No papel almaço
Anibal Beça ©
Todos chegam ao seu destino
exceto os meus passos ao meu país.”
Murid Al-Barghouti
trad. de Albano Martins
“
Oh, quão grande é o desejo de viver
para aqueles que irão morrer.”
Lea Goldberg
Trad. Eliana Rosa Langer
It is equal to living in a tragic land
To live in a tragic time.”
Wallace Stevens
.
À frente a lauda em risca do papel almaço
essa invenção antiga para letras tortas
que eu fui buscar temendo pelo descompasso.
Caneta-fonte à mão abre essa comporta
a borboleta azul pousa na espuma d’água
e um rio nervoso passa o fio da faca às costas
e penteia ou melhor, escarifica mágoas.
em cabeças de pelos rebeldes em cachos.
melenas enroladas de anjos sem suas asas.
Meus olhos não suportam mais a claridade
as sombras se aninharam pássaros no albergue
e os ouvidos só ouvem coma sem alarde
semitonando tons desafinando estepes.
São uivos e assovios de lobos seculares
que sabem da carniça no concerto breve.
Zíngaros violinos sangrando nas tardes
para ventres dançantes de salomés anêmicas
estas mães parideiras de parentes primos.
Vizinhos e irmãos seremos para sempre
mesmo sem o bom-dia cordial dos dias
não há tijolos para se fazer paredes
O barro somos nós em nossas cercanias
essa argila animando o cimento vital
para esse palco único, a sós, nas coxias.
Talvez por mal-traçada, essa rima atonal
não vingue nos ouvidos bem-aventurados.
A Fé desses foguetes cheira muito mal.
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