Oleo do Diabo
Desvio do foco
17 Jul 2008
Não sei como ainda me espanto com isso. Há pouco tempo tinha até me prometido nem comentar mais. É impossível. O jornal O Globo vem fazendo de tudo para perturbar as investigações em torno de Daniel Dantas. Primeiro tentou criar uma crise institucional entre Ministro da Justiça e Ministro do Supremo, e hoje a Miriam Leitão diz que é um absurdo a imagem dos três juntos: Lula, Tarso e Gilmar Mendes. Ora, eles produzem uma crise perigosa entre os poderes e agora reagem agressivamente quando os três aparecem na foto juntos, em harmonia. Primeiro, instigaram Tarso a dizer uma frase imprudente. É uma tática velha. Entrevista-se longamente a pessoa em busca de um deslize verbal. Não importa o verdadeiro sentido da fala do entrevistado. O que importa é montar uma fraude jornalística, pinçando uma frase do contexto. Aí pega-se essa frase e usam-na para atiçar outra pessoa, no caso Gilmar Mendes. A frase era que "Dantas teria muita dificuldade para provar sua inocência". Uma expressão infeliz se tirada do contexto, mas perfeitamente natural de se dizer no meio de uma conversa com jornalistas. Não é prejulgamento nenhum. Aí pegam essa frase e a reproduzem para Gilmar Mendes, que diz, como deveria mesmo dizer, que o julgamento de um réu não é da competência do ministro. Competência aí no sentido de "faculdade concedida por lei para apreciar uma questão". O Globo tasca o manchetão, na primeira página: "Gilmar Mendes diz que Ministro da Justiça é incompetente". Isso é má fé. É jornalismo de intriga e, neste caso, visa criar uma cortina de fumaça por onde Daniel Dantas possa escapar.
E agora criam esse factóide sobre o delegado Protógenes Queiroz. Não interessava à imprensa apurar o que houve, e sim montar a versão que possa criar o constrangimento para o governo e facilitar as coisas para Dantas. A Polícia Federal pode ter desmantelado a maior quadrilha de lavagem de dinheiro, corrupção de autoridades, tráfico de influência, da história brasileira, e a imprensa não demonstra o mínimo ímpeto investigativo para explicar ao leitor a extensão, a profundidade e a origem desses ilícitos. Não, a imprensa procura inverter os papéis, transformando os mocinhos em bandidos. As autoridades constituídas não são perfeitas. Cometem trapalhadas, dão entrevistas fora de hora, gostam de exibir-se, entram em choque uns com os outros, mas se você pensar bem, isso é totalmente normal. Conflitos internos na PF, no governo, entre instâncias, são normais e até saudáveis numa democracia. O mais importante é que a PF está fazendo um bom trabalho. A nossa imprensa até agora não fez um elogio direto, simples, à operação Satiagraha, que, sem disparar um tiro, agindo estritamente segundo a Constituição, usando grampos autorizados pela Justiça, pegou com a boca na botija alguns dos maiores golpistas de nossa história. Não. Criticam a PF por usar algemas, mas não falam que nos EUA, pátria amada idolatrada salve salve, os criminosos de colarinho branco são presos com algemas, COM AS MÃOS À FRENTE, e as operações são televisionadas em rede aberta para todo país.
O irônico é que, assistindo ao noticiário, vemos, no espaço de alguns minutos, a polícia prender estelionatários, algemá-los e socá-los na parte de trás de um camburão, diante das câmeras, e ninguém falar nada. No caso de Dantas, nem algemas eu vi. O que eu vi foi um banqueiro sendo conduzido muito educadamente para a sede da Polícia Federal e, à diferença de qualquer cidadão brasileiro, ser solto duas vezes por ordem direta do Supremo Tribunal Federal, pelo senhor Gilmar Mendes, ex-assessor de Collor e ex-Advogado Geral da União do presidente Fernando Henrique Cardoso. O mesmo STF que havia sido citado, nas conversas gravadas pela PF, como um lugar onde Dantas teria "facilidades".
É espantoso que, depois de anos falando de mensalão como quem fala de uma catástrofe que marcou a história política brasileira, quando a PF prende aquele que teria sido, mais que o mentor, teria sido o financiador principal do mensalão, a imprensa não se interesse mais pela história. Ao contrário, desvia-se continuamente o foco, tentando produzir crises políticas, tentando debilitar as forças do Estado, criando intrigas, jogando confetes por toda a parte.
Tudo tem um preço, porém. Para vender suas teorias, a imprensa voltou às suas velhas práticas mensaleiras. Diz-se, por exemplo, que o Palácio do Planalto quer isso, quer aquilo, deseja aquilo, mas sem nominar fontes, sem consultar nenhum de seus porta-vozes. Volta-se à terra das fontes anônimas, e desconfio que muitas delas nem existam, ou mesmo tem suas declarações distorcidas. Se a imprensa consegue distorcer uma declaração pública de uma autoridade, que dirá de uma fonte anônima. Outra estratégia é usar verbos condicionantes: "ele teria dito", "teria feito". E práticar a (des)memória seletiva - no factóide dos grampos, abusou-se dessa tática. Criou-se a suspeita de que Mendes estaria grampeado, o que foi negado pelas equipes de segurança do próprio STF, após uma varredura. Mas a imprensa aproveitou para lembrar de outras suspeitas no passado, conforme publicadas na Veja. E ainda tem a cara de pau de dizer que foi na Veja. Mas não deixa claro que também foram feitas varreduras e não se encontrou nada.
O curioso é que a imprensa não lembra que um dos crimes dos quais Dantas é acusado é justamente espionagem ilegal de autoridades. Há provas contundentes contra ele nesse sentido. Outro que espionava os outros era o falecido Antonio Carlos Magalhães. E o senhor José Serra, quando ministro da Saúde, contratou uma empresa de espionagem privada, que até alguns anos, agia nas sombras do poder.
Enfim, como diz Bob Fernandes, do Terra Magazine, os intestinos do Brasil estão à mostra. E merecendo uma boa lavagem. Quem irá puxar a descarga?
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Sobre o Protógenes Queiroz, é irônico que ele, após ser vilanizado pela mídia, agora seja ungido como santo. Nem uma coisa nem outra. Ele fez um bom trabalho, mas parece ter se excedido em diversos pontos. O seu relatório revela um idealista e talvez só mesmo ele pudesse ter resistido às pressões que se desencadearam neste caso. Agora que o caso chegou ao ventilador, talvez fosse melhor a hora de entrar um cara mais frio e calculista, que não deixe margem para a defesa fugir pela tangente. Não se esqueçam que as investigações também estão sendo conduzidas pelo Ministério Público, que é independente da PF e do governo federal. Queiroz exagerou, por exemplo, e sobretudo, não soube medir as consequências políticas, ao mandar prender a jornalista da Folha, e ainda lançou suspeitas de que Naji Nahas teria acesso à informações privilegiadas do Banco Central americano - seria melhor que dissesse que ele, Nahas, tenha se vangloriado disso, e não que o soubesse efetivamente. Enfim, Protógenes é um grande delegado, mas é um só e não é super-homem. Está cansado e sob fogo cerrado da mídia - primeiro como vilão e agora como pivô de uma crise entre governo e PF. O trabalho para pegar uma quadrilha desse porte merece uma equipe diversificada, apoio do Ministério Público e da sociedade civil, que precisa pressionar para que as poderosas relações políticas de Dantas não atrapalhem o curso das investigações.
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Ah, se fosse o Lulinha...
Fonte: Óleo do Diabo
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Nota do blog: Por falar em desvio de foco... leia o que está fora de foco, segundo Urariano Mota.
Urariano: A excelência do ministro Gilmar Mendes
Por Urariano Mota [Quinta-Feira, 17 de Julho de 2008 às 12:24hs]
Do Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal, mais conhecido pelo nome de Gilmar Mendes, já se disse que é um especialista em Direito Constitucional. Que é autoridade em Direito Público. E que à luz dos últimos julgamentos no Supremo é, pelo menos, ilustre concessor de habeas corpus. Mas quem procurar informações sobre tão insigne homem na página do STF reservada a seus presidentes encontrará apenas quatro modestíssimas, melhor dizendo, quatro quartos de linhas:
Gilmar Ferreira Mendes
Nomeado pelo presidente: Fernando Henrique Cardoso
Faculdade: Faculdade de Direito da Universidade de Brasília
UF de origem: Mato Grosso
Isso é de uma espantosa sobriedade, quando se lhe comparam os anteriores presidentes Ellen Gracie, Nelson Jobim, Maurício Corrêa, Marco Aurélio... todos cheios de currículos cuja importância é digna de mais de cem linhas. Por que tamanha modéstia? Haveria nessa brevidade o intuito de omitir? Segundo o jurista Dalmo de Abreu Dallari haveria mais o que incluir nessas modestas linhas. A saber:
“Advogado-geral da União, subordinado ao então presidente Fernando Henrique Cardoso, que o indicou para o STF antes que se formalizasse a abertura da vaga... especialista em ‘inventar’ soluções jurídicas no interesse daquele governo. Assessor muito próximo do ex-presidente Collor, o qual nunca se notabilizou pelo respeito ao Direito. Autor de inúmeros pronunciamentos pela imprensa, agredindo grosseiramente juízes e tribunais. E por último, mas não menos importante, na chefia da Advocacia Geral da União, o Dr. Gilmar Mendes pagou R$ 32.400 ao Instituto Brasiliense de Direito Público - do qual o mesmo Dr. Gilmar Mendes era um dos proprietários - para que seus subordinados lá fizessem cursos. Isso é contrário à ética e à probidade administrativa, estando muito longe de se enquadrar na ‘reputação ilibada’, exigida pelo artigo 101 da Constituição, para que alguém integre o Supremo”.
Continue lendo o texto de Urariano Mota neste link.
Fonte: Revista Fórum
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