PICICA: "(En)Cena –
Qual o impacto da nomeação de Valencius Wurch Duarte Filho para as
políticas públicas destinadas a usuários de álcool e outras drogas?
Domiciano Siqueira - O
impacto será desastroso, pois, antes de atingir usuários, certamente
atingirá os profissionais que trabalham com essas pessoas. Certas
conquistas são muito mais políticas do que técnicas e administrativas. E
se são conquistas políticas, são fruto dos debates e precisam ser
respeitadas. Esse tipo de retrocesso reabre as portas não só dos
manicômios, mas do medo, da insegurança e do desrespeito. Política
pública é aquela que a gente faz e o estado implementa, não o contrário."
Retrocesso pode reabrir as portas dos manicômios no Brasil
Por Sonielson Luciano de Sousa
Bacharel em Comunicação Social (CEULP/ULBRA), filósofo (Univ. Católica de Brasília), pós-graduado em Docência Universitária, Comunicação e Novas Tecnologias (Unitins), estudante de Psicologia (CEULP/ULBRA), especialista em Jornalismo Cultural, é editor do jornal e site O GIRASSOL, colaborador do (En)Cena e do Portal Educação, e atua como coach (SBC-SP).
Fotos: http://domicianosiqueira.blogspot.com.br
Ativista conhecido em boa parte do país, Domiciano Siqueira concede
entrevista ao (En)Cena para falar sobre os impactos que a nomeação de
Valencius Wurch Duarte Filho traz para as políticas públicas destinadas a
usuários de álcool e outras drogas, além de toda a rede de atenção
psicossocial e Saúde Mental. Domiciano diz que se nada for feito, não
apenas os usuários destes serviços serão impactados negativamente, mas
uma gama de profissionais envolvidos nestas políticas públicas, como
psicólogos, por exemplo.
Profissional voltado às áreas de Saúde, Educação e Justiça com sólida
experiência no setor, junto às organizações governamentais, não
governamentais e de iniciativa privada, Domiciano Siqueira tem vivência
em treinamentos, elaboração de programas de prevenção, levantamento de
necessidades e implantação de novos sistemas de prevenção à AIDS e ao
uso indevido de drogas. Além disso, detém habilidade na implantação e
coordenação de projetos de vanguarda promovendo a inserção, manutenção e
avaliação de trabalhos, racionalizando custos e otimizando programas já
existentes.
Domiciano também tem um
importante trabalho junto a programas de Redução de Danos, visando a
diminuição na propagação de doenças (DSTs), e a melhoria de vida na
população de usuários de drogas (UDs), como a troca de seringas e
distribuição de insumos. Por fim, Domiciano Siqueira tem vasta
experiência em assessoria e organização de eventos na área de Redução de
Danos, Direitos Humanos e outros. Abaixo, confira a entrevista na
íntegra.
Domiciano Siqueira - O
impacto será desastroso, pois, antes de atingir usuários, certamente
atingirá os profissionais que trabalham com essas pessoas. Certas
conquistas são muito mais políticas do que técnicas e administrativas. E
se são conquistas políticas, são fruto dos debates e precisam ser
respeitadas. Esse tipo de retrocesso reabre as portas não só dos
manicômios, mas do medo, da insegurança e do desrespeito. Política
pública é aquela que a gente faz e o estado implementa, não o contrário.
(En)Cena – Como ativista, quais as suas principais ênfases nesta área e, com esta mudança política no MS, qual o futuro das políticas públicas para o setor?
Domiciano Siqueira - Como
ativista, assim como tantos outros que lutaram ainda muito mais do que
eu, sinto-me estimulado a continuar com muito mais veemência a luta pela
garantia dos Direitos Civis. Há ladrões que roubam dinheiro, há ladrões
que roubam dignidade. Não será a primeira vez que somos chamados a
lutar e empunhar bandeiras em favor da coerência e da liberdade.
(En)Cena – Como está o atual panorama da redução de danos, no âmbito da saúde pública federal?
Domiciano Siqueira - A
Redução de Danos é um dos frutos da Luta Antimanicomial, da Reforma
Psiquiátrica, mas, acima de tudo, fruto do desejo de inclusão, de
respeito e dignidade com relação a grupos e minorias historicamente
abandonados. Num quadro como o atual a RD se torna ainda mais
necessária.
(En)Cena
– Quais as ações que grupos organizados estão tomando a fim de evitar
esta guinada rumo à onda manicomial? Há um movimento político de
pressão? Se sim, haverá sucesso, diante do atual momento de
enfraquecimento das esquerdas?
Domiciano Siqueira - Não
vejo insucesso, encaro como mais uma importante batalha. Pelas redes
sociais já é possível vislumbrar um verdadeiro "levante" contra esse
atraso. É uma situação que deverá gerar uma grande onda de discussões,
debates e embates, que vão contribuir com o amadurecimento da proposta
antimanicomial, com o desejo de uma sociedade de bem estar para todos e
não apenas para alguns.
(En)Cena – Qual o impacto que esta mudança de postura do MS, na área de saúde mental, traz para o SUS, de modo geral?
Domiciano Siqueira - O
SUS já vem sendo combatido há bastante tempo e com mais ferocidade
depois que vieram governos mais populares. Permaneço afirmando que
continuaremos a trabalhar por um SUS melhor, por uma sociedade mais
justa e igualitária. Será mais uma vez que a Saúde deverá ditar os
passos nessa direção.
Domiciano Siqueira - O
mundo é cada vez mais e mais Capitalista. O famoso modelo neoliberal
continua forte na tentativa de construir um mundo de acordo com o que
acreditam, e tem muita força. Confio, no entanto, que as mudanças
ocorrem, mesmo em meio a retrocessos e obstáculos e isso vai contribuir
com o avanço das propostas sociais e humanistas. Não penso em derrota ou
vitória, penso em luta!
Domiciano Siqueira - Não
sou especificamente um otimista, mas "nunca antes na história desse
país" se viu tanta consciência à disposição das pessoas. Se esse
processo ainda esbarra na necessidade de definir o que é maioria e o que
é minoria... é democracia.
Fonte: (En)Cena
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