janeiro 28, 2009

O mundo encolheu, meu caro Watson!

Foto: Rogelio Casado - Teatro Amazonas - Manaus-AM, jan/2009

Nota do blog: Por ordem de prioridade, o Teatro Amazonas é um dos nossos mais ricos patrimônios. O outro é o Encontro das Águas. O primeiro é cultural; o segundo é paisagístico. Ambos constituem parte essencial da identidade dos amazonenses. Propor a construção de um porto na frente do Encontro das Águas é o mesmo que propor a transformação do teatro num estacionamento de carros. O texto abaixo pretende dar relevância ao tema, que pode ficar obscurecido por um imbróglio na comunicação. Certamente, deve-se lutar pelo mais legítimo direito à informação e a transparência com que são conduzidos os negócios públicos, sem descuidar das razões que levaram a Associação Amigos de Manaus - AMANA a contestar o local da construção de um porto para atender as demandas do Distrito Industrial da Zona Franca de Manaus.

O mundo encolheu

Ficou pequeno. Cabe na ponta dos dedos. Para quem conhece linguagem digital.

No Brasil, a internet atingiu, neste ano, o expressivo número de 40 milhões de usuários; grande parte deles situados na faixa de idade da população economicamente ativa. Nela cabe tudo: conhecimento, lazer, informação, notícia, comunicação e lixo... “Muito lixo”, acentuam os conservadores, sempre dispostos a demonizar qualquer avanço tecnológico . Vide o debate teatro versus cinema; rádio versus televisão; pintura versus fotografia, máquinas de datilografia versus computadores etc.

Certamente vivemos numa sociedade que valoriza o espetáculo e o consumo. Nela os meios de comunicação desempenham um importante papel no estímulo e na permanente alimentação desses dois componentes do cimento ideológico da atual fase do capitalismo.

Ocorre que se a indústria da cultura construiu uma forte hegemonia, nas brechas do sistema atuam agentes que tecem as possibilidades de um outro mundo. Para esses, a internet é um instrumento a serviço da rápida difusão da comunicação de idéias.

Nos Estados Unidos da América do Norte, a candidatura de Barack Hussein Obama soube captar essa evidência da vida real dos tempos de hoje e usá-la como instrumento de persuasão do eleitorado.

O genocídio praticado pelo governo de Israel contra a população da Palestina teve na internet uma cobertura como nunca houve nos conflitos do Oriente Médio, permitindo uma (re)visão da ocupação israelense sobre o território palestino desde a fundação do estado judaico. Uma derrota da opinião eurocêntrica vigente, obrigada a conviver, doravante, com um outro entendimento público da tragédia vivida pelo povo palestino.

Entretanto, não é qualquer um que sabe usá-la. É preciso que o agente social que a maneja disponha de credibilidade.

Ademais o instrumento contém suas armadilhas. A pressa é uma delas. No afã de prontas respostas, o açodado come cru. Ora, não se constrói discursos competentes tratando a informação de modo superficial.

O caso do Porto das Lajes

Demonizada pelos conservadores, incensada pelos movimentos sociais, a internet está no centro de um debate que vem despertando, paulatinamente, o interesse da opinião pública manauara: a construção do Porto das Lajes.

Em menos de 24 horas, duas tentativas de responder às evidências de uma matéria publicada no jornal italiano Il Manifesto e postado em dois blogs manauaras, com repercussão posterior na mídia local, causaram mais perplexidade do que esclarecimento sobre um fato sugerido pela reportagem – a de que os legítimos interesses em construir um porto para atender demandas do Distrito Industrial de Manaus pudessem conter outros: o de personas non gratas à opinião pública internacional.

Embora não haja nenhum fato jurídico – salvo um rumoroso processo que resultou na prisão de um empresário italiano por supostas ligações com o crime organizado – agiu-se com inusual inabilidade em omitir o fato, ou julgar que ele não viria à luz por intermédio da imprensa italiana livre, ainda que o primeiro ministro italiano, com suas pretensões monopolizadoras, tenha construído um império de comunicação.

E ademais, é elementar meu caro Watson: existe a internet. A riqueza dos detalhes contidos nas matérias do jornal – que podem ser consultadas por qualquer indivíduo no planeta – abriu um rombo na credibilidade da prestação de informação de interesse público.

Não é a primeira vez que sobra para uma autoridade pública as pressões para um esclarecimento não trabalhado no tempo devido. Ossos do ofício.

Todo esse imbróglio ainda deve render contundentes discursos políticos. Enquanto isso, nosso maior patrimônio paisagístico corre o risco de ser subtraído da discussão sobre a pertinência da criação de um porto em frente do Encontro das Águas. Ou alguém aí acredita que o projeto das Lajes deixará de ter seus defensores, tenham ou não personas non gratas nele envolvido?

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