PICICA: "“[…] uma subjetividade interminável
imposta aos outros como objetividade: é a definição filosófica do
terror. […]” O homem revoltado, Albert Camus p.280"
Uma definição de Terror
Nos
livros de filosofia, há momentos de definição. Seja antes da análise ou
como uma conclusão dela, são nestes momentos que nos deparamos com a ação própria do pensamento filosófico: a organização das ideias na forma de conceitos. L’homme révolté,
eis um livro cheio destes momentos. Ao longo do “ensaio” (como o autor
se refere ao livro), vários conceitos me chamaram atenção, mas um deles
em especial:
“[…] uma subjetividade interminável imposta aos outros como objetividade: é a definição filosófica do terror. […]” O homem revoltado, Albert Camus p.280
Se o Terror é
a imposição de termos subjetivos tomados como objetivos, estamos muito
mais acostumados a conviver com “terroristas” do que imaginamos. No
sentido filosófico em questão, a realidade, tomada como plena, só pode
ser objetivada se for recortada. Explico: apenas a escolha de um
determinado aspecto e a consequente recusa de outro pode fazer surgir
uma objetividade de uma realidade plena de significações possíveis. Como toda escolha é interpretação, é portanto subjetiva, pessoal. Camus vai além:
“[…] Esta objetividade não tem sentido definível, mas o poder lhe dará um conteúdo quando declarar culpado tudo aquilo que não aprova.”
Ao tomar a subjetividade e elegê-la como
objetividade, dá-se o primeiro passo no sentido do terror, da opressão,
da negação. O segundo passo, muito mais cruel, é usar do poder
instituído (pelo Estado, pela Família, pela Igreja por exemplo) para
afirmar essa nova objetividade, declarando “culpadas” todas as outras
escolhas possíveis.
Nesse sentido, qualquer privação deliberada de informação é um ato terrorista, pois recorta a
realidade sob a alcunha de defini-la. A Mídia monetarista, elitista,
interesseira, excludente, parcial de nosso país é uma ótima
institucionalização desse conceito de terror. Isso sem nem comentar os
anúncios que ela veicula!
Quem define (definir não deixa de ser
objetivar) o que é bonito e o que é feio? Qualquer um! Veja que o
problema não é tornar objetivo para si, mas empurrar aos outros. Fazer o
outro engolir sua ideia acerca do real. Ou será que as capas de revista
de estética discutem com a população qual a referência de beleza
feminina da vez?
Peguemos o exemplo mais corriqueiro de
terrorismo de nosso tempo: o atentado às Torres Gêmeas de 11 de
setembro. Há alguma relação do fato com o conceito exposto? Lembremos o
básico do conceito de Jihad para o Islã: no alcorão, o conceito está associado ao empenho, mediante vontade pessoal, na busca por uma fé perfeita.
O processo que levou da interpretação das palavras no alcorão aos
aviões se chocando contra as torres pode ser considerado terrorista na
medida em que se percebe o quanto a lógica da objetivação foi
necessária. Para alcançar o fim último, “empenho” tornou-se
“sacrifício”, o poder armamentista foi o meio para afirmar esta
objetividade inquestionável. Se, apenas por um momento, os pilotos dos
aviões questionassem aquela visão construída arbitrariamente sobre os
textos, provavelmente eles não teriam escolhido o suicídio e o
assassínio em massa como os caminhos para a salvação. Eis o poder da
interpretação.
Fonte: Razão Inadequada
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