maio 06, 2007

Uni-vos, irmãos!!!

IRMÃOS, UNI-VOS!!!

Por Jair Alves - dramaturgo/SP

Foi uma gritaria geral, nos camarotes e nas galerias. O Bispo da igreja Universal, hoje senador da República pelo Rio de Janeiro e ex-candidato a governador, vem propondo a inclusão de um item na Lei Rouanet que possibilite a destinação de incentivos fiscais para a recuperação e, quem sabe, construção de "templos" religiosos. Está parecendo o fim do mundo, mas ainda não é. Interessante o que acontece no Brasil; somente depois ganhar espaço em programas televisivos como, por exemplo, o Programa do Jô, determinadas questões parecem, de fato, críveis e escandalosas. Foi o que aconteceu, no último dia 30 de abril. Assuntos insólitos e cinematograficamente inacreditáveis acontecem a rodo em nosso dia-a-dia, sem com isso provocar revolta na classe artística ou nos meios de comunicação. Vamos embarcar no mote da emenda a Lei, proposta pelo Bispo Marcelo Crivella (PRB-RJ), para apontar apenas uma delas, envolvendo a Lei Rouanet.

No programa citado, o excelente ator e dramaturgo Juca de Oliveira fez graça, zombou (com alguma razão) do Bispo legislador, lembrando o estado de miséria em que vive grande parte das atividades artísticas no país, em especial aquelas ligadas à preservação do patrimônio histórico. Sempre é bom ter alguém lembrando desse misère muito particularmente se feito por um artista como Juca de Oliveira, com seu currículo como presidente do Sindicato dos Artistas e militante ou simpatizante do velho Partidão (Partido Comunista Brasileiro), porém outras mazelas não só legalizadas, mas tidas como aceitáveis estão acontecendo a todo o momento, com a aplicação da referida Lei, e não vemos uma 'viva alma' dizer que o mundo está preste a acabar.

Exemplificando: no ano que passou (2006) foram aplicados R$ 817.750.812,12 (Oitocentos e Dezessete Milhões, Setecentos e Cinqüenta Mil, Oitocentos e Doze Reais) contra 714.214.147,25 (Setecentos e quatorze milhões...), no ano de 2005, para todas as atividades cobertas pela Lei. Os números não são tão desprezíveis se considerarmos que ao longo de cada ano o MINC autoriza o protocolo de 10.000 projetos, pelos interessados, inclusos neste número os projetos que são diretamente patrocinados com dinheiro do orçamento do próprio Ministério, ou seja, por um fundo criado para atender demandas menos volumosas. Muitos desses projetos sequer passam da primeira fase, nem chegam a ir a julgamento pelo CNIC. Em média, cada inscrito deveria receber (como podemos projetar) 81 mil reais. Já pensaram nessas cifras e no tamanho da revolução artística e cultural que aconteceria no Brasil? Mas, esses números não representam a realidade, pois, apesar dos 8 e tantos milhões de reais, aplicados na Cultura, a título de Mecenato, somente 15% dos projetos inscritos conseguem o beneplácito das empresas patrocinadoras. Afinal, são elas e não o governo que decide quem vai para o céu ou para o inferno. Ou seja, apenas (aproximadamente) dois mil projetos, anuais, são contemplados.

Nessa nossa nova projeção cada projeto inscrito receberia o correspondente a 408.500, 00 (Quatrocentos e Oito Mil Reais), mas também isso não corresponde à realidade, pois em verdade esta cifra é atingida por média e, na prática, isso não acontece. Acreditem os senhores que existem projetos que recebem, a título de incentivo a cultura, R$ 7.137.606,97, já captados R$ 3.385.000,00, em 2006, e o restante será sacramentado este ano (2007), depois de passar por revisão do CNIC, em recente reunião. Este é o caso de My Fair Lady (PRONAC de número 064579). Pelo preço do mármore de banheiros reformados pela Infraero, senadores, deputados, do PSDB, PPS e Democratas (???) provocaram duas CPI’s, mobilizando todo o Congresso Nacional; Imprensa; Exercito; Aeronáutica; Controladores de vôos; Passageiros, acampados nos aeroportos; etc. Mas, nenhum "ai" a respeito de My Fair Lady.

Importante dizer que entendemos a proposta do senador Crivella - pentecostal convicto, inconsistente - mesmo que tenha passado por qualquer senador também inconsistente, do PT, ou de sua costumeira incompetência. Condenamos de qualquer forma, como condenamos seu projeto de marketing denominado CANAÃ, no semi-árido brasileiro. Uma fotografia aérea do projeto, mostrada no Programa do Jô, evidenciou que o mesmo não passa de um protótipo, esperando recursos federais para a sua realização. E mais, o episódio "dinheiro para os Tempos" não pode virar bandeira de moralidade de nenhum outro senador da assim denominada oposição; até que se prove o contrário, são todos iguais.

O ator Juca de Oliveira enfaticamente lembrou, no Programa do Jô, a precária situação dos Museus, Arquivos e Grupos de Teatro, distribuídos por esse Brasil; aparteado pela também excelente atriz Bibi Ferreira que se limitou a dizer, diante do escândalo suscitado por Crivella, "Sem comentários, nada mais". De nossa parte, dizemos: dinheiro para recuperar templos e a conivência com escândalos como a montagem de My Fair Lady, em cartaz na cidade de São Paulo, com patrocínio da Lei Rouanet, mas mesmo assim com ingressos ao custo de R$ 185,00, nos faz lembrar o que disse Bibi Ferreira - "Sem comentários, nada mais". Seria o caso de perguntar aos extraordinários atores, Juca e Bibi, se nesse caso vai haver gritaria. O que vale para Deus, vale para o Diabo, irmãos! Portanto, uni-vos!

Siglas usadas no texto:

CNIC - Comissão Nacional de Incentivo à Cultura
MINC - Ministério da Cultura

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