Cacique Babau
Foto: Marcelo Min - Fotogarrafa
quarta-feira, 16 de junho de 2010
quarta-feira, 16 de junho de 2010
A ATUAÇÃO DA SOCIAL ADVOCACIA POPULAR, SAP, NO CASO DE CRIMINALIZAÇÃO DAS LIDERANÇAS DO POVO TUPINAMBÁ.
Em 16/04/2010, os irmãos ROSIVALDO FERREIRA DA SILVA (Cacique Babau) e GIVALDO JESUS DA SILVA, do Povo Indígena Tupinambá de Serra do Padeiro, sul da Bahia foram transferidos da carceragem da Polícia Federal de Salvador/BA para a Penitenciária Federal de Segurança Máxima de Mossoró/RN, PFMOS. O motivo? Segundo o Sr. José Maria Fonseca, Superintendente Regional da Polícia Federal na Bahia, "a transferência prende-se ao fato da custódia desta Superintendência Regional (BA) ter sido desativada, bem com o reduzido efetivo de policiais para reprimir possíveis manifestações programadas para próxima semana (19/04, dia do índio), data do evento da ONU nesta Capital, por parte de simpatizantes dos elementos que se encontram aqui custodiados provisoriamente cumprindo prisão preventiva".
Em 20/04/2010, véspera da viagem a Salvador/BA para participar do Encontro de Advogados Populares promovido pela Rede Brasileira de Justiça Ambiental (pelo Grupo de Trabalho de Combate ao Racismo Ambiental), o Coordenador Executivo da SAP, Luciano Falcão, visitou os indígenas e foi constituído como advogado de defesa atuando no Rio Grande do Norte. A articulação para visita dos irmãos foi realizada pelo Antropólogo Guga Sampaio, professor da Universidade Estadual da Bahia e membro da Associação Nacional de Ação Indigenista - ANAÍ, que entrou em contato com Falcão por e-mail e telefone.
Desde que a FUNAI iniciou o processo de demarcação da Terra indígena Tupinambá as fazendas invasoras da terra indígena passaram a contratar pistoleiros, fazendeiros dos municípios de Ilhéus e Buerarema iniciaram campanhas difamatórias nas rádios e jornais locais, incitando a população regional contra os índios, o que resultou numa série de conflitos envolvendo pistoleiros, fazendeiros e indígenas. Como conseqüência da disputa pela posse da terra, os Tupinambás respondem a uma série de inquéritos e processos criminais patrocinados pela Polícia Federal, numa estratégia clara de criminalização de sua luta legítima em defesa de seu território tradicional.
Em 29/04/2010 chega a Natal Patrícia Pataxó, a primeira estudante indígena e cotista, do curso de direito da Universidade Federal da Bahia, indicada pela família para acompanhar o caso de perto. Luciano recepcionou Patrícia no aeroporto de Natal e foram direto para a Justiça Federal obter autorização do Juiz Corregedor para que a indígena estudante pudesse ter contato com os irmãos presos. Em seguida, após uma articulação no escritório de um companheiro da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares, RENAP, que também é Conselheiro Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional RN, Daniel Pessoa, levamos o caso à reunião ordinária da OAB/RN, que ocorrera em 29/04. Durante a reunião do Conselho da OAB/RN foi concedida a palavra a Luciano e Patrícia, que explicitaram o movimento de criminalização que está em curso contra o Povo Tupinambá. A OAB/RN deliberou que os Conselheiros Estaduais residentes em Mossoró acompanhassem a visita; a comunicação do caso ao Conselho Federal da OAB em Brasília para acompanhar o caso; e a comunicação a OAB/BA para também acompanhar.
Em 30/04, após entrevista ao Jornal O MOSSOROENSE, Patrícia e Luciano acompanhados dos representes da OAB/RN conversaram com Babau e Givaldo e prestaram algumas informações sobre a tramitação das 04 ações de Habeas Corpus que estavam em andamento.
Em 28/05/2010, Patrícia Pataxó esteve novamente em Natal e, acompanhada de Luciano viajaram até Mossoró para realizarem nova visita aos irmãos. Na ocasião Patrícia informou a Babau sobre a devolução documentada das armas apreendidas pelos indígenas junto a pistoleiros que aterrorizavam a comunidade. Disse ainda que o relatório feito pelo Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa da Bahia seria anexado aos autos do Habeas Corpus que seria julgado na semana seguinte.
Quando tudo caminhava para o sucesso do julgamento do Habeas Corpus dos irmãos presos, no feriado de Corpus Christi Glicéria Tupinambá e seu filho de apenas (02) dois meses foram presos. Glicéria é liderança de seu povo e membro da Comissão Nacional de Política Indigenista - CNPI. Vinculada ao Ministério da Justiça, a CNPI tem entre seus integrantes representantes de 12 ministérios, 20 lideranças indígenas e dois representantes de entidades indigenistas. Na tarde de ontem, 2 de junho, Glicéria participou da reunião da CNPI com o Presidente Lula, oportunidade em que denunciou as perseguições de que as lideranças Tupinambá têm sido vítimas por parte da Polícia Federal no Sul da Bahia. A prisão foi decretada pelo juiz Antonio Hygino, da Comarca de Buerarema (BA), sob a alegação de Glicéria ter participado no seqüestro de um veículo da META (empresa que presta serviço de energia na região). Esse juiz em entrevista concedida ao repórter Fábio Roberto para um jornal da região, se referiu aos Tupinambá como “pessoas que se dizem índios”. Mãe e filho serão transferidos para um presídio na cidade de Jequié, distante cerca de 200km de sua aldeia.
Em 08/06/2010, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília, julgou o processo nº 0014723-10.2010.4.01.0000 / BA e decidiu por maioria conceder a ordem de "habeas corpus" aos índios custodiados em Mossoró. No dia seguinte ao julgamento ainda comemorado pela família, o mesmo juiz que decretou a prisão de Glicéria decretou nova prisão preventiva inédita, inclusive do ponto de vista jurídico, por crimes praticamente idênticos aos apurados pela Justiça Federal. O mandado de prisão da Justiça Estadual foi cumprido imediatamente pela Polícia Federal (ainda não sabe por que, visto que eles respondem perante a justiça estadual por crime comum), num ato que é uma verdadeira afronta ao Estado Democrático de Direito. Trata-se de uma banalização da prisão. O princípio da presunção de inocência ou quaisquer outros belíssimos princípios constitucionais são utilizados num típico caso de criminalização do movimento legítimo e democrático pela regularização das terras indígenas. Regularização territorial esta que, pelo próprio texto constitucional, já deveria ter sido exercida pelo Estado Brasileiro no prazo de cinco após a promulgação da Magna Carta de 1988.
O fato é que, na véspera da estreia da seleção brasileira no evento econômico-esportivo denominado copa do mundo, o Estado de Direito é ignorado. Clamamos por justiça ao Povo Tupinambá tanto no que tange à regularização de suas terras quanto no desbarate da verdadeira quadrilha que utiliza para fins particulares as instituições públicas.
Natal/RN, 15/06/2010
Luciano Ribeiro Falcão
Advogado Popular OAB/RN 6115
Coordenador Executivo da Social Advocacia Popular
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