PICICA: "É impossível não ler O Anti-Édipo deleuzo-guattariano sem
se colocar em xeque a todo instante e sem sentir reverberar ao mesmo
tempo no próprio corpo a intensa subversão que implica entrar em contato
com os afetos do esquizofrênico - figura-limite, aquela "mais próximo
do real", não o farrapo autístico em que as instituições quase sempre o
convertem."
Uma genealogia de "O Anti-Édipo"
É impossível não ler O Anti-Édipo deleuzo-guattariano sem
se colocar em xeque a todo instante e sem sentir reverberar ao mesmo
tempo no próprio corpo a intensa subversão que implica entrar em contato
com os afetos do esquizofrênico - figura-limite, aquela "mais próximo
do real", não o farrapo autístico em que as instituições quase sempre o
convertem. O discurso sem estrutura, o vomitório de palavras, fatos e de
todos os nomes da história. Aos poucos compreendemos que o gesto de
Deleuze e Guattari é mais profundamente bergsoniano do que kantiano -
embora a introdução à edição italiana de Mil Platôs sugira
insistentemente o contrário. Fazer uma síntese das multiplicidades
inconscientes, pois sim, mas com que positividade profunda e inaparente
dotar essas multiplicidades inconscientes que, em Bergson, se confundem
com o "espírito" - palavra bouleversante para qualquer
materialista, para qualquer filósofo político, que crê que todo espírito
seja ainda demasiadamente metafísico...? E, no entanto, por cada poro
do imenso corpo furado antiedipiano sopra um ar bergsonista, uma energia
espiritual indomável pela matéria que, por sua vez, não passa da
interrupção e do limite atuais de um fluxo virtual incessante, que não
para de jorrar (imanência, de manare, "jorrar"). Como então se
definem as máquinas desejantes, senão como máquinas de cortes-fluxos
arranjadas segundo três sínteses (produção, registro, consumo)? Eis aqui
as operações mais físico-política (e, ao mesmo tempo, em um sentido
exclusivamente bergsoniano, mais metafísicas) do desejo: profunda
repulsão do eu, magmática recusa a adoecer de normalidade:
Fonte: A Navalha de Dalí
“[...]há estados mórbidos ou anormais que parecem somar-se à vida normal e enriquecê-la em vez de diminuí-la. Um delírio, uma alucinação, uma ideia fixa são fatos positivos. Consistem na presença, e não mais na ausência, de algo. Parecem introduzir no espírito certas maneiras novas de sentir e de pensar. Para defini-los é preciso considerá-los no que são e no que trazem consigo, em vez de ater-se ao que não são e ao que tiram” (Bergson, H. L'Énergie spirituelle, 1919, em um texto originalmente publicado em 1908).
Um comentário:
Olá. Adorei teu texto. Tenho alguem com esquizo e penso bem assim. as coisas nao acontecem por acaso. elas sao a continuação, a conexao de td que vivemos e fazemos. td tem ligação e nada é totalmete ruim nem bom. elas só sao e deveriamos aprender a viver com td, aprendendo, trocando, ensinando e vivendo, simplesmente. Muito obrigada por me confirmar. Preciso ler mais esses caras. Abração.
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