PICICA: "(...)os palestinos estão
corretos ao pegarem um atalho para desviar dos EUA na região, já que a
política americana em relação a seu povo tem sido, desde os tempos de
Harry Truman, sacrificá-los no altar da política interna americana
(Truman observou que ele tinha constituintes judeus, mas nenhum
palestino). Os lobbies pró-Israel nos EUA são tão poderosos e bem
sucedidos que 81 congressistas passaram parte de seu recesso de agosto em Israel!"
Palestina, Bahrein e a hipocrisia americana
por Juan Cole
Hipocrisia deslavada é algo que com frequência destrói a reputação, seja de uma pessoa ou de um país.
O presidente Barack Obama parece ter achado que poderia ir à ONU ostentar tanto a liberação da Líbia e mais um adiamento dos direitos palestinos, e que essas posturas o fariam popular no sul global. Na verdade, ele pareceu apenas inconsistente, hipócrita e pensando nos próprios interesses.
Os Estados Unidos não estiveram na vanguarda das mudanças que varreram o Oriente Médio nos últimos meses, e seu instinto enquanto Superpoder é apoiar o status quo. Assim, o governo Obama não encontrou nada para dizer sobre a Tunísia até que a população já tivesse conseguido expulsar seu presidente. O presidente Obama parece ter sentado no muro sobre o que fazer com o Egito após 25 de janeiro, mas seu instinto certamente não foi o de apoiar os revolucionários contra o governo. Apenas uma semana antes que tudo estivesse acabado é que Obama se juntou ao coro daqueles dizendo que Mubarak deveria sair.
Foram Arábia Saudita, França e Grã-Bretanha que decidiram que Muammar Qaddafi tinha que sair do poder. Obama relutantemente se uniu a eles.
No ínterim, os EUA têm feito pouco a não ser soltar uns resmungos a respeito do esmagamento do movimento popular por reforma no Bahrein. Ali, geopolítica triunfou sobre preocupações com direitos humanos. A monarquia sunita no Bahrein arrenda aos EUA a base naval que serve de quartel general para a Quinta Frota.
Agora, descobre-se que o governo Obama quer até mais ou menos recompensar o governo do Bahrein pela repressão, retomando as vendas de armas. É como uma viúva há uma semana que decide sair por aí dançando.
Mas a maior hipocrisia em Washington foi reservada para os palestinos, que labutam sob uma repressiva ocupação militar na Cisjordânia e estão cercados e bloqueados em Gaza. Se há alguma diferença, eles são mais despojados do que os povos de Egito e Tunísia eram há alguns meses.
Mas a resposta do governo Obama à proposta dos palestinos para tornarem-se membros das Nações Unidas tem sido trabalhar para preveni-la, lidar duramente com Mahmoud “Abu Mazen” Abbas e torcer os braços de países como Nigéria e Gabão para que votem contra a proposta.
O argumento de Obama, que simplesmente ecoa o do governo do Likud em Israel, é que, ao ir à ONU, a Autoridade Palestina está evitando o processo de paz. Mas essa é uma proposição ridícula. Não existe processo de paz. Obama fracassou em estabelecer um. Assim, os palestinos estão corretos ao pegarem um atalho para desviar dos EUA na região, já que a política americana em relação a seu povo tem sido, desde os tempos de Harry Truman, sacrificá-los no altar da política interna americana (Truman observou que ele tinha constituintes judeus, mas nenhum palestino). Os lobbies pró-Israel nos EUA são tão poderosos e bem sucedidos que 81 congressistas passaram parte de seu recesso de agosto em Israel!
Os palestinos estão sem estado. Não têm cidadania em nada. É por isso que Benjamin Netanyahu pôde dar curto-circuito no processo de Oslo, e é por isso que Israel pôde renegar à seu bel prazer todos os compromissos que havia firmado com os palestinos. É por isso que terras palestinas podem ser usurpadas à vontade por intrusos israelenses na Cisjordânia.
Obama fez discursos interessantes sobre a Primavera Árabe, sobre a vontade dos povos e o idealismo e ativismo dos jovens. Ele fez isso mesmo em relação a países como Egito, onde a ditadura de Mubarak serviu tão fielmente aos interesses americanos.
Mas aparentemente ele acha que os palestinos de Gaza, que não são permitidos pelos israelenses sequer a exportar os bens que produzem, merecem apenas ainda mais ocupação via bloqueio, até o dia em que o governo israelense de extrema-direita decidir unilateralmente revogar suas políticas punitivas contra os palestinos, que ficaram sem estado devido à campanha sionista de limpeza étnica de 1947-1948 (40% da população de Gaza, suas famílias expulsas de casa por israelenses, ainda vive em campos de refugiados).
Obama faz bons discursos e consegue invocar altos ideais, mas quando, no Bahrein e na Palestina, Washington adota massiva hipocrisia, mina completamente a boa vontade que poderia de outra forma ter ganho por pelo menos não ter ficado no caminho das mudanças na Tunísia e no Egito, e por ter intervindo para prevenir um massacre de Qaddafi na Líbia.
Vitórias em política externa são raras. Obama desperdiçou as suas ao se rebaixar às forças direitistas em Manama e Tel Aviv. Esse é o tipo de mudança em que a juventude árabe jamais será capaz de acreditar.
Hipocrisia deslavada é algo que com frequência destrói a reputação, seja de uma pessoa ou de um país.
O presidente Barack Obama parece ter achado que poderia ir à ONU ostentar tanto a liberação da Líbia e mais um adiamento dos direitos palestinos, e que essas posturas o fariam popular no sul global. Na verdade, ele pareceu apenas inconsistente, hipócrita e pensando nos próprios interesses.
Os Estados Unidos não estiveram na vanguarda das mudanças que varreram o Oriente Médio nos últimos meses, e seu instinto enquanto Superpoder é apoiar o status quo. Assim, o governo Obama não encontrou nada para dizer sobre a Tunísia até que a população já tivesse conseguido expulsar seu presidente. O presidente Obama parece ter sentado no muro sobre o que fazer com o Egito após 25 de janeiro, mas seu instinto certamente não foi o de apoiar os revolucionários contra o governo. Apenas uma semana antes que tudo estivesse acabado é que Obama se juntou ao coro daqueles dizendo que Mubarak deveria sair.
Foram Arábia Saudita, França e Grã-Bretanha que decidiram que Muammar Qaddafi tinha que sair do poder. Obama relutantemente se uniu a eles.
No ínterim, os EUA têm feito pouco a não ser soltar uns resmungos a respeito do esmagamento do movimento popular por reforma no Bahrein. Ali, geopolítica triunfou sobre preocupações com direitos humanos. A monarquia sunita no Bahrein arrenda aos EUA a base naval que serve de quartel general para a Quinta Frota.
Agora, descobre-se que o governo Obama quer até mais ou menos recompensar o governo do Bahrein pela repressão, retomando as vendas de armas. É como uma viúva há uma semana que decide sair por aí dançando.
Mas a maior hipocrisia em Washington foi reservada para os palestinos, que labutam sob uma repressiva ocupação militar na Cisjordânia e estão cercados e bloqueados em Gaza. Se há alguma diferença, eles são mais despojados do que os povos de Egito e Tunísia eram há alguns meses.
Mas a resposta do governo Obama à proposta dos palestinos para tornarem-se membros das Nações Unidas tem sido trabalhar para preveni-la, lidar duramente com Mahmoud “Abu Mazen” Abbas e torcer os braços de países como Nigéria e Gabão para que votem contra a proposta.
O argumento de Obama, que simplesmente ecoa o do governo do Likud em Israel, é que, ao ir à ONU, a Autoridade Palestina está evitando o processo de paz. Mas essa é uma proposição ridícula. Não existe processo de paz. Obama fracassou em estabelecer um. Assim, os palestinos estão corretos ao pegarem um atalho para desviar dos EUA na região, já que a política americana em relação a seu povo tem sido, desde os tempos de Harry Truman, sacrificá-los no altar da política interna americana (Truman observou que ele tinha constituintes judeus, mas nenhum palestino). Os lobbies pró-Israel nos EUA são tão poderosos e bem sucedidos que 81 congressistas passaram parte de seu recesso de agosto em Israel!
Os palestinos estão sem estado. Não têm cidadania em nada. É por isso que Benjamin Netanyahu pôde dar curto-circuito no processo de Oslo, e é por isso que Israel pôde renegar à seu bel prazer todos os compromissos que havia firmado com os palestinos. É por isso que terras palestinas podem ser usurpadas à vontade por intrusos israelenses na Cisjordânia.
Obama fez discursos interessantes sobre a Primavera Árabe, sobre a vontade dos povos e o idealismo e ativismo dos jovens. Ele fez isso mesmo em relação a países como Egito, onde a ditadura de Mubarak serviu tão fielmente aos interesses americanos.
Mas aparentemente ele acha que os palestinos de Gaza, que não são permitidos pelos israelenses sequer a exportar os bens que produzem, merecem apenas ainda mais ocupação via bloqueio, até o dia em que o governo israelense de extrema-direita decidir unilateralmente revogar suas políticas punitivas contra os palestinos, que ficaram sem estado devido à campanha sionista de limpeza étnica de 1947-1948 (40% da população de Gaza, suas famílias expulsas de casa por israelenses, ainda vive em campos de refugiados).
Obama faz bons discursos e consegue invocar altos ideais, mas quando, no Bahrein e na Palestina, Washington adota massiva hipocrisia, mina completamente a boa vontade que poderia de outra forma ter ganho por pelo menos não ter ficado no caminho das mudanças na Tunísia e no Egito, e por ter intervindo para prevenir um massacre de Qaddafi na Líbia.
Vitórias em política externa são raras. Obama desperdiçou as suas ao se rebaixar às forças direitistas em Manama e Tel Aviv. Esse é o tipo de mudança em que a juventude árabe jamais será capaz de acreditar.
Professor de História na Universidade de Michigan, há mais de três
décadas estuda as relações entre o Ocidente e o mundo muçulmano.
Comentarista em diversos canais de tevê, é autor, entre outros, de Engaging the Muslim World (2009). Com sua autorização, traduzimos e reproduzimos alguns de seus artigos no Amálgama.
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