PICICA: "No final da semana passada, após o
cancelamento – por questões de saúde – da participação do
intelectual-companheiro Stephen Graham no Seminário Internacional
“Cidades Rebeldes”, alguns companheiros-trabalhadores da Boitempo
Editorial (organizadora do seminário) convidaram integrantes de nosso
movimento para completar a mesa específica sobre “Polis, polícia:
violência policial & urbanização”, que compõe a sua programação
completa (Confira as mesas na íntegra aqui:).
Diante do convite de última hora,
durante o fim de semana nós do Movimento Independente Mães de Maio
meditamos e discutimos bastante, coletivamente, e decidimos não
participar deste Seminário Internacional pelas razões a seguir, as quais
também achamos importante tornar públicas (não apenas para os
inscritos e demais participantes do Seminário, mas também para a
reflexão de toda esquerda autônoma e anticapitalista)."
A rebelião não será gourmetizada
9 de junho de 2015
Crítica coletiva e pública à
realização do Seminário Internacional “Cidades Rebeldes”, organizado pela
Boitempo Editorial e o SESC São Paulo. Por Movimento Independente Mães de Maio
“Eu sou problema de montão / De carnaval a carnaval / Eu vim da selva / Sou leão / Sou demais pro seu quintal” – Racionais MCs em “Negro drama”
No final da semana passada, após o
cancelamento – por questões de saúde – da participação do
intelectual-companheiro Stephen Graham no Seminário Internacional
“Cidades Rebeldes”, alguns companheiros-trabalhadores da Boitempo
Editorial (organizadora do seminário) convidaram integrantes de nosso
movimento para completar a mesa específica sobre “Polis, polícia:
violência policial & urbanização”, que compõe a sua programação
completa (Confira as mesas na íntegra aqui:).
Diante do convite de última hora,
durante o fim de semana nós do Movimento Independente Mães de Maio
meditamos e discutimos bastante, coletivamente, e decidimos não
participar deste Seminário Internacional pelas razões a seguir, as quais
também achamos importante tornar públicas (não apenas para os
inscritos e demais participantes do Seminário, mas também para a
reflexão de toda esquerda autônoma e anticapitalista).
Para começo de conversa, uma primeira
grande decepção: com toda nossa história de luta cotidiana contra a
violência policial no Brasil ao longo dos últimos 9 anos, e
(humildemente) o barulho, as denúncias, as medidas práticas (e as
reflexões) que temos feito, todos os dias, frente a cada
execução/chacina da polícia não só aqui em SP, mas em todo o Brasil, o
movimento Mães de Maio ter sido chamado apenas após a desistência de um
dos intelectuais da mesa não nos soou digno, à altura do respeito que
exigimos e fazemos por onde merecer cotidianamente nas ruas. Os
companheiros intelectuais, sobretudo os de esquerda, a nosso ver
deveriam ser os primeiros a tomar a iniciativa e construir espaços em
conjunto com/de/para os movimentos sociais populares, principalmente
para escuta e aprendizado mútuo. Rebeldemente rompidas algumas dessas
persistentes torres de marfim – reprodutoras de hierarquizações e
privilégios seculares, possivelmente muito teríamos a aprender de parte a
parte. Porém, salvo raras exceções – as estrelas de sempre de alguns
movimentos, as catracas das mesas de seminários, da participação em
pesquisas ou em grandes colóquios públicos, as cercas dos “latifúndios
do ar”, infelizmente, seguem erguidas para a grande maioria dos
integrantes dos movimentos sociais.
Por outro lado, num primeiro momento,
soou francamente tentador (e para nós seria uma honra) poder trocar
ideia com intelectuais-realmente-compromissados-e-companheiros como
Lúcio Gregori, David Harvey, Mariana Fix, entre outros que compõem as
mesas atualizadas do Seminário e, sobretudo, trocar ideia com as
centenas de pessoas inscritas no ciclo – a grande maioria delas,
certamente, pessoas de esquerda e interessadas em buscar conhecimento
crítico e transformador – que tem na editora e nesses intelectuais
referências importantes nas suas trajetórias. Além de nossa contribuição
ao debate-papo, poderíamos também levar os materiais de
agitação/informação/formação do nosso movimento (camisetas, livros, DVDs
etc produzidos nós por nós), que geralmente vendemos (a preços baixos)
para garantir a nossa autonomia na luta cotidiana, ao mesmo tempo em que
dividimos/difundimos nossa caminhada com outros tantos compas. Uma
troca de ideia proveitosa com alguns verdadeiros camaradas, o “luxo
curricular” de constar o nome de alguns de nossos integrantes em meio à
galáxia de estrelas da nossa intelectualidade de esquerda (e de exquerda
tb, de currículos
que lattes-mas-não-mordem), muito possivelmente venderíamos um bocado
de material – o que, tudo somado, poderia ser muito interessante para
nós… (Particular e pessoalmente?)
PORÉM, HÁ UMA QUESTÃO MUITO SÉRIA E
ANTERIOR A TUDO ISSO, REFERENTE A ESTE SEMINÁRIO ESPECÍFICO, que diz
respeito a toda esquerda anticapitalista, implicando todos nós: participar
desta programação significaria, a nosso ver, de alguma maneira,
compactuar com a forma como foram concebidos e estão sendo realizados
tanto a tônica/composição dessas mesas, como o mecanismo seletivo das
suas inscrições (ao preço de R$ 60,00).
Opções que, infelizmente, dão um sentido político claro e alarmante ao
Seminário como um todo: uma verdadeira “gourmetização” da Rebeldia, bem
concreta, vivida por muitas e muitos de nós no cotidiano. Na pele, na
mente, e nos corações.
Ora, em primeiro lugar, a nosso ver um
Seminário Internacional intitulado “Cidades Rebeldes”, cujo tema remete
de imediato às Revoltas Populares de Junho de 2013 e a uma publicação
que a própria Boitempo coorganizou sobre esses acontecimentos (“Cidades Rebeldes – Passe Livre e as manifestações que tomaram conta das ruas do Brasil”
-), num evento subsidiado e correalizado junto à organização patronal
SESC – Serviço Social do Comércio, não poderia de maneira nenhuma ter
este valor de inscrição (R$ 60,00) como efetiva Catraca para o público
em geral. Quem conhece a realidade da classe trabalhadora brasileira –
como muitos autores da Boitempo bem analisam em diversos livros, sabe
que este valor é muito pesado no orçamento mensal dos trabalhadores,
ainda mais pressionados pela crise atual. A nosso ver, preços mais
acessíveis ou, de preferência, a entrada gratuita deveria ser um
“princípio de esperança” e de “rebeldia” (de classe?) da própria
organização do seminário para a plena realização dos fins anunciados
pela sua convocatória.
TODAVIA,
TALVEZ AINDA MAIS GRAVE DO QUE ISSO, a nosso ver, é tanto a ausência de
nossos irmãos e irmãs, trutas de batalhas, do Movimento Passe Livre São
Paulo na programação original – e mesmo na atualizada – do Seminário
Internacional que leva o nome de sua rebeldia, ao mesmo tempo em que
assistimos à simultânea presença de figuras como o Sr. Luís Inácio Lula
da Silva (originalmente na Abertura do seminário, para uma palestra
sobre “Das Diretas Já às Jornadas de Junho: os desafios para uma
esquerda democrática” – palestra depois cancelada por ele); bem como do
Sr. Fernando Haddad (que vai participar do Encerramento, junto ao David
Harvey, na mesa “Da Primavera dos Povos às cidades rebeldes: para pensar
a cidade moderna”). Afora a presença de algumas figurinhas carimbadas
de mediadores e comunicadores totalmente integrados, e sempre a postos, à
máquina petista-governista de lavagem cerebral (“progressista”, “livre”
e “amorosa”) de trabalhadores e trabalhadoras…
Nós não acreditamos ser mais possível, a
esta altura do campeonato, intelectuais de esquerda dignos deste nome,
organizarem um seminário sugerindo que o Sr. Luís Inácio Lula da Silva
tenha qualquer legitimidade para falar sobre “os desafios para uma
esquerda democrática”. Logo este Sr. que, todos sabemos – ou deveríamos
saber, se trata das figuras mais centralizadoras e autoritárias da
chamada exquerda brasileira; que capitaneou, usou, abusou e ainda
capitaliza até hoje todo um projeto coletivo de décadas e gerações de
trabalhadores brasileiros [o hoje – não por acaso – agonizante Partido
dos Trabalhadores (PT)], em torno de si e em favor de um projeto pessoal
permanente de poder, que se renova a cada ciclo eleitoral. Uma figura
cercada por fiéis correligionários que fazem todo o trabalho sujo para
ele, que nunca permitiram qualquer democracia interna dentro do PT, e
que nunca toleraram a ascensão de qualquer forma de
questionamento/oposição a sua figura (desde a época de liderança
sindical no ABC, e as muitas histórias tenebrosas que aquelas cidades
escondem, até os dias atuais de Instituto Lula). Ademais, foi o próprio
Lula quem disse, já em 2008, para um insuspeito Mino Carta e para quem
mais quisesse ouvir, em alto e bom som, que ele “NUNCA FOI DE ESQUERDA”.
O que este sujeito, então, teria agora a
dizer sobre as “Jornadas de Junho” e a noção de “rebeldia” para a
verdadeira esquerda brasileira nos dias de hoje – que não sejam dicas
para a melhor cooptação (ou repressão) de movimentos sociais e para a
preservação/renovação da ordem do capital e seus espaços/territórios de
acumulação (e espoliação, como nos ensina Harvey) atualmente no Brasil?!
A quem interessa promover, pela enésima
vez, esta confusão na cabeça das pessoas realmente de esquerda (que
acompanharão o Seminário), colocando joio e trigo juntos e misturados:
sugerir que o Sr. Luís Inácio Lula da Silva, e a alta-burocracia do
Campo Majoritário do PT (Lula, Dirceu, Pallocci et caterva, que
destruíram este projeto coletivo de 30 e tantos anos, e ainda por cima
carimbaram por longo-tempo o selo da “corrupção” em toda a esquerda do
país), tenham qualquer coisa a dizer (em favor) ou a contribuir para uma
real renovação da esquerda brasileira?! A quem interessa esta confusão
(ou este proposital “red washing” na imagem de Lula), se não única e
exclusivamente aos interesses pessoais, político-eleitorais, do Sr. Lula
– o eterno-candidato dessa alta-burocracia e seus asseclas?!
Acompanharíamos a sua bela retórica, pela enésima vez “na história deste
país”, com uma total ingenuidade ou um total cinismo? Temos cara de
trouxas?! Até quando?!
O mesmo raciocínio vale – ou deveria
valer – para a participação do Sr. Prefeito Fernando Haddad na mesa de
Encerramento do Seminário Internacional, justamente aquela que tratará
“Da Primavera dos Povos às cidades rebeldes: para pensar a cidade
moderna”, e que, emblematicamente, também não conta com nenhum
integrante do Movimento Passe Livre São Paulo – nem de qualquer uma das
centenas de organizações autônomas de trabalhadores que nos rebelamos e
saímos às ruas cotidianamente ANTES, DURANTE E DEPOIS DE JUNHO DE 2013
(até os dias atuais), não apenas para “pensar”, mas efetivamente
construir “uma cidade moderna” desde baixo, horizontal e coletivamente,
sem velhos nem novos guias geniais dos povos, visando uma sociabilidade
realmente mais igualitária, justa, não-punitivista, diversificada,
autônoma e livre.
A organização de um Seminário
Internacional intitulado “Cidades Rebeldes”, que se inspira na luta
popular do Passe Livre e de todos nossos movimentos que saímos às ruas
“por uma vida totalmente sem catracas”, não chamar nenhum dos
integrantes desses movimentos para a mesa sobre o tema e, ao contrário,
chamar aquele que criminalizou, reprimiu e até sugeriu que os integrantes do MPL seriam espécies de “fundamentalistas” “intolerantes”
– os comparando com os terroristas do atentado contra o jornal Charlie
Hebdo, nos parece uma tomada de posição política bastante clara por
parte dos organizadores do Seminário. Em uma palavra: revisionismo total
de Junho (e, inclusive, de muitos dos textos/análises editadas pela
própria editora, a começar pelo livro homônimo do Seminário). Sob qual
interesse? A soldo ou a serviço de quem?
[Ainda se Haddad tivesse cedido (bem)
antes à pressão da esquerda autônoma por singelos R$ 0,20 Centavos na
passagem do Busão, que ali representavam uma vitória histórica, clara e
necessária das ruas de esquerda (e talvez não tivesse sido criado todo
este espaço/tempo/condições para a onda coxinha fascista subsequente…):
só que não, Haddad quis demonstrar ser um gestor capaz de “segurar a
pressão popular” “no limite da irresponsabilidade” e dos seus ótimos
serviços prestados (em benefício das planilhas e dos lucros de quem?). A
Direita o agradece profundamente até hoje… E pouco nos importa que o
Sr. Prefeito Fernando Haddad se autodefina como um “gestor da nova
esquerda” – diferente do assumidamente conservador Lula, afinal, na
prática, Haddad cotidianamente beija a cruz das empreiteiras,
construtoras, dos grandes empresários do transporte (cuja tarifa ele
voltou a aumentar para pesados R$ 3,50 apenas um ano e meio depois de
Junho: rebeldia?), do próprio padrinho Lula, e de todo o grande capital
que financiou a sua eleição (a reboque do projeto de poder lulo-petista
dos últimos anos). Ouviremos Haddad analisar, no Seminário, se ele será
ou não rifado nas próximas eleições de 2016, mesmo sustentando-se nas
Tattolândias e Andres Sanchezlândias deste neoPT, e mesmo com os já
amarrados apoios “renovadores” do PMDB de Gabriel Chalita e do PDT de
Luis Antônio Medeiros: a que projeto de “rebeldia” ISSO diz respeito?
Porque não tem nada a ver com a nossa. Enquanto a esquerda intelectual
insiste em cultivar seus autoenganos e seus gourmetizados ovos de
serpente – não levando a sério sequer aquilo que ela própria escreveu,
editou e publicou, eles todos (da exquerda à velha direita) sabem muito
bem o que fazem…]
E
por que seriam justamente eles, agora, na Abertura e no Encerramento do
Seminário, o Criador e a Criatura – que, não esqueçamos, foram lá num
ato de subversão incrível, não?, literalmente, beijar a mão do Sr. Paulo
Maluf para a eleição de 2012 – a ditar os novos desafios e rumos da nossa histórica rebeldia?!
A nossa rebeldia sentida na pele, atualizada a cada novo dia de
trabalho, de transporte público e de humilhação cotidiana vivida nestas
Cidades-Mercadorias frente os patrões e o estado, por quem hoje seguimos
sendo monitorados, criminalizados e reprimidos pela simples rebeldia de
existir pobre, preto ou periférico, desde pelo Exército de Lula e Dilma
na Favela da Maré no Rio de Janeiro – e tb sempre a postos diante de
qualquer manifestação popular mais radical (nossos presos de Junho e dos
despejos e espoliações da #CopaDasCopas que o digam…); ou nas vilas e
Cabulas cotidianas chacinadas pela Polícia Militar Baiana dos
governadores-genocidas petistas, Sres. Jaques Wagner, este sionista
baba-ovo de torturador, e agora o sr. Rui Costa (PT-BA); ou pela Guarda
Civil Metropolitana de Haddad e seus “rapas” de todos os dias, por toda a
região central da cidade de São Paulo. Esquerda?! Onde, cara pálida?!
Essa “Democratização”, esse “Desenvolvimento” e essa “Pacificação”
promovida por vocês… essa Exquerda e essa Paz são “uma senhora branca que nunca sequer olhou na nossa cara!”.
Definitivamente, companheiros e
companheiras deste Seminário: desde quando “somos todos de esquerda”?!
Desde quando “é tudo a mesma coisa”?! Até quando sustentarão essa farsa
conciliatória de classes do “amplo, geral e irrestrito” campo
“democrático-popular”?! O que nós temos a ver com as construtoras,
empreiteiras e banqueiros que financiaram, por anos a fio e às pilhas de
dinheiro, pelos Caixa 1, 2 ou 3, este projeto de poder-pelo-poder?! O
que há de esquerda e de rebeldia nisto?! Quem foi que nos colocou neste
balaio de gatos e ratos, cobras e porcos, nos tornando reféns da
constante chantagem desta nova direita prática?! Desde quando
houve/haverá “governabilidade” possível (à esquerda) com o padrão
sarney-temer-renan-cunha que hegemoniza as instituições de todo o estado
brasileiro há décadas – e estamos vendo muito bem a que ponto chegou na
atual hiper-atuação, sob a regência de Cunha e Renan, das bancadas do
Boi, da Bíblia e da Bala, sempre tratadas a pão de ló como “base
aliada”, nos últimos anos, pelos “habilidosos” gestores petistas?!
Verdadeiros “craques”… Em que?! Para quem?!
Qual será o próximo engodo de
“esperança” e “rebeldia” “paz e amor” lulo-petista: uma “frente ampla”
de exquerda forjada como “livre e independente” para esconder a
desgastada “marca PT” nas próximas cédulas eleitorais?! Nossos sonhos e
nossas rebeldias se restringirão, mais uma vez, ao ritual cívico de
apertar algumas teclas a cada dois anos, em verdadeiras urnas funerárias
de nossas ações diretas, para ato-contínuo tomar uma sucessão de tapas
na cara e vacas tossindo, e nos conformar a participar todos os
santos-dias de cada novo aparato-embuste criado pelo sistema petista de
governabilidade biopolítica e contenção da nossa revolta (Conselhos,
Encontros, Audiências, Fóruns, Seminários, Diálogos, Festivais etc etc
etc)?! Como já disse os nossos companheiros Hamilton Borges e Fred Aganju,
da campanha Reaja ou Será Mort@, frente ao sucesso de tantas políticas
públicas de “inclusão social”, “afirmação dos direitos humanos”,
“participação popular”, “mesas de diálogo”, “promoção da igualdade
racial” e blá blá blá “nós preferimos o fracasso de enfrentar o Terror
nas ruas”. O Terror para o qual eles, quando não protagonizam, colaboram
ativamente contra as nossas Raças Perigosas e Classes Rebeldes.
De uma vez por todas: a alta burocracia,
o Campo Majoritário petista e seus principais gestores – Sr. Lula e
Sra. Dilma Rousseff à frente – não são de esquerda! A maioria deles
sequer ex-querda é. Nunca foram, nem nunca “voltarão” a ser. Não nos
confundam com eles! Simplesmente parem: não mais em nosso nome! Já
basta!
Enfim, por tudo isso (e muito mais!), o
nosso Movimento Independente Mães de Maio acha que seria – no mínimo –
contraditório demais com a nossa caminhada autônoma, que trilhamos com
muita luta, compromisso e sacrifício no dia-dia (sem receber favores nem
pagar simpatia para ninguém), aceitar a cômoda e glamurosa participação
neste seminário “Cidades Rebeldes” e, ao fim e ao cabo, compactuar com
essa verdadeira operação político-ideológica de reescrita das
Revoltas de Junho de 2013 e da história recente do país, com a
colaboração e coparticipação ativa de nossos inimigos. Sentar à
mesma mesa, como “aliados”, daqueles que nunca sequer olharam na nossa
cara ao longo desses mais de 12 anos?! Jamais! Lembrem-se: os Crimes de
Maio de 2006, que vitimaram fatalmente mais de 500 jovens, nossos filhos
e filhas, irmãos e amigos – dando origem ao nosso movimento, ocorreram
sob a gestão Lula no governo federal, o qual seguido por Dilma nunca
sequer nos recebeu nem de forma protocolar – mesmo diante de pedidos formais feitos
há anos – a não ser indiretamente, por meio de seus correligionários,
para tentar nos cooptar… Por que nos receberiam, pois?! Não temos uma
conta bancária que faça jus ao cerimonial do Palácio do Planalto
(quantas vezes será que os Sres. Lula e Dilma Rousseff já não se
reuniram com banqueiros do quilate e dos círculos íntimos dos Henriques
Meirelles e Joaquins Levys que, afinal das contas, dão a tônica
política-econômica de seus governos… Rebeldes?). E seguem comodamente
encrustados no alto poder do país há mais de uma década (fazendo também
lobbies internacionais para grandes corporações brasileiras, junto a
sanguinários gestores mundo afora – Teodor Obiang da Guiné Equatorial
que o diga, com dinheiro do FAT e FGTS dos trabalhadores brasileiros,
via BNDES, para mais espoliações territoriais na reprodução ampliada do
espaço capitalista global). Rebeldia?
Para colocar em prática estas operações
de falsificação da realidade (das revoltas e das esperanças reais dos
trabalhadores) eles não precisariam deste Seminário, pois já têm uma
série de canais de comunicação-marketing, de certas mídias tradicionais
ligadas ao que há de pior nas igrejas exploradoras da fé de nosso povo
aos ditos meios “progressistas”, passando pelos Joãos Santanas
contratados a peso de ouro, permanentemente à serviço de seu eterno
projeto de poder (dentro e em prol da renovada ordem capitalista). De
nosso lado, na “Margem Esquerda” do chão de terra que nós pisamos
cotidianamente, mirando firmemente “Para Além do Capital”, não há espaço
para compactuar com esses oportunistas da exquerda – que do alto de
seus gabinetes e contratos com as agências de comunicação oficial do
governo torciam e incentivavam que a Gaviões da Fiel “escorraçasse” das
ruas os nossos companheiros de trincheiras da verdadeira Periferia
Rebelde, tratados como cachorros “vira-latas” por quem desde lá – sem
saber? – já fazia coro com os coxinhas fascistas antes destes saírem às
ruas pedindo – na mesma toada de “escorraçar” e “ fazer faxina”, só que
agora, em 2015, pela limpeza (leia-se prisão) dos petistas e pelo
impeachment de Dilma Rousseff. Que rebeldia real há nesta falsa
polarização histérica, doentia e fascista que marca a disputa espelhada
entre a horda da fé oposicionista versus a horda da fé governista?! Não
jogamos este jogo sujo.
Não ficaremos mais reféns deste tipo de
exquerda, suas falsificações da história, nem cairemos mais em suas
armadilhas. Não seria intelectualmente honesto de nossa parte, seja em
relação aquilo que lemos (inclusive em vários livros da Boitempo – que
deveriam ser levados mais a sério), seja principalmente em relação
aquilo que vivenciamos na prática. David Harvey colocado lado-a-lado com
um dos principais lobbistas globais da Oderbrecht, juntos no mesmo
balaio de “rebeldia”?! Onde isso vai parar?! É urgente voltarmos a
demarcar muito claramente limites, que não falamos essa mesma
novilíngua, não “jogamos no mesmo time”, não estamos do mesmo lado da
trincheira: NÃO!
Só nos faltava mais esta: seriam Lula e
Haddad, agora, os “novos rebeldes” na visão da Boitempo?! Figuras para
quem a verdadeira rebeldia é um espectro a assombrá-los, cotidianamente,
ao menos, desde o ápice das revoltas populares de Junho de 2013…
“Cidades Rebeldes”, “Periferias
Rebeldes”: no que depender de nossas forças, não se tornarão o novo
“Nome da Marca”. Recusamos este espetáculo que nos sufoca e, por trás
das suas “Videologias”, se alimenta do sangue de nossos mortos, aqui na
periferia do “Planeta Favela”, que segue sangrando… Não em nosso nome!
Nossos mortos têm voz em nossa luta, e exigimos respeito a sua memória –
e à rebelde tradição dos oprimidos que nós carregamos no dia-dia
conosco. Os movimentos sociais autônomos, em meio ao vertiginoso e
sufocante “Novo Tempo do Mundo” e do Brasil, não permitiremos que a
nossa rebelião seja gourmetizada pela exquerda que encarcerou e enterrou
muitos dos nossos: sonhos, projetos e irmãos/ãs de carne e osso. E
seguem enterrando.
O mínimo de rebeldia necessária, diante desta proposta política indecente, é a RECUSA pública deste convite.
Rebeldia, para nós, começa pela luta para se garantir a respiração. E pela ressuscitada fúria.
Movimento Independente Mães de Maio, Junho de 2015
PS – Fazemos questão de distinguir a
postura pessoal dos companheiros-trabalhadores da Boitempo Editorial,
em especial dos compas editores-adjuntos Kim Dória e Isabella Marcatti
(sempre muito respeitosos conosco), das opções políticas-ideológicas e
comerciais de seus patrões. Receamos que este “Seminário Internacional”,
da forma como foi concebido – aparentemente sob milimétrica encomenda
dos interesses político-eleitorais do Instituto Lula e cia. ltda., muito
provavelmente tenha o “selo Emir Sader” de subserviência intelectual e
política. Um selo-vergonha (reiterado até quando?) para uma editora que,
simultaneamente, é capaz de trazer verdadeiros intelectuais de esquerda
como David Harvey ou István Mészaros, e editar coleções como a “Tinta
Vermelha” ou a “Estado de Sítio”, coordenada pelo compa-de-várias-horas,
o professor e intelectual-rebelde Paulo Arantes. Menos submissão
editorial ao “estado de sítio” atual no Brasil (copromovido pelo
lulo-petismo e seus pau-mandados), e cada vez mais tinta vermelha de
rebeldia real cairá bem para uma editora que pretende se manter como
referência para as novas gerações da esquerda autônoma e anticapitalista
no Brasil. “O dia é um pasto azul que o gado reconquista(rá)”.
Fonte: PASSA PALAVRA
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