Exercício - Experimente fazer um exercício de releitura crítica dos textos da propaganda oficial do seu município. Surpreenda-se com sua capacidade de dar visibilidade ao que a publicidade esconde sobre a história da sua cidade. Além do prazer de escrever um outro texto, você estará deseferrujando a velha e boa memória. O meu exercício segue abaixo, e trata-se de um patrimônio que está na ordem do dia, quando se deseja substituir o antigo porto de Manaus por um porto que vai destruir o patrimônio paisagístico do Encontro das Águas:
Porto de Manaus - O Porto de Manaus está situado à margem esquerda do Rio Negro, rio que vai encontrar-se com o Solimões para formar o rio Amazonas, no lugar conhecido como Encontro das Águas. Sua arquitetura é única no Brasil. Projetado pelos ingleses, possui cais fixos e flutuantes. Desse modo os cais acompanham o fenômeno anual da enchente e vazante do Rio Negro, sendo possível a atracação de embarcações em qualquer época do ano. Até final dos anos 1960, a visitação pública era permitida, sendo um dos locais de lazer dos manauaras. A história do Porto de Manaus está ligada ao ciclo econômico da borracha, entre 1880 e 1910, época de grande movimentação financeira entre produtores e comerciantes. O uso de equipamentos modernos com o objetivo de adequar-se à realidade operacional da Zona Franca de Manaus desfigurou o antigo porto, originalmente recoberto com pinho de Riga, ao recuperar e pavimentar os cais flutuantes do Roadway e das Torres. O piso do cais foi elevado para um nível superior àquele alcançado durante o período da enchente, em 1953, sob a alegação de evitar novos transtornos e dificuldades técnicas. Além disso, foi construído um armazém medindo 2.800 m2, que não atende às demandas por armazenagem dos modernos conteiners. Empilhados e expostos num pátio próximo do prédio da Alfândega, esses conteiners impedem a visão do rio comprometendo a paisagem do lugar. Em 1975, com a criação da Portobrás pela Lei nº 6.222, a Administração do Porto de Manaus passou a fazer parte do sistema holding da Empresa de Portos do Brasil S/A. A Sociedade de Navegação, Portos e Hidrovias do Estado do Amazonas foi criada em 1997 para substituir a Administração do Porto de Manaus, a partir de sua estadualização, com vinculação direta ao Governo do Estado do Amazonas. Aqui seria iniciada uma disputa jurídica interminável sobre o gerenciamento do porto, imbróglio que deixou sob abandono prédios públicos históricos, que ameaçam ruir a qualquer hora. A história do luxo e riqueza proporcionados pela extração da borracha, época em que os costumes e tradições européias se faziam presentes no cotidiano de Manaus, já vai longe. O patrimônio público resultante da extração, comércio e exportação da borracha é de um valor extraordinário para o conhecimento da história da Amazônia brasileira. Mas as significativas transformações que a cidade viveu, marcadas por grandes obras e melhoramentos, bem como os costumes e tradições européias que marcaram o cotidiano da população, são coisas do passado. Os projetos arquitetônicos recentes têm gosto duvidoso e os projetos de conservação do patrimônio, herdado daquele rico período, é tímido, ao se contabilizar o que já foi perdido pela voracidade e o vale-tudo instituído com a criação da Zona Franca de Manaus em 1967. Vale lembrar que sessenta anos antes, a partir de 1907, com o ingresso da borracha asiática, proveniente de seringais racionalmente planejados, nos mercados consumidores internacionais, começa o declínio das exportações do produto local, anunciando um futuro desalentador. Porém, foi a derrocada da economia da borracha que preservaria o patrimônio público da cidade por algum tempo. Após a queda das exportações do produto, antes colocado em posição de exclusividade, que determinou o encerramento de ciclo da borracha, e que mergulhou a cidade em profundo esquecimento, um rico patrimônio arquitetônico ficaria intocável até o fim dos anos 1960. Maior, porém, foi o poder do capital predador, que teve como aliado dois irmãos siameses: a letargia do porto de lenha e sonho de ser Liverpool. Esse novo modelo foi chamado de 2º grande ciclo de crescimento, responsável pelo reaquecimento das atividades do Porto. Houve quem decretasse a existência de um 3º ciclo, mas tudo não passou das artes e manhas da propaganda, essa filha bastarda da comunicação, segundo afirma o sociólogo Zefofinho de Ogum. (Reescrevendo um texto da Manaustur)
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