fevereiro 17, 2014

"Ninguém representa este movimento". Alexandra Prado Coelho conversa com Giuseppe Cocco

PICICA: "Protestos até à Copa

As coisas teriam sido diferentes se Lula ainda estivesse na Presidência quando rebentaram os protestos? “Sim, com o Lula, teria sido diferente, até por causa da imagem que ele tem. Dilma é particularmente tecnocrática e a grande defensora das mega-obras, dessa ilusão neodesenvolvimentista, mas quem está a fazer as articulações para esse diálogo faz-de-conta [com a sociedade que protesta] é o Lula, que continua a ser o grande timoneiro e que já reconheceu que poderá ser candidato em 2018.”

Por um lado, “o PT continua a dizer que vai dialogar, mas o grande diálogo tem sido com um aparelho de ONG fomentado por ele, o Fora do Eixo, que já foi alvo de todo o tipo de denúncias e não merece nem ser citado”. Mas, por outro lado, continua o sociólogo, “não tem com quem dialogar e não tem como dialogar hoje a não ser colocando a questão do que significa dialogar”. E isso implica uma mudança de postura radical e um questionamento do que é a democracia.

Irá a morte do jornalista no Rio fazer esfriar os protestos? Ou irão estes escalar até à Copa? Irá o Governo aumentar a repressão? Surgirá alguma figura que possa funcionar como representante do movimento de revolta nas ruas? Ou irá este afirmar-se realmente como uma realidade totalmente nova, com a qual é preciso encontrar novas maneiras de lidar?

Faltam quatro meses para o início do Mundial de futebol. E ninguém no Brasil se atreve a fazer previsões sobre o que, daqui até lá, poderá acontecer." 



Ninguém representa este movimento




Em Junho passado, as ruas das cidades brasileiras explodiram num movimento de protesto que tem atravessado altos e baixos mas que está longe de ter desaparecido. Giuseppe Cocco, sociólogo italiano a viver no Rio de Janeiro há 20 anos, diz que ninguém pode representar o movimento das ruas e que este significou para os pobres “a possibilidade de começar a fazer política”
A morte, esta semana, de um operador de câmara vítima de um projéctil lançado por um manifestante no Rio de Janeiro representou um momento de mudança na história dos protestos populares que estão a abalar o Brasil desde Junho do ano passado. A sociedade divide-se, o debate sobre a violência está aberto, o Estado aposta num aumento da repressão e em medidas duras contra os grupos mais radicais.

Em discussão estão agora propostas para a proibição de máscaras e penalização para porte de armas durante os protestos, e de aumento de pena para quem se refugiar no anonimato e para quem lesar o património, medidas destinadas a garantir maior protecção para os jornalistas que cobrem as manifestações, e há pressão para que o projecto de lei que tipifica crimes de vandalismo seja votado com carácter de urgência pelo Senado. 




Entretanto, a opinião pública, que em parte tinha mostrado até aqui alguma tolerância para com os chamados Black Blocs, defensores de tácticas violentas de acção directa, nomeadamente ataques a lojas de marcas conhecidas e agências bancárias, vira-se agora contra estes grupos de jovens que escondem os rostos atrás de máscaras e confrontam a polícia. 

O episódio do ataque contra o operador de câmara — há quem diga que inevitável, mais cedo ou mais tarde, na escalada de tensão que se tem vivido nas ruas de muitas cidades brasileiras à medida que se aproxima o Mundial de futebol, que começará em Junho — mudará alguma coisa?

Quando a Revista 2 conversou com Giuseppe Cocco, sociólogo e professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro, o cameraman da TV Bandeirantes, Santiago Andrade, estava ainda em coma, mas Cocco, que veio a Lisboa participar na conferência Novos Poderes — Observatório de África, América Latina e Caraíbas do programa Próximo Futuro, na Fundação Gulbenkian, referiu-se ao caso na análise que fez do que está a acontecer hoje no Brasil. 

Por 20 centavos

O Mundial — ou a Copa, como dizem os brasileiros — está a aproximar-se. Para os manifestantes, essa é uma das motivações: aproveitar as atenções do mundo para dizer que não estão de acordo com este modelo de desenvolvimento para o país, um modelo que aposta nas grandes obras e nos mega-eventos deixando por resolver questões mais directamente ligadas à vida quotidiana, como a qualidade dos transportes, da educação ou da saúde. Giuseppe Cocco, que assistiu a tudo no Rio desde o Verão passado, ajuda-nos a perceber como se chegou aqui e a pensar para onde se poderá avançar a partir de agora. 

“O que aconteceu em Junho de 2013 foi um levantamento imprevisível, que se afirmou em São Paulo e se espalhou a todo o Brasil. O debate inicial era: foi por causa de 20 centavos [o aumento do preço do bilhete dos autocarros] ou não? E como é que em torno de 20 centavos há um levantamento deste tamanho? Na realidade, foi por causa dos 20 centavos, mas eles representam muita coisa, porque os transportes são hoje fundamentais nas metrópoles”, afirma o analista de origem italiana mas a viver no Brasil há duas décadas.




Cocco baseia a sua análise na ideia da transformação do próprio conceito de trabalho. “Há um novo tipo de trabalho que não está mais na fábrica, está na metrópole. E como é que esta se organiza do ponto de vista da produção? Entre o transporte, que funciona como a linha de montagem, e os museus, as universidades, as escolas, os shopping centers.”

Para este novo trabalhador, que Cocco classifica como “imaterial”, e que luta por uma qualidade de vida da qual depende já não tanto o “emprego” mas a sua capacidade de “empregabilidade”, a questão da mobilidade é essencial. 

Além disso, por trás da indignação popular, está também uma rejeição “das negociatas vergonhosas entre os poderes públicos e as empresas privadas de transportes, que participam de forma espúria do processo eleitoral e são um dos principais factores de corrupção no Brasil”.

Repressão como estopim

Tudo começou, portanto, com os 20 cêntimos. Mas muito rapidamente esse movimento começou a funcionar como um íman, atraindo outros. “O levantamento mostrou um novo sujeito, que é essa multidão do trabalho imaterial metropolitano, capaz de autonomia, e capaz de se afirmar e resistir à violência policial. Há uma recomposição subjectiva da multidão, capaz de reabrir o tema da democracia, da maneira de fazer política. A repressão violenta, sobretudo em São Paulo, funcionou como estopim. A cada manifestação reprimida, havia uma amplificação da mobilização e da tendência à resistência, o que é uma grande novidade”. 




Às manifestações sobre os transportes juntaram-se as de protesto pela abertura da Copa das Confederações que antecede o Mundial. “Se alguém me tivesse perguntado antes de Junho o que iria acontecer nessas manifestações marcadas contra a Copa, que são uma contestação de um modelo de cidade implementado via os mega-eventos, eu teria dito que esperava duas mil, três mil pessoas em cada cidade, gente de partidos de extrema-esquerda, algumas ONG, mas uma participação pequena”, declara Cocco. “E, pelo contrário, a cada jogo, apareciam milhares de pessoas e surgia esta contestação absolutamente autónoma na sua dinâmica, na contestação do modelo de cidade que estava a ser imposto e da relação entre cidade e trabalho.” 

Essa autonomia significava, como se começou a perceber, uma rejeição de aproveitamento por parte dos partidos políticos — quaisquer partidos políticos. “É um movimento incompreensível para o Partido dos Trabalhadores [PT, no poder] mas também para os movimentos sociais organizados e os partidos da extrema-esquerda que fazem oposição do PT. Estes, quando tentaram tomar conta, liderar, apanharam. Acharam que tinham por fim aquele movimento que ao longo de décadas tinham desejado e então foram lá com as suas bandeiras, dizendo ‘nós vamos liderar-vos’, e tiveram de aturar o facto de que não os queriam, e não os queriam mesmo.”

Cocco recorda que, numa das manifestações de Junho, “o PT mandou os seus militantes com bandeiras, e quando o pessoal disse que eles tinham de ir embora ou iam apanhar, eles, de maneira pragmática, jogaram as bandeiras fora e foram embora, mas os outros [a extrema-esquerda] não. Acharam que eram puros idealistas, ficaram, e apanharam. Ninguém pode representar este movimento, nem sequer os seus segmentos mais radicais. Ele é irrepresentável”.


O movimento continuou a crescer. “Foi conectando todas as lutas de resistência, juntando as lutas menores que existiam antes. Junho não vem do nada, havia uma série de lutas minoritárias, nas periferias, por democracia, contra as remoções dos pobres, contra o aumento dos preços, por uma democracia representativa.” Assim, cada manifestação que surgia em torno de um destes temas podia atrair pessoas que vinham de outras lutas. 

Sobretudo no Rio, depois das grandes manifestações de Junho, a tensão foi sempre mantida. “Já não eram centenas de milhares, mas todo o dia havia duas, três, quatro mil pessoas. E em cima disso havia a ocupação de câmaras dos vereadores, a nível municipal. Junho significou para todo o mundo, em particular para os pobres, a possibilidade de começar a fazer política directamente, sem passar pela mediação de um sindicato.” 

Fenómeno "rolezinho"

E a certa altura, no meio de tudo isto, surge outro fenómeno que vem baralhar todas as leituras e análises: os chamados “rolezinhos”, as invasões de centros comerciais por jovens pobres, geralmente negros, vindos das periferias. As autoridades assustam-se, os centros comerciais fecham portas a cada novo rolezinho que é convocado através das redes sociais. Mas, para quem vê de fora, parece haver aqui uma contradição entre os jovens que nas manifestações partem montras de lojas de grandes marcas e caixas multibanco em protesto contra o capitalismo e estes outros jovens que reivindicam a possibilidade de usar essas mesmas marcas, sobre as quais cantam no chamado “funk ostentação”, elogio ao luxo, ao dinheiro e ao consumo. 

“Contradição nenhuma”, garante Cocco. “Os rolezinhos são feitos pelos segmentos mais pobres da periferia. O que é que eles têm de novo? O Governo Lula [também do PT, mas anterior ao actual Governo brasileiro, de Dilma Rousseff] enxergou-os como consumidores, com um maior poder de compra.” “Quando estes jovens compram uma marca, estão a comprar um mundo”, explica. Entra aqui o conceito de “capitalismo cognitivo”. “Você paga uma mais-valia cognitiva maluca para ter uma Adidas ou Nike, mas quando os jovens vão colectivamente dentro do shopping eles fazem o seu próprio mundo, inclusive usando as marcas de forma explícita, e é isso que é intolerável” para a elite. 




Este fenómeno, que “apavorou o poder de maneira desmedida”, tem que ver com a entrada dos pobres, colectivamente, em espaços que são bastiões dos mais ricos, e dos brancos. Isso leva Cocco a outro debate: o das quotas raciais nas universidades. “Foi um debate engraçado porque havia uma oposição da direita, da elite, e outra da esquerda mais tradicional”, recorda. “A direita porque queria manter o controlo sobre a reprodução da elite que é o ensino superior. E a esquerda porque dizia que não adianta você fazer entrar os negros e os pobres nas universidades se não transforma essa instituição que reproduz os valores da elite numa instituição popular.”

Mas isso é partir de um pressuposto errado, segundo o sociólogo. “Eles pensam a reforma e a consciência como algo que vem de fora. Mas, quando os jovens negros e pobres das periferias vêm para a universidade, eles vão mudá-la. Há um processo de produção de subjectividade. O jovem que entra no shopping vai por dentro da dinâmica das marcas, mas produz o seu mundo, dá um novo significado para aquilo e assim apavora o capital e o Governo.” 

É por isso que, para Cocco, nesse movimento, autónomo e irrepresentável, de apropriação das ruas e dos espaços públicos, reivindicando outra ideia de cidade e de sociedade, não existe qualquer contradição entre as manifestações de Junho e seguintes e os rolezinhos. O que houve foi uma escalada, que considera ter sido muito provocada pela repressão, e uma rejeição de “um modelo desenvolvimentista para o Brasil” assente nos tais grandes eventos. 

O que fazer com mega-eventos?

“Estes foram um cálculo errado do Governo, que achava que a agenda dos mega-eventos estava funcionando como consensual. Lembro da campanha eleitoral do governador do Rio, Sérgio Cabral, dizendo que a cidade tinha uma agenda que todo o mundo invejaria: Copa das Confederações, Copa do Mundo, Jornada Mundial da Juventude, visita do Papa, Jogos Olímpicos. E virou um pesadelo. O pessoal não sabe o que fazer com esses mega-eventos, se pudessem cancelariam. Eles tornaram-se o pretexto para contestar toda a cidade. No caso do Rio, há investimentos milionários nos estádios, nos museus, no metro para a zona mais rica, mas por exemplo na Rocinha, uma favela enorme na zona Sul, não existe saneamento básico e o esgoto é todo jogado no mar.”

A política de realojamentos, por exemplo, é uma das que têm provocado bastante mal-estar. “Contrariando a lei do município, que diz que toda a realocação tem de ser próxima do local da residência inicial, o que está acontecendo é que eles chegam a uma favela dizem que têm de fazer um teleférico que ninguém quer e que para colocar os pés do teleférico têm de tirar as casas, e chega a Secretaria Municipal de Habitação e assinala a casa com a sigla SMH e um número, que significa que a casa está condenada. Aí propõem que as pessoas vão viver numa casa com renda social, que não vale nada com o nível de preços que existe hoje no Rio, ou ir morar para o Minha Casa, Minha Vida [programa lançado por Dilma] a 60 quilómetros, com este sistema de transportes que não lhes permite chegar ao local onde trabalham.”




Chegamos, então, à questão da violência. “Os Black Blocs não são um grupo, são uma táctica. O jovem chega, coloca-se de uma certa maneira [geralmente tapando a cara e vestindo-se de negro] e vira Black Bloc. Em São Paulo, os Black Blocs a cada vez escolheram passar à acção directa, quer a polícia atacasse ou não. No Rio, não. A postura aí foi mais a de haver resistência se a polícia atacasse.” Mas há um elemento que o professor destaca: o papel da comunicação social.
“Os media estão junto com o Governo massacrando o movimento e pedindo repressão. Eles caíram na armadilha da táctica Black Bloc, que se declarou pela primeira vez a 30 de Junho e que acabou chamando a atenção dos media, num discurso ambíguo, que por um lado vai-lhes dando visibilidade mas por outro vai legitimando a repressão.”



Papel dos media

A ambiguidade está também do lado dos mascarados. “Os garotos acham que a estética deles, inclusive a prática de acção directa, é mais importante do que a política. Mas os media estão procurando criminalizar para valer.” Dá como exemplo o carro de uma família de poucas posses que se incendiou na manifestação que se realizou a 25 de Janeiro em São Paulo. “Essa história [de que o carro teria sido incendiado, não importando aos manifestantes que a família fosse pobre] só foi desconstruída porque se soube que o condutor tinha passado por cima de um colchão a arder. Mas o pessoal tem de pensar que quando usa o fogo pode dar um grande problema. E os media usam isso.”

Até porque, explica, a relação entre o PT e os grandes grupos de media, sobretudo a Globo, é igualmente ambígua. “Uma das maneiras que o PT tem de dizer que é de esquerda é dizer que é criticado pelos media oficiais. Estes apoiam a prisão de dirigentes do PT por causa do caso do Mensalão, mas por outro lado no Rio há toda uma reorganização da cidade, com a construção de três novos museus, que está a ser entregue para a família que controla a Globo, a Fundação Roberto Marinho.”

E o que vai acontecer a partir de agora? Depois de um período em que as manifestações pareciam ter acalmado, no final de 2013, elas voltaram a surgir. A primeira foi a de 25 de Janeiro, em São Paulo, e acabou com um jovem alvejado pela polícia. Depois, foi a vez de o Rio se levantar contra um novo anúncio de aumento nos transportes — e de o câmara da TV Bandeirantes ser atingido e morrer. 

Há já convocatórias para novos protestos do movimento Não Vai Ter Copa, a 22 de Fevereiro, em São Paulo. Por seu lado, o Governo reforça a segurança, receando sobretudo um aumento de violência durante a Copa. Segundo a edição Brasil do diário espanhol El País, que cita a Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos do Ministério da Justiça, para o Mundial já estão convocados pelo menos 100 mil agentes de segurança pública. 

O lulismo está esgotado

Qual é então o caminho para lidar com o movimento de protesto? “Por enquanto, não tem nenhum caminho”, diz Cocco, que acredita que vamos também assistir este ano a uma profunda “politização do Carnaval”. “No Rio, houve um momento, mais ou menos em Agosto, em que o poder tentou dialogar. Aí o prefeito e o governador recuaram sobre uma série de temas. Por exemplo, na questão das remoções [os desalojamentos por causa das obras para o Mundial], o prefeito disse que era um método nazi colocar um sinal indicando que casas são para destruir. Mas, a partir da segunda metade de Setembro, eles recuaram do recuo e passaram a reprimir.”




Assume-se como um homem de esquerda, mas mostra-se profundamente crítico tanto de Lula como de Dilma. No entanto, estabelece diferenças importantes entre um e outro. “O Governo Lula teve duas políticas que foram um verdadeiro reformismo, embora totalmente insuficiente. Uma foi a da distribuição de renda, com a redução do desemprego e a diminuição da desigualdade. Pela primeira vez, o PIB cresce e as desigualdades diminuem, e isso aconteceu de maneira mais expressiva em 2004. A outra foram as quotas sociais e raciais nas universidades.” Mas, segundo Cocco, o erro do PT foi olhar para estas pessoas que começaram a ganhar alguma qualidade de vida essencialmente como potenciais novos consumidores — a tal nova classe média emergente.

“Até às manifestações de Junho, o lulismo tinha essa ambiguidade — era lulismo para o patrão e era lulismo para os pobres. E parecia que se você lutasse contra ele reforçaria a dimensão capitalista [da sociedade]. Mas Junho veio decretar que o lulismo está esgotado. O que não significa que não possa continuar a governar, mas vai ter de fazê-lo pela direita”, aproximando-se de posições mais conservadoras, defende. 

A chegada de Dilma ao poder, em Janeiro de 2011, veio trazer também uma mudança de estilo. “A Dilma é muito menos flexível que o Lula. A minha impressão é que ela virou uma figura da ordem e pela ordem. Nos últimos tempos, foi recuperando o que tinha perdido nas sondagens, e fê-lo indo cada vez mais pela direita. Com isso, foi ganhando segurança e foi assumindo cada vez mais uma postura de defesa da ordem”. 

A isto somou-se outro elemento que contribuiu para a sensação de segurança do PT: a candidatura de Marina Silva à Presidência não foi aceite pelo Tribunal Superior Eleitoral por não ter atingido o mínimo de assinaturas necessário devido a problemas de reconhecimento nos cartórios eleitorais. Depois disso, Marina aliou-se ao governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que vai disputar a corrida presidencial em Outubro deste ano. “Eles eliminaram a candidatura da Marina, que não é a representante do movimento [das ruas] mas que estava em segundo lugar nas pesquisas, tinha conseguido 20% de votos nas eleições de 2010 e criou bastante mal-estar. Fizeram uma operação cartorial, não reconhecendo o partido dela, e asseguraram-se de que não haveria nenhuma figura, mesmo ambígua, que pudesse ser uma referência para o movimento.”

Protestos até à Copa

As coisas teriam sido diferentes se Lula ainda estivesse na Presidência quando rebentaram os protestos? “Sim, com o Lula, teria sido diferente, até por causa da imagem que ele tem. Dilma é particularmente tecnocrática e a grande defensora das mega-obras, dessa ilusão neodesenvolvimentista, mas quem está a fazer as articulações para esse diálogo faz-de-conta [com a sociedade que protesta] é o Lula, que continua a ser o grande timoneiro e que já reconheceu que poderá ser candidato em 2018.”

Por um lado, “o PT continua a dizer que vai dialogar, mas o grande diálogo tem sido com um aparelho de ONG fomentado por ele, o Fora do Eixo, que já foi alvo de todo o tipo de denúncias e não merece nem ser citado”. Mas, por outro lado, continua o sociólogo, “não tem com quem dialogar e não tem como dialogar hoje a não ser colocando a questão do que significa dialogar”. E isso implica uma mudança de postura radical e um questionamento do que é a democracia.

Irá a morte do jornalista no Rio fazer esfriar os protestos? Ou irão estes escalar até à Copa? Irá o Governo aumentar a repressão? Surgirá alguma figura que possa funcionar como representante do movimento de revolta nas ruas? Ou irá este afirmar-se realmente como uma realidade totalmente nova, com a qual é preciso encontrar novas maneiras de lidar?

Faltam quatro meses para o início do Mundial de futebol. E ninguém no Brasil se atreve a fazer previsões sobre o que, daqui até lá, poderá acontecer.  


Fonte: Publico

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