outubro 25, 2013

"O desafio da esquerda (sobre os protestos de junho)", por Fabiano Santos

PICICA: "O que o autor do texto omitiu acerca da obra de Marx foi o combate de uma vida que ele travou justamente contra as soluções apresentadas neste texto. Marx, seja no 18 de Brumário, seja no Manifesto Comunista, seja na sua luta no interior da Internacional Comunista sempre denunciou os reformistas que pregavam a aliança com a burguesia e demonstrava as constantes derrotas do movimento operário devido a essas alianças." (André Dantas dos Santos)

O desafio da esquerda (sobre os protestos de junho)

Um esquecimento dos achados mais relevantes da obra de Marx é o mínimo que se pode dizer sobre a atuação de boa parte da esquerda nos protestos de junho.





Fabiano Santos
Arquivo “Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem como querem: não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”. A frase consta do primeiro parágrafo da clássica obra de Karl Marx, O 18 Brumário de Luís Bonaparte. Segundo o genial analista político alemão, as circunstâncias são essenciais para entender o sentido e efeito das escolhas e os cursos de ação tomados pelos indivíduos e grupos sociais. Circunstâncias podem ser entendidas como um conjunto de fatores que escapam ao desígnio dos agentes da história, isto é, que não dependem de sua vontade, mas que, no entanto, serão determinantes para o resultado final do processo. Processo aqui entendido como conflito, como disputa e alianças entre indivíduos e grupos tendo em vista a defesa de seus interesses, valores, ideias e identidades.

Nada mais importante na atual conjuntura brasileira do que revisitar o ensinamento de Marx contido em sua brilhante análise de conjuntura. Na França revolucionária de meados do século XIX, classes e frações de classes, grupos e facções políticas, cada um agindo na direção de maximizar seus interesses, da conquista de seus ideias e valores mais caros, acabaram por produzir resultado não desejado por ninguém, resultado, ademais, que em nada traria de novo na vida política francesa de então: trouxe sim o retorno do déspota, do estado autoritário e do golpe como instrumento de tomada do poder. Nem o sobrenome do ditador, no caso, encerraria alguma novidade.

Por que o ensinamento é importante para o momento atual, relevante, em suma para se pensar a política brasileira neste início do século XXI? Total esquecimento dos achados mais relevantes da obra política de Marx é o mínimo que se pode dizer sobre a atuação e discurso de boa parte da esquerda brasileira, sobretudo, a partir das manifestações ocorridas em junho do corrente ano. Quando Marx, no 18 Brumário, se refere às “circunstâncias”, fator chave para o sucesso da ação política, tinha duas coisas em mente: correlação de forças e estrutura social. Uma boa estratégia política é aquela que observa seus contendores e possíveis aliados, bem como os recursos com os quais contam, sendo os atores participantes do jogo, assim como seus recursos em boa parte decorrência da estrutura social.

A estrutura social brasileira hoje é fruto do tipo de capitalismo, com forte participação do estado, que temos desenvolvido desde a revolução de 30, com suas transformações e permanências. Seus atores sociais e políticos mais importantes advêm desta trajetória, sendo qualquer agenda minimamente factível de desenvolvimento dependente em alguma medida de um comportamento cooperativo destes. O papel da política democrática, bem como o de suas instituições é exatamente o de servir de mediação dos interesses em conflito de forma a gerar pautas socialmente inclusivas e de expansão econômica, pautas que contem com boas chances de aprovação e realização.

Plausível, portanto, sustentar que a superação dos obstáculos ao crescimento e ao estabelecimento de políticas públicas eficientes de inclusão social depende da criação de contextos de cooperação e explicitação de divergências entre os principais protagonistas de cena econômica e social. É plausível também sustentar que a Constituição de 88 fornece excelentes instrumentos aos governantes para o estabelecimento de tais contextos. Se é assim, a pedagogia política que ficou das manifestações de junho não é boa. Intolerância, grito e depredação são seus instrumentos. Idealismo e voluntarismo, sua inspiração teórica. Decepção e surpresa, a continuar a tergiversação esquerdista, serão seu provável resultado.

(*) Cientista político, professor e pesquisador do IESP/UERJ


André Dantas dos Santos - 24/10/2013
 
O que o autor do texto omitiu acerca da obra de Marx foi o combate de uma vida que ele travou justamente contra as soluções apresentadas neste texto. Marx, seja no 18 de Brumário, seja no Manifesto Comunista, seja na sua luta no interior da Internacional Comunista sempre denunciou os reformistas que pregavam a aliança com a burguesia e demonstrava as constantes derrotas do movimento operário devido a essas alianças. Sempre denunciou os reformistas demonstrando que não será por meio das constituições capitalistas que chegaremos ao socialismo, não será por meio da institucionalidade capitalista que acabaremos com a exploração do homem pelo homem. Triste ver o uso do nome de Marx para justificar um conceito de democracia e de Estado que Marx passou a vida desmistificando. Marx demonstra que o papel da "política democrática", bem como o de suas "instituições" não é de servir de "mediação dos interesses em conflito", mas sim que estão a serviço de uma classe no conflito, a classe dominante, o Estado é um instrumento da classe dominante e as "instituições" são a sua forma de atuação e garantia. Se os trabalhadores, os oprimidos ficarem aguardando pela Constituição de 88 e os governantes que ela elege em nome e por meio do capital seguirão presos aos seus grilhões. Muito diferente do que tenta o autor atribuir a Marx, este nos convida a outra ação no Manifesto Comunista. Ele nos convida à revolução e não à reforma: %u21COs comunistas não se rebaixam em dissimular suas idéias e seus objetivos. Declaram abertamente que seus fins só poderão ser alcançados pela derrubada violenta das condições sociais existentes. Que as classes dominantes tremam diante da revolução comunista! Os proletários nada têm a perder senão seus grilhões. Têm um mundo a ganhar. Proletários de todos os países, uni-vos%u21D. Aos reformistas recomendo que procurem outro pensador menos revolucionário.

Fonte: CartaCapital

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