novembro 25, 2009

Qual o mistério de Serra?

Serra & Marina
Oleo do Diabo

Qual o mistério de Serra?

Está cada vez mais difícil saber qual o sentido eleitoral dessa guinada ideológica de Serra à extrema direita. O artigo furibundo contra Ahmadinejah não repercutiu bem nem mesmo entre seus simpatizantes. Na Folha, houve nítido constrangimento. Eliane Catanhede e Janio de Freitas afastaram-se, educadamente, das posições semiticas radicais do governador. Clóvis Rossi fez um gesto ainda mais delicado: disse que a opinião de Serra sobre o Irã tinha uma "ética e moral" impecável, mas não o acompanhou.

Pelo visto, o único "formador de opinião" a aprovar entusiasticamente o artigo de Serra foi Reinaldo Azevedo, para cujas opiniões o serrismo converge cada dia mais. Com essa radicalização ideológica, no entanto, Serra perde todo o centro. E perde a direita liberal, a la Clint Eastwood, que tem ojeriza ao conservadorismo tacanho invadindo as liberdades individuais (como a Lei do Fumo). Perde a direita e a esquerda ambientalistas, que agora já tem sua candidata dos sonhos: Marina. E torna-se uma espécie de vilão de histórias em quadrinhos para a esquerda brasileira, que voltou a exalar um pouco de auto-estima, depois de ser humilhada e caluniada durante o escândalo do mensalão. Vale acrescentar que essa esquerda cresceu nos últimos anos justamente em virtude da radicalização conservadora de setores midiáticos e partidários. Gente como Nassif, PHA, diversos ex-jornalistas da Globo, foram praticamente expulsos da pacata residência centrista que ocuparam por tantos anos. Forçando um pouco a barra, lembrou-me os movimentos migratórios que transformaram a Europa pós-romana, quando tribos do oriente deslocam-se para o ocidente, criando um empurra-empurra de diversos povos cada vez mais para o ocidente, até que algumas tribos decidissem invadir e destruir o império romano.

Uma explicação que me parece plausível, embora espantosa, é que esse enorme deslocamento de setores da opinião pública para a direita foi influenciado fortemente pela presença de Reinaldo Azevedo, o blogueiro da Veja. Espantosa porque é incrível que um indivíduo tenha tanta responsabilidade num processo. É preciso, contudo, enxergar o indivíduo dentro do contexto sociológico. Azevedo recebeu, notoriamente, uma missão no Brasil. É o blogueiro ou mesmo o formador de opinião que mais liberdade goza dentro da grande mídia. É o único que recebeu carta branca para dizer o que quiser. Suas opiniões mais escabrosas são toleradas. Difere, inclusive, da condescendência meio paternalista que se dá à Diogo Mainardi, porque este último não desempenha o papel de "sério" ou "politizado" que Azevedo procura transmitir. A liberdade de RA para assumir defesas partidárias explícitas lhe dá um diferencial importante. Colunistas tradicionais do Globo, Estadão e Folha não tem essa liberdade, nem essa desenvoltura. Usam estratégias muito capciosas, mas raramente demonstram a parcialidade orgulhosa e direta de RA.

Diversas personalidades da cultura aderiram ao conservadorismo incendiário de RA. É no mínimo curioso, por exemplo, que um Nelson Mota, boêmio veterano, que já entrevistou Raul Seixas, que biografou Tim Maia, um homem, portanto, que conhece (e gosta delas, ao que parece) as loucuras da vida, tenha se deixado seduzir de forma tão completa por um neocon radical, racista, careta e preconceituoso como o Esgoto. Isso também é um mistério para mim.

Mesmo sem entender, arrisco algumas conjecturas. Voltei a pensar no blogueiro da Veja porque ele deu entrevista ontem ao Jô Soares. Não assisti porque evito enervar-me desnecessariamente. Eu considero RA um desequilibrado mental, um golpista, e aborreço-me com o deslumbramento que sua erudição emporcalhada provoca no brasileiro médio. As pessoas precisam entender que a intelectualidade produz monstros ideológicos do tipo de RA com uma frequência impressionante. A defesa que ele faz de um golpe de Estado no Brasil e na América Latina, para mim, deveria ser razão para prenderem-no. Recordo dos músicos do Planet Hemp, presos algumas vezes, por cantarem músicas sobre maconha, e não entendo porque a pregação de um golpe de Estado, que é notoriamente uma incitação criminosa ao desrespeito à ordem pública, feita por alguém com amplo espaço na midia, não é motivo de condenação por parte do Ministério Público. Ele, RA, que está sempre incitando as autoridades a prenderem os outros por suas declarações, ele é que deveria ser preso, por pregar o maior de todos os crimes: o golpe de Estado. Imagino o que fariam autoridades e opinião pública na Inglaterra, se alguém ofendesse dessa forma a Rainha. Ou na Espanha, se ofendesse o rei, ou nos EUA, se atacassem o Obama e pregassem a sua derrubada por um golpe de Estado.

Muito mais interessante, por outro lado, tem sido a rearticulação das forças jornalísticas, reagindo à direitização acelerada e brutal de redações e tvs. Criou-se uma ala independente que nunca existiu, de jornalistas blogueiros. E, claro, surgiram os blogueiros puros, essa legião de irreverentes incorrigíveis, que não perde uma pauta, um assunto, digerindo tudo com suas milhões de bocas.

A história se acomoda, aos encontrões. Tribos empurram outras tribos. O império romano desaba. Mas não esqueçamos que Roma também já foi uma pequena e simplória vila rural. E que cresceu em função de sua agressividade sem limites. Não é aconselhável subestimarmos nossos adversários. Eu acho Serra um imbecil e RA um louco, mas a humanidade já cansou de ser dominada por imbecis e loucos. Onde eles querem chegar? O que eles desejam? Terminar de privatizar o Brasil? Realizar uma demissão em massa do funcionalismo? Converter o país numa imensa praça de pedágios? Brutalizar os milhões de pobres que ainda vivem em áreas contestadas pela justiça?

A única bandeira realmente popular dos partidos conservadores, a redução dos impostos, é posta em ridículo pela ação concreta desses mesmos partidos quando ocupam o poder. Dentre todos os presidentes do Brasil, FHC foi o campeão em aumento de impostos. A carga tributária brasileira subiu fortemente em sua gestão. Cresceu um pouquinho nos primeiros anos de Lula, mas deve cair substancialmente este ano. E agora, Serra e Kassab promovem, sucessivamente, aumentos tributários. O prefeito de Sâo Paulo está elevando o IPTU em até 300% em vários bairros da cidade. É apavorante. Com base em quê? Nos altos e baixos da especulação imobiliária! Enquanto viadutos, metrô, shopping center, casas de show, desabam, matando pessoas e causando prejuízos bilionários ao contribuinte paulista (e, de forma indireta, ao Brasil todo), por culpa de uma fiscalização falha, terceirizada, as autoridades paulistas, perante um mundo ainda convalescente daquela que foi chamada de pior crise financeira desde o crash da bolsa em 1929, aumentam os impostos e criam novos pedágios nas rodovias do estado!

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