PICICA: "Vamos nos afastar das análises que se mantiveram numa
ambiguidade tipicamente brasileira – entre o biológico e o cultural,
entre o racial e o social – para apresentar uma análise biopolítica.
Hoje, o monstro que a eugenia brasileira procura afastar é biopolítico.
Enquanto a tecnologia disciplinar procurou o indivíduo e seu corpo, o
biopoder se interessa pela população como um todo. O biopoder
contemporâneo nos “faz viver”, mas o faz mediante o controle de nossas
vidas que, por sua vez, resistem inventando novas práticas de vidas,
diferentes modos de produzir a cidade. É possível produzir uma outra
cidade? Eu queria ir além da dicotomia Centro x Periferia, questionar se
é possível pensar as Ocupações contemporâneas como produtoras de
múltiplas centralidades pensar a cidade como uma ampla rede onde cada
ocupação fosse um pólo de produção de cultura e de comunicação, pólos
distributivos sem totalização."
OUTROS MONSTROS POSSÍVEIS
Barbara Szaniecki
Me deparei com o monstro em Multidão, onde Antonio Negri e Michael Hardt afirmam que a civilização occidental garantiu a ordem do mundo por origens e finalidades dadas: “quem nasce bem governa bem.”, Desde a Antiguidade, o monstro, ou seja, aquele que interrompe essa lógica – entre eugenia e finalismo – não deve irromper na polis. Contudo, no início da Idade Moderna, surgiu através da filosofia do Estado, um monstro paradoxalmente dotado de Razão. Na Bíblia, o Leviatã é símbolo do caos, é símbolo da desobediência humana à ordem divina. Nas mãos de Thomas Hobbes, o Leviatã bíblico torna-se é um monstro domado, uma multiplicidade social ordenada hierarquicamente em um corpo político a partir de um centro de comando único, a cabeça soberana. Esse corpo monstruoso se projeta sobre o território urbanomoderno e confirma, em pleno séc. XVII, a eugenia clássica.
O monstro reaparece no século XIX pelas mãos de Marx que nos mostra o quão monstruosa é a exploração do trabalho. Acrescento, com base em Foucault e Negri, que monstruosa é a exploração capitalista porque monstruosa é a resistência da multidão! Contudo, ao longo dos séculos XIX e XX, uma tradição eugênica se constitui sob as formas do imperialismo, do colonialismo, do fascismo e do nazismo. À luz dessas experiências eugênicas, quis investigar a caça ao monstro nas cidades brasileiras: a eugenia “à brasileira” se dissimula na ambiguidade de uma democracia formal, de uma mítica democracia racial, entre outras ambiguidades. Vou comentar rapidamente como se atualizou essa união entre eugenia e finalismo no Brasil póscolonial e recém-republicano.
Nesse periodo, uma parcela considerável de nossas ciências sociais e políticas se preocupava com a criação de uma unidade ou identidade nacional – uma homogeneização dos corpos – que levasse o país ao progresso. Em Os Sertões, por exemplo, Euclydes da Cunha, positivista e Republicano, descreve uma rigorosa campanha militar organizada para submeter um povoado sertanejo ao governo federal. E fica estarrecido ao perceber como, ao longo das campanhas, Canudos dobra a razão contratualista através de táticas metamorfoseantes de uma população multiforme comandada por um Antonio Conselheiro monstruoso. Enquanto Euclydes evoca o monstro e condena a atividade política – o direito à cidade – por parte da população miscigenada, Canudos resiste contra a homogeneização dos corpos ou unidade da Nação. Canudos reivindica sua singularidade. Há uma efetiva tropicalização da eugenia européia na construção desse projeto de Estado-nação que propõe uma inclusão submissa que é totalmente funcional à Razão do Estado e à organização dos Mercados nas cidades emergentes no cenário brasileiro.
Vamos nos afastar das análises que se mantiveram numa ambiguidade tipicamente brasileira – entre o biológico e o cultural, entre o racial e o social – para apresentar uma análise biopolítica. Hoje, o monstro que a eugenia brasileira procura afastar é biopolítico. Enquanto a tecnologia disciplinar procurou o indivíduo e seu corpo, o biopoder se interessa pela população como um todo. O biopoder contemporâneo nos “faz viver”, mas o faz mediante o controle de nossas vidas que, por sua vez, resistem inventando novas práticas de vidas, diferentes modos de produzir a cidade. É possível produzir uma outra cidade? Eu queria ir além da dicotomia Centro x Periferia, questionar se é possível pensar as Ocupações contemporâneas como produtoras de múltiplas centralidades pensar a cidade como uma ampla rede onde cada ocupação fosse um pólo de produção de cultura e de comunicação, pólos distributivos sem totalização.
A Ocupação Prestes Maia em São Paulo
Em novembro 2002, surgiu um monstro em pleno centro da cidade de São Paulo. Na calada da noite, cerca de 2000 pessoas, 468 famílias, ocuparam o edifício Prestes Maia, abandonado por mais de 10 anos e com dívida de IPTU de mais de cinco milhões de reais. Providenciaram os serviços básicos – remoção de entulho, instalação de água, de luz e de limpeza do prédio –, fizeram inscrição das crianças nas escolas dos arredores, se empenharam na inserção dos adultos (catadores, etc.) na economia local, além de organizaram inúmeras atividades socio-culturais. Apesar dessas iniciativas revitalizantes no prédio em situação tributária irregular, os governos, municipal e estadual, optaram por apoiar a reintegração de posse solicitada pelo proprietário.
Encontramo-nos diante de uma luta entre os poderes públicos que condicionam a assistência aos moradores à desocupação e liberação do prédio para a iniciativa privada – a especulação imobiliária – e os moradores que insistem em dar ao prédio um destino social, ou seja, habitação digna para quem trabalha e estuda no centro da cidade. Encontramos-nos frente ao conflito entre 2 formas de “revitalização” do centro de SP: a revitalização imposta pelo Estado e pelo Mercado versus revitalização produzida pela Multidão. “ZUMBI SOMOS NÓS” proclama o monstro erguendo-se frente ao Leviatã.
Mas afinal, quem é esse monstro contemporâneo? Como produz social e culturalmente, como se manifesta estéticamente e como, enfim, o monstro sai da ambiguidade tipicamente brasileira e se constitui politicamente? Inserções na economia local, intervenções e exposições de artistas, preparação de cursos profissionalizantes para adultos e reforço escolar para crianças, exibição de videos e filmes, instalações materiais (luz, água, lixo) e imateriais (biblioteca, internet, etc.): os moradores são extremamente produtivos. Organização de debates, mapeamento da cidade, levantamento das ocupações, planejamento das manifestações, confraternizações e festas: os moradores são intensamente cidadãos.
Mas sua produção assim como sua cidadania são, à sua imagem, monstruosas, pois excedem a inserção no mercado e a representação no Estado. Trata-de uma produção ‘estranha’ para a lógica do Mercado e trata-se de uma cidadania quase que ‘estrangeira’ para o projeto de Estado-Nação. Monstruosa é a eugenia racial, cultural e socialmente hierarquizante, pois monstruosa é a produção da multidão. A monstruosidade dessa produção tem expressões estéticas características: carnavalescas pois avessas à hierarquia, grotescas pois hostis à distância imposta pelo espetáculo do Poder, barrocas pois cientes da urgência das lutas, desmedidas pois impossíveis de serem quantificadas e inacabadas pois ansiosas por movimento. A Ocupação Prestes Maia mobilizou coletivos de artistas paulistanos que multiplicaram intervenções junto aos moradores. Essas intervenções foram importantes na medida em que apresentaram aos cidadãos paulistanos um ponto de vista sobre a Ocupação radicalmente diferente daquele imposto pela Mídia gentrificadora.
Cartazes-carimbo (cartazes do Coletivo BijaRi) são utilizados após os despejos provocados por reintegração de posse de imóveis do centro da cidade. Gentrificado, gentrificado, gentrificado… gritam cartazes colados em janelas e portas trancadas com poderosos cadeados. Vulnerável, a população assiste ao espetáculo do Estado higienista: o cartaz-carimbo burocrático na superfície do imóvel funciona como uma abominável tatuagem na pele dos ex-moradores. A gentrificação pós-moderna remete ao genocído moderno.
Expressões monstruosas
Pode parecer paradoxal a opção pelo cartaz – uma forma com certa tradição de luta, mas com uma aparência convencional diante das novas mídias e tecnologias – para a aborbar a resistência à eugenia nas cidades e sobretudo, e paradoxalmente, a resistência em redes de produção cultural. Gostaria de demonstrar que o desafio à “tradição” eugênica não se encontra apenas no conteúdo, mas na própria forma cartaz. Walter Benjamim relaciona a “autoridade” da obra de arte a uma “autenticidade” ou existência de um original. Coloca em evidência a relação eugênica entre origem e autenticidade que confere à obra de arte uma aura, uma transcendência. O cartaz desafia a aura – o original que gera a autenticidade – da Arte, de modo semelhante ao qual o monstro, segundo Negri, coloca em questão a transcendência – a origem que confere legitimidade – do poder. A monstruosidade política encontra no cartaz uma correspondência estética. Vou abordar algumas das monstruosas táticas do cartaz, táticas que atualizam nas cidade contemporâneas aquelas dos jagunços frente às campanhas militares enviadas contr Canudos: reprodução, movimento, transformação. O cartaz coloca em xeque a eugenia estético-política pois combina livremente umainfinidade de técnicas de produção e reprodução: xilogravura, litografia, serigrafia, fotocópia, fotografia, colagens manuais e virtuais, tecnologias analógicas e digitais.
O cartaz coloca em xeque a eugenia pois, através dessa multiplicação pela cidade, alcança um movimento desde sempre perseguido pela lógica massificadora do Mercado e pela força ordenadora do Estado. E finalmente coloca em xeque a eugenia pois, destas infinitas combinações e destes contínuos movimentos, nascem radicais transformações da própria forma cartaz: cartaz-bandeira, cartaz-mural, cartaz carimbo, cartaz-tatuagem, cartaz-bicho, cartaz-placa, cartaz-camiseta, cartaz-máscara, cartaz-dormitório. Sem recato algum, o cartaz assume na rua sua vulgar reprodutibilidade, ganha fácil mobilidade e exibe suas intrigantes metamorfoses.
Em sua contra a hierarquizante gentrificação paulista, o cartaz prolifica despudoradamente como ratos, cartazes-ratos (cartazes do Dragão da Gravura). Fotocópias vagabundas vagamundam pelos muros, dando visibilidade a uma potência rapidamente proliferante, portanto dificilmente governável.
Cartazes-urubus (cartazes do coletivo Esqueleto) xerocados e colados como uma segunda pele nas portas dos prédios destinados à gentrificação, cartazes-urubus assinalam as lutas das práticas de vida contra a a especulação imobiliária e suas formas de propriedade…
…com a conivência de homens que persistem em ignorar. O cartaz homens ignorando (cartaz do coletivo Esqueleto) se apropria da forma “placa de trânsito”. O código normativo de circulação é re-codificado carnavalescamente para chamar a atenção do pedestre apressado, do motorista de táxi estressado, do passageiro de ónibus apertado. Um burocrata engravatado, sob a forma de pictograma
indiferenciado, demonstra total indiferença ao que se passa em seu entorno. A extrema indiferença de seus contornos humanos o tornaria intensamente indiferente às formas de diferenciação. Seriados, estandartizados, padronizados, homens com gravata ignoram a singularidade de homens e mulheres sem teto.
O controle dessas singularidades é denunciado nos cartazes que, reproduzindo alvos, são pendurados nos corpos: mulheres-placa, homens velhos-placa, crianças-placa. Os cartazes ganham a mobilidade dos corpos em movimento. Corpos que procuram escapar, simbólica e efetivamente, à homogeneização e à massificação realizada pelo biopoder. Ao desfilar com seu corpo-alvo frente a um batalhão militar, a potência militante subverte carnavalescamente o poder bélico soberano.
Para além da desabusada reprodutibilidade e da conquistada mobilidade dos cartazes colados nos corpos, as inversões e subversões carnavalesca estão presentes nas metamorfoses expressas pelas máscaras. Máscara da juíza, máscara do secretário municipal de habitação, máscara do sub-prefeito da Sé: máscaras apontam a relatividade dos poderes desse mundo. Ao proprietário do imóvel, ao secretário municipal de habitação, ao sub-prefeito da Sé, ao prefeito e ao governador, o manifestante diz “eu sou potência”, produzo diferença. O mascaramento é a prática vital que permite a Ocupação revidar a asfixia imposta pela expropriação de tudo. O cartaz metamorfoseou-se em máscara que deve ser analisada dentro dos processos que a configuram: a produção de anti-Leviatãs ou de outros monstros possíveis! Estou procurando mostrar aqui o conflito contemporâneo entre a centralização da
política e da produção representada pelo Leviatã – uma cidade à imagem do Mercado que a produz e do Estado que a organiza – e a produção de múltiplas centralidades, ou seja, produção de anti-Leviatãs ou outros monstros possíveis.
Até o momento falei dessa produção através de cartazes que em sua reprodutibilidade, mobilidade e metamorfose, produzem não apenas uma outra percepção da cidade mas, através de sua própria criação descentralizada, produzem efetivamente uma descentralização da cidade.
Gostaria agora que nos afastássemos um pouco da Ocupação para ver o movimento dessas expressões culturais e mediáticas no atravessamento da cidade. Alguns podem pensar que esses deslocamentos são mínimos diante da massificação da produção cultural, do bombardeio da mídia monopolista e da gentrificação da paisagem urbana. Podem pensar que essa produção é muito mais simbólica que efetiva. Ora, pelas suas passeatas, cortejos e procissões pela cidade, as lutas dos Sem Teto ganharam uma dimensão monstruosa pois aos que lutam contra uma especulação imobiliária injusta, se juntaram os que lutam contra uma representação política obsoleta, os que lutam contra uma imposição cultural unificada, os que lutam contra uma comunicação social monopolizada, etc. Estas lutas ganharam ma dimensão monstruosa pois a essa mutiplicidade de questões, se aliou uma multiplicidade de práticas sociais e uma multiplicidade de singularidades: de artistas e designers, arquitetos e urbanistas, professores e alunos, empregados e desempregados, formais e informais, produtores materiais e imateriais, catadores de papéis e catadores de histórias, etc.
A grotesca mistura de corpos heterogêneos produz uma grotesca expressão estética. Passeatas, cortejos e procissões são expressão e produção do monstruoso precariado urbano, das monstruosas redes de cultura e comunicação que constroem através de suas lutas, das infinitas novas centralidades que constituem as cidades contemporâneas. Essas cidades policêntricas já não são mais a triste projeção do Leviatã. Propomos fazer uma rápida aproximação de algumas dessas infinitas práticas.
As passeatas dos Sem Teto saem dos imóveis ocupados e se dirigem numa desordenada ordem até os lugares dos poderes constituídos: Prefeitura, Câmara Municipal, Fórum de Justiça ou Catedral. Para a missa de 7 dias da morte da Ocupação Plínio Ramos, por exemplo, um paradoxalmente alegre cortejo fúnebre dirigiu-se à Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de SP. Uma multidão vestida de preto acompanhava a fogosa viúva agarrada ao caixão do defunto prédio. Para além dos visíveis elementos carnavalescos, há subversão da ordem urbana que cria o centro (que tem conotação de inclusão e de superioridade social) para então poder definir a periferia (conotação de exclusão e inferioridade social). Nesse incessante movimento de fora – das Ocupações – para dentro – para o centro da cidade e de dentro pra fora, passeatas e cortejos carnavalescos manifestam seu
desejo de centralidade, para além da dicotomia centro versus periferia.
Em outra ocasião, em 2005, moradores da Ocupacão partiram do centro da Cidade para o bairro nobre do Morumbi onde manifestaram em frente à casa do sub-prefeito da Sé, um dos responsáveis pela “limpeza do centro”. A alegríssima comitiva trouxe, além de máscaras, óculos, bonés, chapéus, bolas, bóias, guarda-sóis multicoloridos, um enorme plástico azul que, esticado em frente à poderosa residência, evocou um quilométrico e divertido piscinão. Nesse caminhar, o escracho não representa a mera possibilidade do pobre virar nobre por 4 dias de folia, mas constitui a luta efetiva das 468 famílias da Ocupação pelo direito à cidade que produzem todos os 365 dias do ano. Passeatas, cortejos e escrachos percorrem carnavalescamente a distância que separa: as ocupações provisórias dos poderes constituintes ao espaço permanente dos poderes constituídos, reivindicando a centralidade de sua produção material e imaterial.
Retornemos então à Ocupação: A luta continua! Enquanto a Ocupação Prestes Maia resiste, outras são violentamente despejadas após “reintegração de posse”. Da casa pra rua, da noite pro dia, os antigos moradores acampam na rua. Vemos placas de madeira, pedaços de papelão, km de plástico preto e até anúncio de “4 dormitórios (2 suítes) terraço com churrasqueira” darem abrigo aos neo-Sem Teto. Anúncios característicos da especulação imobiliária são convertidos em curiosos abrigos.
Antes de concluir, queria mostrar uma outra prática de des-hierarquização do espaço urbano: uma “intervenção urbana” do Coletivo BijaRi. O que é uma intervenção urbana? É intervenção sobre o quê exatamente? É intervenção sobre territórios que conhecem por um lado processos de desterritorialização que os mantém em contato com metrópoles globais e, por outro, processos de reterritorialização que estabelecem conflitos entre espaços contíguos. O Largo do Batata em São Paulo é palco de um violento conflito entre interesses de luxuosos shoppings centers e práticas de ambulantes e nômades em geral.
Uma esperta galinha foi solta em pleno Largo da Batata. Correndo o risco de virar canja ou frango assado, ela foi acolhida, fotografada e abraçada calorosamente como uma prima querida que acaba de chegar da roça. Essa mesma galinha, solta dessa vez na entrada de um elegante shopping center foi rápida e violentamente expulsa por agentes de segurança! Afinal de contas, a galinha não pertence aquele lugar onde poderia ser aceita unicamente sob a forma de galinha-bibelô em porcelana nobre, de chique tailleur em pied-de-poule ou ainda de sofisticado coq au vin. Ao transgredir o limite do Shopping, a Galinha BijaRi apontou o conflito entre o ordenamento imposto pela Razão de Estado ou lógica do Mercado e as práticas de espaços configuradas por monstruosos desejos. A Galinha BijaRi é um galiforme artefacto de design, um efêmero projétil arquitetônico, um errante dispositivo de urbanismo de produção de outros monstros possíveis.
Conclusões
Partimos da hierarquia hobbesiana, percorremos os paradoxos carnavalescos, para enfim apreender o monstro na sua constituição do comum: social, estética e política – biopolítica. Segundo Negri, é necessário recusar a dialética entre: um sujeito (Estado ou capital) e um objeto: um cidadão expropriado de seus poderes, um trabalhador explorado na sua força, um consumidor despojado de seus direitos, ou seja, um Sem: Sem Teto, Sem Trabalho, Sem Direitos, Sem Cultura, Sem Comunicação. É necessário afirmar a potente luta entre Sujeito e Sujeito. Pois é na luta contra aquilo que reconhece como forma de desvitalização que os sujeitos se tornam potência. Foi na luta contra o Leviatã paulista, que a Ocupação Prestes Maia – o monstro biopolítico e sua potência produtiva – rompeu o nexo lógico entre eugenia e finalismo.
É preciso reverter/subverter o discurso e a realidade da falta, em produção e valorização do excesso desses sujeitos políticos em constituição (Negri) ou desses agenciamentos expressivos em devir (Lazzarato) que, constituindo o comum – no compartilhamento material, na cooperação intelectual e na colaboração afetiva – constituem a si-mesmos, Multidão. Poderemos então vislumbrar, a emergência de uma cidade de múltiplas centralidades, uma cidade que desdenha o fundamento eugênico par se abrir num rizoma democrático. Frente ao Leviatã neo-positivista que insiste em proclamar a ordem e o progresso da Nação, o monstro contemporâneo resiste na produção e na democracia da Multidão.
Vida longa ao Monstro!
Fonte: Cultura e Pensamento
Nenhum comentário:
Postar um comentário