maio 10, 2010

II Prêmio Carrano de Luta Antimanicomial e Direitos Humanos

Gato Seco – Nos Telhados da Loucura
 Apresenta
 II Prêmio “CARRANO” de Luta Antimanicomial e Direitos Humanos


 datilografado, fotocopiado e encadernado em espiral o desenho é de autoria de Carrano.

Dia 27 de maio completa-se dois anos da morte de Austregésilo Carrano Bueno, dramaturgo, militante da luta antimanicomial e autor do livro “Canto dos Malditos”, que originou o filme “Bicho de sete cabeças”, que junto com o livro revolucionou a história da Reforma Psiquiátrica no Brasil. Carrano se destacou como o principal militante pela Luta Antimanicomial em nosso país. Eleito em congresso na cidade de Xerém-RJ, atuou nos últimos anos como representante dos usuários na Comissão Nacional de Reforma Psiquiátrica do Ministério da Saúde, chegando a receber, em 2003, uma homenagem das mãos do presidente da república Luís Inácio Lula da Silva, por seu empenho na Reforma Psiquiátrica. Além das torturas sofridas nos “chiqueiros psiquiátricos” – como dizia – Carrano sofreu vários processos judiciais por sua militância, principalmente por parte dos familiares dos médicos responsáveis pelos “tratamentos” recebidos nas passagens pelos locais onde foi internado, confinado e torturado. Carrano continuou militando até seus últimos dias no Movimento da Luta antimanicomial, mesmo com a saúde debilitada, no dia 18 de maio de 2008, participou do Dia Nacional de Luta Antimanicomial em Belo Horizonte.

O Prêmio - Para que a sua voz não se cale e seu nome continue vivo no Movimento de Luta Antimanicomial, criamos em 2009, o Prêmio CARRANO de Luta Antimanicomial e Direitos Humanos. O Prêmio tem como o objetivo dar continuidade a sua luta por uma mudança nas condições de tratamento de pessoas em sofrimento mental,  fazendo valer a Lei nº 10.216/2001 da reforma Psiquiátrica no Brasil, da qual foi um dos defensores e críticos. O prêmio será entregue anualmente a pessoas de ações e atitudes importantes nestas áreas, mas principalmente, denunciar quaisquer violações dos Direitos Humanos, especialmente no que se refere a pessoas nas condições de sofrimento mental. Fizemos em 2009, na Semana do Dia Nacional de Luta Antimanicomial, o lançamento do Prêmio, com uma entrega simbólica a Carlos Eduardo Ferreira, mas conhecido como Maicon, usuário e militante da Luta, que esteve em vários momentos ao lado de Carrano, também foi entregue um prêmio a família de Carrano.

A criação do prêmio foi uma iniciativa de alguns amigos de Carrano: Edson Lima coordenador do projeto O Autor na Praça, Erton Moraes escritor, compositor e músico do Movimento TrokaosLixo, Lobão integrante do Movimento 1daSul e Sarau do Cooperifa, Adriano “Mogli” Vieira da AEUSP - Associação dos Educadores da USP, Paloma Kliss escritora e contamos com o apoio do Movimento Nacional e Fórum Paulista de Luta Antimanicomial, Conselho Regional de Psicologia de São Paulo e militantes do movimento. A entrega do II Prêmio Carrano será na semana do dia nacional de Luta Antimanicomial, dia 15 de maio (data de nascimento de Carrano em 1957). Neste ano criamos o coletivo Gato Seco – Nos telhados da Loucura, que tem o papel da organização do Prêmio. O coletivo é formado pelo projeto O Autor na Praça,  Movimento Trokaoslixo, Literatura Nômade, grupo Encontro de Utopias, Lobão, agitador e grande amigo de Carrano, a escritora e produtora Paloma Kliss, a psiquiatra Patrícia Villas-Bôs, a poeta Tula Pilar, o músico e compositor Léo Dumont outros amigos de Carrano. Trata-se de um grupo aberto e convidamos a pessoas e instituições que quiserem participar e colaborar com esta iniciativa. Além da entrega do prêmio haverá uma tarde poética sobre a Literatura e Loucura, organizada pelo pintor e poeta Júlio Bittar e o grupo Encontro de Utopias. Também acontece performance com o coreógrafoa Marcos Abranches e apresentações musicais com a participação da Banda Mokó de Sukata, do músico e compositor Léo Dumont e outros convidados. Estarão disponíveis os dois últimos livros lançados por Carrano com textos de teatro: “Canto dos Malditos” e “O Sapatão e a Travesti”

Para o II Prêmio Carrano foram indicadas 13 pessoas e instituições:
Casa do Saci (Espaço criado e administrado por usuários e apoiadores da rede substitutiva aos manicômios)
Senador Eduardo Suplicy
Grife Dasdoida (criada pela psiquiatra Julia Catunda e usuários do CAPS Itapeva)
Grupo Tortura Nunca Mais
Luciano Santos, advogado e integrante do Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral
Magrão, amigo de Carrano
Marcelo Rubens Paiva, escritor e dramaturgo
Marcos Abranches, Coreógrafo
Paulo Amarante, Psiquiatra e escritor
Revista Ocas – Organização Civil de Ação Social (Maria Alice Vassimon)
Sebastião Nicomedes, escritor, dramaturgo e coordenador de oficina na Casa Restaura-me de apoio a pessoas em situação de rua
Toninho Rodrigues, diretor e ator de teatro
Xico Sá, jornalista e escritor.

Na ocasião também serão homenageadas 13 personalidades que, de alguma forma, muito contribuiram para Luta Antimanicomial e Direitos Humanos:
Antonin Artaud
Arthur Bispo do Rosário
João Cândido, o Mestre sala dos mares
Itamar Assumção, músico e compositor
Lima Barreto, escritor
Machado de Assis, escritor
Maria Conceição Aciolly (Ceça), Atriz e Bonequeira
Nise da Silveira, Psicóloga
Nivaldo Santana (ator e artista plástico)
Paulo Leminski, escritor
Plínio Marcos, dramaturgo
Roberto Freire, escritor e criador da Somaterapia
Sérgio Sampaio, Músico e compositor

Serviço:
Entrega do II Prêmio Carrano de Luta Animanicomial e Direitos Humanos
Data: dia 15 de maio de 2010, a partir das 14h
Local: Espaço Plínio Marcos (Tenda na Feira de Artes da Praça Benendito Calixto, Pinheiros)
Realização: coletivo Gato Seco – Nos telhados da Loucura
Apoio: Fórum Paulista de Luta Antimanicomial, Movimento Nacional de Luta Antimanicomial, CRP-SP, Grupo Tortura Nunca Mais, AEUSP – Associação dos Educadores da USP, CRP-SP Conselho Regional de Psicologia de São Paulo e outras entidades e instituições ligadas ao tema.

Vejam depoimentos do Carrano:
Sobre cultura e direitos autorais
Neste depoimento do Carano faz a leitura de seu poema “Sequelas... e... Sequelas” de abertura do livro “Canto dos Malditos”, que originou o filme “Bicho de sete cabeças” (o texto do poema está ao final deste release).

AUSTREGÉSILO CARRANO BUENO - Curitibano, escritor, ator, dramaturgo. Autor de dois livros editados: “Canto dos Malditos”, que originou o filme “Bicho de Sete Cabeças” e “Textos – Teatro – Seis peças para Teatro”. O texto para teatro de sua autoria “SOS Mãe natureza”, premiado na ECO-92, foi adaptado para livro infanto-juvenil, com titulo provisório: “SOS... Os Senhores Mesquinhos estão devorando a Mãe Natureza” que não foi publicado ainda, embora Carrano tenha batido a portas de algumas editoras. Em parceria com o selo O Autor na Praça, publicou em 2007, dois livros de textos para Teatro: Canto dos Malditos e O Sapatão e a Travesti, com a renda da venda desses livros esperava publicar uma nova edição de Cantos dos Malditos e o romance “Filhas da Noite”.

Carrano foi Ativista do Movimento Nacional da Luta Antimanicomial, Membro da Comissão Intersetorial de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Representante dos Usuários no Conselho Nacional de Reforma Psiquiátrica (Eleito no Encontro Nacional dos Usuários e Familiarres em Xerém, RJ), Defensor Ferrenho das Indenizações as Vítimas do Holocausto Psiquiátrico Brasileiro. Homenageado pelo Ministério da Saúde e pelo Presidente da Republica Luiz Inácio Lula da Silva, em 23 de maio de 2003, pelo seu empenho na construção e luta pela Reforma Psiquiátrica no Brasil.

O livro “Canto dos Malditos” deu origem ao filme mais premiado da história da cinematografia brasileira: “Bicho de Sete Cabeças”, dirigido por Laís Bodanzky, recebeu 45 prêmios nacionais e 08 prêmios internacionais, ao todo são 53 prêmios conquistados. O trabalho de Carrano foi reconhecido nacional e internacionalmente, envolvendo a questão da Reforma Psiquiátrica no Brasil.  Como ele exigia e defendia: “Temos que ter uma nova visão e maneira de tratarmos, sem preconceitos, respeitando seus direitos de cidadão, e aceitando o diferente que se encontra em sofrimento mental. Um basta definitivo no confinamento, sedação e experiências com cobaias humanas. Confinar não é tratar, é Torturar, portanto, são crimes psiquiátricos que devem ser cobrado responsabilidades e serem pagas indenizações as Vítimas”.

“(...) Ainda espero ser indenizado pelas torturas psiquiátricas sofridas, pela minha condenação aos preconceitos sociais, danos físicos, emocionais, morais, danos na minha formação profissional, danos financeiros, destruição de minha adolescência. E esses meus direitos de cidadão serão cobrado até o fim dos meus dias. Se não conseguir em vida, algum dos meus filhos fdicará com essa incumbência. Justiça plena e total é o que exijo, e mesmo depois de morto continuarei a exigir. Não só para mim, exijo essas indenizações para todas a vítimas do holocausto da psiquiatria brasileira, não desistirei por nada nem que leve o resto da minha vida ” (Texto de Carrano no posfácio da última edição do livro Canto dos Malditos)


SINOPSE do livro Canto dos Malditos - História real do período que o autor passou confinado por três anos e meio em instituições psiquiátricas do Paraná e Rio de Janeiro, dos 17 até 21 anos. Sofrendo torturas, e as mazelas de um sistema manicomial brasileiro arcaico, confinador, estigmatizante, e que chamam de “tratamento psiquiátrico”. Sobreviveu a 21 aplicações de Eletroconvulsoterapia; choques numa voltagem de 180 a 460 volts aplicados nas temporas. O livro foi escrito não com a intenção de denegrir a imagem de médico psiquiatra algum, e sim é um relato fiel a que são submetidos os pacientes psiquiátricos dentro dos manicômios.

Homenageado pelo Presidente da República Sr. Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 28 de maio de 2003, pelo seu empenho na Reforma Psiquiátrica, que está sendo construída em todo o Brasil; Porém, todo esse empenho e reconhecimento, têm-lhe cobrado um grande preço, na sua terra natal. Em Curitiba, um Lobby de Psiquiatras, contrários às ideologias de Carrano, e do Movimento Nacional da Luta Antimanicomial, são eles, opositores ferrenhos a Reforma Psiquiátrica no Brasil. Esses Empresários da Loucura, donos e associados dos hospitais psiquiátricos, fizeram perseguições indecentes, constantes e aviltantes, lançou a 1ª edição do livro em 1990, pela Scientia et Labor, Editora da Universidade Federal do Paraná.  Dias após o lançamento, o livro foi retirado das livrarias a mando desse Lobby de Psiquiatras. Só voltando a ser publicado em 1991, pela Editora Lemos, de São Paulo, Carrano comprava a edição e a vendia em seminários, palestras, feiras culturais, entre elas uma em um Shopping da cidade, por onde chegou as mão da diretora do filme Laís Bodanszky. Chegou a publicar e bancar sete edições do livro sem ser vendido em livrarias.

Em 13 de maio de 1998, Carrano entrou com a “1ª Ação Indenizatória” por erro, tortura e crime psiquiátrico no histórico forense brasileiro. Até sua morte em maio 2008, uma de suas rotinas foi responder a processos jurídicos de todos os tipos, até um processo que exige que ele se calasse, proibindo-o de falar de sua experiência dentro dos chiqueiros psiquiátricos que foi torturado. As Perseguições judiciais que recebia, eram repudiadas pela sociedade brasileira, causando indignação em ongs nacionais e internacionais de Direitos Humanos. O livro “Canto dos Malditos” foi cassado, retirado novamente das livrarias e proibido em todo o território nacional, em abril de 2002. Da primeira Ação Indenizatória por erro, tortura e crime psiquiátrico no Brasil, de vítima virou réu, em maio de 1999 foi condenado a pagar R$ 60.000.00 aos donos dos “Chiqueiros Psiquiátricos” do qual foi vítima. Entrou com recurso no Supremo Tribunal Federal em Brasília. Em novembro de 2003 foi condenado novamente a pagar mais R$ 12.000.00 em vinte e quatro horas, por citar os nomes dos hospícios e dos médicos na imprensa, por estas citações chegou a receber ameaças de morte. Na sentença desse processo seu direito de livre expressão foi cassado, foi proibido de falar o nome de seus torturadores em público, com uma multa de R$ 50.000.00 a cada desobediência jurídica.  Julgado pelo Judiciário Paranaense, de Vítima da Tortura Psiquiátrica se tornou Réu por denunciar, exigir mudanças radicais, indenizações, cobrança de responsabilidades dos profissionais dessa falsa psiquiatria que confina, droga e mata pessoas em suas casas de extermínios, os “chiqueiros psiquiátricos” brasileiros. Pagou o preço por enfrentar essa Máfia do Inconsciente, donos exclusivos e ditadores do “Saber Psiquiátrico!”.

Querem o calar, custe o que custar. Foi sem dúvidas um artista, revolucionário, guerreiro dos Direitos Humanos, e dos mais polêmicos do Brasil. Conseguiu, bancando sozinho o trabalho de seu advogado a liberação do seu livro “Canto dos Malditos” depois de dois anos e meio cassado e retirado de todas as livrarias brasileiras, não contou com nenhum apoio da editora da época. “Canto dos Malditos” foi dos poucos livros proibidos depois do fim da Ditadura Militar.  Voltou às livrarias em setembro de 2004, com um posfácio mais picante, denunciando os crimes psiquiátricos e também as fortunas psiquiátricas ilícitas. Cobrando, exigindo “Indenizações” imediatas às Vítimas do Holocausto Psiquiátrico Brasileiro... A Luta pelos Direitos Sociais de nós “Vítimas Psiquiátricas”, está apenas começando, agora que a cobra vai fumar!... Afirmava Carrano.

 Sequelas... e... Sequelas

Seqüelas não acabam com o tempo. Amenizam. Quando passam em minha mente as horas de espera, sinceramente, tenho dó de mim. Nó na garganta, choro estagnado, revolta acompanhada de longo suspiro.

Ainda hoje, anos depois, a espera é por demais agonizante. Horas, minutos, segundos são eternidade martirizantes. Não começam hoje, adormeceram a muito tempo, a muito custo... comigo. Esta espera, Oh Deus! É como nunca pagar o pecado original. É Ser condenado a morte várias vezes.

Quem disse que só se morre uma vez?

Sentidos se misturam, batidas cardíacas invadem a audição. Aspirada a respiração não é... é introchada. Os nervos já não tremem... dão solavancos. A espera está acabando. Ouço barulho de rodinhas. A todo custo, quero entrar na parede. Esconder-me, fazer parte do cimento do quarto. Olhos na abertura da porta, rodam a fechadura. Já não sei quem e o que sou. Acuado, tento fuga alucinante. Agarrado, imobilizado... escuto parte de meu gemido.

Quem disse que só se morre uma vez?

(Austregésilo Carrano Bueno – Poema das quatro horas de espera para ser eletrocutado – aplicação da eletroconvulsoterapia). Veja vídeo do Carrano declamando o poema:
Posted by Picasa

Nenhum comentário: