O processo de licenciamento da usina hidrelétrica São Manoel, no rio
Teles Pires, começou em 2007. O pedido foi feito pela Empresa de
Pesquisa Energética (EPE) ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e
dos Recursos Renováveis (Ibama). O projeto prevê a potência instalada de
750MW (megawatt) e a potência firme de 410,6 MW.
A área de inundação foi calculada em 52,95 quilômetros quadrados, com
extensão de 41 quilômetros, nos municípios de Paranaíta, estado do Mato
Grosso (MT) e Jacareacanga, no Pará (PA), região hidrográfica da
Amazônia. O projeto da UHE São Manoel pretende ser a fio d'água. A EPE
(Empresa de Pesquisa Energética) fez a apresentação formal do
empreendimento ao Ibama em 30 de janeiro de 2008. Estavam presentes
representantes das diversas instância do Ibama, da EPE, da Agência
Nacional de Águas (ANA), das empresas Leme Engenharia e Croncremat,
contratadas pela EPE.
Oficializada a abertura do processo de licenciamento no Ibama, o
passo seguinte foi a elaboração do Termo de Referência para orientar a
elaboração dos Estudos de Impacto Ambiental e Respectivo Relatório de
Impacto Ambiental (EIA/RIMA). A EPE enviou ao Ibama, em 20 de fevereiro
de 2008, uma proposta de Termo de Referência (TR) para elaboração do
EIA/RIMA da UHE São Manoel, curiosamente datada de fevereiro de 2007, um
ano antes.
No período de 10 a 15 de março de 2008, o Ibama, como é praxe,
realizou a vistoria técnica na área de influência da UHE São Manoel. Em
22 de julho de 2008, os técnicos do Ibama emitiram o relatório da
vistoria técnica realizada em março. Esse relatório dá uma ideia clara
das implicações futuras da construção da hidrelétrica em região de
floresta preservada entre as corredeiras Sete Quedas e a foz do rio
Apiacás, no Teles Pires.
Beleza exuberante ameaçada
Foi possível no voo de reconhecimento, segundo o relatório,
contemplar o reservatório da outra hidrelétrica, já em construção, a UHE
Teles Pires, a montante do ponto escolhido para o barramento da UHE São
Manoel. Na região foram observadas castanheiras de grande porte dentro
de uma matriz dominante de áreas florestais relativamente bem
conservadas e com inúmeros igarapés ao longo dos dois futuros
barramentos.
Tanto a UHE São Manoel como a UHE Teles Pires estão inseridas em Área
Prioritária para Conservação, Uso Sustentáel e Repartição dos
Benefícios da Biodiversidade Brasileira, segundo a Portaria n° 9 do
Ministério do Meio Ambiente, de 23 de janeiro de 2007, esclarece o
relatório. Ainda mais importante, tanto na margem esquerda como na
direita do rio está uma área (Am043) considerada de importância
biológica extremamente alta e prioridade de ação alta.
Os técnicos ainda ressaltaram que a localização do remanso do projeto
da UHE São Manoel está a algumas centenas de metros rio abaixo da Sete
Quedas e o eixo do barramento a apenas um quilometro de um terceiro
projeto hidrelétrico, previsto para ser construído na foz do rio
Apiacás, a UHE Foz do Apiacás. Todos esses empreendimentos constam do
inventário da bacia do rio Teles Pires.
Ainda, informa o relatório, a importância da biodiversidade do local
e a relevância ecológica. Constataram a dinâmica pela presença de
inúmeras ilhas que serão submersas, caso o projeto seja considerado
viável, que requer estudos aprofundados de longo prazo. Some-se a isso
locais de reprodução de espécies de peixes e de alimentação de animais
sazonalmente inundados, que serão alterados.
Outra informação de suma importância está na constatação de que o
local está próximo ao limite da Terra Indígena Kayabi. O texto ainda
descreve a presença de andorinhas, araras-vermelhas, bugios,
coatá-de-testa-branca, configurando a riqueza faunística da região
escolhida para abrigar empreendimentos com tamanho potencial de
destruição.
A ameaça já está lá
Outro fato que chama a atenção foi a constatação, pelos técnicos, da
presença de acampamento de equipe de sondagem contratada pela
Construtora Norberto Odebrecht. Sondagens e acampamento com desmatamento
e danos à vegetação em plena Área de Proteção Permanente (APP), não
autorizados nesse caso. Antecipação de procedimentos sem a necessária
declaração de utilidade pública ou autorização para intervenção em APP.
A urgência do PAC
Em 22 de julho de 2008, o presidente da EPE, Maurício Tolmasquin,
enviou ofício ao então presidente do Ibama, Roberto Messias Franco,
cobrando celeridade na emissão do Termo de Referência. Argumentou que
São Manoel faz parte do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e que
os processos decisórios devem obedecer o cronograma estabelecido pelo
governo.
Tolmasquim, incomodado com aquilo que ele interpretava como atraso,
mas que na verdade seria atinente aos procedimentos de licenciamento
ambiental, mencionou que a apresentação do projeto e a concepção do
EIA/RIMA eram do conhecimento dos analistas do Ibama desde janeiro de
2008 e a vistoria técnica fora realizada em março.
Cobrou e obteve. Em 25 de julho, o Ibama expediu o Termo de
Referência. Mas, em 18 de setembro, a EPE protocolou uma análise do
Termo de Referência do Ibama, para apresentar uma visão alternativa para
o TR, "que incorpora conhecimentos já adquiridos das
características regionais e do projeto, além da experiência do setor
elétrico na elaboração de EIA/RIMA".
Entre as propostas está, por exemplo, a exclusão no TR das
pré-definiões espaciais das áreas de influência do projeto. O Ibama
pediu que as áreas de influência indireta fossem definidas levando em
consideração parte da bacia hidrográfica do rio Teles Pires. Reafirmou
essa necessidade depois, em 21 de novembro de 2008, quando emitiu um
novo TR aceitando algumas alterações da EPE e recusando outras.
Em 6 de março de 2009, a EPE enviou ao Ibama um novo ofício com
justificativas para exclusão de quatro itens do TR com relação ao
comportamento dos sedimentos nas diferentes vazões do rio Teles Pires a
montante e a jusante do barramento da UHE Teles Pires. Esse estudo,
segundo o Ibama, se fazia necessário, uma vez que o remanso do
reservatório da UHE São Manoel se estenderia até o barramento da UHE
Teles Pires.
Para a EPE, no entanto, tais preocupações eram irrelevantes e
valeram-se de observações técnicas em que minimizaram os efeitos dos
sedimentos depositados ou transportados pelo rio Teles Pires.
Aparentemente, o Ibama aceitou a exclusão dos quatro itens do TR e o
processo deu seguimento com a elaboração do EIA/RIMA a partir de março
de 2009.
A tentativa de dar um golpe no processo de licenciamento
A UHE São Manoel é uma das seis hidrelétricas planejadas para o rio
Teles Pires e seu afluente Apiacás. Nesse conjunto, quatro delas
estariam em processo de licenciamento pela Secretaria de Meio Ambiente
(SEMA) de MT. As UHEs São Manoel e Teles Pires estavam a cargo do Ibama.
Em 18 de março de 2009 , o analista ambiental Fernando de Carvalho
Bittencourt, lotado no Ibama de MT, encaminhou em ofício, ao
Departamento de Licenciamento Ambiental (DILIC), uma representação do
Ministério Público Estadual de MT, assinado pelo promotor Luiz Alberto
Esteves Scaloppe. Nesse ofício, o analista entende que implantar
hidrelétricas em sequência no rio Teles Pires, com dispensa do EIA/RIMA
dada pelo Conselho de Meio Ambiente (Consema) de MT, seria uma
temeridade. Se reporta à importância dos argumentos do promotor e à
preocupação da Conselho Estadual de Recursos Hídricos de MT (CEHIDRO),
nesse sentido.
A representação do MP ao Ibama tinha, realmente, argumentos
suficientes para provar que vários empreendimentos planejados numa mesma
bacia hidrográfica, como o Complexo Hidrelétrico do rio Teles Pires,
não poderiam ser licenciados isoladamente. Os efeitos sinérgicos e
cumulativos de significativos impactos ambientais estavam sendo
ignorados nos estudos ambientais. Diante disso o promotor pedia a
apreciação e providência ao Ibama para que promovesse a unificação dos
estudos.
Componente Indígena e a tolerância da Funai
Em 2 de outubro de 2009, a Fundação Nacional do Índio (Funai)
encaminhou à EPE o Termo de Referência para os estudos do Componente
Indígena. Estranhamente, no entanto, a Funai diz no ofício de
encaminhamento que está atendendo "à solicitação da Empresa de
Pesquisa Energética (EPE), no sentido que o Termo de Referência para os
estudos do Componente Indígena abrangesse esses dois empreendimentos (UHE São Manoel e UHE Foz do Apiacás), devido a sua proximidade geográfica".
A Funai informa ainda que o TR para os estudos do Componente Indígena foi elaborado a partir de "reuniões de esclarecimento nas comunidades indígenas". Resta
saber se essas reuniões de esclarecimentos mencionadas aconteceram,
quando e em quais comunidades. E as memórias dessas reuniões?
O TR da Funai reforça que para os dois empreendimentos, UHE São
Manoel e UHE Foz do Apiacás, é facultada a elaboração de apenas um
estudo do Componente Indígena que vai integrar os dois processos de
licenciamento. Só não mencionam que a UHE Foz do Apiacás estava em
processo de licenciamento na Secretaria Estadual do Meio Ambiente do MT e
não no Ibama.
Os índios isolados na região mereceram atenção no TR.
Continua na Parte II.
Nota:
Este artigo teve como base os documentos do processo de licenciamento da UHE São Manoel que tramita no Ibama.
Telma Monteiro é ativista sócio-ambiental, pesquisadora, editora do blog http://www.telmadmonteiro.blogspot.com.br,
especializado em projetos infra-estruturais na Amazônia. É também
pedagoga e publica há anos artigos críticos ao modelo de desenvolvimento
adotado pelo Brasil.
Fonte: Correio da Cidadania
***
PICICA: "Em 21 fevereiro de 2011, Amilcar Guerreiro, diretor da EPE, envia um
ofício a Aluísio Atonio C. Guapindaia, diretor da Funai, onde manifesta
sua preocupação com o rumo que o processo está tomando. Ele se reporta a
outro ofício da Funai, de que teve conhecimento, mas que não foi
protocolado na EPE e que, segundo ele, punha em risco o desenvolvimento
do potencial hidrelétrico brasileiro, em especial de projetos na região
Amazônica.
Numa apologia à importância da energia elétrica nas sociedades
modernas, Amilcar Guerreiro profetizou que, diante da postura da
fundação, os brasileiros estariam condenados a sofrer os males
provocados pela construção de projetos termelétricos em larga escala. O
potencial hidrelétrico é patrimônio da União, apregoou ele, segundo a
Constituição Federal."
Hidrelétrica São Manoel: Cronologia de mais um desastre – Parte II |
|
|
Escrito por Telma Monteiro
|
Segunda, 19 de Agosto de 2013 |
Nesta segunda parte do imbróglio do processo de licenciamento da UHE
São Manoel, ficam patentes as artimanhas, o cinismo e o desespero da
Empresa de Pesquisa Energética (EPE) para viabilizar o projeto em tempo
para o leilão de energia de dezembro de 2011. Como a EPE tenta manipular
informações para evitar aprofundar os estudos ambientais. Os técnicos
do Ibama e da Funai continuaram apontando as inconsistências e pedindo
complementações. O Ministério Público empreende sua via crucis junto ao judiciário, para evitar o desastre.
As falhas gritantes nos estudos ambientais e no Estudo do Componente
Indígena (ECI) se acumulam e já seriam mais que suficientes para ter
justificado a anulação do EIA/RIMA e do processo de licenciamento da UHE
São Manoel. É de estarrecer, também, a afirmação da EPE de que os
projetos hidrelétricos no PAC 2 somam 80% com algum grau de
interferência com Terra Indígena.
EPE em desespero
No início de 2010, a EPE enviou ao Ibama o EIA/RIMA desenvolvido em
2009, mas sem os Estudos Socioambientais do Componente Indígena (ECI).
Em março, o Ibama expediu um ofício – 263/2010 – informando a recusa de
análise do EIA, pois sem o ECI ele estava incompleto. Esse ofício,
assinado pelo então Diretor de Licenciamento Ambiental, Pedro Alberto
Bignelli, comunicava também que a solicitação de Licença Prévia estaria
desconsiderada e, apenas com o estudo entregue em sua totalidade,
deveria ser reapresentada ao Ibama.
Em abril, o diretor de Estudos Econômico-Energéticos e Ambientais da
EPE, Amilcar Guerreiro, em resposta ao Ibama, traduziu seu
desapontamento diante da decisão. Afinal, o leilão da UHE São Manuel
previsto para acontecer em 2010 seria prejudicado. Inconformado, Amilcar
Guerreiro informou que as complementações pedidas pela Funai estariam
concluídas em junho e que, diante disso, não cabia o entendimento de que
o EIA da UHE São Manoel estivesse incompleto.
A Funai recusa as complementações
As complementações do ECI foram encaminhadas pela EPE em 17 de agosto
de 2010. A Funai, no entanto, expediu um ofício em 25 de agosto,
informando à EPE que, após uma checagem do ECI, constatou que ele não
possuía elementos suficientes para análise técnica e que estava em
desacordo com o Termo de Referência.
Seguiu-se uma extensa lista entre quesitos insuficientes e não
atendidos. Foram ao todo 30 itens. Para finalizar, a Funai pede ainda a
reinterpretação da análise de viabilidade dos documentos, pois na
conclusão do EIA/RIMA não foram considerados os impactos sobre os povos
indígenas.
O Ibama rejeita o EIA e o MPF se manifesta
Ainda em agosto de 2010, o Procurador da República do Ministério
Público Federal de Mato Grosso, Mario Lucio Avelar, oficializa o Ibama,
reiterando o pedido de informações sobre o processo de licenciamento de
todos os empreendimentos hidrelétricos na bacia do rio Teles Pires.
Dando continuidade ao processo de licenciamento, o Ibama fez a
checagem do atendimento do TR do EIA/RIMA da UHE São Manoel. Emitiu
parecer técnico em 14 de setembro de 2010, em que apontou 33 pendências,
entre elas das complementações do ECI já mencionadas pela Funai. O
EIA/RIMA foi rejeitado pela equipe técnica do Ibama, uma vez que ele não
atendia ao TR.
A Funai endurece
As principais pendências do EIA/RIMA continuaram sendo as
complementações dos Estudos do Componente Indígena (ECI) e isso se
confirmaria meses depois, já em janeiro de 2011. Um ofício da Funai para
a EPE informava que, para o prosseguimento de qualquer atividade no
processo, antes da emissão da LP, era preciso reformular os Estudos do
Componente Indígena em onze itens específicos. Até então, esses estudos
se referiam à UHE São Manoel e à UHE Foz do Apiacás – Terras Indígenas
Kayabi, Mundurucu e Pontal dos Apiacká.
O estudo só seria aprovado depois de reformulado e após a realização de reuniões em terras indígenas "com linguagem e metodologia adequadas"
previamente submetidas à Funai. Mais ainda, a fundação destacou que, só
depois do cumprimento integral das condicionantes do componente
indígena da UHE Teles Pires, teria condições de avaliar os processos de
licenciamento dos empreendimentos a jusante. Portanto, ficava aí
estabelecida, pelo menos para a Funai, a relação entre o processo da UHE
Teles Pires, já adiantado, e os demais processos da UHE São Manoel e da
UHE Foz do Apiacás.
O cinismo da EPE
Em 21 fevereiro de 2011, Amilcar Guerreiro, diretor da EPE, envia um
ofício a Aluísio Atonio C. Guapindaia, diretor da Funai, onde manifesta
sua preocupação com o rumo que o processo está tomando. Ele se reporta a
outro ofício da Funai, de que teve conhecimento, mas que não foi
protocolado na EPE e que, segundo ele, punha em risco o desenvolvimento
do potencial hidrelétrico brasileiro, em especial de projetos na região
Amazônica.
Numa apologia à importância da energia elétrica nas sociedades
modernas, Amilcar Guerreiro profetizou que, diante da postura da
fundação, os brasileiros estariam condenados a sofrer os males
provocados pela construção de projetos termelétricos em larga escala. O
potencial hidrelétrico é patrimônio da União, apregoou ele, segundo a
Constituição Federal.
Não poderia deixar de mencionar a urgência do PAC. Então, acaba
entregando um dado estarrecedor ao mencionar que, de 48 projetos
hidrelétricos, 18 atingem áreas de Terras Indígenas. Vai mais longe ao
afirmar que 16 projetos, embora não estejam diretamente em TIs, estão a
menos de 50 quilômetros delas, como a UHE São Manoel e a UHE Foz do
Apiacás. Ainda confirma que os projetos hidrelétricos no PAC 2 somam 80%
com algum grau de interferência com TI.
Amilcar Guerreiro se mostra inconformado com a decisão da Funai de
condicionar a análise dos ECI de São Manoel e Fóz do Apiacás ao
cumprimento das condicionantes da UHE Teles Pires. Usando um tom jocoso
afirma que as usinas São Manoel e Foz do Apiacás "não atingem um
hectare de TI demarcada, nem sequer de áreas pretendidas para amplicação
da TI demarcada. A propósito (cinismo), o ECI revelou que a demarcação
das terras é uma genuína preocupação das comunidades indígenas que
parece ser muito maior do que a implantação das usinas. Se nesses casos a
Funai se posiciona da forma como fez no (ofício), o que esperar com relação ao licenciamento dos projetos que atingem diretamente território indígena?".
O diretor da EPE anexou uma tabela (ver abaixo) das UHEs previstas no
PAC 2 e as distâncias das TIs. São Manoel está a 700m e Foz do Apiacás a
230m da TI Kayabi.
A EPE protocolou a reformulação do ECI na Funai em 27 de julho de
2011. A partir daí a Funai comunicou que passou a considerar o estudo
apenas para a UHE São Manoel e não mais para a UHE Foz do Apiacás.
Em outro anexo, chamado de
"Considerações Gerais", sobre o ofício da Funai, a EPE repudia o que
chama de precedente e despropositada vinculação de projetos
hidrelétricos de diferentes agentes e em diferentes etapas de
licenciamento. Não há embasamento legal nessa colocação, mesmo que a
Funai, como mencionado no item II, não tenha emitido um TR para o ECI da
UHE Teles Pires.
Quanto aos índios isolados, objeto do ítem III desse mesmo anexo, a
EPE atribui à Funai a culpa por não ter conseguido cumprir a exigência
de elaborar o estudo relacionado aos índios isolados.
O Ibama também rejeita o RIMA
Em parecer técnico datado de 1° de abril de 2011, os analistas do
Ibama rejeitam, também, RIMA da UHE São Manoel. A conclusão aponta
inconsistências textuais e recomenda a devolução do RIMA para as devidas
correções. Faltam justificativas sobre a alternativa estudada, faltam
fundamentos que façam o leitor, leigo no assunto, entender a decisão de
contruir a hidrelétrica e faltam explicações sobre a interação da UHE
São Manoel com a UHE Teles Pires, rio acima.
Em 22 de julho de 2011, a EPE encaminha novamente o RIMA com as
devidas correções para análise dos técnicos que se dão por satisfeitos e
o aprovam em parecer de 27 de julho.
Neste momento, cabe perguntar o porquê de, diante de tantos problemas
detectados nos estudos, o projeto estar liberado para ir a leilão.
O Ministério Público de MT se manifesta
Em ofício ao Ibama, de 25 de julho de 2011, o Promotor de Justiça de
MT, Marcelo Caetano Vacchiano, comunicou a instauração do Inquérito
Civil (IC) 068/2011 para acompanhar o licenciamento ambiental da UHE São
Manoel e requisita cópia integral do processo e informação sobre
alterações no projeto.
Em 29 de agosto, novamente o MP de Mato Grosso se pronuncia, ainda
dentro do IC, no sentido de solicitar a realização de audiências
públicas nos municípios que sofrerão influência da UHE São Manoel – Alta
Floresta, Paranaíta e Jacareacanga.
Ibama aceita o EIA/RIMA e marca audiências públicas
Depois de aceito o EIA/RIMA, o Ibama, dando continuidade ao processo
de licenciamento ambiental da UHE São Manoel, marca as audiências
públicas em Paranaíta (MT), Alta Floresta (MT) e Jacareacanga (PA) para
os dias 22, 23 e 25 de outubro de 2011, respectivamente.
Em 7 de outubro de 2011, um ofício do Ibama, assinado pelo então
presidente Curt Trennepohl, ao Palácio do Planalto, Ministro do Gabinete
de Segurança Institucional da Presidência da República, José Elito C.
Siqueira, em um procedimento inédito, solicita segurança nas Audiências
Públicas. A alegação é a forte resistência apresentada pelos Munduruku
ao projeto da UHE São Manoel. Uma das competências do Gabinete de
Segurança é o de coordenar atividades de inteligência federal e de
segurança da informação.
Mas, em nota técnica de 19 de outubro de 2011, o Ibama concluiu que o
tema "sinergias e cumulatividades entre os impactos da UHE São Manoel e
da UHE Teles Pires" não está satisfatoriamente contemplado no âmbito do
EIA e necessita mais complementações. Os técnicos pedem que o
empreendedor complemente as lacunas apontadas na análise e as
informações sobre os Efeitos Cumulativos e Sinérgicos dos Impactos da
UHE São Manoel.
As audiências públicas seriam suspensas em 21 de outubro de 2011, em
decisão proferida pelo Juiz Federal Paulo Cézar Alves Sodré, da Subseção
Judiciária de Sinop (MT), atendendo um pedido do MPF e do MP de Mato
Grosso. Para desespero ainda maior da EPE, a suspensão das APs da UHE
São Manoel, por decisão liminar, inviabilizaria a habilitação do projeto
para o leilão de energia marcado para 20 de dezembro de 2011.
Em 7 de novembro de 2011, o Desembargador Federal, Olindo Menezes,
derruba a liminar de suspensão das Audiências Públicas. Diante da
reviravolta, a EPE tenta de urgência confirmar com o Ibama o agendamento
de novas datas para a realização das APs, ainda em novembro, para
viabilizar o leilão da UHE São Manoel.
Continuo e finalizo este relato na Parte III, em que vou mostrar como
a EPE joga sujo. Primeiro exigiu alteração e depois desqualificou autor
e relatório antropológico complementar, requerido pela Funai e
contratado pela própria EPE. O relatório avaliou as implicações da UHE
São Monoel nas comunidades indígenas, em especial na Terra Indígena
Kayabi.
Leia mais:
Hidrelétrica São Manoel: Cronologia de mais um desastre - Parte I
Telma Monteiro é ativista sócio-ambiental, pesquisadora, editora do blog http://www.telmadmonteiro.blogspot.com.br,
especializado em projetos infra-estruturais na Amazônia. É também
pedagoga e publica há anos artigos críticos ao modelo de desenvolvimento
adotado pelo Brasil. |
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário