instalou
contra a planta patriótica: ela foi transformada na erva demoníaca que iria
expor os norte-americanos à ameaça comunista. Ocorre que desde 1937, a despeito
do temor popular da maconha incentivado pela mídia, o uso da planta vinha sendo
difundido para além das populações marginais. Tanto que em 1960 ela foi
associada a um poderoso símbolo político de liberdade e desobediência civil, em
meio a legislações usadas para destruir os dissidentes políticos. Contra sua
crescente difusão e tolerância de organismos como a Comissão Nacional sobre
Marihuana, que recomendava mudanças na legislação federal, o presidente Nixon
enviou ao Congresso Nacional uma mensagem, em 17 de junho de 1971, declarando “guerra
às drogas”. Trilhões de dólares depois, a constatação do fracasso da política norte-americana,
adotada em toda a América do Sul, vem sendo reconhecida até por políticos conservadores,
como FHC, sob cuja presidência a legislação anti-drogas não desencorajou os
proibicionistas. Há sinais preocupantes de que o Brasil enfrentará uma nova
onda de conservadorismo no governo Dilma Rousseff, que acaba de instituir
medidas higienistas no enfrentamento do uso abusivo de drogas, adotando um
modelo inconstitucional baseado na internação compulsória e no financiamento de
clínica para drogados, na contramão do que recomendou a IV Conferência Nacional
de Saúde Mental. Contra a visão policial e médico-repressiva que insiste em se perpetuar
na implementação de políticas públicas, é possível outra forma de situar o convívio
com drogas ancestrais numa perspectiva histórico-cultural, sem a banalidade do
debate mecânico e linear do fundamentalismo que se abateu na sociedade do nosso
tempo. (Texto elaborado a partir do artigo "A cannabis nos Estados Unidos", publicado em O Grande Livro da Cannabis, editado por Jorge Zahar Editor, 1999).
PICICA - Blog do Rogelio Casado - "Uma palavra pode ter seu sentido e seu contrário, a língua não cessa de decidir de outra forma" (Charles Melman) PICICA - meninote, fedelho (Ceará). Coisa insignificante. Pessoa muito baixa; aquele que mete o bedelho onde não deve (Norte). Azar (dicionário do matuto). Alto lá! Para este blogueiro, na esteira de Melman, o piciqueiro é também aquele que usa o discurso como forma de resistência da vida.
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