agosto 05, 2015

Camus - O que é Filosofia? (RAZÃO INADEQUADA)

PICICA: "Para Camus, filosofar é encontrar um sentido para a vida, é responder à pergunta: “Afinal, a vida vale a pena ser vivida? É digno viver?“. A filosofia é uma busca pela sensibilidade perdida, é um caminho traçado do nada ao sensível, da morte à vida. Seus atalhos são pelos sentidos: abrir caminhos, renovar o campo do possível. Se Camus não filosofa, apenas fala do que viveu, é porque ele, mais do que muitos outros pensadores, conquistou uma existência verdadeiramente filosófica." 

Não sou filósofo, só sei falar do que vivi” – Albert Camus
À pergunta ‘O que é um filósofo?’, muitas pessoas logo responderiam: é um homem isolado em seu quarto abafado, lendo e escrevendo, tendo pensamentos abstratos, descolados do cotidiano. Lá fora o sol brilha, lá dentro, separado por uma pesada cortina, o filósofo pensa. Albert Camus é em prosa, poesia e filosofia o contrário desse paradigma. Filosofou como ninguém. Através de suas cartas, peças de teatro, artigos para jornais, romances podemos vemos uma filosofia que não se retrai, que se expande, que vai em direção à luz. É como filósofo que viveu e como vivente que filosofou.
Não se separar do mundo. Não se desperdiça a vida quando ela é conduzida sob a luz” – Albert Camus, Cadernos 1935-1937
Para Camus, filosofar é encontrar um sentido para a vida, é responder à pergunta: “Afinal, a vida vale a pena ser vivida? É digno viver?“. A filosofia é uma busca pela sensibilidade perdida, é um caminho traçado do nada ao sensível, da morte à vida. Seus atalhos são pelos sentidos: abrir caminhos, renovar o campo do possível. Se Camus não filosofa, apenas fala do que viveu, é porque ele, mais do que muitos outros pensadores, conquistou uma existência verdadeiramente filosófica.

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O filósofo não justificará a realidade, este é o trabalho que cada um deve fazer para si, mas cabe ao pensador ampliar o campo do real, mostrar que a vida pode ser mais e que, a partir daí, cada um pode encontrar seu caminho. Devolver ao homem a capacidade de amar, para que cada um encontre sua própria verdade no mundo, para que cada ser humano volte a ser capaz de criar. Camus apenas grita em nossos ouvidos que é possível a felicidade terrena. Sim, apesar da dor, da morte, do sofrimento, um dia de sol continua sendo um dia de sol e o mar continua lá. A amizade continua levantando homens caídos e o amor continua reconciliando.


Daí vem seu radical posicionamento contra a pena de morte: Camus coloca-se contra a morte e qualquer forma de opressão, coloca-se contra a tortura e tudo que faz a vida ser menos vida porque quando matamos um criminoso, matamos também um homem, um ser vivo, um ser humano, tudo se vai com o ato de matar. Jamais cometer um só para abreviar a vida. Muito pelo contrário, é necessário lutar para estar à altura da vida. Mesmo vivendo em um mundo de guerras e sofrimentos, é preciso, em algum momento, começar a viver.


Por isso, para Camus, a filosofia deve ser uma luta constante contra o fanatismo. Toda busca pela unificação, pelo fechado, hermético, racional, é, no fim das contas, terrorismo. Impor verdades ao homem, dar a ele uma verdade que não lhe pertence, isto é fanatismo. O filósofo amplia o campo das possibilidades, estende o campo do real, para evitar as tolices de fazer do todo um. O desejo de unificação vem do terror ao se presenciar o absurdo.
Numa esquina qualquer, o sentimento do absurdo pode bater no rosto de um homem qualquer. Tal como é, em sua nudez desoladora, em sua luz sem brilho” – Albert Camus, O Mito de Sísifo
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O Absurdo é apenas o ponto de partida, ele é tudo aquilo que ultrapassa nossa lógica, que nos supera e oprime com sua grandeza. Tudo que fica além de nós, o paradoxo, o indefinido, a contradição, é o Absurdo. Estamos sempre aquém. Somos olhos que confrontam o silêncio gritante da realidade. Vivemos este divórcio entre o homem e o mundo, a incapacidade de se adaptar totalmente, de se integrar, uma recusa a ser engolido. Encaramos de frente o espanto de ser, de estar jogado, perdido na existência.


O Absurdo não leva à morte, não é argumento de suicídio. Matar-se é confessar, é dizer “não dou conta”. Muito pelo contrário, se há motivos para viver é porque a própria vida dá sentido a si mesma, ela não precisa de argumentos. A vida merece ser vivida, e isto por ela mesma, se alguém vier justificar a vida por qualquer outro motivo, a existência será traída. Por isso é tão importante não fugir do Absurdo que é estar vivo. Em face disso, tudo que um homem quer é viver sem apelação. Não queremos ceder à ânsia de sermos abraçados por Deus. O homem absurdo se sabe condenado àquilo que deve terminar.

O homem absurdo não pode fazer outra coisa senão esgotar tudo e se esgotar” – Albert Camus, O Mito de Sísifo

Da sensibilidade do Absurdo, não podemos renunciar nem nos perder. É dela que nasce a revolta. Da sensibilidade à ação; do absurdo à revolta. Estes dois momentos estão diretamente relacionados, somente a Revolta permite ultrapassar o Absurdo, não para defini-lo, mas para não perder-se nele. Não é possível filosofar apenas no sem sentido, qualquer pensamento que se perca no Absurdo afunda em um jogo niilista de aforismos vazios. Toda filosofia precisa levar em algum momento à revolta, à ação.
Essa revolta é apenas a certeza de um destino esmagador, sem a resignação que deveria acompanhá-la” – Albert Camus, O Mito de Sísifo
Revolta como bússola. O mundo vive, todos vivem, como se não dessem conta disso, mas a revolta é esse grito: “vivemos sem perceber! É hora de viver! Já perdemos tempo demais!”. Amor pelo presente. Recusa da morte. Construir um presente para o homem é colocar-se ao lado dele no processo. Nos revoltamos quando um sentido foi encontrado. Quando sentimos que temos algum tipo de valor, quando nos recusamos a ceder mais um passo. Se a morte é um grande mal, é ela, ao mesmo tempo, que dá a possibilidade de grandeza do homem. Na morte, existe a possibilidade de revolta. Não uma revolta em busca da recusa, da negação.


Mas Camus não está falando de uma revolução (talvez de um devir-revolucionário). Camus não propõe uma Ditadura do Proletariado, nem coloca a conta da liberdade na história ou na dialética. Camus não era marxista (veja aqui). Eu me revolto significa, eu vivo!, mesmo com a morte, e apesar dela. É possível se orgulhar desta situação. A revolta nega tudo que nega o homem, nesta dupla negação há uma afirmação ao quadrado!


O revoltado amplia o campo do possível. Manter-se, sustentar sua revolta, apesar dos pesares, mesmo com tantas desculpas de virar a cara e esconder-se. O Homem Revoltado sai de sua solidão, sai do solipsismo, para encontrar o mundo. Passa a conjugar-se no plural: “Eu me revolto”, se torna, “nós nos revoltamos”.
Sentir o máximo possível sua vida, sua revolta, sua liberdade, é viver o máximo possível” – Albert Camus, O Mito de Sísifo
Camus aprendeu a filosofar com o espetáculo do absurdo e com a revolta. Uma reta é traçado entre os dois. Mas sua filosofia deu-se também nos romances que escreveu. Não ficar preso na filosofia, não ficar preso em problemas puramente intelectuais. É possível ser filósofo na literatura e romancistas também carregam consigo uma filosofia. A filosofia para Camus não é uma questão de vida eterna, e sim de eterna vivacidade. Escrever era sua maneira de mostrar que a vida é possível, que o absurdo é real e a revolta é necessária. O filósofo sabe ficar nu diante de si e da realidade porque não vive contra o mundo. Filosofar é sentir-se digno de viver, E Camus fez isso.
Um pouco de pensamento afasta da vida, mas muito pensamento, retorna a ela” – Albert Camus, O Mito de Sísifo

Fonte: RAZÃO INADEQUADA

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