PICICA: "O movimento socioambiental SOS Encontro das Águas, que nasceu
no interior da Universidade do Estado do Amazonas, quando tive a honra
de ocupar o cargo de Pro-Reitor de Extensão (2007-2010), não tem dúvida
sobre os interesses em jogo: de um lado os que fazem a defesa popular
contra o capital predatório, e do outro os que operam a favor deste.
Construir um terminal portuário nas imediações de um importante
patrimônio natural, seja do ponto de vista paisagístico, geológico,
cultural ou arqueológico (estão a viajar pelo mundo as fotografias de
Valter Calheiros sobre os desenhos rupestres achados recentemente na
região das Lajes, a mesma onde desovam os jaraquis, peixe da culinária
popular), só poderia merecer o mais veemente repúdio da parte de quem
defende a posição republicana-participativa,
que entende que bem comum é produção de discurso entre cidadãos livres e
iguais." (Rogelio Casado)
Nota de desagravo, em defesa do tombamento do Encontro das Águas
Foto: Valter Calheiros
PICICA: O arqueólogo Eduardo Góes Neves, professor da Universidade de
São Paulo (USP) e da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) foi alvo
de argumentos reacionários (aqueles que querem neutralizar os efeitos de
uma mudança: o povo não é mais passivo) de um articulista do jornal
Amazonas em Tempo (reprodução abaixo), com a intenção
de desqualificar o parecer que fundamentou o tombamento do Encontro das
Águas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN), postado anteriormente aqui neste blog. Ao tentar atingir o
ilustre professor com a suspeita de trabalhar por encomenda, impossível
não reconhecer neste gesto uma projeção mental do modo como opera o
acusador. O movimento socioambiental SOS Encontro das Águas, que nasceu
no interior da Universidade do Estado do Amazonas, quando tive a honra
de ocupar o cargo de Pro-Reitor de Extensão (2007-2010), não tem dúvida
sobre os interesses em jogo: de um lado os que fazem a defesa popular
contra o capital predatório, e do outro os que operam a favor deste.
Construir um terminal portuário nas imediações de um importante
patrimônio natural, seja do ponto de vista paisagístico, geológico,
cultural ou arqueológico (estão a viajar pelo mundo as fotografias de
Valter Calheiros sobre os desenhos rupestres achados recentemente na
região das Lajes, a mesma onde desovam os jaraquis, peixe da culinária
popular), só poderia merecer o mais veemente repúdio da parte de quem
defende a posição republicana-participativa,
que entende que bem comum é produção de discurso entre cidadãos livres e
iguais. Não são os representantes dos "bourgeois" privados que tem o
costume de se orientar para o bem comum, mas os "citoyens",
politicamente virtuosos, que tem os interesses subordinados à soberania
popular. Certamente, estes dois campos são marcados por atos lutúrgicos
diferentes. O movimento SOS Encontro das Águas, por amor à verdade, vem
desconstruindo os argumentos falaciosos dos porta-vozes do privatismo
ensimesmado que põe em risco nossa "ecologia social". Quero dar apenas
meu testemuno sobre quem recusa o debate, na prática. A fotografia
abaixo (no qual o articulista mencionado, observa as lamentações de
outro defensor do capital predatório: "Você veio aqui só pra detonar
nossa reunião?") foi feita após o momento em que este blogueiro
"desmonta" um cenário onde se tentava praticar a domesticação de uma
audiência pública, suspensa por liminar da Promotoria Pública Estadual.
Logo após o comunicado da decisão judicial, a população da comunidade de
São Francisco, na margem direita do rio Amazonas, município de Careiro
da Várzea, fora submetida à condição de espectadores dos argumentos da
empresa em prol da construção do terminal portuário. Perguntei se
haveria direito ao contraditório. Diante do argumento de que só haveria
espaço para "esclarecimentos" da empresa, convidei os comunitários a se
retirarem, menos por infração contra a liminar mencionada, do que pelo
modo ignóbil com que os presentes estavam sendo tratados. Todos se
retiraram do local. O articulista, que acusa os intelectuais do
movimento popular de aversão ao debate, mais uma vez incorre numa
projeção mental de uma covardia moral que não nos diz respeito. Não
fomos nós que usamos da manipulação midiática, mediante campanhas
publicitárias de conteúdo duvidoso, tentando criar opinião pública sem
debate. O movimento popular foi a todas as instâncias onde se processava
o debate público, muitas vezes com nítidas desvantagens ao interagir
com interlocutores que não tem respeito por uma concepção radical de
cidadania, em que a pluralidade das comunidades éticas e associativas
disputam espaço na comunidade política, no enfrentamento entre os
discursos públicos institucionalizados e não institucionalizados.
Desqualificar o relatório do professor Eduardo Góes Neves e insistir em
falácias já desconstruídas, merece o mais veemente repúdio. E mais, é
agredir um movimento social que há dois anos trabalha na construção da
verdade que vem subtraindo da opinião pública os interesses que
sustentam a agressão ao Encontro das Águas, patrimônio da humanidade. A
luta continua.
Fonte: Rogelio Casado
Fonte: Rogelio Casado
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