PICICA: "Segundo dados sistematizados pela
Comissão Pastoral da Terra, 53% dos resgatados em 2013 exerciam
atividades nas cidades. Construção civil encabeça lista"
Escravidão urbana passa a rural pela primeira vez no Brasil
Segundo dados sistematizados pela
Comissão Pastoral da Terra, 53% dos resgatados em 2013 exerciam
atividades nas cidades. Construção civil encabeça lista
Fernando Stankuns
São Paulo – O número de
trabalhadores resgatados de condições análogas à escravidão em
atividades urbanas superou a quantidade de casos ocorridos no campo pela
primeira vez desde que dados sobre libertações começaram a ser
compilados. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), que
sistematizou informações que vão de 2003 a 2013, 53% das pessoas libertadas no ano passado trabalhavam nas cidades. Em 2012, esse percentual foi de 29%.
A construção civil foi a maior
responsável por isso, sendo o setor da economia brasileira com mais
casos de resgates em 2013: foram 866 libertados, ou 40% do total. Em
segundo lugar, ficou a pecuária, com 264 (12%). A construção civil já
havia liderado em 2012, mas com uma porcentagem bem menor: 23%. A
pecuária, no entanto, encabeça o “ranking” se contabilizados os casos
desde 2003, com 27% das ocorrências, seguida pela cana, com 25%. Chama a
atenção o fato de que 24% do total das libertações tenham ocorrido no
estado de São Paulo.
“Olhando para os casos de trabalho
escravo na construção civil, percebe-se que a maioria deles, se não
todos, estão em áreas urbanas. De fato é a primeira vez que os casos de
trabalho escravo em atividades não agrícolas ultrapassam os do setor
agrícola (neste incluindo as carvoarias)”, diz Xavier Plassat, da
coordenação da Campanha Nacional da CPT de Prevenção e Combate ao
Trabalho Escravo. O levantamento da entidade tem como base dados da
Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo, do
Ministério do Trabalho e Emprego (Detrae/MTE) atualizados até 28 de
janeiro de 2014.
A “disparada” de libertações no setor da
construção civil difere do observado na última atualização do cadastro
de empregadores flagrados com trabalho escravo no Brasil, também do MTE,
chamada de “lista suja”. Isso porque esta última inclui casos de
resgates acontecidos em anos anteriores. Além disso, as variações dos
números de trabalhadores escravos encontrados não refletem
necessariamente uma mudança na incidência do problema em determinado
setor econômico ou localização geográfica, pois pode também estar
relacionado a uma maior ou menor ocorrência de denúncias e inspeções
trabalhistas.
De qualquer forma, na última atualização da lista suja, ocorrida em 30 de dezembro, observou-se um crescimento
do número de inclusões de empregadores cuja atividade acontece em áreas
urbanas: foram 120 trabalhadores submetidos à escravidão em dez
estabelecimentos. Em declaração à Repórter Brasil na época, o auditor fiscal em São Paulo Renato Bignami afirmou: “percebe-se
cada vez mais que as situações descritas no artigo 149 do Código Penal
[que configuram condições análogas à escravidão] ocorrem com maior
frequência em atividades urbanas do que se imaginava e o trabalho dos
auditores fiscais vem demonstrando essa tendência”. Segundo ele, no
futuro os resgates acontecerão “majoritariamente no meio urbano”.
São Paulo lidera
Ainda de acordo com os dados compilados
pela CPT, São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Pará foram o estados
brasileiros com o maior número de trabalhadores resgatados de condições
análogas à escravidão em 2013. Os dois primeiros lideraram com folga,
com, respectivamente, 538 e 440 casos de libertação, aumento de 125,1% e
26%. Bahia e Pará vêm em seguida, com 149 e 141 casos. O Pará, que
havia encabeçado a lista em 2012, com 519 trabalhadores resgatados, teve
uma redução de 72,8% em relação ao ano passado. Em número de
fiscalizações, no entanto, o estado da região Norte do país continua na
frente. Em 2013, ocorreram inspeções em 33 estabelecimentos nessa
unidade da federação, contra 23 em São Paulo.
Em 2013, 2.192 pessoas foram libertadas
em todo o Brasil , uma redução de 19,7% em relação aos 2.730 de 2012.
Segundo a CPT, desde 2003 foram libertados 42.664 trabalhadores. Os
estados com maior incidência de pessoas resgatadas ao longo desses anos
foram Bahia, Goiás, Mato Grosso e Pará. No ano passado, o Sudeste foi a
região com mais resgates: 1.129 (51,5% do total). Houve uma inversão de
posições com relação à região Norte. Enquanto esta teve o número de
trabalhadores libertados reduzido de 1.054 (38,6% do total) para 274
(12,5%) de 2012 para 2013, na região que engloba Espírito Santo, Minas
Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo ocorreram, em 2012, 623 libertações
(22,8%).
Perfil dos resgatados
A partir da análise dos dados do registro
do seguro-desemprego (garantia dada a todos os libertados) de 2003 até
15 de outubro de 2012, a CPT concluiu que, de um total de 28.702
trabalhadores encontrados em condições análogas à escravidão, o Maranhão
foi o estado de onde veio o maior número de vítimas (25,5%), seguido de
longe por Pará, Minas Gerais e Bahia (8,2% cada). Quase dois terços dos
libertados tinham entre 18 e 34 anos (63,6%), 73,7% eram analfabetos
(35,3%) ou haviam estudado até o 5º ano incompleto (38,4%) e 95,3% eram
homens.
Fonte: Rede Brasil Atual
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