outubro 15, 2015

Escucha Chile / Memórias da adolescência

PICICA 1: "Aqui es Radio Moscú. Escucha Chile". Logo após o golpe militar, em 1964, minha pequena família voltara a morar na Rua dos Barés, fronteira com a mítica Praça dos Remédios, onde nasci. Da rua Frei José dos Inocentes carreguei minhas memórias da infância, com seus incríveis personagens: Hahnemann Bacelar, Professora Geanne Sobral, Gilmar Sobral, Jorge Aragão, Haroldo Maranhão, Eurico e Edila, Abdon e Omar Haddad, João Paco-Paco, Mali, Cássia, Professora Amélia, João Valério, Valério, Niza e Joanna Valério, Professora Consuelo Vale, Professora Adelaide Macedo, Professora Alzira Reis Góes, Carmen Doida, Jóia, Yayá, Arantes, Nega Nazinha, Hilda "Cú de Mola", Aldenora, Siloca, Agostinha, Prisco, Haroldo e Marcelo, família Figlioulo, Homero de Miranda Leão, Sérgio Pessoa, Dona Filó, as putas da Pauzada e da velha estância do casal de portugueses de Trás-os-Montes Florêncio e Felismina, e tantos outros, sem contar com os personagens das adjacências, como o bairro do Céu, a rua Governador Vitório, a Praça D. Pedro II, a rua Visconde de Mauá, onde morava a família Laredo, e o final da rua Luiz Antony, onde morava a família de meu amigo Alexandre Souza Cruz Silva. Nessa época ainda não havia a hegemonia televisiva de hoje. Vivíamos, no Amazonas, o final da Era do Rádio. Todas as noites, minhas irmãs, meu pai, minha mãe e eu subíamos ao terraço da casa para fugir do calor, e antes de dormir passávamos horas intermináveis ouvindo Rádio Havana-Cuba e Rádio Moscou. Graças à cultura latino-americana de meu pai - neto de um espanhol de Valladolid e filho de uma peruana de Iquitos -, acrescida da sua experiência de vida como prático da Marinha Mercante brasileira, a serviço da empresa inglesa de navegação Booth Line Ltda., a riqueza do aprendizado daqueles dias ficaria para sempre em minha memória. A melodia do castelhano de Fidel Castro, que discursava horas a fio, tornou-se inconfundível para mim. Sou capaz de reconhecer sua voz à léguas de distância. Adolescente, ainda não tinha os códigos da linguagem política do comandante revolucionário, entretanto sabia distinguir em sua fala a gravidade daqueles primeiros momentos da revolução cubana. Mas era a programação chilena dos anos 1970, transmitida desde Moscou, a que mais me causou impacto. Durante a programação fazia-se longas chamadas dos desaparecidos e mortos pela ditadura do general Pinochet. A voz do locutor ecoava noite afora apertando os corações de quem ouvia a dolorosa leitura do nome dos chilenos martirizados pelo golpe militar. Nas visitas noturnas à casa de minha avó Maria Casado Ramirez, residente à rua dos Andradas, para tomarmos chá, seguíamos a mesma rotina de audição, embora lhe agradasse mais ouvir Perez del Rio, pela Voz da América, antípoda dos programas dos países comunistas. Enquanto isso, nos porões da ditadura militar brasileira, os opositores do regime eram eliminados sem que tomássemos conhecimento, face à censura instalada no país. 

PICICA 2: "La angustia de los chilenos que viven el golpe militar de 1973, es narrada en este cortometraje que ganó el 2º lugar de la categoría profesional del festival VISOL 2003. Hombres y mujeres, frente a la desinformación que vivía el país, esperan escuchar noticias de sus amigos y familiares desaparecidos. Escondidos y desesperados, escuchan la transmisión radial que llegaba desde Rusia a través de la voz del escritor Volodia Teiteilboim.

En el año 2004 este cortometraje ganó el 4º Festival Iberoamericano de Cine de Atacama, y también ha sido exhibido en importantes festivales internacionales como Overhausen, Lleida, Toulosue, entre otros.
Reparto: Carlos Mauricio Graves, Cristian Quevedo, Tamara Arévalo, Aníbal Reyna (voz de Volodia Teiteilboim) y Rosario Corbalan.
Producción: Ambientarte y Cine de Trinchera.
Guión y Dirección: Luciano Cesar."

Escucha Chile

radiomoscu

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