abril 24, 2015

"Fotografando o Invisível" (Ponto de Vista)

PICICA: "Inspirada em Manuel de Barros, venho me esforçando nos últimos anos para fotografar o invisível e depois fazer com essas fotos uma bela exposição. É um desejo impossível e, todavia, muito presente. E a cada vez que tenho “percepções”[3] inconscientes, que parecem ­– só parecem ­– se juntar aleatoriamente e produzir pensamentos inconscientes complexos, o desejo de fotografar esse processo se reativa. De repente um “avolumar-se” interno que se transforma em uma cascata de palavras-pensamentos não pensados sem que se possa impedi-la. Para mim, são momentos de felicidade, surpresa e jouissance ­– para me valer de uma expressão de Lacan, e depois que passa fico pensativa, reatando os fios desse belo acontecimento. No consultório eles acontecem e, cá e lá, também os pacientes ficam sem fôlego, me narrando pensamentos não pensados – que ganham falas sem ainda terem sido pensados. Vários são os sinais que acompanham esse curioso acontecimento: o ar fica mais leve, percebemos que está acontecendo algo importante durante o acontecer ­– nem um minuto antes, nem um minuto depois ­– e temos clareza que o que está sendo falado não foi, não é fruto da consciência, do pensar egóico. Saiu, pois, de outro lugar e, o que é mais importante, nos revela. Esse tipo de cascata de pensamentos reveladores só interessa, na maioria das vezes, para quem os tem e por isso não podem ser “levados” para um congresso de pensadores. Todavia, o processo que leva à cascata pode sim ser narrado e, com certo esforço, tendo como mestre Manuel de Barros, até fotografado!"

Fotografando o Invisível

o pensamento tem razões que a consciência desconhece”[1].

 I) Introdução

Manuel de Barros conseguiu fotografar o silêncio[2]:

Difícil fotografar o silêncio,

Entretanto tentei, Eu conto:

Madrugada, a minha aldeia estava morta. Não se via ou ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas. Eu estava saindo de uma festa,

Eram quase quatro da manhã. Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado. Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?

Estava carregando o bêbado.

Fotografei esse carregador.

Tive outras visões naquela madrugada. Preparei minha máquina de novo. Tinha um perfume de jasmim no beiral do sobrado. 
Fotografei o perfume. Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.

Fotografei a existência dela.

Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão. Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa. Fotografei o sobre.

Foi difícil fotografar o sobre. Por fim eu enxerguei a nuvem de calça

Representou para mim que ela andava na aldeia de braços com maiakoviski – seu criador.

Fotografei a nuvem de calça e o poeta. Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa

Mais justa para cobrir sua noiva.

A foto saiu legal.

Inspirada em Manuel de Barros, venho me esforçando nos últimos anos para fotografar o invisível e depois fazer com essas fotos uma bela exposição. É um desejo impossível e, todavia, muito presente. E a cada vez que tenho “percepções”[3] inconscientes, que parecem ­– só parecem ­– se juntar aleatoriamente e produzir pensamentos inconscientes complexos, o desejo de fotografar esse processo se reativa. De repente um “avolumar-se” interno que se transforma em uma cascata de palavras-pensamentos não pensados sem que se possa impedi-la. Para mim, são momentos de felicidade, surpresa e jouissance ­– para me valer de uma expressão de Lacan, e depois que passa fico pensativa, reatando os fios desse belo acontecimento. No consultório eles acontecem e, cá e lá, também os pacientes ficam sem fôlego, me narrando pensamentos não pensados – que ganham falas sem ainda terem sido pensados. Vários são os sinais que acompanham esse curioso acontecimento: o ar fica mais leve, percebemos que está acontecendo algo importante durante o acontecer ­– nem um minuto antes, nem um minuto depois ­– e temos clareza que o que está sendo falado não foi, não é fruto da consciência, do pensar egóico. Saiu, pois, de outro lugar e, o que é mais importante, nos revela. Esse tipo de cascata de pensamentos reveladores só interessa, na maioria das vezes, para quem os tem e por isso não podem ser “levados” para um congresso de pensadores. Todavia, o processo que leva à cascata pode sim ser narrado e, com certo esforço, tendo como mestre Manuel de Barros, até fotografado!

Ontem tive um desses acontecimentos durante uma supervisão. Falei durante alguns minutos algo que nunca tinha pensado, com uma clareza estonteante. Claro que já pensara e já estudara, durante anos, todos os elementos da minha fala, mas ela saiu de um outro jeito e, o que é mais curioso, ajudou a compreender o caso em supervisão, mas também me revelou! Mais estranho ainda, pois não?! Não fiz uma identificação projetiva com o paciente do supervisionando, mas de uma estranha maneira o que falara correspondia a uma certa configuração psíquica minha, me cabia. Isso demorou um pouco para chegar à consciência e, na medida em que compreendia, ficava boquiaberta com a charada que conseguira matar sobre mim.

Freud detectou um fenômeno parecido e o denominou de après coup – o a posteriori. Com isso, Freud queria dizer que há tempos diferentes entre a interpretação feita pelo analista e a integração emocional pelo paciente. Muito tempo depois da interpretação, pode se dar a integração, uma verdade que se dá a posteriori. Penso que Freud des-cortinou algo fundamental e, depois disso, como se sabe, J. Lacan fez uma verdadeira revolução com o a posteriori, mudando praticamente a flecha do tempo: o presente em direção ao futuro e, então, a releitura, e mesmo reescritura, do passado. W. R. Bion, de novo com os pensamentos não pensados, rediscute e amplia a questão na medida em que, para o psicanalista inglês, os pensamentos surgem antes do pensar: são os pensamentos não pensados que mobilizam e expandem o aparelho de pensar – que não se confunde com o ego. E, por isso, Bion é o mais anti-cartesiano dos pensadores da psicanálise.

Nesta postagem, quero pensar como isso se dá no consultório, valendo-me particularmente de Bion, mas quero pensar isso “para além” do consultório, na vida mesmo: no cinema, na filosofia, na poesia e na literatura.

 II) “Percepções” e Pensamentos Inconscientes

Na vida, essas percepções e pensamentos inconscientes estão facilitados quando uma fase está por terminar. Temos várias passagens, ao longo da vida, que mais se parecem mortes e renascimentos: de uma atitude, de uma ideia, de maneiras de pensar e, às vezes, mesmo de estruturas psíquicas, emocionais e mentais. Tive um analista bioniano, Dr. Ântonio Muniz de Rezende, que me dizia: “Amnéris, você já percebeu que as pessoas sempre anseiam pelo renascimento, mas não querem morrer para chegar lá?”. Ninguém quer por que o processo é misterioso e nos retira do conforto de pensar que gerimos, egóica e conscientemente, as nossas vidas. E, todavia, esses processos misteriosos acontecem, e como acontecem.

Durante anos trabalhei com a ideia desses “fins de mundo” pessoais e constatava que a cada um deles ocorria a intensificação no limite dos processos vividos até então. Chamava-os de o “último ataque do demônio”, porque quer no consultório, quer fora dele, quando algo quer morrer na nossa vida mental e emocional – na nossa vida psíquica – antes se aguça e se potencializa – e não contrário! Pois é nesses momentos, no auge desses processos, que somos muitas vezes agraciados com “percepções” inconscientes que se transformam em cascatas de pensamentos (inconscientes) não-pensados, que nos revelam!

Sincronicidades, Ideogramas e cascatas de pensamentos não pensados

Somos também, ou podemos ser, agraciados nesses “fins de mundo” pessoais com os ideogramas de Bion e/ou com as sincronicidades de Jung. A sincronicidade, não raro, se apresenta naqueles pacientes que estão vivendo uma certa dissociação entre os opostos (consciente e inconsciente[4])   e, também, um trabalho de integração entre esses mesmos opostos, auxiliados por sonhos e pela função integradora, a função transcendente. Neles, a sincronicidade é vivência significativa e comporta, para Jung, a emoção, a emoção numinosa: terror e êxtase, como Rudolf Otto a definira. O momento é exceção: algo novo se impõe por meio da sincronicidade, algo não previsto pela cadeia da causalidade que repõe o mundo no sempre igual, no conhecido, no previsível. Jung chama os eventos sincronísticos de “atos de criação no tempo”, pois eles indicam que o indivíduo deve realizar algo constelado no inconsciente, seja uma nova ideia, seja um novo conhecimento. Nós diríamos que os eventos sincronísticos são atos de criação do tempo; e então, como súditos do tempo – aí sim! –, temos algo a fazer. Se nos mantivermos como analistas circuambulando em torno do self, as sincronicidades podem ser acontecimentos: algo que salta fora da linha do tempo, da história, da sucessão de fatos, da sua progressão.

Para Bion – aproximando-se de Jung, os pacientes que vivem uma espécie de barragem entre as duas partes da mente (a parte psicótica e a parte não psicótica)[5] esperam por  ideogramas.  Aguardam a ocorrência de fatos propícios para, então, de posse de um ideograma adequado, se valer da comunicação consigo mesmos e com os demais. Os ideogramas são fundamentais por que, para Bion, eles reparam o ego. Pergunto-me, porém, por que a personalidade como um todo, nos casos que atendi, não raro continuam fascinadas pelos ideogramas mesmo quando o ego já está restaurado. Não teriam essas pessoas encontrado uma linguagem outra, não verbal, não conceitual, e que, todavia, comunica? Pois isso que aí se revela é sui generis: não é algo esquecido, não tem nada a ver com o après coup, com o a posteriori. Os ideogramas são linguagem típica da parte psicótica da mente ou do inconsciente bioniano. Essa parte da mente é pré-verbal e não é acessível às interpretações. Então, os que têm a sensação de aprisionamento, em função da barragem a que aludimos antes, ficam atentos aos ideogramas que comunicam algo para a personalidade. Essa chave bioniana, dos ideogramas, é memorável, pois está a me indicar que essa parte da mente, muito mais próxima do registro ontológico[6] que a parte não psicótica, que por definição alcançou a realidade compartilhada, a linguagem e o pensamento pensado, tem algo a nos dizer na clínica, tem algo a ser valorizado e, como uma das minhas pacientes me ensinou, vale à pena “voltar os olhos para trás” – valendo-me de uma metáfora topográfica para as duas partes da mente – e não tirá-los de lá, na expectativa dessa escuta. É muito importante frisar que esses processos, os ideogramas, as sincronicidades ou as cascatas de pensamentos não pensados, sempre aparecem sob uma sequência – de tirar o fôlego – de sinais desconexos, de palavras soltas de um outro, de imagens, intuições, pensamentos que “nos assaltam”, associações absolutamente inesperadas e também sonhos, que de repente montam um sentido profundamente revelador sobre cada um de nós. Não raro é com essa linguagem não verbal, uma linguagem de sinais, que enfrentamos os “fins de mundo” pessoais e, então, fazemos a passagem  na vida que até então só sentíamos como mal-estar, como pressão, como angústia. E, claro, se estamos versados nessa linguagem, podemos praticamente recompor os vários sinais, as várias palavras des-conexas, e puxar o fio, montar um enredo absolutamente não previsto e não pensado, e fotografar o invisível.

Perguntas sem respostas

Outra forma em que essa linguagem não verbal se diz é quando estamos muito acuados por uma pergunta sem resposta. A pergunta sem resposta é uma espécie de ninho vazio, útero, container para que o processo se dê. No filme O jogo da imitação (The Imitation Game), o matemático Alan Turing, representado pelo ator Benedict Cumberbatch, que tem como tarefa obsessiva decifrar o código da Enigma alemão, formulou uma pergunta sem resposta – como decifrar o código? – e o diretor, Morten Tyldum, foi capaz de filmar seu brainstorm numa sequência alucinante de sinais desconexos.
O código Enigma, que parecia indecifrável, agendava os próximos ataques dos alemães, onde e quando os submarinos alemães atacariam os navios dos aliados, as próximas batalhas, toda a estratégia da segunda grande guerra mundial. Depois de trabalhar na “máquina de Turing” – chamada de Christopher e que viria a ser um dos primeiros computadores digitais – por dois anos, toda a equipe liderada pelo próprio Turing estava desolada. Eles estavam desacreditados e, com o tempo – a guerra deles é com o relógio! –, se esgotando, pois não mais seriam financiados e, provavelmente, seriam demitidos. Uma noite após intenso trabalho, vão a uma espécie de danceteria dos anos 40, na Inglaterra, mas Turing mantêm-se obsessivo e não abandona sua pergunta: como decifrar o código e encurtar a segunda guerra mundial? Na danceteria, uma garota encontrada ao acaso está tagarelando e brincando, dizendo que “namora” um alemão que ela nunca viu, simplesmente. A garota “encontrou” o pseudo namorado quando fazia a escuta dos alemães, uma escuta de outro tipo de código, que nada tinha a ver com a Enigma. Aliás, a garota nem sabe que a Enigma existe. Ora, um desses alemães, que ela frequentemente escuta, chamou a sua atenção ao começar todas as mensagens com a palavra ou o nome CILLY. As mensagens sempre começavam com o mesmo nome e, então, a mente de Alan Turing velozmente faz conexões com o seu quebra cabeça, o código da Enigma, observado e acompanhado durante anos, e… mata a charada, decifra o código. Busca agora, com Christopher, as mesmas palavras presentes nas poucas mensagens que sua equipe, às cegas, conseguira decodificar e bingo: decifra Enigma. Morten foi, então, capaz de fotografar o invisível. Como se sabe, a história é verídica e, com o deciframento do código alemão, Alan Turing apressa o fim da segunda guerra mundial.

Mas não precisa ser um gênio matemático para ter um brainstorm; um cliente/paciente teve um antes de chegar ao meu consultório que muito o intrigou. O brainstorm foi muito curioso porque, para esse estudioso do social marxista-racionalista, processos assim não poderiam acontecer, não estavam incluídos na agenda do pensar! Ora, ele tinha uma pergunta que o interpelava há anos, cuja resposta lhe permitiria sustentar uma tese bem difícil. Sem essa resposta, sua tese ficava incompleta, seu argumento, algo capenga, não “fechava”. Pois um certo dia, durante a madrugada, acordou e a resposta chegou. E ele, atropelado em si mesmo e por si mesmo, buscou sofregamente uma caneta e um papel e pode anotar o “que chegava”, perdendo muito, porém, do amontoado de ideias que não paravam de brotar, espécie de download, cascata de pensamentos não pensados.

III) Condições para o desenvolvimento das “percepções” e pensamentos inconscientes     

Penso que o mais instigante na psicanálise e na área psi como um todo é a escuta. Como escutar o que outro diz – de preferência de uma maneira solta, espontânea, livre. Vou citar três autores que me ensinaram muito sobre a escuta. Bion: o fato selecionado; C. Bollas: um espaço esvaziado, construído pela dialética do saber e do não saber; e Jung, ao propor a circumambulation em torno do Self.

A escuta na área psi – tal como a compreendo – não pressupõe, sempre ou basicamente, boas e inteligentes interpretações do analista. Os pacientes/clientes podem ser compreendidos em seu funcionamento psíquico, emocional, mental sem a construção de hipóteses interpretativas. A interpretação psicanalítica implica numa determinada concepção do tempo: passado/presente e futuro e esse é um grande problema! Qualquer interpretação na área psi está amarrada à flecha do tempo: quer nos convoque para o passado a partir do presente (Freud), liberando-o para o futuro; quer quando o presente não é remetido ao passado, mas ao futuro e, então, a uma ressignificação do passado (Lacan); quer quando o presente aparece tensionado entre o passado e o futuro. E, todavia, esses modelos mantêm a flecha do tempo e sua tripartição em presente/passado/futuro.

Como escapar da flecha do tempo? Como diz Peter Pál Pelbart, a transformação do mundo pressupõe a transformação da compreensão do tempo[7] e, nela e para ela, é preciso abrir mão da flecha do tempo!  

Na compreensão que tenho hoje, é preciso não ficar preso às interpretações, sempre devedoras da flecha do tempo, e dar mais ênfase à ideia de nomeação e de funcionamento. Como a pessoa funciona nos permite aprofundar o tempo, a temporalidade da pessoa, e então apreender os acontecimentos luminosos que a cada instante somos. É uma questão de ênfase e não de exclusividade, e confesso que me inspirei na esquizoanálise para pensar a ideia do “funcionamento da pessoa”, muito embora a psicanálise também se aproxime, nos autores citados, dessa noção.

O fato selecionado de Bion – que aprendi a escutar com um grande mestre da psicanálise, Ignácio Gerber – proporciona exatamente isso: como, por vezes, o paciente/cliente gira em torno de um ponto inconsciente a sessão inteira, a semana inteira, muito embora ele fale tudo que lhe vem à cabeça. Ofereço na clínica, através do fato selecionado, o funcionamento e deixo esse pensamento aberto o máximo que eu posso, porque estamos tão aferrados à flecha do tempo que, não raro, o paciente se encarrega de usá-la. Enfatizo o funcionamento muito embora, claro, também faça interpretações. Descrever “como a pessoa funciona” leva-a para um aprofundamento cada vez maior de seu tempo próprio e, com isso, as flechas do tempo começam a desabar e vemos, então, nascer pensamentos não pensados desse rizoma temporal[8].

Melhor não enfatizar as interpretações: mais radical ainda, é bom que o analista-intérprete seja desconstruído – e isso aprendi com Christopher Bollas em vários de seus livros e, particularmente, em Forças do Destino[9]. No lugar dele, há de surgir um analista portador de uma subjetividade, uma pessoa. Então, a dialética da diferença – a discordância do analista consigo mesmo quando se percebe equivocado em função da autoanálise e da contratransferência, a discordância do analisando com o analista, incentivada pelo próprio analista, e a discordância do analista com o analisando – cria dois sujeitos. Dois sujeitos no campo analítico, ainda que um deles seja o analista e o outro o analisando – e que por vezes transformam-se um para o outro em objetos de pensamento. Os lugares – do analista e do analisando – estão preservados na dialética da diferença muito embora não sejam, como na psicanálise ortodoxa, assimétricos. É nesse “entre – das discordâncias – que se abre a figura do não saber, mais precisamente do não saber inscrito no saber e do saber inscrito no não saber. Ora, só no cultivo da dialética da diferença isso é possível. Porque a dialética da diferença é sinônimo – e isto é uma percepção minha – do “mundo do entre”, e é no “mundo do entre” que o não saber habita.

Bollas nos ensinou a levar os pacientes para um lugar esvaziado através da dialética da diferença e é nesse lugar que nascem os pensamentos não pensados. Outro tanto poderíamos dizer de Jung e a ideia de circuambulation em torno do Self: já que nada sabemos do Self, mistério por excelência, o esvaziamento está inscrito na busca.    

Quando comecei a clinicar, obviamente não tinha essa compreensão da escuta, pois me valia das propostas dos grandes analistas, aprendia com eles o que era a escuta e o que significava o fim da análise. Fui, porém, tendo experiências com a escuta que foram firmando um caminho: a escuta pode abrir uma vereda para um lugar – esvaziado – em que pensamentos não pensados possam ser paridos por ambos os parceiros: analista e analisando. Aliás, é neste momento que, de fato, uma análise começa, quando este lugar esvaziado começa a comunicar percepções e pensamentos não pensados. A teoria da recepção de C. Bollas é o desenvolvimento da atitude adequada para que possamos receber do verdadeiro self emoções nascentes, sementes de pensamentos não pensados. Para chegar aí, porém, é preciso que a mente esteja esvaziada, tanto do analista quanto do analisando.

Nas primeiras fases da análise, a mente, a psique, não raro está sobrecarregada de vozes. Quem pensa em mim? Vozes nos assaltam sem cessar e podem ser vozes extremamente mortíferas, um superego atroz e ameaçador. Complexos de vários tipos: de inferioridade, de superioridade, de abandono, de rejeição. O filme aclamado Birdman (A inesperada virtude da ignorância), do diretor Alejandro González Iñarritu, vencedor do Oscar em várias categorias, narra a história de um ator, Riggen Thonsom (Michael Keaton), célebre por interpretar um super-herói, o Birdman. Ao longo do filme, Riggen tenta uma mudança profissional: quer fazer arte e não mais apostar na “solução certeira”, filmando outro Birdman – Birdman 4,  e luta para montar uma peça na Broadway (peça de Raymond Curver, sobre o amor).

Toda a peça se passa praticamente nos bastidores do teatro, metáfora preciosa do inconsciente dos seus atores. Lá, nos bastidores, a luta intestina entre Riggen e Mike Shiner, que despreza Riggen como ator, já que é uma celebridade que se recusa a continuar celebridade e que luta para ser um artista verdadeiro. Também a poderosa crítica de arte o despreza. O que Alejandro encena e filma para nós é a mente ou a psique do ator – bastante povoada, diga-se de passagem – e nela vemos seu superego em ação e o vil sofrimento de seu ego, quando enfrenta essa voz mortífera que quer levá-lo à morte. Vemos o próprio Birdman, seu personagem, tornado ele também parte vital e ativa de sua mente, querer voltar à vida e da mesma forma ameaçar seu ego – uma espécie de ideal de ego. O ideal de ego – diferentemente do ego ideal[10] – é discutido por S. Freud no segundo modelo do aparelho psíquico. E ele o vê como componente do superego e herdeiro das exigências narcísicas dos pais.

Um ego frágil, o ego do ator que representa o Birdman e que não tem forças para livrar-se das vozes mortíferas: quer do seu algoz, o superego, quer do personagem, que, uma vez encenado, não desiste de voltar à vida – seu ideal de ego. É possível perceber dois movimentos oscilantes na mente de Riggen: fantasias extraordinárias de poder são seguidas de fantasias de impotência, fracasso, incapacidade.

O ator também se divide – divide sua contraditória e atormentada mente – entre o pai, o amante e o profissional. Parece que ele “nunca está e/ou esteve lá” de fato. E dá-lhe tormento. Alejandro G. Iñarritu também conseguiu fotografar o invisível, e como fotografou bem. Nas últimas cenas do filme, o ator transforma a opressão em realidade, confundindo para nós, expectadores, realidade e ficção. Exatamente esta diferença é anulada neste filme, que prima pela metalinguagem. Dá um tiro verdadeiro em si mesmo, não sem antes dizer: “Eu não existo, eu realizei todos os seus desejos”, diz ele referindo-se à sua mulher, “e não sei quem sou”. Dá um tiro em si mesmo, para deleite e aplausos da crítica de arte, que agora lê em Riggen um “recomeço do teatro americano”, e compreendemos, então, o subtítulo do filme: inesperada virtude da ignorância.

Uma mente/ psique atormentada pode seguir atormentada até o fim. Riggen conquistou os aplausos e a visibilidade que ansiava e, curiosamente, isso nada significa para ele, aprisionado que está no movimento oscilante da sua psique: para cima e para baixo, fantasias de poder e fantasias de fracasso. Essa oscilação, infelizmente, é sua única verdade!

Quando Riggen se joga da janela do hospital, sua filha primeiro olha para baixo e depois para cima, acompanhando imageticamente a psique do seu pai, que se movimentava exatamente assim: “não sou nada, sou um fracassado”, e em seguida, “sou o máximo, a celebridade máxima, Birdman, sou Deus e movo os objetos, movo e comando o mundo!”. Riggen, na compreensão da sua ex-mulher, confundiu amor com admiração. Queria e lutava por visibilidade acreditando que assim seria amado. Não é isso que todos nós queremos: ser amados? Como conquistar esse bem precioso é a pergunta de Alejandro Iñarritu.  Não é, porém, este ego frágil e atormentado que pode ter um brainstorm!

Fora do consultório e quando a mente está esvaziada, o brainstorm também acontece. Se a mente está atropelada por ladainhas de falas repetidas, ameaçadoras, castradoras etc, os pensamentos não pensados jamais acontecem, é preciso uma mente vazia para que tal se dê. E aí, meus senhores, os sinais se somam: uma flor, uma abelha, uma palavra vão te remetendo a um cem números de outros sinais e a linguagem não verbal acontece, porque, de fato, a mente está grávida e a parturição se impõe. Talvez porque uma pergunta tivesse se imposto sem que percebêssemos. Pensamentos não pensados reveladores são sempre acompanhados de emoção – de uma emoção numinosa, nas palavras de Jung, e/ou de uma emoção criadora, na visão de Jean Jacques Rousseau. E o que é mais incrível: quanto mais  cultivamos a mente vazia e silenciosa, mais as cascatas de pensamentos não pensados se oferecem a nós, como se elas também tivessem sede de mundo.

IV)Jean Jacques Rousseau, F. Nietzsche e  Fernando Pessoa

Na filosofia e na poesia, três acontecimentos são muito famosos: a emoção criadora de Jean-Jacques Rousseau, o Dia Triunfal de Fernando Pessoa e a inspiração de F. Nietzsche.

Estamos por volta da metade do século XVIII e Jean-Jacques Rousseau caminha em direção a Vincennes para visitar, na prisão, seu amigo Diderot. Rousseau tem uns 37 anos e ainda não ganhara nenhuma projeção intelectual. Amigo de alguns enciclopedistas, limita-se a escrever alguns verbetes de música para a Enciclopédia. É preceptor e, de fato, nada escrevera que o notabilizasse. Rousseau, porém, tem uma pergunta e essa pergunta exigia uma resposta:

“Ia ver Diderot, então prisioneiro a Vincennes; tinha em meu bolso um exemplar de “Mercure de France” que me pus a folhear ao longo do caminho. Defronto-me com a questão da Academia de Dijon que deu lugar a meu primeiro escrito. Se jamais qualquer coisa assemelhou-se a uma inspiração súbita, foi o movimento que se fez em mim durante tal leitura; de repente sinto meu espírito cegado por mil luzes; multidões de ideias vivas apresentaram-se de uma só vez com tamanha força e confusão que me jogaram numa desordem inexprimível; sinto minha mente tomada por uma vertigem semelhante à embriaguez. Uma violenta palpitação oprime-me, subleva meu peito, e sem mais poder respirar caminhando, deixo-me cair sob uma das árvores da avenida, e ali passo uma meia hora em tamanha agitação que ao levantar-me notei toda a fronte do meu paletó molhada por minhas lágrimas, sem ter sentido que as havia vertido. Oh Senhor[11], se jamais eu tivesse podido escrever um quarto do que vi e senti sob aquela árvore, com que clareza teria revelado todas as contradições do sistema social, com que força teria exposto todos os abusos de nossas instituições, com que simplicidade teria eu demonstrado que o homem é naturalmente bom e que é somente por intermédio dessas instituições que esses homens se tornam maus. Tudo o que pude reter dessas multidões de grandes verdades que em um quarto de hora iluminaram-me sob aquela árvore, foi muito fracamente disperso pelos meus três principais escritos, a saber este primeiro discurso, aquele sobre a desigualdade e o tratado de educação, três obras que são inseparáveis e que formam juntas um mesmo todo”[12]

Foi a pergunta da Academia de Dijon – as ciências e as artes melhoram ou pioram moralmente o homem? –, com grande probabilidade uma pergunta implícita e ainda não formulada por Rousseau: uma pergunta pulsante que ainda não ganhara palavras. Pois foi essa pergunta, dizíamos, que desencadeou o que depois ficou conhecido na literatura sobre Rousseau como emoção criadora. Destaco, nesse processo de inspiração súbita, algumas questões: 1) A multidão de ideias que aflorou é muito mais forte do que o filósofo pode apreender; 2) Foram necessários alguns sinais para desencadeá-las: a prisão de Diderot, o sugestivo caminho de Vincennes, a pergunta da Academia de Dijon, publicada no Mercure de France, e a leitura desprevenida e ao acaso que Rousseau foi fazendo; 3) Ele está nos contando isso depois de mais de uma década (Lettres a Malesherbes) e voltará ainda a narrar o que lhe aconteceu a caminho de Vincennes nas Confissões e no diálogo Rousseau juiz de Jean-Jacques. Muitos anos se passaram do que lhe acontecera e, todavia, ele ainda está emocionado e, com clareza, grato; 4) Rousseau chora de emoção e cá e lá consegue transformar os pensamentos ainda não pensados, a avalanche de ideias que o acometera, em chaves fundamentais de sua obra. Reveste, então, a emoção com palavras e formula aquela que será central: o homem nasce bom e a sociedade e as instituições o corrompem. Com essa chave, Rousseau escreveu toda a sua obra (Discursos sobre as Ciências e as Artes, Contrato Social, Emílio, Discurso sobre a Desigualdade etc) tornou-se um dos mais importantes filósofos da modernidade e, com certeza, mudou o mundo. Para o bem e para o mal, o mundo tal como o conhecemos não existiria sem ele! Mais precisamente, o mundo tal como o conhecemos não existiria sem a emoção criadora.
Abismo de felicidade: F. Nietzsche

Um grande filósofo no final do século XIX nos ofereceu também uma compreensão do que significa a inspiração – assim denominada pelos poetas de épocas poderosas. Refiro-me a F. Nietzsche. Ele também experienciou a inspiração – próximo à emoção criadora, à emoção numinosa, ao brainstorm dos pensamentos não pensados, que desde o início desta postagem estamos discutindo. Perceba o leitor que Nietzsche descreve a inspiração em Ecce Homo quase nos mesmos termos que nós estamos fazendo desde o início. A ideia de revelação, de êxtase, que simplesmente acontece – “ouve-se, não se procura”, um abismo de felicidade –, no qual a dor,  o lúgubre, se misturam com a superabundância de luz. Acontecimento involuntário que se casa com sentimento de liberdade, de indeterminação, de poder, de divindade, porta-voz de forças superiores (que na nossa terminologia é o Ó de Bion, o self de Jung, o verdadeiro self  de Bollas). Vamos ao Ecce Homo:

…”Se porventura se conserva o mínimo vestígio de superstição, seria difícil rechaçar de fato a ideia de ser mera encarnação, mero porta-voz, mero médium de forças superiores. A noção de revelação, no sentido de que subitamente algo, com uma indizível certeza e sutileza, se torna visível e audível comovendo as profundezas, descreve simplesmente a realidade dos fatos. Ouve-se, não se procura; toma-se, não se pergunta quem dá; um pensamento brilha como um relâmpago, com necessidade, sem vacilação na forma – eu pessoalmente nunca tive que escolher. Um êxtase, cuja tensão se resolve às vezes em lágrimas, no qual algumas vezes o passo se precipita involuntariamente e outras vezes se torna lento; um estado de completo êxtase com a consciência claríssima de um ilimitado número de tremores e estremecimentos delicados que chegam até os artelhos; um abismo de felicidade, no qual o mais doloroso e o mais lúgubre não constitui uma contradição, mas é uma consequência exigida, um elemento indispensável, um matiz necessário no meio de tal superabundância de luz; um instinto das relações rítmicas que se estende sobre vastos espaços de formas – o comprimento, a necessidade de um ritmo amplo, é quase o critério do poder da inspiração, espécie de compensação de sua pressão e de sua tensão. Tudo acontece de maneira involuntária, mas junto com uma tempestuosa sensação de liberdade, de indeterminação, de poder, de divindade. (…) Esta é a minha experiência da inspiração; não duvido de que se tenha que recuar milênios para encontrar alguém que me diga ‘é também a minha’.”[13]

O Dia triunfal de Pessoa   

Não são poucos os críticos que perguntam se o “dia triunfal” de Fernando Pessoa foi mais um ato de fingimento do poeta: verdade ou encenação? A pergunta é supérflua, a meu ver. Em janeiro de 1935, Pessoa escreve uma extensa carta ao seu amigo e crítico literário Adolfo Casais Monteiro, contando-lhe como nasceram os heterônimos – Caieiro, Campos e Reis – e dando o seu testemunho sobre o porquê desses nascimentos. Acontece que o “dia triunfal” acontecera em março de 1914, vinte anos antes da carta a Casais! – e esse dia jamais se repetiria. Casais nos conta suas primeiras impressões: “ficamos atônitos, maravilhados e confusos” ao ler a carta!

Pessoa narra esse acontecimento como se tivesse sido muito recente. Casais publica a carta no número 49 da revista Presença, em 1937, e considera-a, sendo o primeiro a comentá-la: “uma obra excepcional”.  Verdade ou mentira? Simplesmente, a questão não se coloca, porque o que vou descrever não se esquece jamais! A imagem de Pessoa encostado à sua cômoda alta (que ainda resiste no primeiro andar da sua casa), escrevendo pela noite adentro em jactos que não cessavam, jactos esses que serviriam de conduta para o nascimento de Caeiro, Reis, Soares… Jactos esses que lhe permitiram escrever 30 e tantos poemas a fio, de o Guardador de Rebanhos: “acerquei-me de uma cômoda alta, e tomando um papel, comecei a escrever de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei descrever”. Essa é certamente uma imagem que ajudou a firmar o nome de Fernando Pessoa no universo da literatura portuguesa, europeia e mundial[14].

Várias teorias surgiram para explicar o dia triunfal quando os estudiosos começaram a consultar o espólio do poeta: o dia triunfal foi uma realidade? Pura encenação? Um dia simbólico? Processo intencional para fazer de si mesmo um mito ou processo caótico de geração espontânea?

Quem vive processos assim, ainda que em pequena escala, pessoas normais e comuns narram algo que é preciso levar em conta: a pessoa já pensou muito em torno dos temas que brotarão como cascatas. Meu paciente racionalista e marxista pensara muito em torno dos temas que o atormentavam como pergunta e quando eu mesma tenho processos assim em pequeníssima escala é porque já me debrucei muito sobre partes do problema. Rousseau, quando é acometido pela emoção criadora, já tinha pensado muito sobre a desigualdade social: várias vezes ficara sem conseguir entrar na sua querida cidade natal, Genebra, porque encontrara as portas da cidade fechadas – naquela época as cidades tinham muros e portas! Já fora chamado de ladrão por cunhar moedas falsas. Sua mãe morrera de parto, do seu parto, e ele não pode contar com o amor do seu pai que amava a sua mãe e o abandonara na sua cidade natal. Rousseau tivera experiências terríveis de sofrimento e conhecia muito bem o que viria a chamar de desigualdade social, cuja chave é o empalidecimento da pitié. Quem melhor que ele experienciara isso?! E, então, quando ele é acometido pela emoção criadora, obviamente tinha já vivido tudo isso via experiência corporal, via emoção. A emoção criadora a caminho de Vincennes é, todavia, um acontecimento: por ela e através dela, pensamentos não pensados se dão e o acometem como cascatas de pensamentos de uma forma nova – mas, claro, a partir de um universo emocional e mental que lhe pertencia. Quem não compreender isso, não compreende do que estamos falando. A ideia que a emoção criadora e/ou o dia triunfal é geração espontânea fora de qualquer container é simplesmente absurda. Há, porém, quem o faça! Críticas a respeito do dia triunfal de Pessoa como encenação afirmam algo sem saber do que estão falando: “… Existe ainda quantidade considerável de ‘documentos intermediários’, rascunhos iniciais e medianos, passagem a limpo de poemas e emendas finais, que deitam por terra a ideia de Pessoa ter escrito uma grande porção do livro num único dia” – rascunhos com datas díspares não coincidentes com a do “dia triunfal”[15]. Quem  assim pensa, não só não tem a experiência que discutimos nesta postagem como provavelmente jamais a terá. Não compreende simplesmente do que se trata essa experiência.
E, quando pensamos Pessoa infelizmente nos deparamos com o besteirol dos críticos sobre astrologia – Raphael Baldoya é seu heterônomo como astrólogo. Muitas vezes os críticos não tem nenhuma ideia sobre astrologia e  leem  essa arte milenar sob a luz de pré-conceitos modernos e, então, descarregam sobre nós leitores, pobres leitores, uma nauseante interpretação astrológica que beira o delírio. Algo assim se dá também em relação ao dia triunfal,  interpretado por críticos  que também não tem e não compreendem o que é escutar e acolher pensamentos não pensados de maneira involuntária.

É também a minha!

E para acabar este escrito, volto à minha experiência. A maior parte das postagens deste blog são acontecimentos dessa ordem: elas simplesmente “chegam” e, depois que “chegam” inteiras, eu faço alguma pesquisa e ponho notas de rodapé e fico muito emocionada durante a escrita. Depois, quando a releio, eu aprendo algo que não sabia, mas estava latente, faltavam palavras para o meu não saber que tinha sede de mundo.  Para mim, essa experiência é da ordem do sagrado.
           
  Dedico esta postagem ao psicanalista bioniano Ignácio Gerber; esta postagem não existiria sem o seu livro Sessão de Histórias que eu comentei neste blog sobre o título A palavra inacabada de Ignácio Gerber.     

[1] CASSIANO. Marcella. FURLAN. Reinaldo. O processo de subjetivação segundo a esquizoanálise”, p.372/ 2013. Pdf/Internet.

[2] BARROS. Manuel. Ensaios fotográficos. R.J. Editora Record, 2000.

[3] Percepções é um termo adequado para a consciência e por isso uso-o entre aspas querendo indicar com isso uma certa “consciência no inconsciente”.

[4] E também entre pensamento/sentimento; intuição/sensação; extroversão/introversão.

[5] Essa divisão, em Bion, entre a parte psicótica e a parte não psicótica da mente, é comum e esperada em qualquer pessoa. Portanto, nada tem a ver com a psicose psiquiátrica, antes, refere-se às posições de Melanie Klein: PED (posição esquizoparanóide) e PD (posição depressiva). Bion pensa que a saúde mental e a criatividade estão ligadas a uma relação dinâmica entre as duas partes da mente. O problema se põe quando há uma barragem entre elas.
BION. W. R. ” Uma Teoria sobre o Pensar”.Estudos Psicanalíticos Revisados ( Second Thoughts). R.J.: Imago, 1994.
WOLFF. Angelica; CARVALHO. C. V. de’; COSTA. Paulo José. “A psicose do cotidiano: algumas contribuições de W. R. Bion para pensar a clínica contemporânea. Anais V CIPSI – Congresso Internacional de Psicologia. Psicologia: de onde viemos, para onde vamos. Universidade Estadual de Maringá.
SAPIENZA. A. “Uma Leitura Psicanalítica de Bion: cinco tópicos clínicos”. Revista Brasileira de Psicanálise,  1992. 26(3), 301-312.

[6] O registro ontológico está “para além” do imaginário e do simbólico.

[7] Conferência de Peter Pál Pelbart. O que é o Contemporâneo? – Barco/ Pinheiros, 29/12/2014

[8] A expressão é de G. Deleuze e F. Guatarri, presente no primeiro capítulo dos Mil Platôs. O termo rizoma, presente em maior ou menor grau em qualquer relação ou estrato, se opõe ao modelo da árvore; rizoma é modo de proliferação vegetal, proliferação de redes: diferente de linha, não tem começo, meio e fim,  não é central, nem periférico; outra topologia que impõe outro pensamento entre dentro e fora; começo/meio e fim; centro e periferia; sequência. Qualquer ponto pode se acoplar com qualquer outro. Um rizoma temporal des-faz a ideia de uma história; permite navegar de outra maneira na história, no tempo. Conferência de Peter Pál Pelbart, O que é o contemporâneo? já citado.

[9] BOLLAS. Christopher. “Muro e as interpretações”. Forças do Destino – psicanálise e idioma humano. R. J. Imago, 1992. A tradução deste importante livro é péssima e o melhor é lê-lo em inglês.

[10] Ego ideal é a imagem da perfeição narcísica e da onipotência. Momento em que a criança se sente em plena realização com a mãe, complementa-a e não precisa de mais nada. O ideal de ego, pelo contrário, é um conjunto de designações. Momento difícil que a criança descobre que não é absoluta, que existe o pai e que este é forte e poderoso.

[11] Rousseau está a referir-se a Malesherbes.

[12] ROUSSEAU. J.J. “Lettres a Malesherbes”. In: Oeuvres Complètes, Bibliotèque de la Pléiade, Gallimard, 1959, v. I,  p.1135/1136,  tradução e grifos nossos.

[13] NIETSZCHE. F. Ecce Homo. Paráfrafo 3 do aforisma VI, Livro 3. S.P. Ed. Escala, 2008 – grifos nossos.

[14] HIPÓLITO. Nuno. Pdf/ internet. 2007-2014. O autor em questão tem uma “compreensão original” sobre Fernando Pessoa e não se compromete com as interpretações aqui apresentadas.

[15] Comentário de Nuno Hipólito. op. cit. sobre críticos que afirmam que o “dia triunfal” foi uma encenação.

Fonte: Ponto de Vista

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