março 29, 2010

Carta da bióloga Elisa Wandelli pela preservação do Encontro das Águas

Mapinguari vs. King Kong
Nota do blog: Com essa postagem homenageio nossa querida cientista Elisa Wandelli e o movimento SOS Encontro das Águas - encarnação do Mapinguari (povos da floresta) na luta contra o King Kong (capitalismo predatório).

SOS Encontro das Águas x Forum da Sustentabilidade

Prezados Cientistas e Ambientalistas

Dr. Anthony Anderson
Dr. Thomas Lovejoy
Dr. Mario Mantovani
Dr. Pedro Leitão
Sr. Paulo Adário


Em vossa passagem por Manaus, no Fórum de Sustentabilidade, solicitamos seus esforços para a preservação do maior símbolo Natural e Cultural do Amazonas sensibilizando nossos governantes em prol da criação da Unidade de Conservação Encontro das Águas.

O Encontro das Águas dos rios Negro e Solimões forma o rio Amazonas que representa 15% de toda a água doce despejada nos oceanos e é uma das maravilhas naturais da Amazônia. As águas dos dois rios percorrem paralelas, lado a lado no mesmo leito do rio Amazonas, podendo permanecer sem se homogeneizarem até 18 km após a foz do rio Negro. A região do entrelaçamento dos rios Negro e Solimões, formadores do Amazonas, maior rio do mundo, propicia o desenvolvimento de paisagem, biodiversidade e geologia únicas, que devem ser conservadas para que os povos no presente e no futuro desfrutem das riquezas do Encontro das Águas que é o símbolo maior da natureza e da cultura Amazônida.

Apesar da importância ecológica e cultural do Encontro das Águas, a empresa Log-In Intermodal pretende construir nesta região o super-terminal portuário de cargas intitulado “Porto das Lages” que causará profunda degradação socioambiental à região, depauperando mais ainda este patrimônio da humanidade que já é vítima de toda a sorte de desmatamento, resíduos tóxicos e degradação causada pelo Distrito Industrial da Zona Franca de Manaus.

Gostaríamos também que ajudassem a sensibilizar o IPHAN-Ministério da Cultura para que o processo de tombamento do Encontro das Águas (N. 01490.00015-2009-11) instaurado desde agosto de 2009 seja agilizado e o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade/ Ministério do Meio Ambiente para que instaure processo para a criação da Unidade de Conservação Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) Encontro das Águas, cuja solicitação foi realizada pela sociedade civil organizada no dia 22/03/2010, dia Mundial das Águas.

Salientamos alguns aspectos relacionados a criação da Unidade de Conservação e ao Terminal Portuário:

- O Movimento SOS Encontro das Águas é preferencialmente favorável as hidrovias na Amazônia em relação às Rodovias. Terminais Portuários que permitam a rápida circulação de mercadorias e que suportam navios de grande calado são fundamentais para privilegiar o transporte hidroviário. No entanto, o local escolhido para a instalação do Porto das Lajes irá causar perdas socioambientais irreversíveis e o plano de mitigação e compensação ambiental apresentado pela Lajes Logística é inconsistente e omisso. Portanto queremos que o porto seja construído em local já degradado, distante do Encontro das Águas, distante dos lagos de desova e de pesca e em local de menor importância paisagística, social, cultural, turística e ecológica.

- A Proteção do Encontro das Águas possibilitará a melhoria das condições de vida das comunidades locais por preservar os recursos hídricos que permitirão o consumo de água e de peixes, o lazer e o transporte fluvial regional, o desenvolvimento de atividades economicamente sustentáveis como, a pesca e a criação de peixes, o turismo comunitário ecológico. A conservação e o uso sustentável do Encontro das Águas representarão a soberania cultural e econômica e a qualidade de vida das comunidades locais.

- O Porto das Lajes diminuirá a qualidade de vida das comunidades locais porque poluirá as águas inviabilizando seu uso para consumo, recreação, turismo e pesca. Contribuirá com o assoreamento e a degradação do lago do Aleixo, dificultará o fluxo de embarcações regionais e causará empobrecimento da rica vida aquática. A degradação da paisagem e da biodiversidade que o Porto das Lajes causará afetará a atividade turística do Encontro das Águas. O Porto das Lages não gerará empregos significantes porque esta atividade portuária é basicamente mecanizada.

- A instalação do Terminal Portuário propiciará a degradação social associada à instalação de prostíbulos, aumento do tráfico de drogas, contrabando e grande fluxo migratório descontrolado de pessoas para as margens e comunidades do Encontro das Águas.

- O impacto na qualidade da água e o aumento do fluxo de grandes embarcações que a construção do empreendimento e a atividade portuária provocarão afetará a rica vida aquática do Encontro das Águas, região de desova e alta produtividade primária, inclusive as populações de boto vermelho (Inia geoffrensis), boto tucuxi (Sotalia fluviatilis) e peixe-boi (Trichechos inunguis), espécie ameaçada de extinção.

- O Porto das Lajes desmatará e degradará as áreas de reprodução, pouso e descanso de espécies de aves locais e migratórias, a exemplo do maçarico solitário (Tringa solitaria) e o maçarico pintado (Actites macularius), ambos pássaros migratórios provenientes do Hemisfério Norte que pousam na região das lajes no percurso em direção ao Sul do continente, como a Patagônia. Áreas de pouso e reprodução de aves migratórias são protegidas por lei Federal e Municipal, e, portanto não podem ser destruídas.

- A construção do Terminal Portuário irá desmatar e degradar a ultimo fragmento de floresta de igapó restante em Manaus na margem esquerda do Rio Negro e desmatará fragmento florestal de “terra-firme” onde há presença do sauim-de-manaus (Saguinus bicolor), um primata criticamente em perigo de extinção (IUCN 2008).

Portanto solicitamos apoio para:

1 - Que o Encontro das Águas seja transformado pelo Instituto Chico Mendes (MMA) em Unidade de Conservação de Uso Sustentável (Área de Relevante Interesse Ecológico – ARIE) para as comunidades locais. A Unidade de Conservação na categoria de Área de Relevante Interesse Ecológico, que permite propriedade privada, atividades tradicionais e sustentáveis, deverá incluir as duas margens, ilhas e lagos, desde a Ilha de Marapatá e a foz do rio Negro, ilha Xiborena, lago Catalão, Sítio Geológico Ponta das Lajes, lago do Aleixo até pelo menos 18 km a jusante, incluindo a ilha Terra Nova e o Lago dos Reis.

2 - Que as áreas degradadas do Encontro das Águas sejam recuperadas e os dejetos lançados na região sejam tratados e que o governo do Estado não licencie o Terminal Portuário Porto das Lajes. Que seja desenvolvido um programa governamental participativo de recuperação com fins paisagísticos, conservacionistas e de lazer, garantindo assim o uso desse bem coletivo para as comunidades locais e para atividades turísticas.

3 - Que o Encontro das Águas seja declarado Patrimônio Natural da Humanidade pela UNESCO e, portanto, reivindicamos ao IPHAN/Ministério da Cultura a homologação do Tombamento (proteção) desta região como Patrimônio Natural e Cultural do Brasil.

Se não formos competentes para preservar o Encontro das Águas, símbolo maior da identidade cultural e natural da Amazônia, não seremos capazes de gerir sustentavelmente qualquer outro recurso natural da Amazônia.

Muito Obrigada,

Elisa Wandelli
p/movimento socioambiental “SOS Encontro das Águas”

* * *

De quebra, leia a advertência científica que vem sendo ignorada pela mídia deslumbrada:

Criação de rodovias levaria Amazônia à destruição em 20 anos, diz Thomas Lovejoy

Rafael Nobre, especial para UrbanPost
de Manaus

O cientista norte-americano Thomas Lovejoy, famoso pela criação do termo biodiversidade, causou inquietação entre a plateia do Fórum Internacional de Sustentabilidade ao afirmar que a criação de rodovias na Amazônica levaria afloresta à destruição em 20 anos. O pesquisador é presidente do Centro Heinz de Ciência, Economia e Ambiente (Washington, EUA) e defende que a regiãoamazônica deve permanecer apenas com as estradas fluviais ou, no máximo, instalar ferrovias, causando espanto até no governador do Estado doAmazonas, Eduardo Braga, sentado ao seu lado na bancada dos palestrantes e que não escondeu seu descontentamento sobre a opinião de Lovejoy.

O ponto de vista defendido pelo cientista é que a construção de auto-estradas acelera o processo de desmatamento de florestas, pois além da derrubada de árvores para abrir caminho para as máquinas e o trajeto da rodovia em si, ocorre a criação de fragmentos de floresta.

“Os fragmentos de florestas são áreas verdes cercadas por áreas sem cobertura vegetal e uma porção de 100 hectares, por exemplo, inicialmente perde todas as grandes árvores e depois 30% da biomassa geral e é eliminadado mapa em apenas 15 anos”, explicou Lovejoy, dizendo ainda que se muitas áreas fragmentadas surgirem, a floresta Amazônia desaparecerá, dando lugar a uma grande savana.

De acordo com a gestora da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), Flávia Grosso, negar a importância das rodovias em um Estado como o Amazonas, onde a população das cidades mais afastadas da capital tem um aeconomia atrasada e muitas vezes dependente do funcionalismo público, “é negar o direito de crescimento, de desenvolvimento econômico e social ao povo da floresta”.

Durante entrevista após o término da palestra, o governador do Amazonas disse que os amazonenses não podem ficar dependentes das embarcações, como única forma de transporte, considerando a inexistência de ferrovias na região, assim como no restante do Brasil. “A ligação das cidades amazônicas por estradas garante que não fiquemos isolados aqui no meio da floresta. Na última grande seca, ocorrida em 2005, a população do interior do Amazonas quase ficou completamente sem ligação com a capital”, lembrou Braga. Ele afirmou também que o poder público não pode deixar as pessoas desassistidas porque “a Amazônia também é formada por pessoas, não só de animais e plantas”.

O Estado do Amazonas tem 62 cidades e apenas três rodovias, sendo que apenasduas são trafegáveis. O Fórum Internacional de Sustentabilidade iniciou-se nesta sexta-feira (26) e se estende até sábado (27), em Manaus, com a participação de 600 pessoas, entre pesquisadores e empresários.

Fonte: http://verde.br.msn.com/artigo.aspx?cp-documentid=23736729

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