Aníbal Beça ©
Ó multifacetária face de ti mesmo
reverso de teus versos mais insuladores
onde revelas pênsil a palavra a esmo
E o eco do teu eco a eclodir nos tambores
faz-se volátil ressoar do teu retrato
nas elegias em que cantas desamores
Pois bem no fundo do teu mais íntimo trato
lá no recôndito de tua geografia
é que o vero signo reveste-se abstrato
Tu e os teus outros, e o teu Outro desafia
o gesto indecifrável do teu canto oblíquo
que logo reverdece em tua engenharia
Ó pêndulo que pende mais ao lado iníquo
a desvelar ocultas idiossincrasias
no labirinto azul do teu ser tão melífluo
que ao mesmo tempo traz amargas fantasias
adredemente enviesadas na vontade
ao avesso polissêmico das travessias
Tua revisitada Lisboa, cidade
por quem a solidão quedou-se-te nos becos
na mais estranha fala perto da saudade
Ó Lisboa de outrora, de hoje, os teus degredos
de tão particulares e silenciosos
passaram como passos teus breves segredos
E voltas a escandir clarões licenciosos
no sol dessa saliva rubra como um halo
tecido em linha reta aos sons maliciosos
que seguem direções nas patas de um cavalo
e se vão semeando em brilho opalescente
até as pradarias por onde me resvalo
O que fica de ti é esse ir morrendo
como a lua de Durban alhures perdida
como as cartas de Ophélia ainda recendendo
o palor dessa paixão de contorno fendida.
Em sete vezes sete exauriste no aval
de Álvaro de Caeiro de Reis na medida
milenar e obscura da cruz do Santo Graal
que te fez cavaleiro da terra querida
para melhor cantar o teu chão Portugal.
VISITE OS SITES DO POETA ANÍBAL BEÇA
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Fernando Pessoa, um dos expoente máximos do modernismo no século XX, considerava-se a si mesmo um «nacionalista místico».
Nasceu Fernando António Nogueira Pessoa em Lisboa, no dia 13 de Junho de 1888, filho de Maria Madalena Pinheiro Nogueira e de Joaquim de Seabra Pessoa.
A juventude é passada em Lisboa, alegremente, até à morte do pai em 1893 e do irmão Jorge no ano seguinte. Estes acontecimentos, em conjunto com o facto de sua mãe ter conhecido o cônsul de Portugal em Durban, levam-no a viajar para a África do Sul. Aí vive entre 1896 e 1905. À vivência nesse país da Commonwealth pode atribuir-se uma influência decisiva ao nível cultural e intelectual, pondo-o em contacto com os grandes autores de língua inglesa.
O Regresso a Portugal, com 17 anos, é feito com o intuito de frequentar o curso de Letras. Viveu primeiro com uma tia, na rua de S. Bento e depois com a avó paterna, na Rua da Bela Vista à Lapa. Mas com o fracasso do curso (frequentou-o poucos meses), governa-se apenas com o seu grande conhecimento da língua inglesa, trabalhando com diversos escritórios em Lisboa em assuntos de correspondência comercial.
Ficou sobretudo conhecido como grande prosador do modernismo (ou futurismo) em Portugal. Expressando-se tanto com o seu próprio nome, como através dos seus heterónimos. Entre estes ficaram famosos três: Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis. Sendo que as suas participações literárias se espalhavam por inúmeras publicações, das quais se destacam: Athena, Presença, Orpheu, Centauro, Portugal Futurista, Contemporânea, Exílio, A Águia, Gládio. Estas colaborações eram tanto em prosa como em verso.
Teve uma paixão confessa - Ophélia Queirós - com a qual manteve uma relação muitas das vezes distante, se bem que intensa. Mas foi talvez Ophélia a única a conhecer-lhe o lado menos introspectivo e melancólico.
O seu percurso intelectual dificilmente se descreve em poucas linhas. É sobretudo o relato de uma grande viagem de descoberta, à procura de algo divino mas sempre desconhecido. Essa procura efectuou-a Pessoa com recurso a todas as armas - metafísicas, religiosas, racionalistas - mas sem ter chegado a uma conclusão definitiva, enfim exclamando que todos os caminhos são verdadeiros e que o que é preciso é navegar (no mundo das idéias).
Os últimos anos são vividos em angústia. Os seus projectos intelectuais não se realizam plenamente, nem sequer parcialmente. Talvez os seus objectivos fossem à partida demasiado elevados... Certo é que esta falta de resultados concretos o deita a um desespero cada vez mais profundo. Foi um profeta que esperava a realização da sua profecia, mas que morreu sem ver sequer o principio da sua realização.
Fernando Pessoa morre a 30 de Novembro de 1935, de uma grave crise hepática induzida por anos de consumo de álcool, no hospital de S. Luís. Uma pequena procissão funerária levou o corpo a enterrar no Cemitério dos Prazeres. Em 1988, por ocasião do centenário do seu nascimento, os seus restos mortais foram transladados para o Mosteiro dos Jerónimos em Belém. Em vida apenas publicou um livro em Português: o poema épico Mensagem, deixando um vasto espólio que ainda hoje não foi completamente analisado e publicado.
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