junho 30, 2011

"Sair dos eixos à esquerda (1)", por Bruno Cava

PICICA: "Se o Fora do Eixo, bem como todos esses movimentos de composição nova, — e se pode incluir aí, guardadas as particularidades, Túnis e Tahir no norte da África e o 15-M na Europa, — se eles terminarem capturados pelo capitalismo, terá sido a gente, a esquerda, que os perdemos, quero dizer, nós teremos perdido. Mas não perdemos, porque a luta continua com eles, através deles e neles."
Sair dos eixos à esquerda (1)

Tenho acompanhado o debate iniciado pelo coletivo Passa Palavra com o artigo A esquerda fora do eixo. Desde a sua publicação, em 17 de junho, repercutiu em cerca de uma dezena de bons textos pela blogosfera. Há tempos não suscitava uma discussão tão aberta e provocativa, ao redor de um tema candente para a esquerda. Ponto para o Passa Palavra. Discute-se algo crucial: como organizar-se politicamente, como mobilizar-se de modo expansivo, como fazer a luta de maneira coordenada, potente e eficaz?

Neste artigo, que pretendo o primeiro de uma série, proponho-me a pensar ao contrário. Em close reading, repassar e problematizar os principais textos produzidos sobre o assunto.

Começo com o artigo inaugural e, no próximo, passo à réplica de Ivana Bentes, publicada no portal Trezentos.

I. A esquerda fora do eixo“, Passa Palavra, 17/06/2011
 

É pertinente a preocupação crítica com a burocratização e aparelhamento dos movimentos, que assim vão distanciando-se das forças sociais vivas, caindo numa lógica autofágica e, no limite, reinscrita no sistema de controle e exploração capitalistas. Acertada a preocupação crítica também ante os riscos de cooptação de movimentos sociais/ONGs/coletivos, quando o ativismo se aproxima demais, amiúde aliando-se às empresas e ao estado. Ao dissociar meios e fins, o velho dilema tática x estratégia geralmente encobre a domesticação, engessamento e eventual pacificação do movimento. No âmbito da organização do trabalho, costuma ser fatal. Disso já se sabe desde o exame por sociólogos marxistas do sindicalismo de modelo japonês, toiotista. Seduzidos pelo ideal de desenvolvimento e inovação tecnológica, tais sindicatos promoviam a ideologia da empresa, o esforço conjunto de chefes e operários, um modo de vida conciliado para o bem de todos. O sindicato acabava fortalecendo a divisão social do trabalho, em vez de denunciá-la e combatê-la. Esse modelo de organização se difundiu e está presente na maioria das empresas hoje (com muita incidência nas multinacionais), e se reflete na expectativa, num sistema de cobranças e gratificações, em que toda a vida do funcionário — como se veste, onde mora, o que consome, como se comporta, como se relaciona — deve estar, em última análise, subsumida à imagem coletiva da empresa. A moral da empresa (a “carreira”) se estabelece como dimensão principal do indivíduo.

De modo geral, compartilho com o artigo a percepção que a emergência de nova composição política nas lutas não deve afastar uma autocrítica quase jesuítica. Com muita razão, toda nova forma de organizar e resistir está exposta ao capitalismo. O modo de produção dominante e global não cessa de identificar essas novidades e passará a tentar reapropriar-se das dinâmicas. Se os novos grupos político-culturais se esforçam em constituir espaços alternativos à indústria hegemônica, ao mercado dominante e ao emprego formal subordinado; não devemos ser ingênuos, tudo isso também se torna alvo preferencial para a investida capitalista. Nessa linha, o Passa Palavra dá um recado útil: não sejam tão otimistas com o novo, não alimentem a ilusão que estão na crista da onda da história — como se a luta de classes tivesse terminado na ilha dos bem aventurados pós-modernos.  Isso não existe. A luta por autonomia, por libertação do trabalho e pelo trabalho, continua inclusive por dentro da cultura livre, das redes produtivas e das marchas das liberdades. Se o trabalho imaterial e cultural se coloca no centro da economia política, tanto mais será o palco das disputas.

O que se deve ressalvar ao Passa Palavra, contudo, é que reconhecer a ambiguidade dos movimentos 2.0 não pode significar desqualificá-los, nas linhas ou entrelinhas, como genéricos, vagos, vendidos, desviantes. Incomoda naquele artigo o apelo à tradição da “esquerda em geral”, o que me parece um argumento de autoridade. Aborrece a insinuação que tais lutas, talvez por contarem com “setores da classe-média”, estariam desviando-se da linha justa. Em um ou outro ponto, fica parecendo que os autores trazem um marxímetro à mão, — ou então inventaram um novo teste de tornassol, que, sem maiores análises, revela quem é de esquerda e quem de direita. O mundo real é mais complexo e acontece em cores. É preciso diferenciar rancor de rabugice.

Existem, — e é indisputável, — esquerda e direita, — porém jamais sem ambiguidades, vaivéns, contradições, contágios, pontos de fuga, estabilizações e rupturas. Perceber as contradições e aproveitá-las no sentido da libertação — eis aí uma boa tarefa crítica, logo, tarefa de militante, que é o portador do método “científico”. Marx dixit. Sou da opinião que a esquerda só pode ser potente — isto é, perseverar esquerda — quando reconhece a sua heterogeneidade. Quando admite a diferença em seu seio: a possibilidade de lutar por muitas pautas, sem perder de vista as opressões, explorações e expropriações do capitalismo. Multiplicar as lutas sem cair na cacofonia, e orquestrar-se como polifonia.

Portanto, por serem tão produtivas, tão inovadoras, tão vivas, por produzirem e circularem tanto valor, exatamente por essas redes político-culturais autônomas (ou semi-autônomas) darem tão certo, que as empresas engordam o olho e mostram as suas garras sobre os novos terrenos da produção e do trabalho vivo. Se não valessem nada, ninguém iria querer. O capitalismo sabe bem que o mundo se tornou 2.0, então não pode a esquerda ficar pra trás, muito menos renunciar ao campo. É por isso que a indústria cultural e a aristocracia “artística”, aliás, tomaram de assalto o ministério da cultura no governo Dilma, para ir contra essas dinâmicas de libertação. Pois de tão produtivas e autônomas, os ameaçam. Isso não afasta o fato que o capitalismo veio depois, num segundo momento, pra se apropriar das novas lutas e novos movimentos, para torcer o sentido à direita, para cooptar a organização e reconfigurar a composição técnica do trabalho. E daí as lutas, as marchas, as disputas teórico-práticas, tudo isso que resiste. Porque nunca houve pureza, nem se diz isso, nem ninguém proclamou sovietes e internet!. Ao redor das novas redes produtivas e da revolução 2.0, existe e continuará existindo antagonismo, noutras palavras, luta de classe: trabalho x capital, esquerda x direita, liberdade produtiva x comando, expropriação e controle social. O caso, então, em vez de considerar a batalha perdida de antemão, só pode ser mesmo resistir: o que também significa autocrítica, esquiva, reinvenção, reconstituição.

Se o Fora do Eixo, bem como todos esses movimentos de composição nova, — e se pode incluir aí, guardadas as particularidades, Túnis e Tahir no norte da África e o 15-M na Europa, — se eles terminarem capturados pelo capitalismo, terá sido a gente, a esquerda, que os perdemos, quero dizer, nós teremos perdido. Mas não perdemos, porque a luta continua com eles, através deles e neles.
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Próxima resenha, em breve: A esquerda nos eixos e o novo ativismo, Ivana Bentes, 22/06/2011

Fonte: Quadrado dos Loucos

"Ensaios de Orwell, dois de três", por Daniel Lopes

PICICA: "Esses são de fato belos textos, mas o leitor que chegou ao Orwell ensaísta devido ao impacto de 1984 e A revolução dos bichos encontrará mais satisfação ao percorrer outras páginas de Como Morrem os Pobres. A marca mais forte da segunda coletânea de ensaios é a defesa da honestidade intelectual, tanto na tomada de posições políticas quanto na expressão dessas posições – a parte 2 chama-se “A insinceridade é inimiga da linguagem clara”; a parte 3, “A covardia intelectual é o pior inimigo”; e a 4, “’Pacifismo’ é uma palavra vaga”."


Ensaios de Orwell, dois de três

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por Daniel Lopes

-- "Como Morrem os Pobres e outros ensaios", de George Orwell --

Esse é o segundo de três volumes que a Companhia das Letras pretende lançar com ensaios de George Orwell. O primeiro, Dentro da Baleia e outros ensaios, de 2005, com seleção e introdução de Daniel Piza, reuniu em três partes os mais famosos ensaios de Orwell sobre a arte de ler e escrever, alguns ensaios políticos e outros sobre as interseções entre política e literatura. Estão lá das coisas mais interessantes que o autor de 1984 escreveu, como o corajoso “Meu país à direita ou à esquerda” e o tragicômico “Confissões de um resenhista”.


Como Morrem os Pobres e outros ensaios, com umas 150 páginas a mais que o predecessor, está sendo festejado entre os fãs brasileiros do escritor principalmente por trazer em sua primeira parte cinco ensaios (inclusive o que dá título ao tomo) da fase inicial de Orwell, período punk em que viveu entre indivíduos humilhados e ofendidos, as sobras do capitalismo laissez-faire da Depressão, que não poupou a Europa como a nenhum continente. Na pior em Paris e Londres é sua obra representativa desse período.

Esses são de fato belos textos, mas o leitor que chegou ao Orwell ensaísta devido ao impacto de 1984 e A revolução dos bichos encontrará mais satisfação ao percorrer outras páginas de Como Morrem os Pobres. A marca mais forte da segunda coletânea de ensaios é a defesa da honestidade intelectual, tanto na tomada de posições políticas quanto na expressão dessas posições – a parte 2 chama-se “A insinceridade é inimiga da linguagem clara”; a parte 3, “A covardia intelectual é o pior inimigo”; e a 4, “’Pacifismo’ é uma palavra vaga”.


Após ler essas seções, em especial a segunda, se você ainda permanecer com dúvidas a respeito da enorme falta que sujeitos como Orwell fazem, talvez deva ir direto ao livro de Christopher Hitchens, A vitória de Orwell, e ler o capítulo 9, intitulado “Desconstruindo os pós-modernistas: Orwell e a transparência”. O professor Fernando Lima resenhou aqui no Amálgama essa obra, que saiu ano passado também pela Companhia das Letras. “A política e a língua inglesa” é o ensaio mais representativo da categoria.

“A liberdade de imprensa” eu usei recentemente como uma das referências para meu “Ensaio sobre a cegueira de Graciliano Ramos”, mas lamentado aqui pra mim que não pudesse indicá-lo em um local de mais fácil acesso para o leitor brasileiro. Pois bem, agora Matias Suzuki Jr., organizador de Como Morrem os Pobres, fez o favor de deixar esse texto ao alcance de todos nós. Trata-se de um prefácio escrito para a edição de 1945 de A revolução dos bichos, falando das dificuldades de arranjar um editor para essa sátira da revolução e pós-revolução bolchevique, num período em que Stalin ainda era um valioso aliado de Grã-Bretanha e EUA. Mas é mais do que isso. É no fundo uma denúncia da pequenez de intelectuais, inclusive no campo liberal, que não compreendem que fazer alianças de conveniência e arrumar racionalizações para os crimes de aliados pode ser uma tarefa compreensível para diplomatas e líderes de partidos e de governos (e podemos explicá-las nestes termos), mas jamais deve ser uma das funções de intelectuais pretensamente livres. “A liberdade de imprensa” só saiu junto à Revolução em 1995.

Os dois ensaios que praticamente compõem a seção “’Pacifismo’ é uma palavra vaga” servem como mais uma das tantas amostras da não-ortodoxia de Orwell. No primeiro, “A vingança é amarga”, de novembro de 1945, o jornalista relata sua passagem por um campo de prisioneiros alemães no sul do país vencido, observando a rudeza desumanizadora com que os agora carcereiros, inclusive um judeu, tratavam os soldados rendidos. Ele chega a escrever que
Na verdade, resta pouco ódio forte à Alemanha neste país [Inglaterra] e menos ainda, eu espero, no exército de ocupação. Somente a minoria de sádicos, que precisam ter sua dose de “atrocidades” de uma fonte ou de outra, se interessam muito pela caça aos criminosos de guerra e colaboradores. Se perguntarmos ao homem comum de que crimes Goering, Ribbentrop e o resto devem ser acusados em seus julgamentos, ele não saberá dizer. De algum modo, a punição desses monstros deixa de parecer atraente quando se torna possível: com efeito, depois de encarcerados eles quase cessam de ser monstros.
O caráter patético de ex-genocidas quando despidos de poder sempre foi notado ao longo da história, como Hannah Arendt narrando o comportamento de Eichmann em Israel, Milošević e Saddam escutando suas sentenças com expressão apalermada e, nestes dias, cabeças do Khmer Vermelho acertando as contas com a justiça no Camboja por terem ajudado a dizimar um quarto de seus nacionais. Mas nem por isso devem deixar de ser punidos. Felizmente, Orwell jamais parou de ver Goering e companhia como os monstros que eram – esse “quase cessam de ser monstros” é puro Orwell. Apenas, e compreensivelmente, naquela altura dos acontecimentos ele temia que a desforra contra a Alemanha repetisse a tragédia dos “acordos” ao final da Primeira Guerra, com todas as consequências incômodas que tiveram. Tivesse vivido alguns anos mais, acredito que Orwell teria encontrado tempo para aprovar com alguma efusão a maneira como as áreas alemãs sob ocupação francesa, britânica e estadunidense foram desnazificadas – com os invasores reaproveitando antigos colaboradores do regime nazista em serviços essenciais ao mesmo tempo que educavam as massas com o julgamento de criminosos maiores e lições sobre o valor da democracia, reforçadas com as práticas que o boom econômico veio a permitir na Europa Ocidental.


De qualquer forma, após esse ensaio, temos “Pacifismo e progresso”, e eu dizia que, junto com “A vingança é amarga”, ele serve para mostrar o espírito avesso a dogmatismos de Orwell. Se foi ruim demonstrar crueldade com os alemães vencidos, também o foi entrar na impensada corrente pacifista do pré-Guerra, pelo menos quando havia se tornado evidente que a guerra era a única forma que restava para conter os camisas-negras e camisas-pardas.
[o pacifismo] só pode sobreviver onde exista algum grau de democracia; em muitas partes do mundo, jamais conseguiu existir. Não havia movimento pacifista na Alemanha nazista, por exemplo.
A tendência do pacifismo, portanto, é sempre enfraquecer os governos e sistemas sociais que são mais favoráveis a ele. Não há dúvida de que, durante os dez anos anteriores à guerra, a predominância de ideias pacifistas na Grã-Bretanha, na França e nos Estados Unidos estimulou a agressão fascista. E mesmo em seus sentimentos subjetivos, os pacifistas ingleses e americanos parecem mais hostis à democracia capitalista do que ao totalitarismo.
Obviedade? Sim, agora sim. (Eu espero.)


As últimas duas partes de Como Morrem os Pobres reúnem escritos sobre aspectos curiosos da “inglesidade” (o país e alguns de seus costumes eram paixões de Orwell) e crônicas sobre qualquer coisa (você acha que comprar livros é uma atividade muito cara? compare com o que você gasta com cigarros, se é um fumante contumaz; ou, já que isso não está mais na moda, você pode imaginar uma comparação com o que gasta com cerveja).


O esforço que a Companhia das Letras vem fazendo já há algum tempo para trazer ao Brasil, em traduções de qualidade, o essencial da ficção e não-ficção de George Orwell é louvável. Mesmo. Veja só as esclarecedoras notas do editor e do tradutor que ocupam as páginas 386-411 de Como Morrem os Pobres e diga se estou mentindo. Mas há uma faceta importante de Orwell que ainda não apareceu nas coletâneas da editora e que eu ficaria muito feliz de ver no planejado terceiro volume: o Orwell resenhista.


Matias Suzuki e João Moreira Salles coletaram os textos para o presente livro, entre outras fontes, nos quatro volumes da Nonpareil Books com o essencial da ensaística, jornalismo e correspondências do autor. Pois eu acho que uma seção com as resenhas de Orwell fecharia muito bem a terceira coletânea da Companhia. O senhor Eric Blair engajou-se com as grandes questões de seu tempo não apenas através de intervenções públicas (intervenção armada, no caso da Espanha), ensaios e reportagens, mas também em opiniões generosas sobre algumas das principais obras da época. Por exemplo, em 1935, ele resenhou Trópico de Câncer de Henry Miller. Em 38, o Testamento espanhol de seu amigo Koestler. Em 40, Mein Kampf (você não seria capaz de gastar uns minutos lendo Orwell resenhar Hitler?). Em 44, O caminho da servidão de Hayek (como Raymond Aron, Orwell foi um crítico qualificado do austríaco). Em 48, A alma do homem sob o socialismo de Wilde, e Reflexões sobre a questão judaica de Sartre (a crítica mais profunda que alguém já conseguiu fazer em uma página e meia da teoria sartriana do antissemitismo). Em 49, foi a vez das memórias de Churchill ganharem uma resenha.


Então, acho que ficaremos todos em dívida com a editora se alguns desses textos vierem junto com a próxima coletânea.

::: Como Morrem os Pobres e outros ensaios ::: Geoge Orwell (trad. Pedro Maia Soares) :::
::: Cia. das Letras, 2011, 416 páginas ::: compre na Livraria Cultura :::

LEIA TAMBÉM
::: Dentro da Baleia e outros ensaios ::: George Orwell (trad. José Antonio Arantes) :::
::: Cia. das Letras, 2005, 232 páginas ::: compre na Livraria Cultura :::

Editor do Amálgama.

Daniel Lopes

Fonte: Amálgama

Rio Grande do Sul: tuitaço em defesa da água pública

PICICA: "O mundo caminha em direção ao saneamento público. Paris e Itália são os últimos exemplos de localidades que rechaçaram a gestão privada. Quando tratamos de um monopólio natural é muito perigoso pensar um lucro, objetivo número um das privatizações."

Manifestação no twitter em defesa da água pública será realizada na sexta-feira (01/07) #aguapublica


Um movimento está sendo organizado na internet, através do Twitter, para a manifestação a favor da água pública. A mobilização acontece nesta sexta-feira (01/7) e para participar basra adicionar a hashtag #aguapublica em seus tweets. No blog http://defesadaguapublica.wordpress.com/ você encontra mais informações sobre como participar. Abaixo, a íntegra do manifesto publicado no blog:

Participe conosco do Twittaço e manifeste-se a favor da #aguapublica. Insira a hashtag no seu Twitter neste dia 01 de julho.


Acreditamos que a discussão em torno do modelo de gestão que queremos para o tratamento de água e esgoto precisa ser realizada de forma responsável. A população e os poderes concedentes precisam analisar profundamente a realidade do saneamento no Brasil e não comprar argumentos fáceis e soluções milagrosas para o setor.



O mundo caminha em direção ao saneamento público. Paris e Itália são os últimos exemplos de localidades que rechaçaram a gestão privada. Quando tratamos de um monopólio natural é muito perigoso pensar um lucro, objetivo número um das privatizações.



Atualmente municípios do Rio Grande do Sul correm o risco de ter o saneamento privatizado, e ainda ver seu patrimônio entregue à iniciativa privada sem que seja paga a devida indenização. Na gestão pública do saneamento temos um único número que nos orienta, aquele que quantifica as pessoas beneficiadas e não aquele que apontará um lucro no balanço de final de ano de uma empresa.



Nosso Estado não pode andar na contramão, por isso convidamos a todos a participarem do TWITTAÇO EM DEFESA DA ÁGUA PÚBLICA. No dia 01 de julho, sexta-feira, das 12h, às 14h inclua no seu Twitter, a hashtag #aguapublica e manifeste-se contra a privatização da água.



Sugestões de frases para colar no seu twitter:



A água não é um bem privatizável, participe do Twittaço. A favor da #aguapublica.



A água é um direito de todos os gaúchos. Participe do twittaço a favor da #aguapublica.



Eu defendo também o manifesto contra a privatização da água. Sou a favor da #aguapublica.



Não quero privatizar o que é de todo mundo. Sou a favor da #aguapublica.



Sou contra a privatização da água, o nosso bem mais vital. #aguapublica.



Nossa água é de interesse público, não de mercado. Sou a favor da #aguapublica.



Eu defendo o interesse público. Sou contra a privatização da água. Quero #aguapublica.



A água é um direito do cidadão gaúcho, não é mercadoria. Sou a favor da #aguapublica.



A água é um direito humano. Por isso, sou a favor da #aguapublica.



Participe do nosso panelaço virtual contra a privatização da água. Ela é publica e é nossa. #aguapublica.
Lê também este Post sobre o tema e sobre como o tema está sendo tratado na Europa http://luizmullerpt.wordpress.com/2011/06/02/aves-de-rapina-poem-em-perigo-as-aguas-do-rio-grande-e-dos-gauchos/

Fonte: Luizmuller's Blog

Enquanto isso, no Rio de Janeiro a "maquiagem" para a Copa do Mundo vai de vento em popa

PICICA: "No decorrer das visitas algumas entrevistas coletadas deram origem a uma série de vídeos chamada Vozes da Missão. Quatro deles foram disponibilizados hoje, relatando as arbitrariedades, a truculência e as injustiças levadas à cabo pelo Estado em defesa da rentabilidade das empresas privadas que os grandes eventos vieram potencializar. Os vídeos relatam rapidamente as lutas das comunidades da Favela do Metrô, Morro da Providência, Restinga e Vila Recreio 2."
Enviado por em 20/06/2011

Nos dias 18-20 de maio de 2011, a Relatoria do Direito Humano à Cidade da Plataforma Dhesca Brasil organizou uma missão especial no Rio de Janeiro para investigar os impactos da Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016 em comunidades que estão sofrendo processos de remoção e despejo. Estas são as Vozes da Missão.

Mais informações: www.dhescbrasil.org.br e blog.witness.org
Participantes da missão incluem:
- Comitê Popular da Copa e Olimpíadas do Rio de Janeiro
- Conselho Popular do Rio de Janeiro
- Pastoral de Favelas
- Fórum Nacional da Reforma Urbana (FNRU)
- Central de Movimentos Populares (CMP)
- Movimento Nacional de Luta pela Moradia
- Comissão de Direitos Humanos da Alerj
- Grupo de Trabalho - GT de Conflitos do Conselho das Cidades
- Rede Contra a Violência
- Laboratório Estado, Trabalho, Território e Natureza - ETTERN-IPPUR/UFRJ
- Observatório das Metrópoles - IPPUR/UFRJ

***

(Vídeo) Série “Vozes da Missão” relata impactos dos megaeventos em quatro comunidades do Rio (RJ)

Nos dias 18, 19 e 20 de maio foi realizada no Rio de Janeiro a visita da Relatoria do Direito Humano à Cidade da Plataforma Descha Brasil. Dentre os objetivos estava a elaboração de um relatório sobre os impactos da Copa 2014 e das Olimpíadas 2016 sobre comunidades que vêm sofrendo com os despejos e remoções protagonizados pela tríplice aliança entre prefeitura, governo do estado e governo federal na capital fluminense. As visitas foram feitas em diversas comunidades atingidas (como Campinho, Vila Autódromo, Restinga, Vila Harmonia, Vila Recreio 2, Tabajaras, Rua do Livramento, Morro da Providência e Favela do Metrô). A relatora da ONU para a Habitação, Raquel Rolnik, também acompanhou um dos dias de visita.

No decorrer das visitas algumas entrevistas coletadas deram origem a uma série de vídeos chamada Vozes da Missão. Quatro deles foram disponibilizados hoje, relatando as arbitrariedades, a truculência e as injustiças levadas à cabo pelo Estado em defesa da rentabilidade das empresas privadas que os grandes eventos vieram potencializar. Os vídeos relatam rapidamente as lutas das comunidades da Favela do Metrô, Morro da Providência, Restinga e Vila Recreio 2.

O material promete auxiliar também no debate a ser realizado amanhã na audiência pública que será realizada no Ministério Público Federal do Rio de Janeiro. O tema central da audiência serão os impactos sociais que vêm sendo causados pelas obras relacionadas à realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas na cidade. A audiência será realizada no dia 21/6 às 14:00 no Ministério Público Federal (Av. Nilo Peçanha, 31 – Centro) e contará com a presença, além de moradores e moradoras diretamente afetados/as, também da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro e do Ministério Público Estadual.

Fonte: Pela Moradia

Transporte público: a paciência popular no limite

PICICA: Na entrevista com o vereador Valdemir José, do PT, sobre a pressão popular para realização de uma CPI, o jornalista Alvaro Corado põe em questão se este instrumento pode resolver o problema crônico do transporte. A política pública de transporte, envolvida nas brumas das artimanhas do poder econômico, vem desfazendo reputações políticas de administradores incapazes de oferecer uma solução à altura das demandas de uma população que beira 2 milhões de habitantes. Sua descrença decorre das limitações de uma CPI, incapaz de mudar o sistema. Alerta ainda sobre a possibilidade da paciência popular chegar ao seu limite. O vereador pondera que a indignação deve ser transformada em pressão política. Enquanto um percebe a inquietação popular, outro tenta canalizar a insatisfação para a pressão política organizada. O jornalismo amazonense ganharia em credibilidade se outros temas fossem postos em discussão. Assunto é o que não falta: ponte de 1 bilhão de reais, monotrilho de 2 milhões, estádio de futebol de 600 milhões, política habitacional, saúde mental, redução de danos, intolerância religiosa, liberdade de expressão, descriminalização da maconha, meio ambiente... A lista vai longe. De parabéns o vereador Valdemir José, que junto com o deputado estadual José Ricardo e do deputado federal Francisco Praciano honram seus mandatos com pautas de interesse popular. O PT está bem representado no parlamento. 

junho 29, 2011

Ibelber Avelar desvenda os interesses e os falsos argumentos dos defensores do AI-5 digital

PICICA: Aproveite e leia o texto a ser enviado aos deputados com os argumentos contrários ao AI-5 digital que está circulando na internet. Acesse Mensagem aos Deputados. Participe desta luta. Envie a mensagem à lista de e-mails de deputados federais.
Enviado por em 02/06/2009
Entrevista do Professor Idelber Avelar sobre o PL AI5 Digital. Blog do Professor http://www.idelberavelar.com/

"Razão Crítica: Lutas Sociais e Fetichismo: notas sobre o debate iniciado pelo Passa Palavra (I)", por Elton Flaubert

PICICA: "Resumindo, o Passa Palavra acerta na análise: ao mostrar como grande parte da “cultura independente” e das ações de grupos empreendedores do open business está dentro da lógica de funcionamento do capitalismo; assim como, quando aponta os limites: das manifestações e marchas, da “cultura digital”, das novas tecnologias, da falta de sintonia com o cotidiano e anseios das classes mais pobres. E principalmente, quando expõe as motivações contrários ao FdE e parte da cultura “independente” e “alternativa”, sem entrar na lógica imediatista de achar “companheirismos” – sem o menor caráter reflexivo – em causas e movimentos, por parecerem, terem a imagem – por que não, a marca – de “alternativos”. Mas, erra na falta de mediações, não enxergando as possibilidades." Em tempo:  Leitura indispensável acerca do debate sobre movimentos emergentes na cena político-cultural brasileira. O caso do #Fora do Eixo: contradições, perspectivas e possibilidades.

Lutas Sociais e Fetichismo: notas sobre o debate iniciado pelo Passa Palavra (I)


Do que se trata: O ponto central no texto “A Esquerda fora do eixo” do Passa Palavra é mostrar a encruzilhada enfrentada pela esquerda, com a ascensão de uma nova classe gestorial, que através de mecanismos ideológicos da “cultura livre” fortalece o processo produtivo capitalista. Para isto, começam apresentando as especificidades de formação do fenômeno, na conjuntura paulista, ao analisarem cinco mobilizações na capital. Onde disto, conclui-se: “Dessa série de manifestações, extrai-se que as mídias sociais [...] mobilizaram conjunturalmente novos setores da classe média, mas, por outro lado, houve também um caráter diferenciado da pauta tradicional dos movimentos sociais e da esquerda em geral [...], (que) tem possibilitado a aproximação de elementos da classe política – tanto de esquerda como de direita – e também de novas empresas e ONGs com foco no marketing virtual, na publicidade e na cultura”.

Em seguida, passa-se a análise do coletivo “Fora de Eixo” (FDE), o trato da “cultura independente” como mercadoria, o empreendedorismo de organização ‘espartana’, e obviamente, seus planos de entrar no mainstream. O que chamou a atenção do Passa Palavra foi a reprodução pelo FDE de velhos vícios da “velha Indústria” – pelo menos no Brasil –, como a criação de um poder patrimonial dentro do Estado, que arrebata boa parte do financiamento. Além disso, destaca-se a relação deste coletivo com empresas, organizações e indivíduos que orbitam a “cultura digital”.

Diante disso, o Passa Palavra identifica os atuais confrontos do MINC (Ministério da Cultura), de maneira geral, como uma luta entre o tradicional mainstream versus grupos ligados a “Cultura digital”, pelas fatias do bolo orçamentário do Ministério. Um dado interessante do texto: “Em 2010 inscreveram-se em cerca de 125 editais e, com mais de 30 aprovados, captaram aproximadamente R$ 2 milhões para os projetos (festivais de música, de cinema, de economia solidária, etc.) e R$ 300 mil para as despesas do “institucional” . Um outro aspecto interessante é que eles possuem diversos tipos de cadastro jurídico: associações culturais, empresas, ONGs, casas noturnas. No total são 57 CNPJs [número fiscal] a serviço do FdE, uma fluidez que permite um amplo leque de atuação dentro dos negócios. Além dos editais há também propostas comerciais para emissoras de rádio como a OI FM”. Em síntese, o texto procura demonstrar a existência de empresas/coletivos/grupos, ligados à “cultura digital” (tendo como um exemplo marcante o “Fora de Eixo”), que propõe novos modelos de negócios, que estejam conectados com a “cultura independente”, e que através da gestão dela lhe tire melhor proveito.

A partir disto, o texto começa a analisar estes novos modelos de negócios, chamados de “open business”. Para eles, “O open business é a transformação do modelo de negócios de um mercado monopolista em concorrencial, ou seja, dada a natureza não rival do bem digital e a cópia a custo próximo de zero, o lucro passa a depender da produção material (camisetas, adesivos, etc.) e, principalmente, dos shows; caminha-se assim da renda para os serviços. Para as transnacionais da cultura e os oligopólios culturais regionais, isso significa a modificação do seu papel de intermediador entre mercado e consumidor, e, na dimensão econômica, a extração de lucro por renda é ameaçada”. Assim, para os defensores da “cultura livre”, associada ao “livre mercado”, isto estimularia a criação, o que aumentaria a riqueza transformada em mercadoria: “Em síntese, a cultura livre é a própria regra do jogo do capitalismo, a apropriação de algo que a classe capitalista não produz”.

Nisto, entra o coletivo “Fora do Eixo”, que indo de encontro à indústria rentista dos oligopólios culturais, pretende gerir os processos de interação da “cultura independente”. “O trabalho do FdE é fazer serviços para outros. Fazem realmente como um coletivo e não como proprietários de algo. Mas isso é justamente o que os identifica como gestores: possuir o know-how, o trabalho baseado no conhecimento e na gerência dos processos. Um tipo de trabalho que é possível vender e não ficar sem ele, já que conhecimento é um bem não rival”. É neste ponto que reside uma das questões do texto: a troca de elites. A passagem de uma burocracia arcaica e rentista, para uma classe de gestores, antenados com a “cultura independente”. Como ficou (e está) representada, de maneira geral, a briga pelo MINC é essencialmente por duas motivações: quinhão orçamentário e pelo modelo de negócio para cultura. Assim, não se trata de uma visão radicalmente – ou substancialmente – diferente de cultura, fora (ou pelo menos para além) do mercado, e da atuação do Ministério neste contexto.

No último – e talvez mais problemático – ponto, o Passa Palavra aborda as relações desta nova classe gestora com a esquerda. O texto apresenta como contexto histórico da ascensão desta nova classe, o governo Lula, com a ampliação do mercado de consumo, e amadurecimento do capitalismo tardio, assim como, a ampliação da lógica cultural desta ordem. Neste sentido, fez-se necessário o brado pela troca de “elites arcaicas” por novas classes, principalmente burocráticas, antenadas com este novo tempo. Assim, o recado para a elite de Higienópolis foi claro: “o futuro dos negócios chegou, não ignorem as novas classes médias, pois, mesmo morando na periferia, a sua empregada também pode consumir uma TV de plasma e ter um carro na garagem”.

Ou seja, o “churrascão” também – ou principalmente – representou: “Um processo que limita-se à modernização da mentalidade e renovação das elites, e que, por isso, foi incapaz de revelar a incoerência de destinar mais recurso público para a ampliação da oferta de transporte público na região mais rica da cidade”. O Passa Palavra associa a mentalidade desta nova elite “alternativa”: o ambientalismo (não fica claro se é certo ambientalismo, ou ele como um todo). E por fim, coloca uma questão – ou melhor, uma encruzilhada – que desconcerta qualquer defensor intransigente e ultraentusiasmado das novas mídias: quantas pessoas que estavam no “churrascão” interessavam-se em saber da lógica elitista de construção do metrô? Quantas pessoas professam tantas causas, sem ter o mínimo conhecimento delas? Como bem resumiu sobre o texto, Rodrigo Cássio: quando o protesto entra na moda, a política sai do protesto.

Comentário: A questão central do texto exige uma análise sobre a dinâmica do capitalismo e suas relações com o capital (concordando ou discordando, viu Ivana Bentes...), em especial, o “capitalismo tardio”. Para isto, gostaria de começar explanando sobre a teoria do fetichismo da mercadoria, e o desenvolvimento desta pelo “marxismo ocidental”.

No mercado, as relações de um homem com outro homem, as relações sociais, são mediadas pela troca de mercadorias/dinheiro. Ou seja, as relações entre as pessoas no mercado são entre portadores privados de dinheiro/mercadoria. Já que as relações são mediadas pelas mercadorias/dinheiro, elas se autonomizam, coisificando as relações entre seres humanos. Este é o primeiro movimento. Disto, decorre que o próprio processo de produção não só não é democrático (quem produz não discute sobre a produção e consumo global do que deve ser feito), como não é uma escolha do próprio dono do capital, que também está sobre influência dos mecanismos fetichistas. Assim, quem determina a produção, de maneira geral, é o mercado, estrutura criada por – mas que se sobrepõe – aos homens.

Disto decorre que o capital é um ser social objetivo, um “sujeito automático”, um “sujeito quase autônomo”, que se ergue diante das relações sociais coisificadas. Em outros termos, a roda viva do capital movimenta-se infernalmente, transformando as relações sociais coisificadas em “cursos das coisas como são”. Sujeito que forma uma civilização material, produzindo seu espaço, através de processos de modernização. O capital tem a potência de apropriar-se de qualquer tipo de produção, seja ela tradicional ou independente, para dar continuidade a sua reprodução. E também, o capital tem um movimento continuado de obscurecimento da consciência.

A partir de Lukács e Adorno, o marxismo traz a teoria do fetichismo da mercadoria para a cultura. Em termos gerais, o produtor cultural ao se preocupar em como vender melhor seu produto, como fazer corresponder seu conteúdo aos ritmos de produção e distribuição em detrimento da sua própria independência como artista, também está inserido nos mecanismos fetichistas. Um exemplo claro é daquela banda de música que despreocupada com o sentido de sua arte, está mais preocupada em produzir sucessos, refrões banais, submetendo sua arte aos processos massificáveis, generalizantes, e simplistas, da produção industrial. A centralidade deixa de ser a cultura, e passa a ser o mercado, o qualitativo se subordina ao quantitativo. Do outro lado, as pessoas acabam consumindo o valor de troca da música.

É importante destacar que os mecanismos de fetichização não se constituem uma totalidade fechada. Dois exemplos que podemos dar de desfetichização, tanto na produção sócio-material, quanto na cultura são: quando uma terra é utilizada para autoconsumo por camponeses ou indígenas, por exemplo, já que não se identifica produto com o capital, e as decisões de quanto e como produzir/consumir é feita em conjunto por pessoas; assim como, quando um escritor, produz um livro sem as pressões do mercado, depois podendo até utilizar essa indústria, o importante aqui é que ele não foi feito “para a indústria”, embora se utilize dela. Por isto, o fetichismo nunca é total.

Dito isto, é essencial analisar no capitalismo tardio, a apropriação da contracultura, da “cultura independente”, “alternativa”, enfim, pelos mecanismos fetichistas do capital, sem por isso, negar as fissuras, e principalmente sem dar às costas a negatividade presente, que pode ser transformada em outra espécie de negativo, contra o capital.

No livro “O novo espírito do capitalismo” de Boltanski e Chiapello, eles colocam que a partir da década de 70, o capitalismo entra na sua terceira fase: abandonando o espírito fordista, ele começa a se organizar em redes, através da participação de trabalhadores relativamente autônomos, mas dependentes, sendo divididos em grupos de trabalhos, os chamados “times”, tendo cada grupo um líder. Às vezes, apropriando-se da linguagem da “auto-gestão”, para definir o trabalho de seus empregados. Uma espécie de: “eles fazem o que tem que ser feito. Por isso, são livres, independentes, alternativos, e por que não, modernos”. Este novo capitalismo incorpora o discurso igualitário e anti-hierárquico de 68.

Fredric Jameson, em “Pós-Modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio”, afirma que o cultural é a lógica deste novo sistema, ou seja, não se trata do tipo de lógica cultural do capitalismo tardio, mas sim, que ele próprio tem como lógica essa cultura, a pós-moderna. Que significa, entre outras coisas: a transformação da realidade em imagens, ou seja, a estetização; a fragmentação do senso de identidade; a falta de sentido na construção da personalidade do sujeito; a dissolução do eu na entrega perpétua ao gozo; etc. Disto vem o esvaziamento do político e do esforço crítico.

A questão que fica colocada é: se “o discurso de 68” foi incorporado pela roda viva do capital ou se ele, quando refletido imediatamente e esvaziado de sentido, ou seja, de política, não faz parte da própria lógica cultural do capitalismo tardio.

Pois bem, deixarei para tratar da abordagem de alguns teóricos a este respeito na segunda nota, quando analisarei a resposta de Ivana Bentes e Pablo Ortellado. O que nos interessou até agora foi apresentar algumas explicações para o que me parece claro: a apropriação da “cultura livre, alternativa, independente” pelos mecanismos fetichistas do capital, e seu reforço do processo produtivo. Seja essa apropriação, ainda assim uma “ilha de comunismo” dentro do capitalismo, ou elemento da cultura deste novo capitalismo – isto será abordado na segunda nota.

Isto tudo fica ainda mais claro, quando o foco passa para o coletivo-empresarial “Fora de Eixo” (FdE). Parece-me sintomático, o interesse pela “cultura alternativa”, de novas empresas e organizações, que tem como pilar o marketing visual. No caso das marchas, o capital, como ‘sujeito automático’, se fez sentir no esforço de se apropriar e gerar ganhos estratégicos ao coletivo-empresa, feito pelo FdE. Não que o interesse tenha sido meramente econômico, não se trata só disso, como às vezes faz crer o texto do Passa Palavra, que por isso, peca por falta de mediação, às vezes, tendo um entendimento sectário e “imaculado” das lutas sociais.

Que o coletivo-empresa queira lucrar e ganhar “capilaridade” com as manifestações me parece previsível, tendo em vista que no centro da atividade empresarial está a reprodução do capital (capital inventivo?), e com isto: a preocupação tática e estratégica do grupo em crescer, principalmente com capital político, acima de uma pauta política de negação; e principalmente, o desejo de entrar no mainstream, o que demonstra vontade de mudá-lo, adaptá-lo, MODERNIZÁ-LO, mas não negá-lo, enquanto substância, até mesmo por que ela sequer é mais vista, eles “apenas fazem o que tem que ser feito”. É interessante também a relação do coletivo com o Estado, carregado de certa tradição patrimonial. Parece-me relevante que muitos “independentes” e “alternativos” só tenham erguido sua voz para criticar (com justiça) o governo em questões corporativas, como nos problemas com a atual ministra do Minc. Calando-se para problemas da ordem do dia, como o projeto de Belo Monte.

Sobre isto, recomendo a todos dar uma olhada nos comentários nesta matéria da TRIP: (link:http://revistatrip.uol.com.br/revista/199/reportagens/ministerio-da-cultura.html#4.) Dentre os comentários, encontraremos um de “Amargo”, que durante seu desabafo se identifica como Bernardo, da banda Elma. Nele, ele conta a confusão entre sua banda e o Mombojó para acertar horários da passagem de som, montagem do palco, entre outras coisas. O que nos interessa é esta sua conclusão: “Foi também explicitado o porquê da preferência pelo Mombojó (aqui você pode fingir que ainda não sabia): eles têm bem mais público, logo, eles podem mexer e remexer na vida dos outros, com a conivência do Studio SP e do Coletivo Fora do Eixo”. O fator rentabilidade, não só econômica, foi o adotado para a escolha do Mombojó, sendo desconsiderado obviamente quem tinha razão no imbróglio, ou até mesmo a qualidade artística; dentro desta mesma lógica age o Mainstream. O que fica claro é que o coletivo Fora de Eixo é empresarial, e justamente por isso, age – para o bem, ou para o mal – dentro da lógica do capital, e repete seus mecanismos fetichistas.

Acontece que nossa geração aprendeu, através da Indústria Cultural, a ideologia de que tanto a felicidade como prazer não somente existem, como estão à disposição, através do consumo. O consumo é uma forma de fuga, não propriamente de uma realidade desagradável, mas, acima de tudo, uma fuga da própria possibilidade de resistência.

Neste sentido, o coletivo FdE faz parte desta geração marcada pela “cultura alternativa”, pelo novo espírito do capitalismo, e criada na lógica cultural do capitalismo tardio. Sobre isso é interessante à opinião de Alexandre “pós-rancor” Youssef, sócio do Studio SP, que mantém parcerias com o FdE, em artigo intitulado “O Partido Pós-rancor” (sic) na Trip: “Imaginem um liquidificador em que se possa colocar as ramificações da esquerda, com estratégias e lógicas de mercado das agências de publicidade, misturando rock, rap, artes visuais, teatro, um bando de sonhadores e outro de pragmáticos, o artista, o produtor, o empresário e o público. O Fora do Eixo cria, portanto, uma geração que se utiliza sem a menor preocupação ideológica de aspectos positivos da organização dos movimentos de esquerda e de ações de marketing típicas dos liberais. É, como disse, o teórico da contracultura Cláudio Prado, a construção da geração pós-rancor, que não fica presa à questões filosóficas e mergulha radicalmente na utilização da cultura digital para fazer o que tem que ser feito” (grifos meu).

Primeiro, fica claro, a junção entre pautas e modelos de organização da esquerda com as ações de marketing, principalmente as visuais. Segundo, o “pós-rancor” despreza a memória e a reflexão crítica.

O que Cláudio "pós-rancor" Prado não sabe ou oculta, é que o seu “fazer o que tem que ser feito, longe das ideologias”, nada mais é do que ideologia. Lembra-me muito o slogan “Just do It” da Nike. Interessante é esta passagem de Naomi Klein, em “Sem logo: a tirania das marcas em um planeta vendido”: “Segundo o velho paradigma, tudo o que o marketing vendia era um produto. De acordo com o novo modelo, contudo, o produto sempre é secundário ao verdadeiro produto, a marca, e a venda de uma marca adquire um componente adicional que só pode ser descrito como espiritual”. O efeito desse processo pode ser observado na fala de um empresário da Internet comentando sua decisão de tatuar o logo da Nike em seu umbigo: “Acordo toda manhã, pulo para o chuveiro, olho para o símbolo e ele me sacode para o dia. É para me lembrar a cada dia como tenho de agir, isto é, ‘just do it’.” (grifos meus)

A ideologia do “basta fazê-lo”, “fazer o que tem de ser feito”, nada mais é do que o fetichismo tornando-se espetáculo visível dos processos de alienação. Afinal de contas, que tipo de ação consciente é essa que simplesmente joga fora todo sentido crítico, não se preocupa com os sentidos de seus atos, e “apenas faz o que tem de ser feito”? E o que é que tem de ser feito? Simples: fazer, consumir, trabalhar, comprar, ininterruptamente, como por um “feitiço”. Aqui, o fetichismo mostra-se claramente, como a naturalização das coisas.

O pós-rancor para isso abdica da memória. Os choques do mundo moderno enfraqueceram a experiência, ficamos ricos em informação, e pobres em conhecimento. A perda da experiência e da memória transforma o homem em autômato. Destituído de toda sabedoria, é incapaz de contar, analisar, dar conselhos, aprender com o tempo. A experiência, para eles, é rancorosa. O pós-rancor é o não filisteu, filisteu.

Por isto, o “pós-rancor” também abdica de qualquer crítica mais profunda, já que isto seria ressentimento, “parar na pista”, “não fazer o que tem de ser feito”, afinal, “a vida é muito alegre”, para pensarmos além da lógica do “sempre gozando, e tudo ficará bem”.

Ainda mais interessante é o comentário do mesmo Cláudio Prado no site do Passa Palavra, onde está publicado o texto, “Esquerda fora do eixo”: “Rancor é uma marca das esquerdas. Nasce da consciência das tiranias. Nasce da indignação. Rancor é esta indignação + fundamentalismo. Não sou do Fora do eixo. Colaboro com eles.
Considero a proposta do Fora do Eixo o melhor caminho que conheço para uma saída honrosa dos Movimentos Sociais rumo ao século 21”
. O objetivo é claro, e nada estranho aos mecanismos fetichistas: modernizar os movimentos sociais. Tirar deles o rancor, a indignação que vem da precariedade, da falta de democracia no processo produtivo, etc.

E acima de tudo, legitimar a ideologia a partir de uma racionalidade cínica (aqui tenho em mente o estudo de Vladimir Safatle: O Cinismo e a falência da crítica). Sem condições de desenvolver melhor este tópico, abordarei algumas pistas. Como coloca Safatle: “Atualmente, a ideologia já parte do pressuposto de que aquele que se submeterá aos padrões de conformação ideológicos não acreditará completamente neles.” Ou seja, a ideologia como “falsa consciência esclarecida”. Sabe-se da exploração, mas é preciso “fazer o que tem de ser feito”, a própria crítica feita ao que é “tradicional”, funciona como uma interversão que só é bem sucedida por justamente não ser levada radicalmente a sério. Assim, a crítica não escapa da lógica performativa da racionalidade cínica, pelo fato, de já se saber, da inadequação entre a práxis e aquilo que lhe dá fundamento, sentido. A crítica ao “tradicional”, transfigurada como “cultura independente”, funciona como uma espécie de interversão, uma passagem da lei para a infração, sem questionar o que fundamenta o sistema, logo, essa flexibilidade identitária é capaz de dissolver cinicamente os conflitos gerados pela lógica capitalista, e a crítica (a negação de certa maneira) fica impedida de transformar as estruturas sociais, de formar sujeitos refletidos na história. Neste sentido, lembro que Safatle coloca que a interversão cínica é a mola propulsora da economia libidinal da sociedade de consumo.

Não é de estranhar o tipo de convite feito por Pablo Capilé para um debate “faroeste-pop” com o coletivo Passa Palavra: “com data, hora e local marcados”; e claro, “transmissão ao vivo”. O debate foi iniciado com o texto do Passa Palavra, a partir disso, múltiplas respostas apareceram na rede, menos (pelo menos não a encontrei) a do Fora do Eixo. Ora, para que um debate ao vivo, com hora, data e lugar marcados, entre os coletivos? Para transformar a própria crítica ao FdE – e a expectativa diante da resposta – em espetáculo, em produto cultural? Acertadamente, o Passa Palavra não aceitou este tipo de debate. O texto foi colocado, as respostas são múltiplas, várias pessoas estão se pronunciando na rede, sem a intermediação de coletivos, e em tempo real, ao vivo, com possibilidades e mediações maiores do que uma conversa com poucos e específicos interlocutores, que dificilmente não se tornaria uma espécie de “Fla x Flu”.

Sobre as manifestações, é verdade elas de certa forma – e muitas vezes, em sua maioria – foram produzidas por uma histeria coletiva na internet, mais baseadas na imediaticidade de um discurso subjetivista, e de fácil manipulação do open business – sem dúvida, do que por uma consciência mais crítica do que estava sendo criticado. Interessante é a análise do pesquisador Rodrigo Cássio, no seu texto: “Comunicação de Massa, cinema e estereótipos nacionais” (http://vistoseescritos.opsblog.org/2010/05/23/comunicacao-de-massa-cinema-e-estereotipos-nacionais-tres-perguntas/) : “Esse “incentivo” ideológico aos falantes me parece evidente, por exemplo, no fato de que o uso político de maior frequência da internet (sites e blogs engajados, os militantes do Twitter etc) mostra um ímpeto muito maior para divulgar ou impor posições e opiniões que para debater projetos alternativos de sociedade. Temos uma reprodução virtual do modus operandi que define uma política partidária desgastada, reduzida a estratégias de marketing na medida em que os partidos perderam seu papel original, isto é, o de reunir as partes dissensuais do corpo coletivo em torno de ideias e propostas em franco debate. O que escapa a isso, hoje em dia, é casual, raro – em qualquer mídia.”

Mas isto não encerra a questão. Que os mecanismos fetichistas do capital continuam sendo reproduzidos incessantemente no coletivo-empresa, em certa “cultura alternativa”, e que a “cultura digital” tem limites, parece-me claro, mas o que nos interessa é a brecha, a fissura, o ponto escuro, deixado por estas mudanças.

O texto do Passa Palavra hora e outra confunde “alhos com bugalhos”, talvez por problemas de exposição. As marchas (e a participação nelas) são fundamentais, mesmo que boa parte de seus integrantes lá estejam por moda, não por consciência política, e mesmo que estes movimentos estejam sendo reforçados oportunamente por empresas. A questão é: como ir além do espetáculo? O sectarismo, que aponta heresias nas lutas sociais, não ajuda no diálogo com a classe média, tampouco reforça a militância de base, tão esquecida hoje em dia. A crítica imanente é fundamental, devemos ter o olhar de dentro e de fora do objeto ao mesmo tempo, como nos ensinou Adorno. Caso contrário a crítica torna-se não-dialética.

Embora, os problemas das marchas não se reduzam a empresas e grupos que queiram se apropriar dela, mas também ao fato de uma boa parte de aspirações e motivações dos participantes estarem integrados na cultura do capitalismo tardio, isto não encerra a questão. É preciso mediar, diferenciar, especificar. Dentro das próprias marchas existem aspirações para além delas, contra a lógica da economia libidinal da sociedade do consumo.

Além disso, ela oferece um espaço de mobilização, para quem sabe, depois construir alguma reflexão além. Então, não adianta dizer que o movimento está “contaminado”, ou que existem limites, é preciso dialogar, argumentar, convencer. Se o projeto de superação dos mecanismos fetichistas significa mais – e não menos – democracia, dialogar com esta nova classe média das marchas é fundamental. Do contrário, a postura sectária e ortodoxa terá o mesmo efeito das apropriações e só resultará no mesmo reforço do processo produtivo.

É preciso ser contundente na crítica, na demonstração – como foi feita no artigo – da reprodução dos mecanismos fetichistas, mas é preciso, ao mesmo tempo, dialogar com esta nova classe média, ansiosa por projetos, lutas, etc. As marchas oferecem está oportunidade. Os novos movimentos culturais, como: “Fora Bolsonaro”, “PLC-122 já”, “Contra o novo código florestal”, estão muito além da lógica cultural do capitalismo tardio, embora possam estar dentro dela, e serem apropriadas por ela. O que importa é a possibilidade de fissura que estes movimentos podem alcançar, se forem além de si, e refletirem o desejo de uma luta negativa.

Não só a clássica ideia de revolução deve ser colocada em cheque e refletida, como a própria ideia clássica do sujeito revolucionário, e a própria questão das classes. O que não significa abdicar de nenhuma das categorias, ou pelo menos de algumas delas. Mas, simplesmente não dá para retorcer o nariz para tudo que ocorreu no Século XX.

Desta forma, o sectarismo impotente é tão nocivo quanto às novas roupagens do capitalismo tardio. Se parte destas lutas – de fato – não incorporam o cotidiano do trabalho precarizado, nem a análise de classes, tampouco, fala de fetichismo; não significa que são desimportantes ou desviantes. O fetichismo se revela em várias esferas, poderia aqui citar Roswitha Scholz, que mostra através do “valor-dissociação”, como a educação dos filhos, o “trabalho” doméstico e até o “amor” - são dissociadas da produção do valor. Assim, o feminino é o dissociado da razão, do valor, da política; sendo associado à natureza, ao sensível, ao fútil. O nascimento da ideia de feminilidade está assim, em direta relação com os mecanismos fetichistas.

Sem por isso, deixar de fazer a crítica contundente, quando necessária, como coloca o Roman: “Que a “Marcha da Vadias” no Brasil tenha surgido por conta de postagens no Facebook, a respeito de um policial que se pronunciou desonramente a respeito de mulheres universitárias e não em solidariedade real a um caso como este do Rio significa muito em termos de demarcação social. Que o Greenpeace proteste pelo fato de a fabricação de Barbies usar materiais A ou B e não a respeito da exploração de trabalho infantil e degradante na fabricação da mesma boneca ao redor do mundo também é socialmente significativo. Que haja protestos por conta de um empresário ter sido atropelado em uma bicicleta e não por conta dos motoboys que morrem aos montes/dia o mesmo. Os exemplos se multiplicariam”.

O artigo esquece-se de analisar a possibilidade desta nova classe – gestorial – “bater no teto”. O fato de “não ser suficientemente” de esquerda, ou de serem empreendedores do open business não impede o diálogo, só o torna mais necessário, principalmente se este negócio alcançar seus limites – como acredito que acontecerá. O diálogo deve ser estendido ao FdE, sem que por isso, deixe de ser feita a crítica dura a sua atuação. Como colocou o “Arth”, ao comentar o texto: “Demonstra que qualquer mobilização política que não seja uma “mobilização ideal” está falida. As belas almas nunca farão nada além de discordar. Quem garante que esse jovens do FDE já definiram qual é seu programa político? Quem garante que não estão dispostos a se reinventar a partir de um diálogo com outros grupos? Quem garante que os meninos tem mais certezas do que dúvidas? Como enxergamos uma juventude que começa a achar que a militancia e subsistência estão no mesmo barco? Se eles falam que a cultura é meio será que não podemos ajudá-los a pensar o fim?”

Outro problema de abordagem, pela falta de mediação, dá-se quando a “cultura digital” é analisada, parece que vai tudo pro mesmo saco. É preciso entender que a internet e suas ferramentas possibilitam muitas vezes práticas “comunitárias”, para além da lógica fetichista, como: troca de ideias, de arquivos, experiências, músicas, etc. Tudo isto sem a mediação da mercadoria/dinheiro. Um meio onde a comunicação é estabelecida não por poucos interlocutores, mas por vários. Se a apropriação a isto é ruim e medíocre, diz menos da essência da técnica, e mais da cultura que temos. Obviamente, que parte da criação delas está ligada a certo tipo de desenvolvimento de uma sociedade tecnocrata. Mas a técnica não pode ser demonizada em si.

Aliás, embora a ideia de “Creative Commons” tenha um pé no liberalismo e no genuíno livre mercado, isto não impede que partes desta ideia, ou ela em sua essência, seja desprezada. A flexibilização dos direitos autorais pode permitir – dentro de alguns limites – certa quebra do núcleo duro, resistente, da cultura como mercadoria. A questão é: e se esta nova classe gestora, acompanhada pela ideia de Creative Commons, bater no teto, nos limites das ideias liberais, e sempre se deparar com a força dos oligopólios, dos lobbies dos direitos autorais – que ao contrário do que se pensa estão muito longe de serem derrotados? Não seria esta a chance de politização da arte ao invés desta estetização da política, como nos dizeres benjaminianos? Por isto, é essencial o diálogo. Mas o diálogo crítico, fundamentado, reflexivo.

Resumindo, o Passa Palavra acerta na análise: ao mostrar como grande parte da “cultura independente” e das ações de grupos empreendedores do open business está dentro da lógica de funcionamento do capitalismo; assim como, quando aponta os limites: das manifestações e marchas, da “cultura digital”, das novas tecnologias, da falta de sintonia com o cotidiano e anseios das classes mais pobres. E principalmente, quando expõe as motivações contrários ao FdE e parte da cultura “independente” e “alternativa”, sem entrar na lógica imediatista de achar “companheirismos” – sem o menor caráter reflexivo – em causas e movimentos, por parecerem, terem a imagem – por que não, a marca – de “alternativos”. Mas, erra na falta de mediações, não enxergando as possibilidades.

Na próxima parte analisarei as respostas de Ivana Bentes e Pablo Ortellado.


Fonte: Razão Crítica  

CMM discute "combate" às drogas e jornal omite as vozes dissonantes

PICICA: Mensagem para o Julinho (não reparem a intimidade que não tenho com o autor do texto jornalístico, salvo nos encontros sociais onde ele costuma ser afetuoso para com este escriba). Causou-me estranheza a cobertura dada ao evento da Câmara dos Vereadores. Em nenhum momento são citados os quatro discursos que destoaram da maioria dos oradores - e foram muitos. Tamanha foi a perplexidade com o volume de informações, que deixou atordoado o propositor da audiência pública, vereador Homero de Miranda Leão. "São tantas informações... eu, pelo menos, não as conheço", declarou ao final do encontro. Ora, se foi estabelecido o contraditório, porque elas não foram parar nas páginas do jornal. Considero a omissão um desserviço à opinião pública. Os autores contrários ao discurso quase hegemônico da mesa são, por ordem: a representante do Conselho Regional de Psicologia, psicóloga Iolete Ribeiro, este escriba, uma representante do pessoal que trabalha com Redução de Danos e o ativista Alexandre Victor, que participou da organização da Marcha da Liberdade. Em sua fala, Iolete, que compunha a mesa, fez a mais importante das comunicações que o jornal omitiu: não se faz política anti-drogas sem ouvir os usuários, cuja ausência na audiência era notória. Trata-se da mesma posição defendida pelo Conselho Federal de Psicologia. De minha parte, critiquei a falta de políticas públicas para o setor, que resultam em subsídio financeiro das eufêmicas comunidades terapêuticas, cuja irregularidade no seu funcionamento não é desconhecido das autoridades sanitárias: em sua maioria o quadro de profissionais é insuficiente e incompleto. Curiosamente, a proposta de Política de Saúde Mental, aprovada pelo Conselho Estadual de Saúde Mental, previa um orçamento de 200 milhões de reais para atender a ampla demanda por serviços de saúde mental, inclusive às relativas aos abusadores de álcool e outras drogas. Só a construção do novo estádio de futebol, para a Copa do Mundo 2014, está orçada em 600 milhões. Há alguma coisa errada nessa lógica perversa. A representante da Redução de Danos fez críticas sutis ao perigo de manicomializar as demandas por cuidados dos abusadores de drogas: nem o estado, nem o município assumiram responsabilidades com este segmento, e, como se não bastasse, depois de repassar recursos financeiros para terceiros, o estado quer construir um centro para internação de dependentes na contra-mão da política nacional anti-drogas. Pior é que Dilma Rousseff, pressionada pela mídia, contribuiu para confundir o cenário liberando verbas para as comunidades terapêuticas. Mais um pouco e ela cede ao modelo proposto no Amazonas. Era só o que faltava. Finalmente, Alexandre Victor desconstruiu as insinuações pseudo-científicas que costumam sustentar o debate sobre dependências: afinal sexo causa tanta dependência quanto café. Diria, pra finalizar, que até os poderes causam dependência, sobretudo as relações promíscuas com o poder. O que nos falta, além de políticas concretas para o setor, é uma cobertura jornalistíca atenta aos novos discursos no enfrentamento das questões que a produção e o consumo de drogas assumiram na sociedade contemporânea. Fale quem quiser falar mal de FHC. Aos oitenta anos de idade, ele se ombrea ao lado do imortal Jefferson Peres, que em páginas de A Crítica saudou a descriminalização da maconha, como um instrumento importante para por fim à hipocrisia e inaugurar o novo período que se abre com o fracasso da Guerra às Drogas, política norte-americana que mal disfarça seus interesses geopolíticos na América Latina. Como se vê, meu caro, o volume de informações é caudaloso e profundo. Pena que você tenha colaborado para que elas não viessem à luz nas páginas de um veículo que tem obrigações éticas para com a circulação da informação. Não me queira mal, Julinho, pela crítica fraterna tão necessária para espantar a passividade que, felizmente, parece ter seus dias contados em nossa amada terra.

CMM discute campanha de combate às drogas

Ideia de vereadores é realizar campanha maciça para dar abertura ao diálogo entre pais e filhos sobre as consequências das drogas

Manaus, 21 de Junho de 2011

Júlio Pedrosa

Tramita na CMM projeto de lei que deve ser votado até agosto e visa a criação do Conselho Municipal de Combate às Drogas
Tramita na CMM projeto de lei que deve ser votado até agosto e visa a criação do Conselho Municipal de Combate às Drogas (Bruno Kelly )
 
Uma audiência pública realizada nesta segunda-feira (20), na Câmara Municipal de Manaus (CMM), marcou o início da programação de atividades alusivas à Semana Nacional de Combate às Drogas em Manaus.
O evento visa chamar a atenção do poder público para a questão das drogas, com destaque para a necessidade da criação de uma campanha maciça de divulgação junto à população de informações sobre o consumo de entorpecentes e os seus efeitos. 

A ideia é que, a exemplo de campanhas voltadas para a massificação de conhecimentos sobre doenças como dengue, paralisia infantil e gripe, sejam postas à disposição da sociedade também informações sobre as drogas e como os pais podem abordar o assunto com os filhos.

Leia mais em A Crítica

"Jornalistas ou escribas do poder?", por Mario Bentes

PICICA: Qual o dever do jornalista? Dizer a verdade? Muito bem. Mas, qual delas? Sob que embalagens elas estão contidas? E quando essa verdade é condicionada aos interesses dos veículos e dos próprios profissionais. Num cenário de mercantilização da notícia não surpreende que alguns jornalistas façam uso dela para benefícios pessoais. A crítica ao poder da mídia na construção social da realidade ganha outra dimensão quando formulada por quem faz do jornalismo um exercício de consciência, reflexão e ética como o jornalista Mario Bentes, a quem rendo minhas homenagens. Mario figura entre os jornalistas que gozam do respeito e admiração do leitor amazonense.
Imagem postada em portal.d24am.com
PICICA: Como ficaria a leitura desta fotografia pela narrativa graciosa dos locutores acima mencionados: "O momento menos esperado pelos "anjinhos" da ocupação 'José de Alencar", antes da frustrada "carnificina" foi a descida espetaculosa de helicoptero do deputado federal Sabino Castelo Branco, que resolveu tirar uma "casquinha" do episódio. Se não influiu, também não contribuiu. Menos, deputado; menos!..."


Jornalistas ou escribas do poder?

Não me surpreendo com os posicionamentos de alguns jornalistas sobre o que adoram chamar de “invasão de terra”, mas isso não me impede de sentir revolta, um certo nojo, asco. Preocupados com qualquer coisa que passa longe de bem informar, esses pseudo-profissionais – que mais parecem escribas conscientes dos patrões e dos interesses macro-econômicos – não têm nem a decência de sequer descer da torre de marfim de não sei quantos anos de experiência onde vivem, deitados em berço esplêndido, para vomitar suas sandices de preconceito e ódio.
São visões míopes, resumitivas, manipuladoras e deformadoras da realidade, que encontram espaço e voz sagrados na imprensa para especular, usar verbos no futuro do pretérito (“invasores estariam armados…”) e ganhar os corações e mentes desinformados dos leitores (que ridiculamente se acham informados), contra os bandidos, assassinos e terroristas devoradores de criancinhas, vulgarmente denominados em comum acordo – tal como em um cartel midiático – de “invasores”.
Desprovidos de qualquer ética ou de compromisso, adotam manchetes a partir de informações do Poder e nem se dão ao trabalho de investigar, de observar, de apreender o que observam sem os preconceitos que levam diariamente às pautas da vida. Apenas repetem o que mandam os grandes interesses. Não se permitem o questionamento, que fatalmente os levaria a contestar outras “invasões”, como a dos vários prédios de luxo em Manaus que estão às margens de Áreas de Preservação Permanente (APPs).
Não se questionam porque esses invasores, os verdadeiros grileiros, são os donos dos shoppings onde curtimos nossa mediocridade ou os apartamentos das grandes construtoras que pagamos em prestações a perder de vista. Em outras palavras: grileiro rico pode, grileiro pobre não. E grileiro pobre só não pode porque vai atrapalhar a especulação imobiliária do grileiro rico. Mas os asseclas do poder, travestidos de jornalistas, se calam diante disso.
Republico aqui um trecho do livro Jornalismo Canalha, de José Arbex Jr, sobre o posicionamento de alguns deste profissionais (sic) de imprensa, que infelizmente vemos por todos os lados – entre os novos, que reproduzem o discurso fascista por pura ilusão, e dos velhos, que se acomodaram e se deixaram vender por um cargo de editor ou blogueiro corporativo de merda.
Não raro, os próprios jornalistas aceitam fazer o papel de escribas do poder, reproduzindo o comportamento dos correspondentes enviados a Canudos, que não mencionaram – ou apenas registraram, muito de passagem – a degola de homens mulheres e crianças.

Muito poderia ser escrito sobre as razões que determinam tal comportamento – do triunfo momentâneo do pensamento neoliberal, para qual o mercado é a lei inexorável da existência, ao puro e simples oportunismo de carreiristas que sabem o que devem escrever e falar para ‘se darem bem’ na profissão.
(…)
Esses episódios são muito ilustrativos não por revelar aquilo que, na verdade, já se sabe – que a mídia brasileira é extremamente hostil aos movimentos populares em geral, e ao MST em particular –, mas por evidenciar o papel de grande relevância ocupado pelos jornalistas na guerra contra as organizações dos pobres deste país.
Não são mais os generais da ditadura, nem os seus agentes, nem sequer são os donos das empresas jornalísticas que acusam as organizações populares de prática de corrupção, de manobrar ‘inocentes úteis’ com fins escusos, de serem sucursal de Satanás na Terra.

São os próprios jornalistas que metem a mão na massa e ‘mostram serviço’. Em geral, eles são eficientes, pois eram ‘de esquerda’ quando fizeram a universidade – como muitos, aliás, adoram propagar –, e conhecem bem os argumentos que tocam a sensibilidade da classe média.
O título acima não é uma pergunta, de fato. É uma resposta elegante aos imbecis que querem nos enganar com suas capas sensacionalistas, dia após dia.

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Fonte: Identidade Bentes