PICICA: Vivi essa metáfora ao modo Buñuel. A cena é de uma repartição do serviço público. Quando ali cheguei, o serviço não contava com mais do que três funcionários, sem contar comigo, que dispunha de uma sala confortável. Comparada à dos demais parecia um latifúndio. O problema se deu quando chegaram mais dezessete funcionários para dividir uma sala que tinha a dimensão de uma "pequena propriedade". Virou cenário de "ocupação". Tentou-se estabelecer a "ordem". Foram improvisadas três mesas. Uma pra "chefa", professora neurotizada por anos de "guerra" no ensino público, e duas outras para os demais: numa delas acomodaram-se seis pessoas, e na outra mais quatro, todas em torno de seus PCs e noteboooks. Na prática, com "jeitinho" mais três encastelaram-se nas beiradas da mesa da "chefa". Dos que sobraram, duas passaram a dividir a mesa da minha secretária e duas outras, por absoluta falta de espaço, trabalhavam sentadas num sofá, revezando-o com aqueles que pediam para "respirar" ar puro a cada hora de trabalho. O "sufoco" tinha tudo para demorar longos meses. Sempre falta verba para realizar as mudanças necessáris em horas como essa. Um dia a professora "chefa" me confidenciou, atônita, que ela passou a sentir "fogachos" de sentimentos homicidas contra o mais simpático dos funcionários, tudo porque ela não não conseguia olhar mais para a cara da criatura que violava cotidianamente o espaço minimamente lhe era de direito. Sentia-lhe o bafo, o que era bastante desconfortável. Pior era o roçar no cangote. Aos poucos esse tipo de mau humor estendeu-se por todos que tropeçavam uns sobre os outros. Foi necessário por abaixo a divisória da sala, antes mesmo da reforma pretendida. Santo remédio; salvaram-se todos antes que o pior acontecesse. Quem viveu na Manaus dos anos 1960, com seus pouco mais de trezentos mil habitantes, e hoje quando estamos a ultrapassar dois milhões de pessoas, sabem do que estou a falar. Quanto às repartições públicas, o cenário continua precário.
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