julho 07, 2008

POESIA NA SARJETA, a reação dos poetas à destruição dos tótens

POESIA NA SARJETA, a reação dos poetas à destruição dos tótens

Nesta 3ª, 08/07, às 14h30 (mudou o horário; leia mensagem de rodapé), um grupo de poetas brasilienses e o artista plástico e mosaicista Henrique Gougon, farão um ato cultural público de protesto na parada de ônibus da 509/510 Sul, dirigido às autoridades da Administração de Brasília e do Governo do Distrito Federal. O ato é uma resposta dos artistas da cidade à destruição a marretadas, por funcionários da Administração de Brasília, há pouco mais de dois meses, dos tótens poéticos construídos por Gougon em 2004, a partir de versos de poetas locais. As obras haviam sido instaladas pelo próprio artista em vários pontos de ônibus da Asa Sul do Plano Piloto da Capital da República.

Estão convidados para assistir e participar do ato, além da imprensa local e nacional, escritores, atores, ativistas culturais da cidade, cineastas, diretores e atores de teatro, artistas plásticos e outros, assim como cidadãos e a vizinhança do local, inconformados e indignados com o desrespeito que sistematicamente vêm recebendo as manifestações popularares de arte da cidade, por parte do GDF.

Para o local do protesto, Gougon promete mais uma surpresa vinda de sua oficina de criação de mosaicos. Já que os tótens não puderam permanecer de pé, eles agora serão fixados na horizontal, aproveitando os buracos que o tempo deixou nos passeios públicos. "Só é possível derrubar o que está de pé. Ou serão capazes de derrubar...o chão?", indagam os poetas.

Eles explicam que essa nova forma de intervenção urbana pretende demonstrar o cuidado que os artistas têm pela cidade, uma vez que os novos painéis vão recuperar o piso danificado das calçadas. Ao mesmo tempo em que darão prosseguimento às homenagens aos poetas mais respeitados e queridos pela comunidade, agredidos por ocasião da derrubada dos tótens.

REAÇÃO E MANIFESTO DOS POETAS BRASILIENSES – Nesta terça-feira, 08/07/08, às 11h, na Parada de Ônibus da 509/510 Sul.


HISTÓRICO

OS TÓTENS POÉTICOS

A idéia de criação dos tótens poéticos surgiu há quatro anos, quando o jornalista e artista plástico Henrique Gougon, 61, que lidera o grupo Loucos de Pedra, dedicado à arte do mosaico, percebeu que corroídas e abandonadas placas de sinalização nas paradas de ônibus de Brasília poderiam servir de suporte para as intervenções urbanas do grupo.

Ele já havia instalado painéis de mosaico em paredes de lojas comerciais cedidas pelos proprietários, com homenagens a personalidades de Brasília e do Brasil, como o líder estudantil Honestino Guimarães (painel instalado em frente ao Bandejão da UnB), o educador Paulo Freire (no jardim do MEC, na Esplanada), JK (no Bar Brasília), entre outros. Para homenagear os poetas da cidade, usou as placas de sinalização como suporte. E assim surgiram os tótens poéticos. Entre os homenageados, os poetas Cassiano Nunes (que mesmo doente fez questão de participar da instalação), Angélica Torres Lima, Nicolas Behr, Eudoro Augusto e Fernando Mendes Vianna.

Os painéis se incorporaram à paisagem da cidade, e a melhor prova do apreço que o público tinha por eles e pelas figuras homenageadas é que nunca foram pichados ou depredados – até 2 de abril passado, quando os fiscais do projeto "Brasília Limpa", do Governo do Distrito Federal, alegando que as placas atrapalhavam o acesso aos ônibus, puseram abaixo as obras. Apenas os dois tótens que homenageiam a poeta Angélica Torres Lima escaparam da fúria dos fiscais, graças à intervenção do prefeito da quadra 510 Sul, onde os tótens estavam instalados no ponto de ônibus.


A REAÇÃO DOS POETAS

No dia seguinte, quando circulou a notícia da derrubada, começou uma intensa troca de e-mails entre os poetas brasilienses. Além de comentarem com tristeza e indignação a depredação dos painéis, organizaram uma reação ao que consideraram um ato ofensivo à memória cultural da cidade.

À reação uniram-se outras vozes, como a do editor de Política de O Estado de São Paulo e poeta bissexto Carlos Marchi, que morou 22 anos em Brasília ("atos contra a poesia devem ser tratados furiosamente, com a ira santa dos que fazem versos ou se abrigam sob eles... não afrouxem, não aliviem. Não se negocia com a liberdade de fazer arte – que nunca pode ter limites").

A escritora Vera Brant, pioneira de Brasília, amiga de JK e Niemeyer, indignou-se ao tomar conhecimento do ato ("Quem foi o imbecil que fez isso? Que barbaridade!"). Moradores condenaram a derrubada nos painéis nas colunas de cartas dos leitores dos jornais ("Que os responsáveis por esse ato de vandalismo sejam identificados e punidos. Essas obras eram patrimônio cultural de nossa cidade" - André e Cibele Andrade, Correio Braziliense, 6/04/08).

No meio do clima de indignação, os próprios poetas se manifestaram... poeticamente. O jornalista e poeta TT Catalão, por exemplo, disparou um e-mail ilustrado pela foto de um candango chegando para a construção de Brasília: "O plano só será íntegro/se o piloto for integral;/ se uma cidade precisa de metas,/ muito mais urgente/ seus poetas".

Outro poeta, o também jornalista Paulo José Cunha, diante da foto de Gougon juntando os cacos de suas obras destruídas, escreveu e distribuiu: "Mesmo que os cacos dos versos/escorram pelas sarjetas/ sempre há quem os recolha/ para plantar novamente/ (toda poesia é semente)/ Marretadas não abolem/ uma verdade maior/ versos nunca viram pó/ versos sempre viram pólen".

O PROJETO POESIA NA SARJETA

Desde o epísódio da derrubada, o artista Henrique Gougon pensava numa forma de reação ao ato de vandalismo. Ao caminhar pelas calçadas da Av. W-3, onde mora, percebeu que muitas delas estão danificadas, e teve a idéia de construir mosaicos capazes de ser afixados no chão, aproveitando os próprios buracos - uma forma de recuperar o piso dos passeios e prosseguir com as homenagens aos poetas candangos. Surgia aí o projeto "Poesia na sarjeta", cuja primeira obra aproveita exatamente o poema de P.J. Cunha,"Versos sempre viram pólen", para inaugurar essa nova forma de intervenção urbana.

Na mesma época em que ocorreu a derrubada dos tótens de Gougon, poetas e outros atores da cena cultural da cidade, como o cineasta Vladimir Carvalho, decidiram elaborar um manifesto a ser entregue ao Governador de Brasília, José Roberto Arruda. No manifesto, condenam com veemência a derrubada dos tótens poéticos; exigem sua reconstrução; reafirmam o caráter cultural das intervenções urbanas dos artistas da cidade e pleiteiam a institucionalização das manifestações póéticas, com a destinação de todas as paradas de ônibus para essa finalidade.

Depois de dois meses de tentativas infrutíferas de abrir espaço na agenda do governador, os poetas decidiram enviar o manifesto pelo correio. Ele então será lido e distribuído à imprensa durante o evento de instalação do primeiro painel horizontal, na próxima terça-feira.

PANO PRA MANGA

Paulo José Cunha, poeta homenageado com o Poesia da Sarjeta I, foi pego de surpresa pelo gesto de Gougon. Emocionado e grato, escreveu sobre o assunto mais um poema, transcrito abaixo.

Só pelo prazer maldito
Paulo José Cunha

Porque já tiveste sede
e andavas pelas paredes
um dia te confinaram
no fundo de uma prisão

Mataram García Lorca,
calaram a voz de Torquato,
sumiram com Maiakovski,
por escreverem palavras
que andavam de mão em mão.

Depois, juraram de morte
o autor de uns versos satânicos
que afrontaram o alcorão.

Fugiste para os botecos,
poesia marginal,
só os boêmios te ouviam
fugitiva, flor do mal.

Tu és feita de palavras
mais frágeis do que a brisa,
mas eles morrem de medo
só de ouvir o teu nome
pensam que és poderosa
e fazes revolução.

(será por isso que um dia
esmigalharam os tótens
que a mão sutil de Gougon
fez erguer na contramão?)

Agora moras no piso
da cidade que te acolhe
e apenas sentes os passos
do pedestre cidadão.
És a palavra mais pura
que alivia o dia-a-dia
na luta do ganha-pão.

Mas não te iludas, poesia!,
do jeito que as coisas vão
só pelo prazer maldito
de fazer calar teu grito
eles vão achar um jeito
e vão derrubar... o chão.
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Por conveniência editorial, já que os cadernos culturais fecham mais cedo, decidiu-se que o ato POESIA NA SARJETA, a reação dos poetas à destruição dos tótens, será realizado 3ª feira, 08/07,

às 11h!!!!!!!!!

na 509/510 sul.

Favor desconsiderar as mensagens anteriores.
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