fevereiro 07, 2013

"A Criminalização da Política na Democracia Brasileira", por Hugo Albuquerque

PICICA: "Como bem observou Gilson Caroni, a gloriosa aliança entre a mídia e a toga marca o tom do golpismo, uma vez que a política precisa ser esvaziada. Sem mais juntas militares, agora é a hora e a vez dos tribunais supremos mediarem a democracia. Uma mudança tão óbvia que chega a ser caricatural: é como cambia a história da farsa política coma a passagem do capitalismo industrial para o cognitivo. É preciso construir uma doce doutrina de dominação e na falta de conseguir isso por meio de eleições, que seja pela elevação do STF à instância total. Em grau menor, também vemos o ministério público assumir uma função policialesca contra os movimentos sociais como no primeiro exemplo." 

A Criminalização da Política na Democracia Brasileira


Dezenas de estudantes da USP foram indiciados pela ocupação da reitoria daquela universidade. Sinal do nosso tempo. É forçoso crer, pelo propósito empregado, que estudantes cometam algum crime ao realizarem um protesto político dessa natureza. No entanto, o sistema estatal precisa absorver a desobediência civil na forma de ato criminoso para solver a contestação que lhe extrapola -- e o direito penal é solvente universal nesse sentido. Por ele, a narrativa da rebelião é recontada, uma vez se tratar da última linha de defesa da ordem. A criminalização da política, portanto, está na ordem do dia.

Sim, o Brasil é uma democracia e o regime militar foi derrotado. O que não quer dizer que o autoritarismo não possa continuar operando, disputando terreno com a própria luta constituinte de direitos. Seja nas pequenas arbitrariedades quotidianas -- como a má vontade de uma cartorária de vara criminal que pode custar a liberdade de alguém -- ou mesmo nas instância mais altas e visíveis do Estado -- como em decisões casuístas do STF que, na prática, buscam suspender dispositivos constitucionais vigentes. Digamos assim, a luta continua, embora em outra roupagem. 

Como bem observou Gilson Caroni, a gloriosa aliança entre a mídia e a toga marca o tom do golpismo, uma vez que a política precisa ser esvaziada. Sem mais juntas militares, agora é a hora e a vez dos tribunais supremos mediarem a democracia. Uma mudança tão óbvia que chega a ser caricatural: é como cambia a história da farsa política coma a passagem do capitalismo industrial para o cognitivo. É preciso construir uma doce doutrina de dominação e na falta de conseguir isso por meio de eleições, que seja pela elevação do STF à instância total. Em grau menor, também vemos o ministério público assumir uma função policialesca contra os movimentos sociais como no primeiro exemplo.

Isso se vê, por exemplo, na narrativa das recentes eleições dos peemedebistas Renan Calheiros e Henrique Alves para o comando das duas Casas do Congresso. Há pouca crítica programática política dos aliados parlamentares do governo, só moral de ocasião e a insistência em, sobretudo no que diz respeito a Alves, fazer criticas pelo viés da "desobediência ao STF" -- em virtude das declarações do deputado de que é a mesa diretora que declara a perda do mandato, não o STF (como o próprio tribunal concluiu, ampliando sua própria competência para além do texto da Constituição). Nada pode arranhar a figura divina do STF.

Em parte, o governo petista, responsável pela constituição de direitos que ficaram estancados desde a redemocratização, arruma a cama para aqueles que podem ser, e já estão sendo, seu algozes. Bancar emendas constitucionais que possibilitaram o STF chegar a esse ponto é um exemplo disso. Nesse sentido, ele repete uma prática que custou caro à social-democracia alemã. As conquistas democratizantes dos últimos anos na área social e econômica precisam vir acompanhadas de uma democratização política, sem a qual tais avanços podem cair por terra. A burocratização da sociedade brasileira é uma linha de força que está posta. É preciso democratizar a democracia.

Fonte: O Descurvo

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