PICICA: "O carisma, a inteligência ágil e a facilidade na comunicação
fazem do ex-presidente Lula um orador poderoso. E perigoso para os seus
inimigos. Ele consegue hipnotizar quem o ouve e conquistar auditórios.
Mas quem, de fato, ainda acredita no que ele diz?"
O discurso de Lula
O carisma, a inteligência ágil e a facilidade na comunicação fazem do ex-presidente Lula um orador poderoso. E perigoso para os seus inimigos. Ele consegue hipnotizar quem o ouve e conquistar auditórios. Mas quem, de fato, ainda acredita no que ele diz?O efeito superficial do fogo de artifício retórico de Lula se desfaz tão rapidamente quanto a boa impressão que causa. Ele carrega nas tintas da irresponsabilidade e do cinismo. Inventa estatísticas, chuta nas informações e atribui aos seus adversários o que eles não disseram, usando esse argumento inventado para desacreditá-los e ironizar na crítica, colocando-se sempre ao lado do povo e condenando o antagonista à posição de elitista. É o que costuma fazer com Fernando Henrique Cardoso para grudar-lhe o estigma de antipovo. Nem sempre com razão.
Lula repetiu isso tudo, conhecido à exaustão (até a náusea) pelos que o acompanham, na abertura da 5ª Marcha das Margaridas, ontem, em Brasília. Um espetáculo, mas que já cansou.
A inteligência maliciosa de Lula não pode ser ignorada nem subestimada. Ele sabe fazer o jogo político como poucos na história brasileira. Reconheceu que sua sucessora tem errado na condução do país, mas desviou a responsabilidade (indevidamente, por contrariar a realidade) aos banqueiros capitalistas. E também ao pouco tempo de Dilma Rousseff no seu segundo mandato, para o qual ainda tem três anos e meio pela frente (e que, um semestre depois, além de não ter começado, corrói para trás. o que era façanha e agora vai se mostrando uma farsa).
Pediu compreensão e apoio para a presidente, em relação à qual se posiciona novamente de forma paternalista e superior, o que significa estender a trégua e a solidariedade para si. Inclusive porque é a bola da vez. Dilma só será atingida depois dele, se a investigação da corrupção na Petrobrás chegar às provas da conexão direta do ex-presidente com a quadrilha que atuava na estatal do petróleo.
Como de hábito, Lula recorre ao messianismo para se defender dos que o estão perseguindo ou ameaçando. “Essas pessoas, que agora se apresentam como a solução, se esqueceram de que, quando cheguei à presidência do país, ele estava quebrado”. Antes dele, o dilúvio. Depois dele, Dilma, agora uma sinonímia.
Esse diagnóstico é tão verdadeiro quanto atribuir a crise econômica atual a fatores externos, na avaliação dele, provocados por instituições bancárias dos Estados Unidos e da Europa. Já não convence quem se aprofundou no exame da crise atual e das que a antecederam. Mas a mise-en-scène pode funcionar se houver massa para ouvir o ex-presidente e ser usada como efeito multiplicar para convencer a sociedade de que o povão continua com Lula e qualquer manobra para atingi-lo, ou à sua pupila, terá uma resposta enérgica e incontrolável.
De fato, o volume de gente no encontro era de impressionar: 40 mil trabalhadores agrícolas, reunidos no estádio Mané Garrincha, cedido graciosamente pelo governo do Distrito Federal. O propósito era visível: antecipar o contraponto aos protestos contra a presidente Dilma Rousseff, marcados para o domingo, 16. Mas a concentração pró-Lula e Dilma teria que acontecer num dia de semana para ter tempo de tentar esvaziar a próxima concentração.
Por isso, a quinta Marcha das Margaridas, com orçamento de 855 mil reais, precisaria de patrocínio externo. A Contag, a confederação dos trabalhadores rurais, que formalmente a organizou, não teria condições de assumir esse custo. Dividido entre agente estatais: Caixa Econômica Federal (R$ 400 mil), o BNDES (R$ 400 mil) e Itaipu Binacional (R$ 55 mil).
O BNDES informou em nota que o seu contrato de patrocínio “prevê o pagamento após a realização do evento e o cumprimento de contrapartidas previstas”. E que a decisão de patrocinar a marcha “foi tomada no contexto do apoio concedido à atividade agrícola no país”.
O BNDES considera que a marcha “é uma oportunidade de divulgação institucional e dos programas do banco direcionados à agricultura familiar”, cujo peso não guarda a menor proporção com os investimentos na agroindústria e, em particular, em alguns privilegiados empreendimentos no setor, como o do grupo Friboi, apontado como campeão em reclamações trabalhistas.
Já Itaipu, a empresa paraguaio-brasileira, explicou que concedeu o patrocínio por se tratar de um “evento tradicional”. Tradicional há cinco anos. E tradicional porque “defende os direitos das mulheres do campo, da floresta e das águas”. Por essa condição, “está em consonância com as diretrizes da sua política de patrocínio, missão institucional e objetivos estratégicos da empresa”.
Mudam os protagonistas, o enredo continua o mesmo: esquerda e direita querem conquistar o poder para usá-lo conforme seus propósitos e de acordo com seus desvirtuamentos. O povo é uma hipérbole nos seus discursos.
Fonte: Lúcio Flávio Pinto
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