PICICA: "Uma revisão honesta dos fatos
que vêm se desenrolando desde junho do ano passado mostra que há vítimas
desde então – inclusive com mortes. O diferencial, agora, não está na
morte de um inocente – repito, o crime deve submetido à lei –, mas na
autoria: saindo das mãos de um, ao que dizem, Black Bloc, e não da PM.
Era tudo o que queria o discurso fascista, fetichista da militarização e
subversor da democracia. Não, eles não estão preocupados com a família
do inocente cinegrafista morto. Eles queriam apenas um fato para embasar
tudo o que eles já defendiam, mas que estava deslegitimado pela
corriqueira e – comprovada – violência policial."
Um crime não justifica o outro; mas também não anula o outro. O corpo do cinegrafista da Band esteve estendido no mesmo chão onde estiveram os de Fernando da Silva Candido, ator, cantor e fundador do Cinema de Guerrilha da Baixada – grupo responsável pela produção de filmes de baixo orçamento e oficinas para jovens da periferia do Rio de Janeiro. Ele morreu no dia 31 de julho do ano passado por problemas respiratórios causados pela inalação de gases lacrimogêneo e de pimenta durante um protesto no centro do Rio, no dia 20 de junho.
A diretora teatral, atriz e poetisa Gleise Nana, de 33 anos, morreu em novembro do ano passado, depois de ter 35% do corpo queimados num incêndio no seu apartamento, no Parque Paulicéia, em Duque de Caixas, no dia 18 de outubro. Nana, que era militante em movimentos sociais e que esteve presente nas manifestações, chegou a denunciar mensagens agressivas que recebeu de um policial militar na Internet. Não são casos isolados. Há centenas de relatos de abusos, perseguições e violência que acontecem na calada da noite. Um PM foi flagrado trocando o uniforme por roupas comuns na madrugada do Rio, ao lado de uma viatura sem emblema da PM. P2s infiltrados em protestos, insuflando as manifestações e colaborando com o caos.
Em São Paulo, uma jornalista da Folha foi atingida no rosto por uma bala de borracha da Polícia e por pouco não perdeu a visão. A imagem do rosto jovem ensanguentado mudou o discurso da mídia, até então favorável à repressão policial. Mesma sorte da repórter não teve o fotógrafo Sérgio Andrade Silva, de 31 anos, que perdeu a visão de um dos olhos durante manifestação no dia 13 de junho, em São Paulo. Agora, ele processa o Estado. No mesmo dia, a polícia iniciou o conflito com os manifestantes do MPL, atirando balas de borracha e bombas de gás e de efeito moral em gente desarmada. Ninguém me contou: eu estava lá e fui alvejado ao lado de dois repórteres do Estado de S. Paulo e de um repórter da Globo, que pedia calma inutilmente aos PMs.
Uma revisão honesta dos fatos que vêm se desenrolando desde junho do ano passado mostra que há vítimas desde então – inclusive com mortes. O diferencial, agora, não está na morte de um inocente – repito, o crime deve submetido à lei –, mas na autoria: saindo das mãos de um, ao que dizem, Black Bloc, e não da PM. Era tudo o que queria o discurso fascista, fetichista da militarização e subversor da democracia. Não, eles não estão preocupados com a família do inocente cinegrafista morto. Eles queriam apenas um fato para embasar tudo o que eles já defendiam, mas que estava deslegitimado pela corriqueira e – comprovada – violência policial.
Eles não estão preocupados com a vida. Se estivessem, teriam se manifestado na eclosão da violência policial a olhos vistos – comprovada em relatos, fotos, vídeos. Teriam lamentado e reagido à morte dos manifestantes. Teriam dado coro ao crime de Estado cometido, diariamente, pela polícia. Mas calaram-se quando foi conveniente. Calaram-se quando as provas iam no sentido contrário das falácias que defendem. Mas agora, com a tradicional hipocrisia conservadora, descolada da realidade, que analisa o mundo a partir do recorte de jornais manipuladores, voltam à carga. Cheios de si, cheios de “verdades”.
Quem usa o sangue inocente de um pai de família, morto por mãos civis, para “cobrir” as outras mortes, feitas pelas mãos da polícia, não está a favor da vida ou da democracia. Está apenas escolhendo o lado onde vai sujar as mãos de sangue. Não deveríamos estar contando corpos e apontando de saíram os tiros que alvejaram as vítimas, para saber “quem matou mais”. Mas em se tratando de um jogo de esconde-esconde fascista, que tenta fazer de conta que a polícia não é uma entidade programada para matar pretos e pobres, exumar os corpos é fundamental.
Fonte: Luis Nassif online
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