PICICA: "Cada vez mais são criados coletivos de
mídia alternativa ou independente, especialmente de 2013 para cá.
Costumam surgir a partir da crítica à concentração econômica e à
hegemonia conservadora nos meios de comunicação.
Em certo sentido, enquanto existem, são
eles essa própria crítica em seu necessário momento afirmativo, prático e
concreto. Ou seja, ao narrar os acontecimentos da vida sob outras
perspectivas (e a partir de outras preocupações), deixam claro os
estreitos limites ideológicos presentes na grande mídia como um todo.
Ao mesmo tempo, provam ser capazes de
chegar a resultados de excelente qualidade jornalística, estética,
informativa etc, mesmo sem todo o aparato produtivo dos grandes meios.
No entanto, após a empolgação inicial,
mais cedo ou mais tarde, todo coletivo chega ao dilema do financiamento
para se manter: editais, publicidade, prestação de serviços, doações,
crowdfunding, rifas, bingo?
É verdade que, com muita dedicação, dá
para se virar: banca o salário de um ou outro membro, remunera um ou
outro frila, compra um computador e, com sorte, consegue uma salinha
apertada em um prédio qualquer.
De qualquer forma, temos aqui um primeiro
grande entrave. Enquanto os governos perdoam dívidas fiscais e despejam
milhões nas grandes corporações de mídia mensalmente, a nós restam
algumas migalhas num salve-se quem puder típico da lógica liberal
empreendedora."
“Mídia alternativa” pra quê?
Por Matheus Lobo Pismel* – em colaboração especial para o Brasil em 5
Cada vez mais são criados coletivos de
mídia alternativa ou independente, especialmente de 2013 para cá.
Costumam surgir a partir da crítica à concentração econômica e à
hegemonia conservadora nos meios de comunicação.
Em certo sentido, enquanto existem, são
eles essa própria crítica em seu necessário momento afirmativo, prático e
concreto. Ou seja, ao narrar os acontecimentos da vida sob outras
perspectivas (e a partir de outras preocupações), deixam claro os
estreitos limites ideológicos presentes na grande mídia como um todo.
Ao mesmo tempo, provam ser capazes de
chegar a resultados de excelente qualidade jornalística, estética,
informativa etc, mesmo sem todo o aparato produtivo dos grandes meios.
No entanto, após a empolgação inicial,
mais cedo ou mais tarde, todo coletivo chega ao dilema do financiamento
para se manter: editais, publicidade, prestação de serviços, doações,
crowdfunding, rifas, bingo?
É verdade que, com muita dedicação, dá
para se virar: banca o salário de um ou outro membro, remunera um ou
outro frila, compra um computador e, com sorte, consegue uma salinha
apertada em um prédio qualquer.
De qualquer forma, temos aqui um primeiro
grande entrave. Enquanto os governos perdoam dívidas fiscais e despejam
milhões nas grandes corporações de mídia mensalmente, a nós restam
algumas migalhas num salve-se quem puder típico da lógica liberal
empreendedora.
Agora vamos imaginar que vivêssemos em
uma outra realidade, com políticas públicas de fomento minimamente
sérias voltadas à mídia alternativa. E que, em uma área como a região da
grande Florianópolis (1 milhão de habitantes), fosse possível existir
três coletivos com cinco profissionais remunerados de acordo com os
pisos das categorias, trabalhando com bons equipamentos em um ambiente
adequado, publicando diariamente materiais de qualidade em seus portais
de internet.
Será que dá para visualizar uma disputa
real com conglomerados como a RBS, a rede Globo? Até que ponto não
superestimamos nossa capacidade contra-hegemônica de luta através das,
tão em voga, narrativas, especialmente nas “redes”?
Mesmo nessa situação hipotética de
relativa profissionalização dos coletivos, a Globo continuaria detendo
propriedades cruzadas e dominando o consumo de informações não só na
internet, como também no rádio, nos jornais e revistas e nas TVs aberta e
fechada. As novelas e o futebol seguiriam sendo assistidas nos canais
de sempre. Os grandes meios seguiriam detendo a produção e, ainda mais
importante, a circulação dos conteúdos. Além da mesma envergadura para
fazer política e ditar a agenda nacional.
Por isso, se nos contentarmos em ser
apenas um instrumento auxiliar das mais diversas lutas, ou um simples
espaço (remunerado ou não) de convergência de jornalistas
desconfortáveis com a grande mídia, desperdiçamos nosso potencial
político de sujeitos diretamente interessados em avançar na luta pela
democratização da comunicação.
A mídia alternativa é importante,
necessária e realmente já mostrou ser capaz de incidir na conjuntura vez
ou outra. Mas fazê-la existir é só o primeiro passo (de outros
possíveis) depois da saída do conforto da crítica acadêmcia. O segundo, e
decisivo, está em articular esses coletivos na luta por mudanças
estruturais no sistema de telecomunicações no Brasil.
*Matheus Lobo Pismel é jornalista do Coletivo Maruim e coautor do livro “Colômbia: movimentos pela paz” (2014).
Fonte: Brasil em 5
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