PICICA: "O
Estado de direito é imperiosamente laico e a imprensa, se pretende
apresentar-se como democrática, deve ser o sustentáculo deste laicismo."
DECISÃO STF SOBRE ABORTO
A cobertura de um julgamento histórico
Alberto Dines | Programa nº 636 | 24/04/2012 | 0 comentários
Para
que os fatos cheguem à sociedade não basta apenas a cobertura da mídia,
importante é que esta cobertura produza uma percepção correta do
acontecido. Significa que, além do destaque e volume de notícias, o
leitor precisa ser abastecido com avaliações a fim de que possa montar
os seus juízos e tomar as suas decisões.
O
resultado da votação do STF que deu às gestantes o direito de abortar
em caso de anencefalia do feto foi amplamente noticiado na semana
passada. Os jornalões comemoraram a “decisão histórica” de oito votos
contra dois, autêntica goleada. Mas não se preocuparam em explicar por
que era histórica.
Ora,
em 1988 os constituintes já haviam admitido o aborto em caso de estupro
e quando a gestante corre risco de vida. O caso da anencefalia segue a
mesma lógica e o mesmo princípio de interrupção da gravidez não
desejada. A votação ganhou dimensão histórica por tratar-se de decisão
judicial irrevogável e, sobretudo, porque é um avanço na direção do
Estado laico e secular.
A
conotação laicista da decisão no noticiário ficou subentendida,
subalterna, escondida. O Brasil é o quarto país do mundo em número de
fetos anencéfalos, o STF como instituição republicana não poderia ficar
alheio à estatística nem desconsiderar os interesses das gestantes e das
mulheres para atender as pressões de grupos religiosos.
No
farto noticiário dos dias seguintes, o voto do ministro Marco Aurélio
Melo, marcadamente laicista e secular, praticamente desapareceu.
Desapareceu apesar de ter sido o único que concentrou a argumentação em
defesa do laicismo do Estado brasileiro.
Curiosamente, o encerramento do Jornal Nacional de 12 de abril e o do Jornal das 10
da GloboNews valorizaram o voto de Cezar Peluso, que, além de
minoritário, foi proferido por um ministro que na semana seguinte
deixaria a presidência da Suprema Corte.
O
Estado de direito é imperiosamente laico e a imprensa, se pretende
apresentar-se como democrática, deve ser o sustentáculo deste laicismo.
Fonte: Observatório da Imprensa
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