Não aos dispositivos da PEC 358/2013 que alteram o financiamento federal do SUS!
A sociedade brasileira tem, reiteradamente, se manifestado em favor da melhor qualidade dos serviços públicos, com ênfase nos serviços de saúde, que não se têm colocado como prioridade na agenda governamental. Desde o inicio de sua implantação, o SUS sofre subfinanciamento crônico.

Como medida para enfrentar esse quadro, foi elaborado e submetido ao Congresso Nacional um Projeto de Iniciativa Popular, conhecido como Saúde +10, subscrito por 2,2 milhões de brasileiros e que tramita desde junho de 2013. Tal projeto contempla a ampliação dos recursos públicos, especialmente por parte da União, indicando que esse nível de governo aplique valores iguais a 10%, no mínimo, de sua Receita Corrente Bruta (RCB). Se aprovado, esse projeto permitiria ao SUS contar com um acréscimo, para aplicar em ações e serviços públicos de saúde, correspondente a 0,8% do PIB. Ainda que não resolva por completo o subfinanciamento histórico da saúde pública no Brasil e as necessidades dessa política de Estado, representa medida importante para a melhoria das condições de oferta de ações e serviços de saúde e, em ultima instância, para a sobrevivência do SUS.

No entanto, negociações entre governo e parlamento buscaram inviabilizar essa iniciativa por meio de inclusão de dispositivos que alteram o financiamento federal do SUS em uma PEC que tramitava no Congresso. A PEC 358/2013, cujo objeto era a alteração dos arts. 165 e 166 da Constituição Federal, visava tornar obrigatória a execução da programação orçamentária relativas às Emendas Parlamentares, razão pela qual ficou conhecida como a “PEC do Orçamento Impositivo”. Recebeu, no Senado, como resultado de negociações com a base do governo, acréscimo de artigos referentes a mudanças no art. 198 da CF/88 que estabelecem alteração dos montantes e do processo de financiamento da saúde pela União introduzidos quando da aprovação da EC 29 em 2000, suprimindo importante parágrafo que determinava que lei complementar deveria avaliar e rever tais valores a cada cinco anos.

O Art.1º da PEC 358 incorpora ao texto Constitucional, mais precisamente ao Art. 166 da CF, um limite de um inteiro e dois décimos (1,2%) da Receita Corrente Líquida (RCL) para a aprovação de emendas individuais dos parlamentares, sendo que a metade desse percentual deve ser destinado a ações e serviços públicos de saúde. Em outro dispositivo do mesmo artigo, torna obrigatória a execução orçamentária e financeira das emendas individuais até o limite correspondente a um inteiro e dois décimos da receita corrente líquida (RCL) realizada no ano anterior.

Mas são os Art. 2º e 3º desta PEC que tocam mais diretamente no financiamento da saúde.

O artigo 2º altera o percentual e a base de cálculo prevista no Saúde +10, para definição do piso de recursos federais para o SUS: ao invés de valores iguais a 10% da Receita Corrente Bruta (RCB), passa a ser 15% da Receita Corrente Líquida (RCL). Além disso, o piso seria alcançado de forma escalonada em cinco anos, isto é, 13,7% da RCL, para o primeiro exercício financeiro subsequente ao da promulgação dessa PEC, até alcançar 15% da mesma, no quinto exercício financeiro. Como a RCL é um agregado menor, isto resultará um acumulado de recursos, em cinco anos, de apenas R$ 64,2 bilhões, enquanto o Projeto Saúde + 10 corresponderia a um acumulado de R$ 257,1 bilhões no mesmo período. Além da redução no montante, esse artigo introduz rigidez a essa decisão, pois ao levar para o texto constitucional a definição do montante a ser aplicado pela esfera federal, que, pela atual legislação, é estabelecido por lei complementar, torna muito mais difícil e demorada qualquer revisão desses valores, pois emendas constitucionais implicam a exigência de quórum qualificado, de maioria de 3/5, e dois turnos de votação em cada uma das Casas legislativas, Câmara dos Deputados e Senado Federal.

O art. 3º representa outro golpe destinado a reduzir o gasto federal em saúde, pois estabelece que, contrariamente ao que determinou a Lei 12.858/2012 quanto à aplicação dos Royalties do Petróleo, “as despesas com ações e serviços públicos de saúde custeados com a parcela da União oriunda da participação no resultado ou da compensação financeira pela exploração de petróleo e gás natural (….) serão computadas para fins de cumprimento do disposto no inciso I do § 2º do art. 198 da Constituição Federal”. Ou seja, esses recursos deixarão de ser adicionais, conforme determina o Art. 4º da Lei 12.858/2012, e serão computados para o cumprimento do novo mínimo obrigatório estipulado no texto, substituindo aportes de recursos orçamentários da União estabelecidos como piso do financiamento federal da saúde.

Esses dois artigos foram objeto de solicitação de Destaque para Votação em Separado (DVS) no primeiro turno da votação da PEC na Câmara dos Deputados, quando seu texto-base foi aprovado. O DVS relativo ao art. 2º, que solicitava a sua supressão, já foi submetido ao Plenário, que decidiu pela manutenção do dispositivo. O DVS referente ao art. 3º ainda aguarda deliberação e a expectativa é, também, de recusa da proposta de exclusão.

Ao mesmo tempo, exatamente por se saber que os valores definidos pela PEC 358 são absolutamente insuficientes para o financiamento da saúde e para a consolidação do SUS, governo e Congresso Nacional se unem para duas iniciativas que encontram forte rejeição da população: a abertura indiscriminada do setor ao capital externo, que, inclusive, afronta conquista expressa na Constituição Federal de 1988 (sendo, pois, inconstitucional por se tratar de projeto de lei de conversão de medida provisória e não de emenda à constituição), e a discussão sobre a criação de tributo especial para a saúde, conforme foi a CPMF que, por empenho pessoal do então Ministro da Saúde Adib Jatene, foi aprovada pelo Congresso Nacional para em seguida ter parte substantiva de sua arrecadação destinada a outras áreas que não a saúde e ser, progressivamente, transformada em fonte substitutiva e não adicional de recursos para o setor.

O que se vê até os dias de hoje é a mesma falta de prioridade para a saúde. Se as autoridades públicas e os parlamentares reconhecem que a saúde pública é subfinanciada e que deveria ter ampliada a sua base de financiamento haveria de se instaurar maior discussão no parlamento para inclusive tornar claro para a população os motivos reais do não acatamento do PL de iniciativa popular.

As entidades abaixo assinadas manifestam seu repúdio à forma de financiamento proposta pelos artigos 2º e 3º da PEC 358/2013, que não assegura à saúde pública recursos absolutamente necessários ao seu funcionamento, e reafirmam a prioridade da Saúde para todos os brasileiros, com ampliação dos recursos destinados ao SUS, o que exige a aprovação imediata do Projeto de Lei de Iniciativa Popular que destina 10% da receita corrente bruta da União à saúde.

Associação Brasileira de Economia da Saúde – ABRES;
Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO);
Associação Brasileira de Saúde Mental – ABRASME;
Associação do Ministério Público de Defesa da Saúde – AMPASA;
Associação Paulista de Saúde Publica – APSP;
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde – CEBES;
Grito dos Excluídos/as Continental;
Instituto de Direito Sanitário Aplicado – IDISA ;
Plataforma Política Social;
Programa Justiça Econômica (Pastoral Social/CNBB, Comissão Brasileira Justiça e Paz, Pastoral da Saúde e Rede Jubileu Sul Brasil;
Rede Nacional Feminista de Saúde Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos

Fonte: Cebes