janeiro 29, 2014

"O dilema diário de lidar com notícias e informações", por Carlos Castilho

PICICA: "O cidadão comum só agora começa a se dar conta da importância do trato da informação para uso pessoal. Ainda estamos vivemos a era da confiança cega, típica do período pré-internet. Mas os tempos mudaram e não dá mais para confiar numa única fonte de informação, por melhor que ela seja. É impossível saber tudo, logo sempre haverá algo desconhecido, o que nos leva à necessidade de pesquisar, conferir e aprender."

O dilema diário de lidar com notícias e informações

Por Carlos Castilho em 26/01/2014


Há 17 anos, o Observatório da Imprensa se propôs a oferecer ao público uma nova forma de ler jornais. Na época, foi uma decisão ambiciosa e visionária pois estávamos saindo de duas ditaduras: uma militar e outra da autocensura jornalística. Quase duas décadas depois, o novo jeito de ler jornais tornou-se numa virtual obrigação provocada pela necessidade de separar o joio do trigo no meio da avalancha informativa gerada pela internet.

Leitura crítica, contextualização, curadoria e observação da mídia deixaram de ser acessórios para se transformarem em ferramentas indispensáveis para todos nós, desde os que apenas desejam saber o que está acontecendo até os tomadores de decisões, profissionais liberais, educadores, funcionários e pesquisadores. Os riscos para quem não sabe lidar com a informação variam desde tomar a direção errada no trânsito até prejuízos milionários em projetos equivocados, sem falar no letal assassinato de reputações.

Lidar com a informação tende a se tornar uma disciplina obrigatória em qualquer processo de aprendizagem, pois este significa o contato com o novo e desconhecido, o que implica risco de erro ou fracasso. O que antes era uma recomendação para evitar ser enganado, agora é uma exigência compulsória para quem precisa reduzir ao máximo as consequências de erros por falta de informação adequada.

O tratamento da informação tornou-se uma indústria multibilionária conforme indicam o fenômeno dos Grandes Dados (Big Data) e os investimentos de empresas jornalísticas na digitalização de suas edições passadas. Os megabancos de dados lidam com volumes incomensuráveis de números, fatos, eventos e notícias, que só têm valor se forem filtrados conforme as necessidades e desejos do cliente, que hoje não tem mais tempo organizar informações e muito menos cacife financeiro para bancar decisões desinformadas.

O cidadão comum só agora começa a se dar conta da importância do trato da informação para uso pessoal. Ainda estamos vivemos a era da confiança cega, típica do período pré-internet. Mas os tempos mudaram e não dá mais para confiar numa única fonte de informação, por melhor que ela seja. É impossível saber tudo, logo sempre haverá algo desconhecido, o que nos leva à necessidade de pesquisar, conferir e aprender.

Quem lê jornal ou assiste à televisão, por exemplo, não pode mais tomar uma notícia ou informe de um correspondente no exterior como a materialização da verdade. Por melhor e mais competente que seja o jornalista é humanamente impossível esperar que ele transmita todos os detalhes da crise na Ucrânia ou sobre as razões do aumento da taxa Selic. É pedir demais, mas é justamente isso que a maioria dos leitores de jornais e telespectadores fazem todos os dias ao consumir notícias .

A nova realidade, baseada numa enorme diversidade informativa, mostra que o lógico seria tomar as notícias de jornais, reportagens de revistas e o conteúdo dos telejornais como uma fonte de informações entre várias possíveis e não como a nossa única referência. Parece obvio do ponto de vista teórico, mas na realidade não agimos assim. Na verdade, teríamos que situar os dados, fatos, eventos e notícias lidos, vistos ou ouvidos num contexto mais amplo para verificar sua credibilidade, exatidão, relevância e relação com o nosso quotidiano.

O problema é que isso toma tempo, o que inviabiliza a rotina da verificação para quase todos nós. Restam então duas alternativas: ação coletiva ou assumir a complexidade dos fatos, dados ou eventos. Ação coletiva significa trocar percepções e opiniões com outras pessoas para avaliar dados e informações. Muitas pessoas e empresas já fazem isso diante de situações complicadas. 

Assumir a complexidade da vida moderna significa incorporar na rotina pessoal a consciência de que não temos condições de captar toda a diversidade de percepções da realidade e que, portanto, nossas opiniões e posicionamentos são sempre relativos, ou seja, não somos donos da verdade e por isso não temos condições de impor nada a outras pessoas. As notícias captadas em jornais, revistas e telejornais devem ser avaliadas e comparadas com outras fontes.

Cada vez mais surgem ferramentas para nos ajudar a separar o joio do trigo em matéria de noticiário quotidiano. A maioria delas combina softwares e a ação de indivíduos chamados curadores, ou seja, pessoas que ajudam outras pessoas a fazer a triagem de dados e informações. Outros atuam na base das comunidades de curadoria em que integrantes compartilham notícias e recomendações.

Tudo isso indica que a informação por meio da imprensa tende a ser cada vez mais uma ação coletiva e social em vez de um ato solitário, de uma pessoa. Isto muda muito não só o nosso posicionamento diante da mídia como, principalmente, a forma como ela passará a produzir notícias. 

Fonte: Observatório da Imprensa

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