O mau começo da sra. Clinton
Na sua apresentação diante do Comitê de Relações Exteriores do Senado dos EUA, a nova Secretária de Estado desse país emitiu suas primeiras declarações em relação à America Latina. Se propõe a uma “diplomacia direta”, que pretende basear-se em um suposto “poder inteligente”. Fala do continente como se fosse um espaço vazio em que vai se projetar.
Mas seu discurso pretensamente voltado para o diálogo não pode deixar de esconder suas garras, revelando que o “poder inteligente” pode ser uma nova versão para a conhecida combinação do “porrete e da cenoura", alternada ou simultaneamente utilizados sempre pelo poder imperial na América Latina e pelo mundo afora.
Se quer ter uma relação de diálogo positivo, a sra. Clinton deveria, antes de tudo, fazer autocrítica da política que os Clinton desenvolveram no continente e daquela de Bush. Ao invés disso, vejam ao que se propõe a nova Secretaria de Estado:
“Deveremos ter uma agenda positiva no hemisfério como resposta ao tráfico de
temor propagado por Chávez e Evo Morales.”
Falar de temor em nome da potência que recentemente mandou sua V Frota circular pelas costas do continente, como se isso ainda produzisse medo nos governantes latinoaericanos, quando se reunia o Conselho Sulamericano de Defesa, sem a presença dos EUA, pela primeira vez na história. No momento em que novas reservas de petróleo eram descobertas no Brasil. Quando a Bolívia exerce sua soberania expulsando o embaixador dos EUA, pelas reiteradas intromissões na política interna desse país, incentivando os planos golpistas da oposição direitista.
Falar em temor antes de normalizar as relações com Cuba, terminando com o criminoso bloqueio de mais de 40 anos. Antes de retirar de forma imediata a base de terror de Guantanamo e devolver esse território usurpado pelo império há mais de um século a Cuba.O que a sra. chama de temor, nós, os latinoamericanos chamamos de solidariedade – palavra que vocês desconhecem. Porque o que a Venezuela e a Bolívia propagam é a política que, com o decisivo apoio de Cuba, terminou com o analfabetismo nesses dois países. Pergunte-se que país, apoiado há tantas décadas pelos EUA, pode exibir essa conquista, apesar dos milhões de dólares despejados pelo império para fortalecer seus aliados direitistas?
O que a sra. chama de temor, nós conhecemos como Operação Milagre, que já permitiu a mais de um milhão de latinoamericanos recuperar sua capacidade de visão, com hospitais em Cuba, Venezuela e Bolivia, de forma totalmente grátis. Enquanto que o império contribui cotidianamente a cegar a milhões de pessoas fomentando, com, recursos e noticiários falsos, a mídia monopolista privada no continente – aliado fundamental do império na região.
O que a sra. chama de temor, nós conhecemos como Escola Latinoamericana de Medicina, que com suas sedes em Cuba e na Venezuela, forma as primeira gerações de médicos pobres na América Latina, para fortalecer as políticas de saúde pública no continente.
Enfim, sra. Clinton, se querem ter uma política de diálogo com o continente, primeiro tem que se dar conta que este não é o mesmo continente de quando seu marido governava e o neoliberalismo e a Alca reinavam. Assuma modestamente que não conhece o continente, venha visitar os nossos países, sem declarações, para aprender como se constroem processos de integração regional, como se superam as políticas de livre mercado que seu país propaga há décadas como a solução e que se tornou o principal problema a enfrentar.
Venha conhecer os novos governos, as novas políticas, mas antes resolva os problemas pendentes – Cuba, Guantanamo, Operação Colômbia, entre outros -, para não correr o risco de, delicadamente, moralmente, ser recebida não com flores, mas com sapataços.
Fonte: Blog do Emir Sader Postado por Emir Sader
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