Mulheres de Olho
A rejeição ao PL 1135 e a cobertura do Globo
13 Jul 2008
A rejeição do PL 1135 pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados evidenciou um dos grandes problemas para o debate público sobre a questão da descriminalização do aborto: a cobertura pela grande imprensa. Na edição da quinta-feira, 10 de julho, O Globo sintetizou na página 3 – e portanto a mais nobre do jornal –, tudo que há de errado na forma como os jornais abordam o tema. Foi o exemplo mais gritante de que, quando trata do assunto, o Globo dá voz aos argumentos religiosos sem fazer os filtros que a editoria é treinada a fazer em diversas outras ocasiões.
1. Era evidente que os parlamentares religiosos estavam apelando ao levar para o plenário bonecas que representavam bebês. Publicar a foto no alto da página significou dar espaço a um tipo de abordagem que só encontra respaldo junto à opinião pública justamente por ser apelativa. Para ser apelativa, a abordagem depende de conquistar espaço nos meios de comunicação. Editores são treinados para evitar esse tipo de manipulação;
2. O segundo grande equívoco foi se posicionar, de novo, frontalmente contra a candidata Jandira Feghali. Nas eleições de 2006, o jornal se alinhou à Arquidiocese do Rio de Janeiro na campanha contra Jandira, que então estava na liderança para o Senado. Feito duas vezes, parece que o jornal está em campanha contra a candidata;
3.Quando se refere à derrota de Jandira para o atual senador Francisco Dornelles, o jornal ignora completamente toda a campanha contrária a ela, inclusive o fato de que houve propaganda eleitoral irregular para derrubá-la;
4. Quando afirma que “a deputada Solange Amaral levou o tema do aborto de volta ao debate eleitoral” (ela defendeu por diversas vezes a rejeição ao PL 1135 na sessão do dia 9 de julho em que o projeto foi rejeitado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal), o jornal se alinha aos propósitos de Solange, mesmo sabendo que a descriminalização do aborto não é matéria municipal. As duas são candidatas à prefeitura do Rio. De novo, editores são treinados a não se deixar manipular por este tipo de artimanha política;
5. Embora informe que o projeto foi rejeitado “numa forte ação de setores religiosos”, o jornal ignora o fato de que a candidata Solange Amaral tem como aliado o prefeito Cesar Maia, cuja atuação na área de contracepção é submissa à Arquidiocese, e não faz as conexões necessárias entre a atuação de Solange e a dos tais setores religiosos.
É muito comum que se atribua ao jornais atos deliberados que são apenas fruto de pressa, falta de informação ou má formação dos jornalistas sobre o tema. Nenhum dos erros apontados parece se justificar nesses argumentos.
Angela Freitas/ Instituto Patrícia Galvão
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