maio 02, 2008

Maio das mulheres (ou "a luta continua")

ARTICULANDO Eletronicamente
Veículo de informação da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB) Ano VII Nº 174 30 de Abril de 2008

Transformar o mundo pelo feminismo

Maio das Mulheres (ou “a luta continua”)

Começa amanhã o mês que é associado - pelo mercado - às mulheres: “maio - mês das noivas e mês das mães”. A indústria e os comerciantes aumentam seus estoques de toda sorte de eletrodomésticos para as Mães - com M maiúsculo: são produtos de beleza, para as jovens casadoiras e jovens mães; celulares e notebooks para 'mães modernas'; langerie sexy para mães e noivas 'avançadinhas'; e até motos para vovós muito jovens. Vendem-se carros, roupa, molhos de tomate, arroz pré-cozido, enfim, qualquer coisa, sempre com uma imagem de mulher associada, seja como cliente a ser “presenteada”, seja como “promotora” da mercadoria, que costuma ser vendida em nome da maternidade e do casamento, duas instituições que estão no crivo da crítica feminista há um tempo. E por quê?

Para os movimentos sociais, o mês de maio é mês de luta: o 1º de maio é, historicamente, uma data dedicada à denúncia da situação de exploração da classe trabalhadora; e o 28 de maio é dedicado, pelas feministas, para a denúncia da morte materna decorrente da precariedade da saúde pública e em defesa dos direitos reprodutivos, que nós mulheres não temos, na prática. Para nós da AMB, maio é mais um dos nossos tempos de provocar a reflexão e a formação de novas consciências.

No dia “do trabalhador” denunciamos: nós mulheres trabalhamos demais e temos direitos de menos!

Como parte da classe trabalhadora, temos que trabalhar em troca de salário.
Além desse trabalho, somos nós, mulheres, que arcamos com todo o peso do trabalho doméstico nas nossas famílias. 92% das mulheres ocupadas realizam afazeres domésticos. Somando as duas jornadas, nós mulheres trabalhamos muito mais horas do que os homens: a jornada de trabalho doméstico entre pessoas ocupadas é assim dividida: mulheres – 25 horas semanais; homens, 10 h semanais (PNAD/IBGE, 2006).

Para superar esta desigualdade, o Estado brasileiro deve assumir a responsabilidade com a reprodução social: atualmente, do total de domicílios do país, em apenas 39% as crianças têm acesso a creches e à pré-escolas.

Sofremos violência, assédio moral, abuso sexual, maus tratos físicos, exploração e até situações de escravização (trabalho em troca de comida e moradia), sobretudo, nas casas de famílias que empregam mulheres e meninas no trabalho doméstico.

Cerca de 30% das meninas de 5 a 9 anos e 76% das meninas entre 10 e 13 anos realizam afazeres domésticos, no Brasil (IGBE, 2007).

As trabalhadoras domésticas sofrem maior número de acidentes do trabalho por conta de jornadas extensas e exaustivas (OISS, 2006).

Mais de 75% das trabalhadoras domésticas não têm carteira assinada e, portanto, nenhum direito previdenciário (PNAD/IBGE, 2006).

No caso das trabalhadoras rurais, seus direitos previdenciários estão constantemente questionados pelos empresários da agricultura exportadora.

Dos milhões de trabalhadores/as informais do Brasil, a grande maioria são mulheres. São mais de 30 milhões de mulheres em situação de desproteção social (MPS, 2003).

O trabalho doméstico não-pago também é desprotegido: não é reconhecido como trabalho e não conta para fins do direito à aposentadoria para as donas de casa.

Estima-se que o número de mulheres em situação de desproteção social chega a 46 milhões! Isto acontece porque, hoje, no Brasil, a Previdência é um direito apenas para quem paga por ele.

Toda esta situação ameaça a autonomia econômica das mulheres, nos mantém dependentes e reduz nosso poder sobre os rumos de nossa própria vida. O feminismo compreende que o trabalho deve ser uma fonte de realização e autonomia econômica para as mulheres.

Queremos todos os direitos por todo tipo de trabalho e para todas as mulheres; a responsabilidade compartilhada das atividades domésticas com os homens e com o Estado; proteção social a todo o trabalho das mulheres, através de uma Previdência universal, pública e solidária; o fim das discriminações e da violência contra as mulheres no mundo do trabalho; a superação do racismo nas relações sociais; a redistribuição da riqueza produzida, tanto no trabalho remunerado como no trabalho não-remunerado.

Mulheres feministas pelo fim da exploração de toda e qualquer pessoa dentro e fora de casa!

No dia “das mães” reivindicamos: maternidade livre e desejada!

Desde os primórdios do feminismo moderno, ao início do século XX, a luta feminista defende que a maternidade não deve ser obrigação para as mulheres, muito menos o seu destino.

Ainda que compreendamos a importância da função social da reprodução da espécie humana, as mulheres não são uma função, embora possam responder por parte desta função social quando assim decidirem.

A política populacional das nações e grupos humanos que tem sido pautada por interesses - seja de aumentar ou de reduzir o crescimento populacional - não pode se sobrepor ao direito de auto-determinação reprodutiva das mulheres, compreendida como parte dos direitos humanos.

A maternidade só é plena se voluntária, livre e desejada. A maternidade só é justa se compreendida como função social, pelo Estado, que tem a obrigação de assumir sua parte nesta responsabilidade, garantindo políticas públicas universais com qualidade para que as mulheres vivenciem com bem-estar a gestação, o parto e o puerpério.

Cabe também ao Estado assumir sua responsabilidade diante da reprodução humana garantindo políticas universais que envolvem os cuidados com as crianças: escolas, creches, saúde pública de qualidade, direito ao lazer e a uma vida plena e criativa.

O Estado tem o dever de garantir os direitos das mulheres a evitar filhos/as, através de métodos anti-conceptivos acessíveis e seguros para a saúde e, nos casos extremos, pela assistência ao aborto legal na rede pública de saúde.

Nenhuma mulher deve ser impedida de ser mãe!

Nenhuma mulher deve ser obrigada (nem se sentir obrigada) a ser mãe! (Carta da AMB, 8 de março de 2008).

No mês das noivas, alertamos: nem sempre o príncipe vira sapo, às vezes ele vira monstro!

A violência doméstica e sexual acontece na sua maioria dentro de instituições como o casamento, o namoro,o noivado e a família, e é praticada por homens contra as mulheres - homens que, em geral, são das relações íntimas e afetivas destas mulheres.

Entretanto, todas estas instituições são apresentadas como espaços de amor, afeto, aconchego e proteção. As famílias, no patriarcado não são nada disto, são na verdade, para a grande maioria das mulheres, de diferentes classes e regiões, o espaço de opressão, repressão, subordinação, domesticação e a agressão física, na infância, na vida adulta e na velhice.

O feminismo já demonstrou na sua crítica que o príncipe encantado, esperado ao longo da vida de muitas cinderelas, pode ser violento e autoritário. E que a instituição do casamento, na sociedade em que vivemos, não é igual ao companheirismo e igualdade que desejamos nas relações amorosas. Por isto, defendemos a autonomia econômica para as mulheres, pois a utopia das uniões livres só é possível entre pessoas autônomas.

Articulando Eletronicamente Ano VII nº 174, de 30 Abril 2008 Coordenação Editorial Secretaria Executiva da AMB Textos: Silvia Camurça, Verônica Ferreira. Edição Paula de Andrade / Contato: amb@soscorpo.org.br PRODUZIDO EM SOFTWARE LIVRE
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