PICICA: "É hora de focar no que é essencial, é hora de barrar o golpe."
É hora de barrar o golpe
É hora de focar no que é essencial, é hora de barrar o golpe.
Por Luis Felipe Miguel.
Creio que
estamos chegando aos momentos decisivos de uma trama que vem sendo
urdida há muitos anos. O golpe que agora está em pleno curso é a
culminação de um longo processo de preparação. Um de seus elementos
centrais foi a geração de uma ampla massa de pessoas capazes de repudiar
publicamente aquela que foi a marca dos governos petistas – o combate à
pobreza. O consenso de que a miséria era uma chaga a ser superada foi
destruído com a penetração, planejada e amplamente financiada, de um
discurso de extrema direita, que permitiu que uma camada social
minoritária, mas ainda assim numerosa, assumisse sem culpas a percepção
de que a redução da pobreza não era uma conquista, mas uma ameaça.
Também
estiveram presentes os movimentos de ampliação da autonomia do aparato
repressivo de Estado e, é claro, as investigações seletivas sobre a
corrupção endêmica no Brasil, com a triangulação entre judiciário,
Ministério Público e mídia. Assim, estava montado o cenário de uma ampla
base de apoio à cruzada antipetista, com agentes dentro do próprio
Estado capazes de levá-la adiante e um trabalho permanente de ocultação,
diante da opinião pública, do processo que estava em curso.
O golpe se
beneficiou dos equívocos do PT no governo – que agiu para desmobilizar
os movimentos sociais, despolitizou a discussão na sociedade e acreditou
numa política de acomodação e conciliação; e que, quando começou a ser
acuado, apostou que resolveria o problema fazendo mais e mais
concessões. Como já está claro há algum tempo, uma resposta fadada ao
fracasso.
Nisso tudo, o
juiz Sérgio Moro, por mais que em seus sonhos vista a fantasia de
Mussolini de Curitiba, é apenas uma engrenagem. É um pobre coitado que
fica feliz de tirar fotos ao lado de João Doria Jr. Ele é tão útil, e
por isso assumiu uma posição de protagonista, por causa de sua completa
falta de limites, de sua amoralidade, de seu desprezo olímpico pelos
direitos; em suma, por causa de sua falta de compostura. Os tempos
mudaram, as práticas são outras, mas Moro cumpre hoje uma função similar
à de um delegado Fleury durante a ditadura. É o mastim que faz
alegremente, balançando o rabo, o trabalho mais sujo.
O
escandaloso grampo que atingiu a presidente da República, com o
compadrio escancarado com a mídia que também foi revelado de forma
indiscutível, mostra a depreciação final da magistratura em benefício do
golpe. Moro não age como juiz, age como golpista e desistiu de fingir
que não é assim.
O diálogo
ilegalmente gravado de Dilma com Lula não prova nada, exceto o desespero
da direita com a nomeação do ex-presidente para a Casa Civil e sua
vontade de acelerar o golpe. A mídia, sendo a mídia que é, não se dá ao
trabalho de apresentar interpretações minimamente equilibradas. É a
maquinaria do golpe em andamento. Polícia e judiciário de um lado, a
mídia de outro, a massa dos novos direitistas tocando fogo nas ruas,
tudo para forçar uma solução apressada, contrária à Constituição e
antidemocrática para a crise.
O golpe já
está na rua. É hora de ver qual será a resposta das mulheres e dos
homens comprometidos com a democracia. Para a esquerda, vale o recado: é
possível condenar o governo Dilma, é possível criticar Lula por todos
seus vacilos e recuos. Mas se o governo cair e se Lula for vítima do
cerco ignóbil armado contra ele, quem dança é a esquerda brasileira
inteira, que será inviabilizada como projeto de poder por décadas. Quem
dança é o horizonte de uma sociedade igualitária, é a ideia de
democracia como poder do povo sem tutelas, é a noção de que as
liberdades devem ser protegidas para todos. É hora de focar no que é
essencial, é hora de barrar o golpe.
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“A ofensiva de Sérgio Moro e de setores da mídia para derrubada do governo atingiu seu ápice. Estão levando às ruas gente raivosa não apenas contra o PT, mas contra o que quer que seja associado a movimentos sociais e à esquerda. Não são poucos os relatos de agressão e espancamento de pessoas apenas por estarem de vermelho ou por se recusarem a aderir às palavras de ordem. Não se trata de defender o Governo Dilma, aliás indefensável. Trata-se de barrar uma sanha antidemocrática que, se vitoriosa, arrastará com intolerância qualquer movimento crítico, num verdadeiro caça às bruxas. Não é momento de vacilação, mas de posicionamento e ação.” – Guilherme Boulos, MTST
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Luis Felipe Miguel é
professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília,
onde edita a Revista Brasileira de Ciência Política e coordena o Grupo
de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades – Demodê, que mantém o Blog do Demodê, onde escreve regularmente. Autor, entre outros, de Democracia e representação: territórias em disputa (Editora Unesp, 2014), e, junto com Flávia Biroli, de Feminismo e política: uma introdução (Boitempo, 2014). Ambos colaboram com o Blog da Boitempo mensalmente às sextas.
Fonte: BLOG DA BOITEMPO
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