Libelo contra as mordaças
No início dos anos 1980 lutávamos contra os “salários de fome” (expressão da época) do governo José Lindoso – um homem honrado, que, entre erros e acertos, deixou o governo sem acrescentar nada ao seu patrimônio pessoal, como tantos fizeram antes e depois do seu mandato. Esse é o lado moral da coisa. Do ponto de vista ético, aí a porca torce o rabo: apoiar a ditadura militar tem conseqüências políticas que a história cobrará em todos os tempos.
Curiosamente, os governos estaduais do período da ditadura militar – sem nenhum tipo de saudosismo –, pelo menos no Amazonas, não serviram para o enriquecimento pessoal dos governantes. Atire a primeira pedra quem souber de conduta desabonadora de Henock Reis, Arthur Cézar Ferreira Reis, João Walter. A exceção fica por conta de um governador dos anos 1960 que beneficiou empresários e políticos (Chiquinho Scarpa, César Cals etc.) num processo fraudulento de concessões de terras na área atingida pela construção da Hidrelétrica de Balbina, com o objetivo de conceder indenizações por benefícios nunca prestados em território amazonense. “É verdade”, diz Zefofinho de Ogum (consultor deste blog e estudioso das ‘coisas da Amazônia’). “Nunca plantaram um pé de pupunha, mas é um caso isolado. Configura abuso de poder, mas não enriquecimento ilícito”. O processo atravessou o final do século XX, e salvo engano, ainda tem “interposição de recurso” até hoje. Coisas do Brasil!
Na época, do fato que nos interessa, trabalhava como Diretor Clínico do Hospital Psiquiátrico Eduardo Ribeiro. No plenário do Clube dos Trabalhadores, os servidores públicos (termo que caiu em desuso) deram a vitória à proposta dos funcionários do hospital psiquiátrico (só recentemente o trabalhador como conceito ganhou dimensão política, embora algumas categorias rejeitem a denominação por lhes ameaçar o status – talvez por isso o PT tenha tão poucos médicos inscritos em sua agremiação). A mesa diretora da Associação dos Servidores da Secretaria Estadual de Saúde (AS-SESAU) não reconheceu a vitória e declarou vencedora a sua proposta. O tempo fechou, e, entre sopapos e catiripapos, uma corajosa enfermeira saiu acusada como pivô do imbróglio. Colocada sub judice pela diretoria arbitrária lá fomos nós, dias depois, para uma reunião defender a enfermeira acusada e ameaçada de expulsão da AS-SAESAU.
De cara, ela é chamada de fascista pelo presidente da entidade. Dei um salto da cadeira e manifestei, veementemente (que palavrinha venenosa!), minha discordância da distorção da história, devolvendo o adjetivo à indigitada criatura. A enfermeira agradeceu e, com a delicadeza habitual, disse que não precisava de macho para defendê-la. O bate-boca levaria horas.
Ao sairmos, descendo a escada um (col)eguinha bate-me no ombro e brada: “Defendendo enfermeira, doutor?”. Nem tive tempo de fazer minha defesa; a enfermeira, que vinha logo atrás sem que o infeliz tivesse percebido (caso contrário não teria aberto a boca, pois só o faz contra desafetos ausentes dos debates), foi logo vociferando: “Como é que é seu FDP!!!... É por isso que tua mulher... #**#***#**#*****#**#****...”
Lembrei-me do episódio quando vi o cartum acima. Tudo porque tem gente que anda discordando do espaço que tenho oferecido neste blog ao movimento zapatista no México: os militantes zapatistas usam lenços no rosto para não serem identificados pelas forças repressoras do exército mexicano.
Moral da história: tem sempre alguém, em todos os tempos, querendo te amordaçar. Vixe!
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