PICICA: "Na
Bruzundanga de Lima Barreto (aviso que qualquer semelhança NÃO é mera
coincidência), o financeiro/economista acredita que o decréscimo
populacional solucionaria problemas econômicos, os políticos creem-se
feitos de carne e sangue diferentes dos meros mortais e os “pistolões”
garantem o sucesso dos escritores.
Lima cultuou esse humor corrosivo, que o levou a escrever o livro, de
experiências próprias como jornalista e da proximidade com a elite
intelectual da época, sempre disposta ao descarado puxa-saquismo para
ascender socialmente."
Curtas na curva
Diretamente da Bruzundanga de Lima Barreto
por Fernando do Valle
Lima cultuou esse humor corrosivo, que o levou a escrever o livro, de experiências próprias como jornalista e da proximidade com a elite intelectual da época, sempre disposta ao descarado puxa-saquismo para ascender socialmente.
A política
“A política não é uma grande cogitação de guiar os nossos destinos; porém, uma vulgar especulação de cargos e propinas”.
(trecho de Os Bruzundangas)
Em tom satírico, Lima desanca a oligarquia de doutores que
dominava a política, “pobres e ricos corriam” em busca dos títulos de
advogado, médico e engenheiro, o que lhes assegurava “certos privilégios
e regalias”.A primeira edição de “Os Bruzundangas” foi lançada em 1922 (ano da morte de Lima). No livro, o escritor escancara os vícios da República Velha (1889-1930), e que infelizmente continuam atuais na Nova (ou Sexta) República, iniciada após a ditadura militar. O livro é narrado por um visitante das plagas bruzundanguenses que divide sua percepção em capítulos temáticos como “Um grande financeiro”, “O ensino na Bruzundanga”, “A sociedade” etc.
Leia alguns trechos do livro:
“Que financeiro!”
Financista elegante e estudioso dos
mecanismos financeiros do velho mundo, Dr. Karpatoso foi convocado pelo
governo para solucionar o déficit de Bruzundanga, quebrou a cabeça e
três dias depois, elaborou a proposta: “aumentava do triplo a taxa sobre
o açúcar, o café, o querosene, carne-seca, o feijão, o arroz, a farinha
de mandioca, o trigo e o bacalhau além de outros aumentos”. O
governante Idle Bhras de Grafofone e Cinema exultou: “Que financeiro!”.
Um deputado objetou: “Vossa excelência quer matar de fome o povo da
Bruzundanga”. Karpatoso responde: “Não há tal; mas mesmo que viessem a
morrer muitos, seria até um benefício, visto que o preço da oferta é
regulado pela procura e, desde a procura diminua com a morte de muitos, o
preço dos gêneros baixará fatalmente.”
Os políticos
“É que a vida econômica de Bruzundanga é toda artificial e falsa nas suas bases, vivendo o país de expedientes.
Entretanto , o povo só acusa os políticos, isto é, os seus deputados, os seus ministros, o presidente, enfim.
O povo tem em parte razão. Os seus
políticos são o pessoal mais medíocre que há. Apegam-se a velharias, a
coisas estranhas à terra que dirigem, para achar solução às dificuldades
do governo.
A primeira coisa que um político de lá
pensa, quando se guinda às altas posições, é supor que é de carne e
sangue diferentes do resto da população.
O valo de separação entre ele e a população que tem de dirigir faz-se cada vez mais profundo.
A nação acaba não mais compreendendo a
massa dos dirigentes, não lhe entendendo estes a alma, as necessidades,
as qualidades e as possibilidades”.
Pobres x ricos
“A inteligência pobre que se quer
fazer tem de se curvar aos ricos e cifrar sua atividade mental em
produções incolores, sem significação, sem sinceridade, para não ofender
seus protetores. A brutalidade do dinheiro asfixia e embrutece as
inteligências”.
“Sobre os literatos
— Quantas cartas tem aí! — disse-lhe eu ao vê-lo abrir a carteira para tirar uma nota com que pagasse a despesa.
— São “pistolões”.
— Pra tanta gente?
— Sim; para os críticos dos jornais e das revistas. Não sabes que vou publicar um livro?”
Fonte usada: “Os bruzundangas”, de Lima Barreto (editora Martin Claret).
Sou blogueiro e jornalista. Pai de Lorena, santista e obcecado por literatura, cinema, música e política.
Fonte: ZONACURVA
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