Convido
os chegados da UniNômade à defesa deste mestrando em filosofia do
direito, na UERJ, 14:00 do dia 24. Uma palhinha: "Escrito na prisão e
publicado em 1981, quando os conflitos e movimentos dos anos 1970
pareciam abafados pela repressão e um consenso conservador da “esquerda”
à “direita” partidária governava na Itália; Anomalia Selvagem reafirma a
filiação de Antônio Negri ao pensamento da positividade. Não se
abatendo com a ciranda da história, o maestro se concentrou em Spinoza
para abraçar ainda mais uma ontologia constituinte e afirmativa. Para se
animar com uma ontologia do ser pleno, sem concessões a derrotismos,
catastrofismos ou outras paixões deprimidas da razão. Da intrincada
malha de tratados, proposições e escólios, Negri desenovela o fio
vermelho de uma política radical e transformadora. A ontologia spinozana
transpira de política por todos os poros, uma política de baixo pra
cima, uma política materialista que não separa razão e desejo. Propõe
uma práxis revolucionária diretamente no dilacerar a trama do presente,
na materialidade do agir, do fazer. A modernidade assistiu ao nascimento
da concepção jurídica do mundo. De imediato, os defensores da
modernidade colocaram como tarefa do pensamento filosófico fundamentar
esse poder de novo tipo, vestindo-o com o manto da legitimidade e da
justiça. Teorias voltadas a garantir o soberano, sua lei, seu direito,
sua violência legítima. De Hobbes a Hegel, de Rousseau a Kant, várias as
tentativas de elevar-se sobre as paixões, as vontades e as volúpias das
plebes. Quantos funcionários do poder não recorreram e continuam
recorrendo às “verdades eternas”, que o homem deixado a seu bel prazer
invariavelmente abusa do que pode, passa a perseguir fins condenáveis e
praticar regularmente o mal; que não é prudente relaxar demais a lei e a
punição; que o povo precisa de alguém para guiá-lo e só respeita um
poder maior. Mesmo o mais ignaro popular não discordaria disso. Então,
por que seríamos arrogantes, nós os ilustrados do novo tempo, a ponto de
conceder-lhe o valor que ele mesmo não reclama, em vez de simplesmente
dar ao povo o que, sem romantismos, ele mais precisa e deseja: ordem e
autoridade? Temos de oferecer pelo menos um norte, um sistema razoável
de normas e valores, em que o homem comum possa acreditar e confiar. O
senso comum está do lado da polícia. No limiar da modernidade, o estado
foi fundamentado como solução para desordem humana. O direito, como
mediação de conflitos particulares e contenção da criminalidade. O
estado moderno, um “mal necessário”, defendem os corações burgueses mais
humanistas, porém o que de melhor a civilização humana pôde oferecer
diante da natureza oscilante e imprevisível, em todo caso perigosa, dos
homens. Quem vai cuidar de nossos filhos? Negri contesta os pensadores
mais notáveis na fundamentação desse senso comum. E rasga outra
modernidade, uma alternativa antimoderna. De Maquiavel a Spinoza a Marx,
três malditos em desafio e escárnio diante da concepção jurídica do
mundo. Minhas bússolas em impudência. Contra o problema do fundamento da
moral, do direito ou do estado, uma máquina de guerra anti-idealista,
no maravilhamento e vertigem da imanência. A subversão spinozana
divorciou a teologia da ontologia. Um Spinoza crítico do transcendente,
do finalismo, do estado e do mercado. Não só expulsou Deus como não O
deixou voltar travestido pela janela. A democracia de que fala Spinoza, e
Negri se constrói na práxis, de baixo pra cima, na terra do
materialismo absoluto. A concepção da crise do mundo recusa o contrato
social e o mercado, em favor da organização autônoma da produção e sem
quaisquer mediações. As essências, essas criaturas singulares, todas
elas habitam o mesmo plano ontológico, na superfície do que a política
compõe e decompõe as forças --- uma política de autoprodução do ser, da
democracia e da felicidade. Amar a verdade só é possível numa paixão ao
real, em que aquela age como práxis. Bem diferente das pirâmides
normativas e edifícios axiológicos, onde distintas ordens do ser
transmitem valor e legitimidade de cima a baixo, um esquema hierárquico
cuja motivação é pedir fidelidade ao tirano. A imanência se organiza, à
transcendência se é fiel. A doutrina do judeu maldito dispensa juntos o
Céu e o Inferno, todos os sacerdotes de uma só vez, e reconstrói a
causalidade eficiente na gênese das forças de tudo o que existe.
Simplesmente tudo, sem exceção. Não há lugar para a modernidade no
Spinoza de Negri. Em vez de teorias sobre a melhor forma de estado,
teorias sobre a melhor forma de libertar-se do estado. De destruí-lo de
baixo a cima, a começar pelo estado em nós mesmos, na nossa própria
economia de paixões."
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