PICICA: "Um amigo libanês, pintor de primeira e bruxo militante, mostrou-me certa vez uma adaga em uma bainha de prata ricamente trabalhada com uma inscrição em árabe que ele traduziu. A frase alertava ao portador da arma que seria sábio quem não a desembainhasse, mas aquele que o fizesse não usando a arma seria um covarde.
A delicada conjuntura em que nos encontramos está cheia de blefes, o que torna difícil a análise. A direita ameaça com o impedimento da presidente, um ex-presidente ameaça colocar o “exercito” de outros para defender o seu governo, outro ex-presidente tece pendores democráticos e de respeito a legalidade enquanto seu partido conspira na direção oposta.
Como sempre, para superar a borbulha enganosa da aparência, é necessário descer às determinações de classe e aos interesses em jogo."
A adaga dos covardes, ou, O limite da imbecilidade direitista
Um amigo
libanês, pintor de primeira e bruxo militante, mostrou-me certa vez uma
adaga em uma bainha de prata ricamente trabalhada com uma inscrição em
árabe que ele traduziu. A frase alertava ao portador da arma que seria
sábio quem não a desembainhasse, mas aquele que o fizesse não usando a
arma seria um covarde.
A delicada
conjuntura em que nos encontramos está cheia de blefes, o que torna
difícil a análise. A direita ameaça com o impedimento da presidente, um
ex-presidente ameaça colocar o “exercito” de outros para defender o seu
governo, outro ex-presidente tece pendores democráticos e de respeito a
legalidade enquanto seu partido conspira na direção oposta.
Como sempre,
para superar a borbulha enganosa da aparência, é necessário descer às
determinações de classe e aos interesses em jogo.
[TRÊS BLEFES]
O equilíbrio
do governo de pacto social sempre foi difícil uma vez que supõe poder
conciliar o que é inconciliável, isto é, os interesses de classe opostos
de trabalhadores e burgueses. A engenharia possível pressupõe uma certa
estabilidade econômica e uma governabilidade negociada por meio de
cargos no governo, favorecimentos eleitorais e emendas ao orçamento para
responder aos lobbies por trás (pela frente e por todos os
lados) dos digníssimos parlamentares eleitos e se completa com a ação de
governo que garante as condições para a acumulação de capitais em
proporções adequadas. Enquanto isso acena aos trabalhadores com a
miragem da inserção na sociedade de mercado via garantia dos níveis de
emprego e salário, acesso ao crédito e programas compensatórios de
combate às manifestações mais agudas da miséria absoluta.
O mais importante é que funciona enquanto a burguesia deseje que funcione.
Por um tempo
funcionou e reconduziu os governos petistas em três mandatos
consecutivos. O quarto mandato chegou de raspão com o país dividido
praticamente ao meio. Um congresso nacional ainda mais conservador, uma
oposição fortalecida e um PMDB como fiel da balança e representando a
condição, mais que nunca, para a governabilidade. Uma receita para a
instabilidade, toda a negociação anterior e durante a campanha eleitoral
se torna insuficiente. O PMDB exige mais espaço (Lula se apressa em
afirmar que concorda com o pleito), mas também mais protagonismo e mais
independência. Ganha a presidência da Câmara com Cunha e endurece a
negociação sobre a composição do governo e o orçamento abrindo margem
para chantagear a presidência.
Aqui o
primeiro blefe. O PMDB tem a vice presidência e vários ministérios
chaves. Controla um quinhão invejável no segundo e terceiro escalões,
governos de estado que por sua vez dependem de projetos e verbas
federais, assim como de favores eleitorais dos mais diversos. Tem pouca
chances de um vôo solo como alternativa e suas chances estão ligadas ao
sucesso do governo que enfraquece para negociar melhor.
O PSDB,
histrionicamente bradando contra o governo com o cacife de uma oposição
que garfou mais de 48% dos votos no último pleito, também se encontra em
posição problemática. Não pode atacar o governo pelas medidas
impopulares assumidas, pois as defendeu abertamente na campanha. Da
mesma forma tampouco pode se dar ao luxo de se contrapor à linha geral
da condução da economia e do Estado, pois no essencial respeita os
compromissos macro econômicos, a premissa sacrossanta do superávit
primário, a lógica privatista e mercantilizadora da vida… Escolheu a
centralidade dos escândalos e da corrupção, mas convenhamos, é um
terreno em que o PSDB não tem só o telhado de vidro, mas uma casa
todinha de vidro. Basta lembrar a forma como foi feita a privatização
das tele-comunicações sob a batuta do falecido Serjão, a entrega da Vale
do Rio Doce, as contas não tão secretas em paraísos fiscais, para não
falar do metrô de São Paulo e outras aventuras conhecidas.
Eis o
segundo blefe. Alardeia-se o combate à corrupção, torcendo para que a
apuração rigorosa e profunda, “doa a quem doer”, não chegue muito perto
da mão que acusa, como o caso do HSBC parece indicar. Se o caos
interromper o mandato da presidente e gerar dividendos eleitorais ao
PSDB, ótimo para eles, mas não se pode fritar muito de modo que a fumaça
não sufoque a todos na cozinha do Estado burguês. Qualquer alternativa
de governo do PSDB passa pela negociação com o PMDB, daí o dilema: como
queimar a gordura do PT sem tostar o bife do PMDB?
Por isso o
escudeiro do caos, Aloysio Nunes e outros asseclas, vão às ruas pelo
“sangue” de Dilma Rousseff, enquanto FHC e Aécio Neves, pedem um pouco
mais de calma. Afinal, somos todos civilizados, não é?
[A APOSTA PETISTA]
O governo,
um tanto quanto desorientado, pois julgava que bastava a mera repetição
do mesmo procedimento anteriormente exercitado e uma base sólida no
Congresso para escapar do pior da crise, tateia erraticamente. Antes das
eleições sua prioridade era recompor uma base e compensar as defecções,
como as PSB e PTB, mas, prioritariamente mostrar-se confiável aos
financiadores de campanha: as empreiteiras, os bancos, os industriais, o
agronegócio, em suma, os donos do governo. As alianças, o programa e o
perfil da campanha não deixaram margem à dúvida desta prioridade.
No entanto, a
polarização da campanha contra o PSDB (Marina foi um episódio inflado
que não se manteve) obrigou os petistas a desenterrar o discurso da luta
entre ricos e pobres, do fantasma do passado e, na reta final, produzir
um factóide diversionista segundo o qual trata-se de um embate de
projetos que contrapunha de um lado uma direta privatista, que atacaria
os direitos dos trabalhadores e reverteria as “conquistas” alcançadas, e
de outro uma proposta progressista que enfrentaria a crise com
crescimento (o que implicava, por sua vez, a manutenção da generosa
ajuda aos capitalistas) e não realizasse ataques aos direitos dos
trabalhadores.
Vejam que o
governo agiu com uma certa sinceridade. Precisava atrair os setores
sociais (por isso o discurso), mas não podia romper com suas alianças e
com as exigências de seus patrões (por isso a manutenção do rumo geral
conservador). Não é esse o blefe do governo. É que tem gente que quer
tanto uma coisa que a projeta na realidade como se realidade fosse…
O problema é
que passada as eleições, os setores sociais e movimentos populares que
generosamente se dispuseram a votar na candidata “mais progressista”
para evitar a direita, se viram diante do constrangimento de um governo
que moveu-se rapidamente para implementar tudo aquilo que a direita
perversa propôs. Os movimentos sociais e populares já tinham cumprido
sua função, agora era o momento da incrível arte do pragmatismo político
no qual o governo do PT tinha que gerar as condições para manter-se no
governo até o final e, quem sabe, um próximo mandato. Nesta direção era
necessário recompor a base, acertar a vida com o Congresso e tomar as
medidas amargas contra os trabalhadores para garantir a continuidade da
política de superávits primários e a sangria de recursos do fundo
público para o capital financeiro.
Evidente que
isso gerou um descontentamento muito grande, mas aqui fico na incômoda
posição de defender a presidente Dilma. Ela falou que ia fazer isso, era
evidente que faria. Os setores sociais que apostaram, com razões
louváveis e algumas até justificadas, nesta opção estão descontentes com
a imagem que criaram e não com o real efetivo. Acontece com torcidas de
futebol, com relacionamentos amorosos… acontece também com projetos
políticos. Já cantava Chico com as palavras de Ruy Guerra:
“Se trago as mãos distantes do meu peito
É que há distância entre intenção e gesto
E se o meu coração nas mãos estreito,
Me assombra a súbita impressão de incesto”.
…e até o Chico acreditou!
Certos
movimentos sociais, setores populares e segmentos de esquerda
literalmente não negociaram nada. Daí o qualificativo “generosamente” ao
tratar do apoio oferecido. O Governo não se comprometeu formalmente com
nenhum dos pontos que constituem a fantasia imaginada de uma inflexão à
esquerda. Pelo contrario, deu o tempo inteiro mostras que não alteraria
o rumo da política que enterrou a reforma agrária em benefício do
agronegócio, os direitos trabalhistas em nome das condições favoráveis
ao crescimento da economia capitalista, a privatização contra as
políticas públicas, o acordo com os fundamentalistas religiosos
descartando a luta contra a homofobia e outras pautas, a conivência com
velhas formas políticas contra uma verdadeira mudança das regras do
fazer política na direção dos interesses populares.
[A VELHA DIREITA]
Aqui é que começa o problema. Apesar de
ter cedido em tudo… tudo mesmo, ao que a ordem burguesa exigiu, o
governo de pacto social do PT continua ameaçado. Ocorre é que a metáfora
da adaga aqui se torna limitada. Não estamos diante de um instrumento
nas mãos de um sujeito, mas de uma dinâmica política que uma vez
desencadeada ganha certa autonomia. Os sujeitos políticos são
compósitos, formados por fragmentos, facções segmentos que reproduzem em
ponto menor o dilema da sociabilidade burguesa: a contradição entre
interesses individuais particulares e interesse geral.
Nenhum ator particular que desembainhou a adaga parece de fato querer o impeachment,
mas parece que a adaga quer. Em tempos de fetichismo absoluto, um
fenômeno desses não devia nos espantar. É verdade que a burguesia
monopolista em suas diferentes facções (industrial, bancária, agrária,
comercial, etc.) nunca ganhou tanto e prescreveu o remédio que seus
funcionários no governo estão zelosamente administrando. Precisa de
estabilidade institucional, teme reviravoltas que possam colocar em
risco, real ou potencial, a ordem. Mas adorariam encerrar este ciclo de
governos petistas. E se houver possibilidade, porque não?
O mesmo pode
ser dito do imperialismo. Alguns governistas afoitos e seu exercito de
dedos nervosos nas redes sociais, desenterraram o imperialismo como o
sujeito oculto da desestabilização. Ora o imperialismo sempre pensa em
cenários e a desestabilização nunca ficou fora da pauta. A pergunta é:
como se pensou nestes doze anos enfrentar esta evidência? Armando o
povo, preparando as forças armadas e buscando aliados, como na
Venezuela? Ou se mostrando confiável e evitando se apresentar como
responsável, como nos governos Lula e Dilma, e fazendo um acordo militar
com os EUA, mobilizando e dirigindo tropas de intervenção no Haiti?
Impedimentos
e interrupções institucionais não são utilizados apenas contra governos
de “esquerda” ou de um reformismo potencialmente perigoso à ordem
capitalista (duas coisas que o governo do PT não representa nem
remotamente) mas também contra governos que já cumpriram sua função e
passaram a se tornar incômodos. É o que aconteceu quando surgiu
a necessidade de interromper o Estado Novo getulista ou a autocracia
burguesa no final dos anos 1970.
A grande
burguesia e o imperialismo lucraram com o ciclo petista, mas não lutarão
para defendê-lo se ele ameaçar ir para o ralo. A burguesia não é fiel,
nem monogâmica. Nunca foi. Não será agora que irá mudar sua natureza.
A expressão
política da burguesia tem, no entanto, outros problemas. A ocupação do
espaço político central pelo PT lhe rouba sua essencialíssima função na
vida. Ela precisa encontrar um meio de se livrar do PT porque este ocupa
o lugar que por coerência seria o seu, por isso quer aproveitar toda
chance possível. Sua responsabilidade com os interesses de classe da
grande burguesia monopolista faz com que ela hesite, assim como o medo
de, no chumbo trocado das acusações, colocar em risco a ordem
instituída. Mas ela tem a obrigação de tentar, porque disso depende sua
sobrevivência.
[A EXTREMA DIREITA]
Isso é
diferente quando se trata da extrema direita. Ela é o cachorro louco da
burguesia. É incômoda e caricatural, mas útil. Não pede licença para pôr
fogo no circo. Em épocas normais a burguesia a mantém presa na jaula do
Estado de Direito, mas a crise é seu habitat natural. Isolada ela é só
pitoresca, como nas marchas que andou ensaiando pelo país. Mas, num
certo caldo de cultura, se alimenta do irracionalismo e do
conservadorismo, cresce e pode se tornar uma ameaça, mesmo um incômodo
para seus donos.
A extrema direita foi às ruas e ganhou dimensão massiva nos últimos protestos pelo impeachment.
A extrema direita quer o impedimento da presidente, se possível seu
fuzilamento e a exumação do corpo de Marx para ser fuzilado também.
Parece que descobriram o motivo do desmonte da educação no Brasil, é um
perigoso terrorista de barbas longas (sem turbante) chamado Paulo
Freire.
[O BLEFE PETISTA]
Diante deste
cenário intricado o PT mantém-se fiel à sua ação aparentemente
errática. Faz todos os esforços para garantir a credibilidade diante do
grande capital e de seus aliados de direita, que constituem a base
operacional de seu governo; ao mesmo tempo em que precisa mobilizar suas
“bases sociais” (de fato eleitorais) para não virar presa fácil contra
aqueles que querem sua queda.
Neste ponto a
coisa fica ridícula. O governo impõe as chamadas medidas de austeridade
e ataca diretamente os direitos dos trabalhadores. O principal partido
do governo (talvez o segundo na linha hierárquica depois do PMDB) – o PT
– aprova por maioria as medidas de austeridade propostas, e o
ex-presidente Lula conclama que elas são necessárias e não atacam os
direitos dos trabalhadores. Ao mesmo tempo conclama suas “bases sociais”
(na verdade, em parte aparelhos burocráticos que um dia foram
organizações independentes da classe trabalhadora) para atos em defesa
do governo, mas contra as medidas de austeridade… do mesmo governo… que
implementa as medidas… Estão acompanhando?
Ora, aqui
também não se deve culpar o PT. Ele não pode fazer outra coisa. Os
setores que, com razões honestas, queriam uma guinada à esquerda estão
trabalhando com o desejo, não com a realidade. Este seria o caminho mais
rápido para o impeachment. O governo jamais fará isso. Todos
sabem. Desde os que sinceramente gostariam que o governo fosse mais à
esquerda, até os governistas mais renitentes que acham que tudo está
certo e não há nada a ser corrigido.
Este é o blefe.
Mobilizam as
massas, mas para apassivá-las. As mobiliza para usá-las como
instrumento em seu jogo e não como força própria em busca de seus
próprios interesses de classe. É para ameaçar seus aliados e
adversários. Desembainha uma adaga que não pretende usar.
A direita chama um ato pelo impeachment.
Lógico que a extrema direita se anima. Mas as lideranças estão
preocupadas, seus nomes andam sendo divulgados pelas listas dos
envolvidos nos atos de corrupção. FHC pede calma, não é hora de impeachment.
Michel Temer sorri ao lado dos presidentes do Senado e da Câmara (os
dois na lista) na arte de fazer de conta que ele não tem nada haver com
isso.
Na mais alta
temperatura do acirramento, escuto a notícia que Dilma propôs um pacto…
com o PSDB… que não aceitou… mas, está pensando. Depois do domingo
amarelo… duvido.
No meio
disso uma população tentando entender o que está acontecendo. De um
lado, um cara com uma adaga bradando – “vou te meter um impeachment no
bucho!” – (lógico, com muita calma para não prejudicar os negócios), de
outro um senhor que pregava a paz e o amor e que adora dizer que
banqueiros nunca ganharam tanto em seu governo ameaçando chamar as
massas para uma rebelião (lógico, desde que não atrapalhe o bom
relacionamento da ministra do agronegócio com a presidente e as medidas
de austeridade, que na verdade são necessárias… não é?).
De um lado
os governistas chamam um ato contra as medidas de austeridade que atacam
os trabalhadores e em defesa do governo que as aplica, de outro a
direita que quer derrubar o governo “esquerdista”, mas aprova as
medidas.
E vocês
querem que os trabalhadores entendam isso? Lá na consciência imediata da
classe trabalhadora uma faxineira explica ao repórter de um jornal
paulista porque aderiu as vaias contra a presidente diante de seu
pronunciamento (no qual disse que era preciso coragem para aplicar as
medidas contra os trabalhadores propostas por seu ministro Levy) e diz:
“Querem saber o motivo da vaia? É simples: estou cansada de trabalhar e não ter nada”.
Outro trabalhador é ainda mais direto:
“Ela mexeu nos direitos do trabalhador. Falou a campanha inteira que não ia e fez”.
(“Após manifestação de ‘peões’, empresária defende petista“, Folha de S. Paulo, 11/03/2015, por Juliana Sayuri e Daniela Lima)
[A PERGUNTA QUE NÃO SE CALA]
Que a
direita e a extrema direita se comportem como tal é compreensível e
esperado. A pergunta que precisa ser respondida é por que ela ganha
apoio de amplos setores de massa. A resposta cômoda para o governismo
defensor do pacto social é simplista, trata-se de quem votou e quem não
votou na Dilma. Típico de quem abandonou o referencial de classe para
pensar em eleitores. Trata-se perigosamente de um momento onde os
anseios e inquietações de setores dos trabalhadores estão sendo
capturados pelo ideário conservador e de direita.
E que
ideário é esse? A rede Globo em mais uma demonstração de miséria
jornalística tenta enquadrar a realidade no molde de seu jornalismo de
desinformação, transformando o circo de horrores da direita na rua no
dia 15 em uma “festa da democracia” e perguntando aos inquietos e
perdidos ministros Rosseto e Cardoso como o governo responderia às
“demandas da ruas”, a “voz das ruas”, o “grito das ruas”. Apesar da
emissora (que recebeu auxílio governo petista para não quebrar) tentar
reapresentar o samba de uma nota só da corrupção, as “ruas” gritavam
coisas como: “pela intervenção militar”, “morte aos comunistas”, “em
defesa do feminicídio”, “pela maioridade penal”, “contra as doutrinações
marxistas nas escolas”. Algumas demandas, para facilitar o
entendimento, escritas em inglês e francês.
Vejam, com
todos os problemas das Jornadas de 2013 podíamos ver ali como central um
conjunto de demandas como a defesa do transporte público, contra os
gastos com os eventos esportivos, contra a violência da política
militar, a denúncia dos limites desta pobre democracia representativa.
Ainda que houvesse por um tempo, a tentativa de contrabando das
bandeiras direitistas elas foram sendo isoladas das manifestações. Agora
elas dão o tom e organizam grandes manifestações em defesa da barbárie.
Interessante
notar que as Jornadas de 2013 forma violentamente reprimidas e o senhor
Cardoso, Ministro da (in)Justiça, se apressou a cercar de garantias
legais a ilegalidade da repressão e criminalização dos movimentos. Já no
festival da extrema direita anti-comunista a policia militar tirava
fotos e selfies com os animados participantes vestidos com a
camisa da CBF, enquanto à noite o Ministro dizia que precisamos
respeitar as manifestações porque são democráticas.
[Oficial da tropa de choque tira foto com família verde a amarela. A imagem foi capturada pelas lentes da TV Trip na cobertura que fez da manifestação em São Paulo]
Meu
barbeiro, filho de operário eletricitário, que se animou com a campanha
das diretas porque queria votar para presidente, diz que este governo
precisa acabar porque senão vai implementar aqui um regime parecido com o
da Venezuela e sugere duas alternativas: entregar o Brasil para ser
administrado pelos EUA ou devolver aos índios (eu sugeri que ele
insistisse na segunda alternativa).
O mais
surpreendente, no entanto, foi sua conclusão diante das minhas
ponderações. Com o olhar sério e aquela autoridade que só possui quem
segura uma navalha afiada em sua garganta, ele concluiu: “Sabe, eu acho
que ninguém quer o impeachment, o que eles querem é deixar este
governa sangrar por quatro anos para depois derrotá-lo de uma vez por
todas nas próximas eleições”.
Sabe do que
mais, acho que meu barbeiro está certo. Feito isso, pegou a navalha e
aparou o que restava de cabelo na minha nuca, limpando a espuma em um
pano. Lá na rua ainda se ouvem os gritos de combatentes segurando suas
adagas cegas que não pretendem usar… “olha que eu te furo”… “não se eu
te furar primeiro”… enquanto se prepara o acordo.
Mauro Iasi é
professor adjunto da Escola de Serviço Social da UFRJ, pesquisador do
NEPEM (Núcleo de Estudos e Pesquisas Marxistas), do NEP 13 de Maio e
membro do Comitê Central do PCB. É autor do livro O dilema de Hamlet: o ser e o não ser da consciência (Boitempo, 2002) e colabora com os livros Cidades rebeldes: Passe Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil e György Lukács e a emancipação humana (Boitempo, 2013), organizado por Marcos Del Roio. Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às quartas.
Fonte: Blog da Boitempo
Fonte: Blog da Boitempo
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