SOS Encontro das Águas
Foto: Rogelio Casado - Manaus-Amazonas, 2009
Carta ao governador Eduardo BragaTenório Telles (*)
Justiça, equidade, bem comum, autoridade, tolerância, firmeza e bondade. Essas palavras expressam atributos indispensáveis aos que se dedicam ao exercício do poder, bem como ao processo de formação dos indivíduos e fortalecimento dos vínculos sociais. Os pensadores que se debruçaram sobre as questões do Estado concluíram que, sem o cultivo desses valores, os instrumentos asseguradores da ordem não são suficientes para manter a coesão social. O sábio grego Platão considerava a sabedoria e a serenidade imprescindíveis para o exercício do bom governo. Nem Maquiavel negligenciava esses fatores no fortalecimento político do príncipe.
Governador Eduardo Braga,
Com essas ponderações, desejo expressar minha compreensão sobre os desafios e circunstâncias que envolvem a condução do poder e, ao mesmo tempo, meu respeito pela sua coragem e firmeza no enfrentamento das demandas da prática política. Ninguém pode lhe acusar de falta de autoridade ou de ter sido indiferente em relação aos problemas e interesses do Estado. Acompanho suas ações à frente do governo do Amazonas e percebo seu comprometimento com a construção de perspectivas para o futuro.
É em nome desse compromisso com o futuro que apelo para sua sensibilidade e bom-senso. Não permita, governador, que o novo porto de Manaus seja construído nas Lajes. O Encontro das Águas e seu entorno é uma das áreas mais belas e simbólicas de nosso Estado. É um patrimônio natural de nossa gente e um fator expressivo de nossa identidade. Trata-se de uma obra que está na contracorrente do debate sobre a importância da preservação do meio ambiente, e o senhor é um governante compromissado com essa causa. Um porto pode ser construído em qualquer lugar, mas o que fizermos com o Encontro das Águas será irreversível e seremos cobrados por isso.
Governador, é inegável que o Estado precisa de um porto novo e moderno, que atenda aos novos padrões logísticos e ao desenvolvimento, e ajude a desafogar o fluxo de veículos pesados no centro de Manaus, mas acredito ser possível encontrar uma outra área. Todo esforço para preservar o Encontro das Águas não será em vão. Esse espaço é valioso intacto e possui um potencial econômico inestimável como um futuro centro turístico e de lazer para a população de Manaus e os turistas que nos visitam. As futuras gerações o agradecerão por um gesto seu a favor dessa causa.
Governador Eduardo Braga, sei que todo ser humano convive com suas circunstâncias e demandas de suas relações, mediando interesses e conflitos. Acompanhei-o em muitos momentos de sua trajetória. Como seu eleitor, entristeci-me com as derrotas sofridas e enchi-me de esperança com a sua vitória em 2002. O senhor é jovem e terá ainda muitas oportunidades de trabalhar para construir um futuro melhor para o povo amazonense. Como autoridade máxima do Estado, o senhor pode ajudar a encontrar uma solução para esse impasse em relação ao Encontro das Águas. Ainda há tempo de evitarmos esse erro. Minha intenção não é importuná-lo ou insinuar críticas, mas expressar, como um cidadão comum, minha preocupação com o futuro do Encontro das Águas, que é um símbolo e um patrimônio do povo do Amazonas.
O senhor em breve deixará o governo e o que espero, assim como muitos que defendem a manutenção desse espaço natural, é uma atitude favorável à sua preservação e a construção do porto em outro local. Essa seria mais uma demonstração de compromisso de sua administração com a natureza, com a vida e com o patrimônio ambiental de nossa terra. Neste momento, socorro-me das palavras do professor Mário Ypiranga Monteiro sobre o desafio de cuidar do meio ambiente: “O enriquecimento do homem traz o empobrecimento da terra. Mas aonde vão cantar os pássaros, nadar os peixes, frutificar as árvores? O empobrecimento da terra traz o aniquilamento do homem”.
(*) Professor, poeta, editor, membro da Academia Amazonense de Letras e articulista de a Crítica de Manaus.
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