PICICA: "Deleuze diz
que, tal como a revolução russa, é difícil dizer quando a psicanálise
começou a dar errado. Dito isso, cabe a pergunta: quando a revolução
psicanalítica se tornou um estandarte para bandeiras reacionárias? Não
queremos com este texto “provar” que Édipo não existe. Ele está aí, é
fato, é dado no café da manhã e no jantar. Produzimos neuróticos em uma
linha de montagem. Por isso, o que queremos é fazer um escracho de
Édipo. Queremos encontrar a linhas de fuga que racham a máquina edípica e
explodem o familismo. O que queremos é limpar o inconsciente de Édipo,
desnaturalizar a formação edípica. Retirar a pedra angular da teoria
psicanalítica e ver suas estruturas todas desmoronarem e se
rearranjarem.
A esquizoanálise procura
romper com Édipo, não resolvê-lo! Queremos retomar o processo
esquizofrênico do desejo, lá onde poucos psicanalistas chegaram, mas
não tiveram coragem de continuar. Tudo que queremos dizer é: “sim, sim, Édipo. Já entendemos, já entendemos… mas e depois?“.
Édipo veio com manual de instruções e foi montado dentro de nosso
quarto de bebê. A pergunta é, como desmontar o triângulo edípico?"
Esquizoanálise – o Império de Édipo [ou, a fábrica de neuroses]
Uma criança não brinca apenas de papai e mamãe” – Deleuze e Guattari, Anti-Édipo, p. 66
Deleuze diz
que, tal como a revolução russa, é difícil dizer quando a psicanálise
começou a dar errado. Dito isso, cabe a pergunta: quando a revolução
psicanalítica se tornou um estandarte para bandeiras reacionárias? Não
queremos com este texto “provar” que Édipo não existe. Ele está aí, é
fato, é dado no café da manhã e no jantar. Produzimos neuróticos em uma
linha de montagem. Por isso, o que queremos é fazer um escracho de
Édipo. Queremos encontrar a linhas de fuga que racham a máquina edípica e
explodem o familismo. O que queremos é limpar o inconsciente de Édipo,
desnaturalizar a formação edípica. Retirar a pedra angular da teoria
psicanalítica e ver suas estruturas todas desmoronarem e se
rearranjarem.
A esquizoanálise procura
romper com Édipo, não resolvê-lo! Queremos retomar o processo
esquizofrênico do desejo, lá onde poucos psicanalistas chegaram, mas
não tiveram coragem de continuar. Tudo que queremos dizer é: “sim, sim, Édipo. Já entendemos, já entendemos… mas e depois?“.
Édipo veio com manual de instruções e foi montado dentro de nosso
quarto de bebê. A pergunta é, como desmontar o triângulo edípico?
Fluxos gotejam, passam através do triângulo, separam-lhe os vértices” – Deleuze e Guattari, Anti-Édipo, p. 94
A lógica do inconsciente não é uma lei
universal, a linguagem do inconsciente (orgulho de Lacan) é uma língua
que nos obrigaram a falar. Mas e se nos sentíssemos estrangeiros dentro
de nossa própria nação (casa)? E se fôssemos nômades demais para ficar
dentro deste triângulo apertado de papai e mamãe? Por que se quer a todo
custo que o inconsciente signifique algo? E mais, por que o
inconsciente diz Édipo? Com a psicanálise, torna-se mais difícil ainda
sair da família, que já está investida de todas as repressões sociais.
Ela reforça a repressão sem dar meios para sair dela.
A família é o principal agente de
recalque da produção desejante. A morte sempre vem de fora, e começa com
a família: morte dos fluxos, morte de um ambiente que impede o desejo
de fluir. Deixa de ser investimento social e passa a se confundir com
investimentos familiares. Tudo começa na família, depois, a igreja se
confunde com uma grande família; depois, no escritório, o chefe é nosso
pai; então, filhos da pátria, a polícia. Qual o principal objetivo?
Recalcar um desejo que
sempre procura se expandir. Cada sociedade recalca o desejo de uma
forma, a nossa é produzindo Édipo. É quando as forças de liberação são
usadas para a própria escravidão. Axiomatização do desejo, o beijo do
vampiro. Édipo é produção de inconsciente, não estrutura universal.
Recalcar o desejo, a estrutura familiar corta suas arestas e o organiza
sutilmente dentro de si. O caos de multiplicidades e experimentações se
torna um lindo e amável triângulo.
Édipo produz corpos dóceis.
O sujeito sustenta sua própria repressão, como se fosse sua liberdade.
Há um desejo que a vida continue a ser o que é, um medo de ser
diferente. O sujeito edipianizado deseja a repressão social, a
axiomatização do seu desejo, mantê-lo recalcado. Porque se este desejo
não estiver recalcado, o sujeito perde seu senso de realidade. Pobre
homem edípico, ele quer ser escravo, e pior, acredita que dentro dele
pulsam forças perigosas e primitivas. Pulsões de morte… incestuosas e
parricidas. O desejo da criança tenta escapar, com todas as forças, do
espaço familiar, ele procura a todo momento ultrapassar a si mesmo,
fluir, mas é difícil quando as paredes da casa e as portas são tão
controladoras e vigilantes. A família é estruturada pelo capitalismo, o
inconsciente é estruturado pela família, logo, o inconsciente é
estruturado pelo capitalismo. Não foi a psicanálise que inventou o
Complexo de Édipo, mas ela deixa explícito o neurótico, o põe a nu:
Diga que é Édipo, senão você leva um tapa” – Deleuze e Guattari, Anti-Édipo, p. 61
O desejo não é perigoso por ser desejo da mãe e morte do pai (veja mais aqui)!
O perigo não está aí. O desejo é perigoso porque, por menor que seja,
ele já desafia a ordem estabelecida pelo social. O desejo da criança não
quer dormir no quarto com a mãe e expulsar o pai, ele almeja outras
veredas. Plural demais para caber em uma forma geométrica, todo desejo
investe em um campo social. A família, agente responsável pelo
recalcamento cria a imagem desfigurada de pulsões incestuosas. A
psicanálise diz: “Ah, então é isso que você queria, não é?“, ficamos envergonhados, estupidificados, desmoralizados, sem qualquer saída.
É lastimável ter de dizer coisas tão rudimentares: o desejo não ameaça a sociedade por ser desejo de fazer sexo com a mãe, mas por ser revolucionário” – Deleuze e Guattari, Anti-Édipo, p. 158
A esquizoanálise procura desestruturar o
Eu normal. Quebrar com as estruturas que fizeram do homem um filho do
mal estar na civilização. Afastar de si a pulsão de morte, o ressentimento,
a má consciência. Queremos descobrir as máquinas desejantes de cada um,
não sabemos nem ainda o que pode o corpo e já estamos falando de um
inconsciente estruturado como uma linguagem?
Toda produção desejante é esmagada, submetida às exigências da representação” – Deleuze e Guattari, Anti-Édipo, p. 77
Não estamos falando de história, nem de
papai e mamãe, abrimos um mapa sobre a mesa e se traçamos linhas de
fuga. Somos constantemente colocados em esteiras de produção onde a
única saída para o indivíduo é tornar-se neurótico (e ainda achamos esta
a opção menos pior). Vivemos o melhor do pior dos mundos? Dizem que a
neurose é individual e universal, mas a verdade é que a criança sabe
menos de Édipo que seus pais. A criança não é metafísica como pensam,
ela é uma máquina desejante.
Quando limitamos assim o desejo, quando o
colocamos em um quarto apertado, é óbvio que ele volta-se contra si
mesmo. Nietzsche já disse tão bem: “Todos os instintos que não se descarregam para fora voltam-se para dentro – isto é o que chamo de interiorização do homem” (veja aqui).
Desejo é falta? Só quando encontra tantas barreiras que não encontra
outra alternativa a não ser cavar dentre de nós mesmos. Quando dizem que
o desejo é falta, nós damos risada e pensamos, o que falta são as
alternativas aos desejos. Quando dizem que a psicanálise é a
alternativa, nós rimos e dizemos, o que falta são as alternativas à
psicanálise.
Nenhum comentário:
Postar um comentário